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Na ressaca da Obamafolia.


Alguns breves comentários sobre a viagem de férias do Presidente dos EUA ao Brasil:
1- É inquestionável: o Obama é a cara simpática da potência hegemônica. Mas os deslumbrados de plantão não devem esquecer (se é que algum dias eles se lembraram) que hegemon é hegemon, não importando se a sua face aparente é branca ou negra, democrata ou republicana;
2- Em linhas gerais, o que mudou de fato na política externa americana nos últimos dois anos? Afinal, enquanto o Obama se divertia no Brasil, os EUA capitaneavam mais uma intervenção internacional “em nome das liberdades e dos direitos humanos” na Líbia...
3- E por falar nisto, o que será que aqueles que tem uma visão panglossiana (ou mais popularmente, “poliânica”) das relações internacionais acham desta história de bombardear populações civis para “libertá-las” de um ditador sanguinário que bombardeia populações civis?
4- Outra coisa: é sempre importante lembrar que os líderes execrados de hoje eram os aliados estratégicos do ocidente, em um passado não muito distante. Tão estratégicos que até ajudaram a financiar campanhas eleitorais de candidatos eleitos para os governos de potências ocidentais....
5- And last but not least, a Patrícia Amorim repetiu com o Obama a mesma coisa que fez com o falecido José Serra: deu-lhe uma camisa do Flamengo. E do jeito que as coisas vão para o Baraca lá nos EUA, periga ele ter o mesmo fim que o Mr. Burns da Paulista! Sei não, mas este ato de entregar a camisa do Urubu da Gávea para “pessoas ilustres” está parecendo mais uma espécie de beijo da morte...
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Diálogo fictício, porém plausível, em um táxi carioca.


Um homem de meia-idade, bem-vestido, pega um táxi nas imediações da Rua Uruguai, em direção ao Centro da Cidade. No rádio do carro, a CBN anuncia a queda de Mubarak, no Egito. Entusiasmado, o passageiro começa a jogar conversa fora: “Essas manifestações no Egito foram fantásticas! O povo nas ruas lutando contra um ditador, pela liberdade! Aqui no Brasil é que as pessoas são muito acomodadas, não lutam por seus direitos! Tanta roubalheira por aí e ninguém fala nada! Aqui se tem cerveja, samba e futebol, está todo mundo feliz e ninguém quer saber de porcaria nenhuma!”.
E o táxi vai chegando ao Centro: “Que merda! A Presidente Vargas está toda engarrafada! O que é que é? Manifestação dos Sem-Terra? Que pouca vergonha! Bando de arruaceiros, de vagabundos que não querem trabalhar! E a polícia não faz nada, deixa esses caras fazerem baderna e atrapalharem a vida de todo mundo! Duvido que no tempo dos militares eles se engraçassem assim! Pra dar jeito neste país só uma ditadura mesmo!”.

Moral da História: Por que os medioclassistas e os “veículos de comunicação” que fazem a sua cabeça apóiam as manifestações populares no Egito e no restante do mundo árabe? Resposta óbvia: porque elas estão longe daqui...
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Elocubração político-metafísica à la Globo News...

Desde Akhenaton, a história mostra que, no Egito, a derrubada de um governo impopular não significa que o que virá depois será melhor...
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Seminário "A Política Externa Brasileira na Era Lula: um Balanço"- Universidade Federal Fluminense.

Entre os dias 20 e 23 de setembro de 2010, no auditório do ICHF/UFF, acontecerá o Seminário "A Política Externa Brasileira na Era Lula: um Balanço". Organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos - PPGEST/UFF, o evento reunirá alguns dos maiores especialistas brasileiros sobre o tema - vinculados à diversas universidades, instituições de pesquisa, órgãos governamentais e "think tanks" de todo o país - e pretende analisar e debater de forma plural os rumos da política exterior do Brasil durante os oito anos de governo do Presidente Lula. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas através do site do evento, onde também pode ser consultada a programação completa do mesmo.

Clique aqui e acesse o site do Seminário.
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A Política Externa do Governo Lula e os Direitos Humanos.

Nos últimos tempos, a grande imprensa tem atacado sistematicamente a atual política externa brasileira, acusando o governo Lula de estar rompendo com as tradições do Itamaraty e de “ideologizar” nossas relações exteriores. Acrescente-se a isto as recorrentes afirmações - feitas por articulistas dos principais jornais e revistas do país ou por “embaixadores de pijamas” ligados ao governo anterior – de que o Brasil mantém relações cordiais ou mesmo de conivência com Estados que violam constantemente os direitos humanos. Esses comentários estão longe de traduzir a realidade e na verdade refletem a utilização por parte dos grandes grupos de mídia – que têm assumido claramente o papel de opositores ferozes do atual governo – de questões de política externa para “engrossar o caldo” da luta política interna que ora se trava. Desta forma, procura-se construir na opinião pública uma percepção negativa sobre os movimentos da política externa brasileira e, consequentemente, sobre o próprio governo. Em um excelente artigo publicado na “Folha de São Paulo” – de vez em quando ela publica algo que preste para manter o discurso de ser um jornal plural - , o Ministro Celso Amorim reflete sobre estas questões e coloca o dedo na ferida ao explicitar os reais interesses existentes por trás das condenações as posições assumidas pelo Brasil no cenário internacional.

Dedo acusador pode render aplauso, mas raramente salva

Atuar com discrição é a expressão da natureza conciliadora do brasileiro

Celso Amorim

Têm sido frequentes as críticas que apontam para uma suposta “indiferença” - ou mesmo “conivência”- da diplomacia brasileira diante de países acusados de violar os direitos humanos. Trata-se de um juízo equivocado.
O Brasil deseja para todos os demais países o que deseja para si - a democracia plena e o respeito aos direitos humanos, cuja consolidação e aperfeiçoamento têm sido uma das preocupações centrais do governo do presidente Lula.
Consideramos, entretanto, que as reprimendas ou condenações públicas a outros Estados não são o melhor caminho para obter esse resultado. Na verdade, escolher a intimidação em detrimento da persuasão é quase sempre ineficaz, quando não contraproducente.
O dedo acusador pode render aplausos ao dono, mas raramente salva o jornalista silenciado, o condenado à morte, o povo sem acesso à urna ou a mulher privada de sua dignidade. Isolar quem se quer convencer ou dissuadir é má estratégia.
Preferimos dar o exemplo e, ao mesmo tempo, agir pela via do diálogo franco - em geral, mais eficaz. No caso do Brasil, essa capacidade de atuar com discrição não é oriunda de algum talento excepcional: é a expressão, em nossas relações com outros Estados soberanos, da natureza conciliadora do povo brasileiro.

AGENDA
Ações desse tipo são bem menos visíveis do que a admoestação midiática exercida por alguns países contra um punhado de governos, selecionados de forma nem sempre criteriosa ou politicamente isenta. A escolha dos indigitados, além de obedecer a agenda política, muitas vezes revela preconceitos, ora religiosos, ora raciais.
Muitos dos países que se consideram modelares cultivam relações com regimes não democráticos, desde que isso corresponda a interesses econômicos ou estratégico-militares. Os exemplos são tantos que não podem escapar ao mais complacente dos olhares.
Além disso, alguns aplicam, eles próprios, a pena capital. Ou conferem tratamento desumano e degradante a trabalhadores imigrantes. Ou ainda transferem suspeitos sem julgamento para prisões secretas, em voos também secretos. Isso para não falar de ações militares unilaterais, à margem do Conselho de Segurança da ONU, que resultam em milhares de vítimas civis.
O Brasil considera que as referências específicas a outros Estados no campo dos direitos humanos devem ser feitas preferencialmente no âmbito do Mecanismo de Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (CDH), que, aliás, nosso país ajudou a criar.
Ali se busca o tratamento não seletivo, objetivo e multilateral dos direitos humanos em todos os países-membros da ONU.
Em 2011, os métodos de trabalho do CDH serão revisados. Procuraremos aperfeiçoá-los para que o órgão se torne cada vez mais eficaz e para que possa trazer benefícios diretos àqueles que sofrem violações. Em matéria de direitos humanos, como já declarei diversas vezes, não há país que não tenha algo a ensinar, assim como não há país que não tenha algo a aprender.
No esforço de persuadir, o Brasil se vale da cooperação com organizações ou países da mesma região, que têm muito mais probabilidade de serem ouvidos do que, por exemplo, as ex-potências coloniais ou outras nações cuja ação é percebida como reflexo de arrogância e complexo de superioridade.
Destas, pode-se dizer, como na Bíblia, que percebem mais facilmente o cisco no olho do próximo do que a trave em seu próprio olho. Foi o que se revelou quando propusemos, na antiga Comissão de Direitos Humanos, resolução que enunciava que o racismo era incompatível com a democracia.
Tampouco é verdade que o Brasil se recuse a recorrer à condenação quando o diálogo se revela ineficaz.

SEM INDIFERENÇA
O acompanhamento cuidadoso, não movido por preconceitos, de nossas votações no CDH revela que estas estão longe de obedecer a um padrão uniforme e tomam em conta uma variedade de fatores. Muito recentemente, aliás, o Brasil apoiou resolução condenatória a um Estado que se negou a acolher recomendações que tinham por objetivo aperfeiçoar a situação dos direitos humanos no país.
Tampouco é demais lembrar que, por meio da ação multilateral e de projetos de cooperação, o Brasil tem ajudado concretamente na melhora da situação de direitos humanos - no Haiti, na Guiné-Bissau e na Palestina, para citar apenas alguns. As posições do Brasil são fruto de um conjunto bem menos simplório de considerações do que a enganosa dicotomia entre bons e maus. O Brasil não é indiferente ao sofrimento daqueles que defendem liberdade de expressão ou de culto, dos que lutam pela democracia, dos que se insurgem contra discriminações de toda natureza.
Ao contrário, nossa diplomacia busca constantemente -sem alarde, sem interferências que geram resistências e ressentimentos, mas visando resultados efetivos- atuar em prol da universalização dos valores fundamentais da sociedade brasileira.
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Sobre o terrorismo.

Nos últimos dias, tenho lido em sites de diversas publicações conservadoras ou pró-Israel, brasileiras e estrangeiras, inúmeros artigos sobre o episódio da invasão pelas forças de segurança daquele país à flotilha que levava ajuda humanitária à Gaza. Em quase todos eles, os ativistas que estavam nos navios são chamados de "terroristas" e acusados de terem "reagido violentamente" à "abordagem pacífica" dos israelenses. Por isto, não pude deixar de lembrar dos versos do poema "Apóio o terrorismo", do poeta sírio Nizar Qabbani, transcritos por Tariq Ali em seu livro "Bush na Babilônia". Neste poema, Qabbani identifica-se com os movimentos de resistência palestinos que Israel e os setores pró-Israelenses no ocidente associam ao "terrorismo" e, que por isto, acabam sendo colocados em um grande saco-de-gatos, ao lado de grupos extremistas de toda a espécie, que proliferam às margens da tal "ordem mundial". Ah, é importante ressaltar que a própria esposa do poeta foi morta quando muhajedins libaneses atacaram a embaixada iraquiana no período da guerra entre o Irã e o Iraque. Mas isto não o impediu de se posicionar claramente em defesa do povo palestino e contra o terror de Estado implantado por Israel. Reproduzo abaixo trechos deste poema:

(...) Acusam-nos de terrorismo
se escrevemos a ruína de uma terra arruinada
dilacerada, fraca...
um lar sem endereço
uma nação sem nome

Um lar que nos proíbe de ler jornais
e de ouvir as notícias.
Um lar onde os pássaros são proibidos
de cantar.
Um lar onde, pelo terror,
acostumamo-nos a escrever
sobre nada. (...)

Estados Unidos da América
Contra a cultura dos povos
porém sem cultura
Contra as civilizações civilizadas
mas sem civilidade
Estados Unidos da América
Um poderoso edifício
sem paredes! (...)

Acusam-nos de terrorismo
se defendemos nossa terra
e a honra do chão...
e revoltamo-nos por sua honra
quando abusam de nós e de nosso povo
e acusam-nos se protegemos as últimas palmeiras do nosso deserto
as últimas estrelas do nosso céu
a última sílaba de nossos nomes
e o último leite do seio materno
e se este foi nosso pecado
como é belo o terrorismo (...)

Apóio o terrorismo
se ele pode libertar um povo
da tirania e dos tiranos
e salvar o homem da crueldade humana (...)

Apóio o terrorismo
enquanto a nova ordem mundial
quiser massacrar nossos descendentes
e atirá-los aos cães.
E é por tudo isso
que elevo minha voz às alturas:
defendo o terrorismo
estou com o terrorismo
apóio o terrorismo...
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Sobre o Irã.

Reproduzo abaixo, com a devida autorização, o ótimo texto de um estimado colega do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense. Um texto simples, objetivo, bem-escrito e que coloca de forma contundente os devidos pingos nos is.

CHAFURDO NO CORETO

Manuel Domingos Neto

(Professor de Ciência Política da UFF e editor da Revista “Tensões Mundiais”).

Os poderosos precisam enviar permanentemente sinais de força; seus arsenais carecem de testes práticos e seus complexos tecnológico-industriais de encomendas. Assim, a invasão do Irã estava traçada: diabolização de suas lideranças, imposição de apertos econômicos, fomento à oposição política interna, convencimento da opinião mundial de que a bomba atômica estaria sendo preparada e que o mundo ficaria mais feliz com Ahmadinejad enforcado.

Usado no caso iraquiano, tal roteiro se desenvolvia rapidamente até a entrada em cena de dois emergentes, Brasil e Turquia, ambos sem assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Os EUA e seus grandes aliados, com insolúveis crises internas e, externamente, em déficit de legitimidade, não queriam nem querem acordo. Caso contrário, a primeira iniciativa seria a desativação das ogivas israelenses. Sem perspectivas promissoras à vista, os mandões pretendem manter a todo custo a autoridade conferida pelo monopólio da arma nuclear, o mais terrível instrumento de destruição em massa já inventado.

Correndo por fora, Brasil e Turquia, com experientes e atrevidos chanceleres, Celso Amorim e Ahmet Davutoglu, bagunçaram-lhes o coreto ao promover o inesperado acordo com o Irã e ao escancarar o fim do alinhamento automático que marcou até recentemente suas políticas externas. Ficou mais difícil cumprir o roteiro agressivo e menos convincente a ilusão de que podem continuar mandando indefinidamente. Desconcertados, restaram-lhes declarações amarelas de descrença na sinceridade iraniana e admoestações arrogantes a Lula, protagonista maior do espetáculo. Prosseguirão, sem dúvida, seus intentos bélicos, porém não mais com a mesma facilidade.

Ao lutarem pelo acordo, Brasil e Turquia defenderam seus próprios interesses e os interesses da paz. Apenas potências decadentes lucrariam com a insegurança global ensejada por uma nova guerra; apenas governantes carentes de reconhecimento se beneficiariam com os surtos de unidades nacionais propiciadas por mobilizações guerreiras. Não é este o caso do Brasil de Lula nem da Turquia do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan.

A propaganda dos mandões destacou a decisão iraniana de continuar enriquecendo urânio a 20%. Ora, o acordo tranqüilizaria a todos quanto à fabricação da bomba, mas não implicaria em renúncia ao domínio da tecnologia nuclear, já que isso comprometeria o desenvolvimento. Esta tecnologia não se limita a geração de bombas e a geração de eletricidade; se presta a incontáveis aplicações, da medicina à agricultura, da navegação aérea aos utensílios domésticos. Caso o Brasil e a Turquia acatassem a completa interdição da tecnologia para os iranianos, trairiam suas próprias pretensões de autonomia.

Os brasileiros, que não querem a bomba, jamais abdicariam do enriquecimento do urânio. Destaque de nossa agenda estratégica, inclusive, é o submarino movido a energia nuclear, com maior capacidade de dissuasão. Hoje, apenas cinco países dispõem dessas máquinas impressionantes e de autonomia para fabricar seu combustível. Abandonar o enriquecimento de urânio, a rigor, seria persistir reverenciando uma ordem mundial em franco declínio.

Ao repelir o acordo brasileiro-turco-iraniano, o Conselho de Segurança da ONU entoa música antiga a ouvidos ansiosos por novas harmonias.

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As Sepulturas Caiadas ou Uma Falsa Polêmica.

Eu penso que a greve de fome não pode ser utilizada como pretexto de direitos humanos para libertar pessoas. Imagina se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade. Temos que respeitar a determinação da justiça e do governo cubano, de deter as pessoas em função da legislação de Cuba, como quero que respeitem ao Brasil.
(Declaração de Lula à Agência de Notícias Associated Press)

Duas idéias aparecem como centrais nesta fala do Presidente da República:

1- Ele é contra a utilização da greve de fome como instrumento de luta política e/ou reivindicatória;
2- Ele invoca o princípio da não-ingerência nos assuntos internos de Cuba, como justificativa para a não-condenação de eventuais violações dos direitos humanos cometidas pelo governo dos irmãos Castro.

A primeira destas idéias pode ser questionada por muitos, visto que no passado o próprio Lula já recorreu a este instrumento de luta; porém esta é uma opinião bastante defensável e que deve ser respeitada, concorde-se com ela ou não. A segunda idéia, que também pode ser questionada, não deixa de se encaixar dentro daquilo que alguns historiadores da nossa Política Externa (como o ex-ministro Rubens Ricupero, por exemplo) definem como uma das “tradições” das nossas relações exteriores, consolidada durante a gestão do Barão do Rio Branco, no Itamaraty: a defesa do princípio da não-ingerência. No entanto, não são estas idéias centrais da fala de Lula que estão sendo bombardeadas pela grande imprensa, mas sim algo absolutamente secundário e que o presidente utilizou somente como exemplo, para ilustrar suas afirmações: uma suposta comparação entre os presos comuns do Brasil e os presos políticos de Cuba. Pode até ter sido um exemplo infeliz, mas fica claro que, em nenhum momento, Lula afirmou que os presos comuns daqui são iguais aos presos políticos de lá. Também é bastante óbvio que o que ele quis dizer foi que, concordemos com elas ou não, o Estado cubano tem o direito de fazer cumprir as suas leis no território sob sua soberania. No entanto, esta frase retirada de seu contexto tem sido utilizada pela grande imprensa (marrom) para criticar, de forma acintosa, o presidente da República (Em “O Globo” de hoje, só para exemplificar, existem três páginas dedicadas ao tema!). Esta é que é a tal da liberdade de imprensa defendida pelos oligopólios midiáticos...

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Ainda sobre esta questão, não sou nenhum entusiasta do regime castrista (apesar de admirar bastante o povo cubano e de reconhecer algumas das conquistas da revolução), porém, como já escrevi em posts anteriores, só um completo idiota não consegue perceber como a grande imprensa brasileira é bastante seletiva ao criticar a violação dos direitos humanos ao redor do mundo. Assim, se ela é pródiga em críticas à Cuba, à Venezuela e ao Irã, este discurso humanitário desaparece (ou diminui muito de intensidade) quanto se trata das violações cometidas pelos EUA, por Israel ou mesmo pela China. E é claro que as relações que o Brasil mantém com aqueles países são criticadas de forma bastante cínica pelos jornalões e revistas semanais de (des) informação: afinal de contas, não se pode perder a oportunidade de criticar o governo Lula e de ecoar os temores da nossa "classe-mérdia" que, 20 anos depois da queda do Muro de Berlim, ainda se caga de medo quando ouve a palavra “comunismo”. Assim, não dá para deixar de lembrar das palavras de um grande intelectual conservador francês, que por muitos anos foi editor do “Le Figaro”, Raymond Aron. Ao comentar a questão dos direitos humanos como base para a política exterior de um Estado, em uma entrevista concedida em 1980, Aron disse algumas palavras que podem soar cruéis a alguns ouvidos poliânicos, mas que refletem, na verdade, a dura realidade da política internacional:

Entrevistador: O senhor acha que se pode basear uma política nos direitos humanos?
Aron: É possível viver na obsessão de defender os direitos humanos. Se a questão é ter uma política externa, não, não se pode fazer uma política externa a partir da idéia do respeito aos direitos humanos. Se os Estados Unidos tivessem como princípio absoluto só reconhecer como aliados os regimes que respeitam os direitos do homem, pergunto-me quantos Estados, fora da Europa ocidental, poderiam ser aliados dos Estados Unidos.
Entrevistador: Isso supondo-se, aliás, que os próprios Estados Unidos os respeitem sempre...
Aron: Disse há pouco que não há país algum em que os direitos humanos sejam sempre respeitados, e em particular, todos os direitos humanos. Não é tão fácil definir e enumerar os direitos humanos, e não se sabe muito bem em nome de que se considera isto fundamental e aquilo secundário.

Os "capos" da máfia midiática com certeza concordam com esta fala. Mas, como bons fariseus que são, eles vão continuar a proferir seus hipócritas discursos humanitários, assumindo-se assim como as verdadeiras “sepulturas caiadas” a que JC se referia...
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Dois Pesos, Duas Medidas.


Situação 01: Em uma área conflagrada e ocupada por uma decadente potência estrangeira, uma organização nacionalista de extrema-direita, ligada a um dos lados em conflito, explode um grande hotel matando 91 pessoas. Alguns anos depois, o principal líder desta organização torna-se primeiro-ministro de seu país;

Situação 02: Numa região em conflito, a ONU envia um mediador para tentar um acordo entre as partes. Este emissário é assassinado por membros de uma organização ultranacionalista vinculada a uma destas partes. Um dos envolvidos neste episódio, alguns anos depois, também se torna primeiro-ministro de seu país;

Situação 03: Em um país dividido por uma longa guerra civil, milicianos ligados a um dos lados beligerantes atacam campos de refugiados estrangeiros e matam milhares de pessoas. A guarda destes campos estava a cargo de um outro Estado que no citado conflito apoiava o grupo que promoveu o massacre. O ministro da defesa deste Estado estrangeiro foi responsabilizado pela opinião pública internacional e por seus próprios compatriotas como sendo o grande responsável por este trágico acontecimento e, por conta disto, foi demitido do cargo que ocupava. Porém, alguns anos depois, ele acabou - como nos casos anteriores - se tornando primeiro-ministro de seu país.

Se você classifica tais atos como crimes ou exemplos de terrorismo e considera um absurdo que criminosos e terroristas transformem-se nas principais lideranças políticas de seus países, aí vão duas perguntas: o que você diria se soubesse que os três personagens citados nas situações relatadas tornaram-se primeiros-ministros de um mesmo Estado? Como você definiria este Estado?

Então vamos lá: na situação 01, a região conflagrada era a Palestina, o ano era 1946, a potência decadente era a Inglaterra, os lados em conflito eram os judeus e os árabes-palestinos, o hotel em questão era o Hotel King David, em Jerusalém, a organização era o Irgun Zvai Leumi e o seu líder que se tornaria primeiro-ministro de Israel era Menachem Begin; na situação 02, a região em conflito também era a Palestina, o ano era 1948, o mediador da ONU era o Conde Folke Bernardotte (da família real sueca), a organização ultranacionalista era a Gangue Stern e o seu membro que se tornaria primeiro-ministro (também de Israel) era Yitzhak Shamir; na situação 03 (que está retratada na imagem que ilustra este post), a guerra civil em questão era a do Líbano, o ano era 1982, os milicianos eram cristãos maronitas, os refugiados eram palestinos, os campos eram os de Sabra e Chatila, a potência estrangeira responsável por sua “guarda” era Israel e o ministro da defesa que foi responsabilizado pelo massacre era Ariel Sharon, que alguns depois se tornaria primeiro-ministro de... Israel!

Levanto estas questões depois de saber que, devido ao anúncio de uma nova data para a visita do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, ao Brasil, a comunidade judaica brasileira está se mobilizando - com uma repercussão extremamente favorável nos principais veículos de comunicação do país - para que, no dia da visita, os seus membros coloquem no peito a estrela amarela, com a qual os judeus eram marcados nos campos de concentração nazistas. O resgate deste símbolo deverá ser feito em protesto contra a presença do líder iraniano (que sabidamente defende teses revisionistas em relação ao holocausto), que eles classificam como “tirano, fundamentalista e militarista”. Ora, todos nós sabemos que Ahmadinejad não é flor que se cheire. Mas e os ilustres primeiros-ministros israelenses citados acima, como devemos classificá-los? Se o Brasil mantém relações com Israel que teve líderes como Begin, Shamir e Sharon, qual é o problema em manter relações com o Irã dos aiatolás? A política externa de um Estado não deve ser efetuada levando-se em conta os seus interesses nacionais? Se é interessante do ponto de vista econômico ou estratégico manter relações com o Irã, com Israel ou com quer que seja, por que o Brasil não deve fazê-lo?

Continuando com a mesma linha de raciocínio: se os atos belicosos de Israel são justificados como sendo em "defesa de seus interesses", por que os do Irã são classificados como "perigosos" para a paz mundial (a notinha da coluna de Ancelmo Góis em "O Globo", no dia 26/10, que noticiou a mobilização da comunidade judaica contra a visita de Ahmadinejad intitulava-se, significativamente, "Paz no Mundo")? E por que será que para os judeus – e para a maior parte da mídia brasileira - “terroristas” e “criminosos” são sempre os outros? E mais: por que ao invés de discutir tais questões de maneira aberta e livre, boa parte das lideranças judaicas prefere cair no discurso fácil de acusar seus críticos de anti-semitas? Por que, com a cumplicidade dos meios de comunicação, estas mesmas lideranças confundem deliberadamente dois conceitos absolutamente distintos como “anti-semitismo” e “anti-sionismo”? Até quando os horrores do holocausto (sim, é um absurdo que o Ahmadinejad procure negar a sua existência!) servirão de pretexto e de desculpa para que Israel perpetre horrores semelhantes aos palestinos? Tantas perguntas, tão poucas respostas. E sempre, mas sempre mesmo, a comunidade judaica – e a “Veja” e “O Globo” e o “Estadão” e a “Folha” - usando dois pesos e duas medidas para analisar tais questões...
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O Prêmio Nobel de Obama e a Encruzilhada Norte-Americana no Iraque e na Ásia Central.

De maneira até certo ponto surpreendente, o presidente dos EUA, Barack Obama, foi o escolhido para receber o Prêmio Nobel da Paz de 2009. Tal premiação deve ser entendida muito mais como um estímulo à ocorrência de transformações concretas na política externa norte-americana – e também como um respaldo das forças progressistas do mundo a um presidente que, eleito com um discurso de mudança, tem enfrentado uma séria oposição interna por parte dos setores mais conservadores de seu país -, do que como o reconhecimento dos resultados de ações práticas do governo estadunidense. De modo geral, em seus aspectos mais significativos, os movimentos de política externa da potência hegemônica ainda não sofreram alterações significativas com o novo governo. É lógico que hoje – como geralmente ocorre em governos democratas – os EUA tem dado uma ênfase maior ao multilateralismo e ao fortalecimento das organizações internacionais, além de assumirem compromissos com o restante do mundo em relação à questões como meio-ambiente, direitos humanos e desarmamento. Porém uma das questões centrais da agenda internacional permanece quase que no mesmo patamar da Era Bush: a política norte-americana para o Oriente Médio e para a Ásia Central. Nestas regiões, além da manutenção do apoio irrestrito ao Estado de Israel, os EUA afundam cada vez mais nos atoleiros do Iraque – de onde não conseguem sair (apesar das declaradas intenções de Obama de que isto ocorra em breve) devido à fragilidade das instituições do “reconstruído” Estado iraquiano – e do Afeganistão, local em que a milícia talibã mantém-se bastante forte – e por conta disto, o novo governo norte-americano aumentou o efetivo das forças militares que ocupam o país – e onde trava-se um, ainda, discreto jogo geopolítico entre EUA e Rússia envolvendo o acesso aos recursos energéticos na Ásia Central. Neste sentido, algumas questões que levantei em um paper apresentado em um evento acadêmico em 2005 – ainda no início do segundo mandato de George W. Bush – permanecem bastante atuais. Reproduzo abaixo alguns trechos desse trabalho:

(...) ao pensarmos o mundo neste início de século XXI, temos de levar em consideração que estamos vivendo na ordem mundial que se ergueu sobre os escombros da Guerra Fria, e que esta ordem é baseada na hegemonia de uma superpotência – os EUA – que impõe as suas políticas, os seus valores e a sua visão de mundo às demais nações do Globo. Portanto, o decantado processo de Globalização, na verdade, deveria ser chamado de “Americanização”. Do "soft power" da Era Clinton ao intervencionismo expresso pela Doutrina Bush, o que temos assistido são os movimentos de uma potência imperial procurando fazer valer os seus interesses, a partir da “crença de que o mundo pode se tornar seguro com uma Pax Americana na qual a hegemonia global dos Estados Unidos se estabeleça num futuro previsível”.¹

(...) é importante assinalar que, paradoxalmente, foram o fenômeno da globalização e o desenvolvimento tecnológico que possibilitaram o surgimento de organizações como a Al-Qaeda, bem como a “democratização” do uso de armas de destruição em massa. Tais fatos contribuíram para que “mesmo os mais estáveis e eficazes Estados” perdessem “o monopólio da força coerciva, entre outras razões devido à chegada de inúmeros instrumentos de destruição novos, pequenos e portáteis e da extrema vulnerabilidade da vida moderna às perturbações repentinas, por pequenas que sejam”.² Este processo também foi facilitado pela pressão exercida pelos EUA e seus aliados ocidentais sobre a URSS, no momento de sua desintegração (dentro da lógica triunfalista do fim da Guerra Fria), que fez com que, naquele momento de crise, muitos segredos tecnológicos chegassem às mãos de organizações não-estatais.

Em segundo lugar, deve se ressaltar o apoio sistemático dos EUA ao Estado de Israel, baluarte do ocidente no Oriente Médio, e ator principal de um dos principais focos de tensão do mundo contemporâneo, os conflitos árabe-israelenses. Este apoio, agravado pelas péssimas condições de vida do povo palestino e pelos inúmeros acordos políticos feitos pelos norte-americanos com setores considerados “confiáveis” do mundo árabe, fazem com que a região torne-se um terreno fértil para o surgimento e a proliferação de grupos fundamentalistas islâmicos que difundem o ódio a tudo que os EUA representam. Não se pode esquecer que o mais famoso desses grupos, a Al-Qaeda, fez de um objetivo político de caráter local – a derrubada da dinastia dos Saud e o controle dos lugares sagrados do islã – uma luta de caráter global.

Finalmente, não se deve esquecer o já assinalado aprofundamento do abismo existente entre ricos e pobres que veio no bojo da nova ordem mundial. Nos últimos 30 anos, a movimentação financeira passou de U$ 70 milhões/dia para U$ 1,5 trilhões/dia, capitais esses que acabam convergindo para os países centrais do sistema, em particular, para a grande potência hegemônica (...)

Por tudo isto, a concretização da Pax Americana, triunfalmente anunciada no início da década de 1990, parece estar bastante distante e a grande potência do norte enfrenta diversos obstáculos para consolidar sua hegemonia imperial. Neste momento, o mundo parece ser um lugar muito mais inseguro para se viver, do que há duas décadas atrás e a crença central da modernidade – a de que razão, o progresso e o conhecimento científico trariam a emancipação da humanidade – está cada vez mais esmaecida (...)

Referências Bibliográficas:

¹ GRAY, John. Al-Qaeda e o que significa ser moderno. Editora Record, Rio de Janeiro/São Paulo, 2004.
² HOBSBAWM, Eric. “A Falência da Democracia”. In: Caderno Mais – Folha de São Paulo, 9/9/2001.
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Outros Drops.

Sempre que eu escrevo algum post com referências musicais ou quero compartilhar alguma canção com os leitores do "Abobrinhas", costumo utilizar o site de compartilhamento de músicas "MP3Tube", que recentemente mudou de nome para "Yehplay". No entanto, há alguns dias parece que ele saiu do ar (definitivamente?), pois quando digita-se o endereço da sua página, automaticamente ocorre o redirecionamento para um site de jogos. Com isto, as músicas linkadas em vários dos meus textos no "Abobrinhas" - inclusive em um dos últimos, "Qualquer Música, Uma Certa Canção..." - não estão mais acessíveis, como se pode notar pelo "sumiço" do Player do MP3Tube nos posts. Preciso encontrar, com urgência, um outro site do gênero. Assim que o fizer, recoloco as músicas.
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Anteontem, assistindo ao "Jornal da Globo", fiquei absolutamente atônito (mas não surpreso!)com o lobby feito pela emissora da Família Marinho em favor da empresa norte-americana Boeing, no processo de compra de novos caças para a Força Aérea Brasileira. Mencionando, muito de passagem, o nome das outras empresas que disputam a concorrência, a Saab (Suécia) e a Dassault (França), o programa fez uma longa reportagem mostrando as vantagens do Caça Super Hornet, da fabricante norte-americana, e as intenções da Boeing em transferir tecnologia para o Brasil, seguindo "orientações" do governo Obama. Tudo isto, com direito a uma longa entrevista de William Waack, com um dos diretores da empresa. Enfim, propaganda pouca é bobagem. E viva a nossa imprensa livre, isenta e imparcial...
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Acordei hoje, não sei por qual motivo, com um poema na cabeça, "Viver sempre também cansa", do poeta português José Gomes Ferreira. Escrito em 1931, ele permanece profundamente atual. É só substituir o nome de Mussolini pelo de algum líder político contemporâneo que se caracterize pela escrotidão e pelas tendências fascistóides. Tenho certeza que não faltarão candidatos...

Viver sempre também cansa
O sol é sempre o mesmo e o céu azul
Ora é azul, nitidamente azul,
Ora é cinzento, quase verde
Mas nunca tem a cor inesperada

O mundo não se modifica
As árvores dão flores
Folhas, frutos e pássaros
Como máquinas verdes

As paisagens também não se transformam,
Não cai neve vermelha
Não há flores vermelhas que voem
A lua não tem olhos
E ninguém vai pintar olhos à lua

Tudo é igual, mecânico e exacto

Ainda por cima os homens são os homens
Soluçam, bebem, riem e digerem.
E há bairros miseráveis sempre os mesmos,
Discursos de Mussolini
Guerras, orgulhos em transe,
Automóveis na corrida.

Pois não era mais humano
Morrer por bocadinho,
De vez em quando,
E recomeçar depois,
Achando tudo mais novo?

Ah! Se eu pudesse suicidar-me por seis meses,
Morrer em cima de um divã
Com a cabeça sobre uma almofada,
Confiante e sereno por saber
Que tu velavas, meu amor do Norte.

Quando viessem perguntar por mim,
Havias de dizer com teu sorriso
Onde arde um coração em melodia,
“Matou-se esta manhã
Agora não o vou ressuscitar
Por uma bagatela”

E virias depois, suavemente,
Velar por mim, subtil e cuidadosa
Pé ante pé, não fosses acordar
A Morte ainda menina no meu colo.
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Trilha Sonora do Dia: "Famous Blues Raincoat", de Leonard Cohen.
Infelizmente, sem o MP3Tube para compartilhá-la...
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Sobre Liberman e Ahmadinejad: alguns breves comentários a partir de um texto de Sérgio Besserman.

Avigdor Liberman durante encontro com o Governador José Serra

No dia 22/07, o economista Sérgio Besserman Vianna publicou em seu blog, no site de “O Globo”, o post que reproduzo abaixo (mantendo os erros de digitação/português do original):

Cadê os outros ?

O secretário de Relações Internacionais do PT, Valter Pomar, chamou o chanceler de Israel, Avigdor Liberman, de racista. Querem saber? Eu tambem acho que o Liberman é racista e acho, além do mais, que a declaração do PT é oportuna. Politica externa é assunto importante da cidadania...
Contudo, há um problema...e ele é grande, enorme mesmo...
Se o PT considera oportuno, como eu considero, criticar o Liberman e , por tabela, o perigoso governo do radical Netanyahu, fica na forte obrigação ética de pronunciar-se com a mesma ênfase sobre o racista, facista, homofóbico, opressor de mulheres, perigoso radical e fundamentalista religioso ignorante presidente do Irã Ahminejad quando de sua visita ao Brasil.
Para não falar do matador de cristãos , genocida, pária e condenado internacionalmente presidente do Sudão Omar Al Bashir, que tambem é , junto com o Ahminejad , queridinho seleto do governo brasileiro.
Fico ao aguardo, na esperança de assistir essa demonstração de independencia do PT em relação ao governo, de uma fortíssima condenação pública desses dois personagens do mal ( como tambem são, na minha opinião, o Netanyahu e o Liberman ) .
Não faze-lo será pusilaneme e, pior, racista !

Após a leitura deste texto - que me foi enviado, via e-mail, por um colega -, decidi postar aqui alguns breves comentários a respeito das questões por ele levantadas:

1- Em primeiro lugar, conscientemente ou não, Besserman cai em um discurso recorrente entre boa parte dos judeus progressistas: embora critiquem a direita israelense, eles não deixam de compará-la a líderes muçulmanos, como se estivessem justificando, assim, os inúmeros crimes contra a humanidade cometidos pelo Estado de Israel. Na verdade, o que tal discurso oculta é a crença inconfessável - pelo menos para esses setores - de que Israel é, na verdade, uma “ilha de civilização” em meio a “barbárie muçulmana”. Logo, o limite da "visão progressista" desses judeus é a sua impossibilidade de criticar o Estado israelense, preferindo então personalizar as críticas a partidos e líderes da direita judaica. O problema é que a História mostra que as violações dos direitos humanos cometidas por Israel ocorreram – e ocorrem – independentemente de quem esteja no governo, seja a centro-esquerda trabalhista, o Khadima ou o Likud;

2- Em segundo lugar, o bravo economista tucano procura estabelecer em seu texto – agora sim de forma consciente e deliberada - uma conexão direta entre a posição do Partido dos Trabalhadores e a posição do governo brasileiro em relação a Liberman. Ora, na sopa de letrinhas que é o quadro partidário brasileiro, é extremamente louvável que um partido político assuma, mesmo que minimamente, algumas posturas de ordem ideológica, concordemos ou não com elas. Agora, associar a posição do PT à do governo brasileiro é ignorância ou má-fé, visto que embora sendo o Partido dos Trabalhadores a força política majoritária na ampla coligação – ampla até demais, para o meu gosto – que hoje governa o Brasil, qualquer observador minimamente isento da política externa brasileira consegue notar que a mesma tem se guiado muito mais pela lógica pragmática de defesa dos interesses nacionais, do que pela lógica das opções partidárias. Neste sentido, o governo brasileiro, come il faut, mantém relações com Israel, com o Irã, com a China, com os EUA, com o Azerbaijão e com inúmeros outros Estados soberanos espalhados pelo mundo;

3- Outra questão a ser ressaltada é o fato de que a mídia brasileira tão combativa ao denunciar as violações dos direitos humanos no Irã de Ahmadinejad e ao criticar a intenção do governo brasileiro em recebê-lo, por ocasião do que seria a sua – posteriormente cancelada – visita ao Brasil, manteve um estranho silêncio em relação ao curriculum (ou melhor, folha corrida) de Liberman, preferindo, ao invés disto, dar destaque ao seu encontro com o presidenciável tucano José Serra, como fez “O Globo”;

4- E, last but not least, não dá para deixar de ressaltar que a expressão “Direitos Humanos” tem sido – juntamente com a palavra “ética” – uma das mais prostituídas do idioma pátrio nos últimos anos, sendo usada de acordo com a conveniência de quem a pronuncia. Como será que aqueles que hoje criticam o que chamam de “excessivo pragmatismo” da Política Externa do Governo Lula reagiriam, caso o Brasil, em nome da defesa dos direitos humanos, decidisse romper relações com Israel ou - afinal, a prisão de Guantânamo continua no mesmo lugar - com os EUA?

Na verdade, todo este papo é só mais um bom exemplo daquilo que os nossos avós chamavam de conversa para boi dormir...
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Os Equívocos da Política Externa de FHC.


No final de 2007, a leitura do artigo "End of Dreams, Return of History”, escrito pelo pensador neoconservador norte-americano Robert Kagan e publicado na Policy Review (nº 144), levou-me a fazer inúmeras reflexões sobre a inserção internacional do Brasil e sobre alguns equívocos que haviam sido cometidos pelos formuladores da política externa brasileira, ao longo da década de 1990. Pouco tempo depois, o artigo foi ampliado e transformado em livro sob o título de “The Return of History and the End of Dreams”, que acabou sendo o foco de uma excelente matéria do Maurício Dias publicada na “Carta Capital”, em novembro de 2008, que transcrevo ao final desta postagem. Nela, o Cientista Político Wanderley Guilherme dos Santos comenta o livro e faz algumas afirmações bem próximas do que eu havia pensado um ano antes, quando li o artigo. Hoje, ao ler a tradução recém-lançada do livro de Kagan (O Retorno da História e o Fim dos Sonhos, Ed. Rocco, 2009), sinto as minhas convicções iniciais reforçadas: o esvaziamento do Estado brasileiro, a aceitação incondicional da agenda internacional imposta pelos países centrais, na década de 1990, e a adesão acrítica do Brasil ao processo de globalização levada a cabo pelos governos Collor/Itamar e FHC, reduziram bastante as possibilidades de uma inserção mais ativa do Brasil no sistema internacional e de um aumento da projeção mundial do país (Abrindo um breve parêntese, é importante lembrar que Collor e FHC, promoveram um esvaziamento deliberado das funções do Itamaraty, visto que boa parte de nossos diplomatas transformaram esse órgão em um foco de resistência do nacional-desenvolvimentismo). Ao analisar o papel que alguns Estados – que são bem menores (em quase todos os aspectos) que um certo país de grande extensão territorial, situado na América do Sul - desempenham hoje nas relações internacionais, as observações de Kagan – que não falam diretamente sobre o nosso país - nos ajudam a refletir sobre a desproporção existente entre o peso econômico, territorial e populacional do Brasil e o nosso real poder político. Nos últimos anos, com a ascensão de Lula à presidência, o governo brasileiro tem procurado corrigir esta desproporção, buscando recuperar o tempo perdido. No entanto, o estrago feito durante os anos de predominância do paradigma neoliberal é grande e deverá levar algum tempo para ser superado.

Um Erro Histórico de FHC.

Maurício Dias - Carta Capital, nº 522, 19/11/2008

O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos acabou a leitura do livro The Return of History and the End of Dreams (New York, Alfred Knopf, 2008), de Robert Kagan, com uma avassaladora certeza em relação à passagem do tucano Fernando Henrique Cardoso pelo poder (1994 e 2002):“Ele abdicou de parte da soberania brasileira ao assinar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares. Foi um tremendo equívoco histórico do governo dele.”Robert Kagan é um personagem que transita no coração do poder nos EUA. Scholar neoconservador, um neocon, é respeitado estrategista internacional. Diretor do Projeto Liderança Americana, da Fundação Carnegie para a Paz Internacional, trabalhou no Departamento de Estado de 1984 a 1988 e foi assessor para política externa de John McCain, no Senado.Para Wanderley Guilherme, Kagan lança uma das perguntas fundamentais da política internacional contemporânea: “Pode uma nação se considerar uma grande potência no mundo moderno se não é também um membro do clube nuclear?”“Se o Brasil espera manter sua capacidade de decidir autonomamente o que pode se apresentar como uma ameaça física à sua soberania, que é um ingrediente do próprio conceito de poder de Kagan, precisa refletir sobre essa pergunta. Ela é feita por um dos possíveis estrategistas dos Estados Unidos, independentemente do resultado das eleições presidenciais”, considera Wanderley Guilherme.E, como ele diz, a resposta à pergunta não significa lançar o Brasil “à aventura de produzir artefatos nucleares”. Situação que, certamente, não interessa ao País, nem econômica nem politicamente.Wanderley lembra que a adesão ao tratado ocorreu sem maior discussão com o Congresso e “no limite, sem submeter tamanha abdicação de parte da soberania (a de definir autonomamente o que é uma ameaça ao País) a um plebiscito ou referendo”.Ele explica: “A não adesão nunca significou que o Brasil desejava produzir artefatos nucleares, mas, sim, que não abdicava do direito de decidir, em algum momento, se era de seu interesse nacional produzi-los. O Paquistão e a Coréia do Norte são ouvidos e as cautelosas políticas de todas as nações árabes, em relação a Israel, se devem simplesmente ao fato de que tais nações consideraram de seu interesse de sobrevivência, não a estúpida deflagração de uma suicida corrida armamentista, mas a aquisição de argumentos contra intenções estranhas de desafios aos interesses desses países”.Wanderley Guilherme lembra que “não é insensato pensar” que, caso o Brasil não tivesse assinado o tratado, as referências na Europa e nos Estados Unidos aos direitos brasileiros sobre a Amazônia “não teriam a petulância e sem-cerimônia” que possuem.Além da Amazônia, há, agora, o pré-sal. Confirmadas as expectativas, a soberania brasileira sobre faixas oceânicas é outro tópico com elevado potencial de conflito. Os EUA talvez pensem o mesmo se considerarmos a surpreendente reativação da IV Frota.“Caso alguma ameaça real se concretize, o Brasil ficará diante da alternativa de não ter como se defender ou violar um tratado que livremente assinou. Em certo sentido, esse foi o mais desastroso legado do governo Fernando Henrique Cardoso”, afirma Wanderley Guilherme.A solução para remediar essa herança de FHC é difícil, complicada, exige coragem. A saída é denunciar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, como fez a Coréia do Norte.Esse episódio, por sinal, foi relembrado pelo embaixador Samuel Pinheiro, secretário-geral do Itamaraty. Em 2006, durante o 4º Encontro Nacional de Assuntos Estratégicos, ele disse que “é possível que o Brasil venha a sair do tratado”. Estimulado por um militar presente ao encontro, Samuel Pinheiro lembrou que a Coréia do Norte denunciou o tratado e retirou-se.O Brasil e a Índia eram dois emergentes poderosos que não assinaram o tratado. O Itamaraty o considerava, e ainda considera, discriminatório. Mas, em 1998, FHC entregou os pontos.”
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D. Miriam Leitão e a eleição para a direção da UNESCO.

Há cerca de duas semanas, comecei a escrever um post sobre a polêmica em torno do não-apoio do governo Brasileiro à indicação de Márcio Barbosa para a direção-geral da UNESCO. Tive esta idéia porque, em uma de minhas aulas sobre Política Externa Brasileira, uma aluna comentou que achava um “absurdo” o Itamaraty estar apoiando a candidatura do egípcio Farouk Hosny quando há um brasileiro no páreo. Na ocasião, repeti o discurso que faço sempre, dizendo que alguém que pretende ser um especialista em Relações Internacionais não pode pautar suas análises por aquilo que é exposto na grande imprensa, devido à, essencialmente, dois fatores:

1- Os artigos jornalísticos de opinião, na maioria dos casos, nada mais são do que o supra-sumo do senso comum, já que os argumentos são lançados de forma rasteira e juízos de valor são emitidos sem o mínimo compromisso com a realidade dos fatos;
2- A maior parte da mídia brasileira adotou nos últimos anos uma postura de oposição extremamente raivosa em relação ao governo Lula. Logo, as suas análises sobre a Política Externa Brasileira acabam sendo contaminadas pelas paixões da luta política.

Mas depois, com o passar dos dias, acabei deixando de lado a idéia de terminar o post devido, em primeiro lugar, ao excesso de compromissos e afazeres profissionais, mas também – confesso – por uma certa falta de saco em escrever, mais uma vez, sobre a parcialidade da mídia (é por isto que os meus últimos posts foram sobre cultura e não sobre política!). No entanto, depois de ler a coluna de hoje da Sra. Miriam Leitão, em “O Globo”, intitulada “Frente Externa”, não posso deixar de me manifestar (é o anjo torto que vive a sussurrar em meus ouvidos!). A “ilustre” economista/jornalista global voltou a atacar, pra variar, as linhas gerais da política externa do atual governo, utilizando-se, desta vez, dos comentários do ex-ministro das Relações Exteriores de FHC, Luiz Felipe Lampreia. A coluna inicia-se com um comentário do ex-chanceler tucano que disse que nunca viu "tamanha série de enganos e equívocos" no Itamaraty e a partir daí continua a transcrever (e a endossar, é claro) os argumentos do embaixador, que reproduzo abaixo, com alguns grifos meus:

“Nessa lista de equívocos, Lampreia inclui a idéia de mandar um embaixador para a Coréia do Norte — que teve de ser abortada — e a decisão de apoiar a candidatura do egípcio Farouk Hosny para a direção-geral da Unesco: — Eu creio, sinceramente, que a explicação básica está no fato de que o dr. Márcio Barbosa, um homem de extrema competência e grande posição na Unesco, padece de um vício enorme: o de ter servido ao governo Fernando Henrique Cardoso. O Itamaraty tem longa tradição de respeitar posições diferentes e não ter facciosismo. Ele acha que os árabes merecem um gesto nosso, mas esse foi o sinal errado.— Primeiro, há um candidato brasileiro. Segundo, o egípcio é uma pessoa inaceitável. Uma organização que se propõe a defender a educação e a cultura não pode ter como diretor um homem que diz que vai queimar livros. É uma contradição — afirmou”.

Não pretendo me aprofundar na discussão sobre o apoio brasileiro à candidatura de Hosny (discussão esta que, como já disse, não estou com muita paciência para travar. Porém, não posso deixar de assinalar o quão deprimentes foram as defesas “patrióticas” do nome de Márcio Barbosa feitas por “nacionalistas” convictos como Diogo Mainardi e a própria Miriam Leitão. Mais do que nunca, percebo a atualidade da célebre frase de Samuel Johnson: “O patriotismo é o último refúgio dos canalhas”), mas tenho o dever de ofício de recordar ao excelentíssimo Senhor Embaixador alguns episódios que ilustram como são falaciosos os seus comentários. Ao afirmar que no Itamaraty há “uma longa tradição de se respeitar posições diferentes”, o ex-chanceler (e a D. Miriam) esquece-se de dois casos ocorridos no governo a que serviu:

1- A demissão do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães (atual secretário-geral do MRE), em 2001, da direção do Instituto de Pesquisas e Relações Internacionais (IPRI) do Itamaraty, por emitir opiniões contrárias à adesão do Brasil à Associação de Livre Comércio das Américas (ALCA).;
2- A falta de empenho do MRE, através do então ministro Celso Lafer, na manutenção do Embaixador José Maurício Bustani, na direção da Opaq (Organização para a Proscrição das Armas Químicas). Bustani foi derrubado do comando da Organização, em 2002, por pressões do governo Bush, já que desagradou ao “grande irmão do norte” por sua insistência em negar tratamento preferencial aos Estados Unidos no que diz respeito às inspeções militares e industriais e por não admitir interferências, de nenhum tipo, na administração da Opaq. Como ressalta, o próprio Bustani em artigo publicado na revista “Estudos Avançados”, da USP (José Mauricio Bustani, "O Brasil e a Opaq: Diplomacia e Defesa do Sistema Multilateral sob Ataque", "Estudos Avançados", vol. 16, nº 46, setembro/dezembro de 2002), Lafer fez um acordo de bastidores com o Secretário de Estado dos EUA de que o Brasil não faria nenhum lobby em favor de sua permanência.

Ora, é importante ressaltar que Márcio Barbosa lançou sua candidatura à direção-geral da UNESCO, de forma avulsa e não-orgânica, sem nenhuma consulta prévia ao governo brasileiro. Logo, estava preparado (ou, pelo menos, deveria estar) para a possibilidade de não receber o apoio do Brasil, que foi o que efetivamente aconteceu, visto que, em nome de interesses geopolíticos e dos próprios objetivos gerais de nossa política externa atual, o Itamaraty optou por apoiar a candidatura de Hosny. Tudo isto aconteceu de forma legítima e transparente, destacando-se o fato de que, em nenhum momento, o MRE trabalhou contra a candidatura de Barbosa ou mesmo procurou tentar inviabilizá-la: simplesmente uma outra opção foi feita, de maneira coerente com as diretrizes de política externa do governo Lula (abrindo um rápido parênteses: esta história do governo ter que apoiar a candidatura de alguém – mesmo que tal pessoa não esteja alinhada com suas posições – só por este alguém ser brasileiro, lembra-me aquele discurso dos narradores esportivos quando algum time brasileiro está na final da Libertadores ou do Mundial Interclubes: “É o Brasil na Final!”. E desde quando um torcedor do Vasco vai torcer pelo Flamengo numa situação destas? Ou o do Atlético pelo Cruzeiro, ou o do Palmeiras pelo Corinthians, ou o do Colorado pelo Grêmio, e por aí afora? Poupem-nos destes argumento esdrúxulos). Repito mais uma vez: mesmo tendo feito uma outra opção, o Itamaraty em nenhum momento atuou nos bastidores contra a candidatura de Barbosa. Como vimos, não foi isto que o governo FHC fez no caso Bustani: para atender subservientemente aos interesses norte-americanos, o ex-ministro Celso Lafer (aquele mesmo que tirou os sapatos!), literalmente, puxou o tapete do Embaixador na Opaq (é importante notar que nenhum dos “patriotas de ocasião”, que recentemente apareceram na mídia, levantou-se, naquele momento, em defesa de Bustani!). Já a demissão de Samuel Pinheiro Guimarães, do IPRI, foi um caso claro de perseguição ideológica, a mesma que o ex-Chanceler Lampréia afirma que nunca ter havido no Itamaraty.

Pois é: estas questões nunca aparecem na coluna da D. Miriam Leitão...
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Cuba

Sem sombra de dúvidas, a Revolução Cubana foi um dos mais importantes - e fascinantes - acontecimentos do século XX e, juntamente com a Revolução Mexicana, marcou profundamente o imaginário das esquerdas e dos movimentos sociais latino-americanos. Apesar disto e ao contrário de muitos amigos queridos e de pessoas que respeito e admiro, não sou nenhum grande entusiasta do regime castrista. Melhor dizendo: tenho uma profunda admiração pela revolução e pelos revolucionários que derrubaram a infame ditadura de Fulgêncio Batista, no início de 1959, mas também tenho diversas críticas ao modelo de Estado construído em Cuba, notadamente a partir de 1964, embora compreenda os condicionamentos externos e internos que levaram à implantação e à consolidação desse modelo. Porém, continuo a achar que, em diversos momentos, outros caminhos poderiam ter sido tentados e experimentados, apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelo governo revolucionário ao longo destes cinqüenta anos. Mas, mesmo assim, são indiscutíveis os avanços conquistados pela sociedade cubana em diversos campos, assim como é indiscutível o heroísmo de uma nação que se construiu como tal, através da luta e do enfrentamento das adversidades. Escrevo tudo isto como preâmbulo a um comentário sobre a matéria “Negociar sim; sem perder a firmeza, jamais”, surpreendentemente (deve ter sido um “cochilo” da editoria internacional) publicada em “O Globo” de hoje. Nesta reportagem, assinada pela jornalista Nani Rubin, o jornalão da família Marinho foge do seu tom crítico habitual sobre a ilha (por sinal, somente alguém completamente idiota ou então um leitor compulsivo do Mainardi - o que, no fundo, acaba sendo a mesma coisa - para acreditar que um “regime decadente e que está perdendo o apoio popular” - que é como “O Globo” habitualmente define o governo de Fidel - consiga sobreviver por cinco décadas, enfrentando as pressões da maior potência do mundo, sem poder contar, há quase 20 anos, com o apoio da extinta URSS) e apresenta um vibrante quadro da sociedade cubana, diante das perspectivas da ocorrência de mudanças no país e de uma reaproximação com os EUA. O que vemos ali é o retrato de um povo orgulhoso e consciente que deseja mudanças políticas e econômicas e que sonha com o fim do embargo norte-americano e com melhores relações com seu poderoso vizinho, mas que não abre mão das conquistas obtidas após 1959 e nem aceita transformar-se novamente em um “quintal” dos EUA, como nos tempos anteriores à revolução. Tal disposição fica bem clara nas palavras de uma cubana comum, a recepcionista Maria Cristina Sánchez, que afirmou para a jornalista de “O Globo”: “Este é o melhor país para se viver. Quem trabalha tem o seu dinheirinho, quem não trabalha... o que se pode fazer? Não temos muita coisa, mas temos orgulho do que conseguimos e comida para todos. O bloqueio é injusto e precisa acabar, mas Raúl não pode ceder”.
Depois de ler isto, não pude deixar de abrir um sorriso e de dar um “Viva”, mentalmente, a esse heróico e orgulhoso povo.

Leia aqui, na íntegra, a matéria sobre Cuba publicada em O Globo.

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Lula e o Prêmio Chatham House.

Na coluna do Ancelmo Gois, em “O Globo” de ontem, dia 10/05, saiu uma notinha – se fosse sobre um certo sociólogo da USP, que já andou pelas bandas do Planalto, daria primeira página - informando que, no próximo mês de outubro, Lula receberá das mãos da Rainha Elizabeth II, em Buckingham, o prêmio Chatham House (e não “Catham” como saiu na coluna) por sua contribuição à paz e ao desenvolvimento no mundo, durante o ano de 2008. Este prêmio é concedido anualmente por um renomado e tradicional think tank britânico da área de Relações Internacionais, a Chatham House - cujo nome oficial é Royal Institute of International Affairs – a estadistas de todo mundo que tenham se destacado, no ano anterior, por desempenharem um importante papel no desenvolvimento das relações internacionais. No perfil de Lula que se encontra no site da organização - http://www.chathamhouse.org.uk – pode se ler que (em tradução livre) o “Presidente Lula tem dado uma importante contribuição para a redução da pobreza no Brasil através de políticas inovadoras que mantiveram o equilíbrio fiscal e impediram uma alta da inflação – tudo em um contexto altamente democrático. Isto tem demonstrado para o resto da América Latina e mesmo para países de fora da região, que é possível combater os problemas sociais sem recorrer à políticas populistas ou abandonar a democracia”. A esta hora, o PhDeus e ex-supremo mandatário da nação, Fernando Henrique Cardoso, deve estar se rasgando e prestes a cometer harakiri. Imaginemos, então, o que acontecerá com esta pobre alma, caso Lula ganhe, algum dia, o Prêmio Nobel da Paz, como já andou sendo cogitado...

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Sobre Battisti, Troccoli e a mídia tupiniquim: algumas ponderações.

Após o meu último post sobre o caso Jorge Troccoli – que foi repercutido por outros blogs como o “Cloaca News” e o “Abunda Canalha” -, recebi diversas mensagens no endereço eletrônico do "Abobrinhas Psicodélicas" e ouvi muitas opiniões de colegas que o leram, além, é claro, dos comentários que foram postados no próprio blog. No geral, a repercussão do texto foi bastante positiva. Porém, uma pequena minoria discordou de seu teor – educadamente, na maioria das vezes; com uma grande dose de rancor ideológico, em algumas poucas outras. Grosso modo, os que criticaram o texto alegaram que eu estava querendo “justificar um erro do governo brasileiro com outro erro do governo italiano”. Em vista disto, resolvi fazer estas breves ponderações:

1- Parte de uma leitura equivocada do meu texto, a afirmação de que procurei justificar a decisão do Ministro Tarso Genro sobre Cesare Battisti , contrapondo à ela a postura do governo italiano em relação a Jorge Troccoli. O principal objetivo daquele post foi mostrar a parcialidade da mídia brasileira na cobertura do caso Battisti, omitindo uma série de informações que seriam necessárias ao público para que este possa construir a sua própria opinião (não seria esta a principal missão de uma imprensa que se diz livre e democrática?). Quem não percebeu isto é porque: I- ou leu o texto e não entendeu; II- ou o leu, mas fez uma interpretação ofuscada pelo preconceito ideológico;

2- Seguindo esta linha de raciocínio, uma “imprensa livre e democrática” deveria enfatizar que a decisão do Ministro seguiu estritamente o que estabelece a lei brasileira sobre refugiados, que por sua vez atende a uma série de convenções e acordos internacionais. No entanto, isto só tem sido mencionado de forma passageira e sem muito destaque. Para ilustrar tal fato, reproduzo a seguir alguns dos artigos da Lei 9.474/97:

Art. 12. Compete ao CONARE (Comitê Nacional de Refugiados), em consonância com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com as demais fontes de direito internacional dos refugiados:
I - analisar o pedido e declarar o reconhecimento, em primeira instância, da condição de refugiado (...)
Art. 29. No caso de decisão negativa, esta deverá ser fundamentada na notificação ao solicitante, cabendo direito de recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no prazo de quinze dias, contados do recebimento da notificação.
Art. 31. A decisão do Ministro de Estado da Justiça não será passível de recurso, devendo ser notificada ao CONARE, para ciência do solicitante, e ao Departamento de Polícia Federal, para as providências devidas.
Art. 33. 0 reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.

Para que as pessoas possam ter suas próprias opiniões, o acesso à informação é fundamental. Reflitamos: a cobertura da grande imprensa tem permitido que nós, cidadãos, tomemos uma posição consciente sobre o caso ou o que está havendo é mais uma tentativa de jogar a opinião pública contra o governo?

3- Ao mostrar as repercussões do caso na imprensa italiana, algum “veículo de comunicação” tupiniquim lembrou de informar que o Sr. Silvio Berlusconi é o maior controlador da mídia privada italiana e que depois que retornou ao cargo de Primeiro-Ministro ele tem promovido um verdadeiro expurgo na mídia estatal, pressionando e/ou demitindo jornalistas independentes ou que lhe são críticos?

4- Para que o público pudesse se informar melhor, não seria importante que nossos "veículos de comunicação" mostrassem o contexto histórico da Itália na década de 1970, quando o grupo armado do qual Battisti fazia parte estava na ativa, ao invés de repercutir a fala de autoridades italianas quando estas afirmam que “não se pode comparar os grupos da esquerda armada italiana na década de 1970, com aqueles que lutavam contra ditaduras militares aqui na América Latina, já que a Itália era um país democrático”? Portanto, não seria interessante lembrar que esta “democracia” era marcada pela corrupção nos altos escalões do Partido Democrata-Cristão (que esteve no governo da Itália, durante praticamente toda aquela década), pela livre atuação da máfia (infiltrada nos vários escalões governamentais), por um judiciário venal e conivente com o crime organizado e por uma série de operações e eventos suspeitos que envolveram até a cúpula da Igreja Católica?

5- A questão central é a seguinte: ao contrário do que a mídia brasileira afirma, NÃO há um incidente diplomático em andamento entre Brasil e Itália. O que ocorre é que agrupamentos políticos dos dois países estão tentando criar este incidente, para se fortalecer no jogo de suas respectivas políticas internas. Na Itália, durante a campanha eleitoral, Berlusconi tratou o caso Battisti como uma “questão de honra” e, portanto, pretende faturar politicamente em cima de uma eventual extradição do ex-ativista; no Brasil, a oposição a Lula procura desesperadamente alguma coisa que possa atingir o Presidente da República - já pensando nas eleições de 2010 - e para isto tem contado com o apoio irrestrito da nossa mídia golpista.

Em tempo: Recomendo a leitura de um artigo intitulado “Condor, P2 e a fênix”, postado em 25 de fevereiro de 2008 no blog “Conexão Diplomática”, pois ele fornece alguns elementos bem interessantes para uma melhor compreensão do caso Troccoli.



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O que a "imprensa livre" brasileira não mostra: o caso Jorge Troccoli.

Nas últimas semanas, o caso Cesare Battisti vem ocupando um grande espaço nos principais "veículos de comunicação" do país e a cobertura dada ao mesmo - para variar - tem sido extremamente tendenciosa. De modo geral, a grande imprensa brasileira tem feito coro às alegações do governo italiano de que o Brasil está concedendo o status de refugiado político a um "terrorista", condenado por quatro homicídios, em seu país natal. No entanto, esta mesma imprensa - que se diz neutra, livre e isenta - esquece deliberadamente um episódio ocorrido no ano passado na "democrática" Itália e que merece ser lembrado, no momento em que acontece este contencioso entre o Brasil e o governo do Sr. Berlusconi: o caso do militar uruguaio Jorge Troccolli. Capitão da marinha uruguaia, Troccoli teve uma atuação bastante ativa na tristemente famosa “Operação Condor” (que contou com a participação das ditaduras militares do Uruguai e de outros países sul-americanos), tendo sido responsável pela tortura e morte de mais de uma centena de opositores desses regimes, entre 1975 e 1983. Em 2002, o governo do Sr. Silvio Berlusconi – em sua segunda passagem pela chefia do gabinete de ministros da Itália - concedeu cidadania italiana ao Capitão Troccoli, mesmo sabendo das acusações de crime contra a humanidade que pesavam contra ele. Em setembro do ano passado, o ministro da justiça da Itália, Angelino Alfano, negou-se à extraditar Troccoli para o Uruguai, alegando que ele é cidadão italiano, tomando como base jurídica um tratado assinado entre os dois países em 1879. Portanto, o mesmo governo que nega-se a extraditar um notório torturador, utilizando dessas filigranas jurídicas, é o mesmo que se considera ofendido pela não-extradição de Battisti, que seguiu todas as normas da legislação brasileira, que por sua vez se baseia em uma série de convenções internacionais. A mídia golpista brasileira, interessada em atacar o governo Lula, opta por dar razão a um governo com notórias ligações com grupos neo-fascistas e com o crime organizado na Itália, como é o governo Berlusconi, ao invés de cobrir o caso Battisti com a isenção que seria necessária. E se é para dar opiniões pessoais e subjetivas - que é o que tem feito a maior parte dos principais articulistas da grande imprensa - eu prefiro concordar com a bela Carla Bruni, que apóia Battisti, do que com a deputada neo-fascista Alessandra Mussolini (neta do próprio), que faz parte da base de apoio de Berlusconi!!

Maiores informações sobre o caso Troccoli podem ser encontradas em um artigo publicado recentemente no jornal italiano "l'Unità". O link é:
http://www.unita.it/news/80861/troccoli_il_battisti_uruguayano
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Perguntas Inconvenientes.

Depois de ler “O Globo” de hoje, duas perguntas vieram-me à cabeça:

1-Por que é que “O Globo” (e os demais tentáculos das Organizações Roberto Marinho) não fez o estardalhaço que está fazendo em relação à não concessão da extradição do ex-ativista da esquerda armada italiana Cesare Battisti, quando o governo brasileiro concedeu asilo político ao ex-ditador paraguaio Alfredo Stroessner?
2-Por que o mesmo “veículo de comunicação” não demonstrou tanta indignação quando o governo italiano negou-se a atender o pedido de extradição do banqueiro Salvatore Cacciola feito há alguns atrás pelo governo brasileiro e hoje trata a não-extradição de Battisti como um grave incidente diplomático?

Quem souber respondê-las estará concorrendo a um ingresso para o grande clássico carioca na segundona-2009, Vasco da Gama X Duque de Caxias, que acontecerá nas dependências do Estádio Romário de Souza Farias, o popular “Marrentão”, naquela simpática cidade da Baixada Fluminense.
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Recorrendo a Camões e Saramago para não falar de Gaza...



Vou deixar os comentários sobre Gaza para outros blogs, que tem feito isto de maneira brilhante e extremamente competente (Grande “Cloaca News”! Valeu, “Abunda Canalha”!), denunciando a farsa da suposta “neutralidade” da mídia na cobertura do conflito (beirou o ridículo “O Globo” de ontem dedicar meia página de seu noticiário internacional a uma manifestação ocorrida em Jerusalém contra o PT, organizada por brasileiros lá residentes, devido ao fato do partido ter definido a ação israelense como “terrorismo de Estado” ). Por isto, pedindo licença ao mestre Veríssimo, vou entrar no clima de “poesia numa hora destas!?”.

Em 1966, José Saramago lançou o livro “Poemas Possíveis”, onde estava uma pequena obra-prima chamada “Fala do Velho do Restelo ao Astronauta” (posteriormente musicada pelo compositor português Manuel Freire) que estabelece uma relação intertextual com a famosa “Fala do Velho do Restelo”, do canto IV de “Os Lusíadas”. Para quem não lembra do clássico de Camões, o Velho do Restelo é aquela que se aproxima das naus de Vasco da Gama, no momento da partida, no porto de Belém e vocifera um feroz discurso contra as navegações, atribuindo a elas todas as desgraças de Portugal e em um dos trechos desta fala, o Velho tece uma crítica contundente ao fato dos portugueses irem tão longe em busca de novos inimigos e conquistas, enquanto o “velho” inimigo batia à porta (numa clara referência à presença moura no norte da África): Deixas criar às portas o inimigo,/Por ires buscar outro de tão longe/Por quem se despovoe o Reino antigo,/Se enfraqueça e se vá deitando a longe? . Pois bem, em meados da década de 1960, em plena corrida espacial – um dos momentos mais “quentes” da Guerra Fria – e com os EUA começando a se afundar no atoleiro do Vietnã, com suas tropas praticando diversos crimes de guerra – uso do Napalm, ataques à populações civis, torturas - , Saramago coloca na boca do venerável ancião uma nova fala, desta vez dirigida aos astronautas que começavam a conquista do espaço (que era, no linguajar da Guerra Fria, a “última fronteira”). A questão é que esta “nova” fala do Velho do Restelo continua impressionantemente atual, mais de quatro décadas depois. E aí, acabamos voltando a Gaza...

Fala do Velho do Restelo ao Astronauta

Aqui, na terra, a fome continua,
A miséria, o luto, e outra vez a fome.
Acendemos cigarros em fogos de napalme
E dizemos amor sem saber o que seja.
Mas fizemos de ti a prova da riqueza
Ou talvez da pobreza, e da fome outra vez,
E pusemos em ti nem eu sei que desejo
De mais alto que nós, e melhor, e mais puro.
No jornal soletramos, de olhos tensos,
Maravilhas de espaço e de vertigem:
Salgados oceanos que circundam
Ilhas mortas de sede, onde não chove.
Mas o mundo, astronauta, é boa mesa
(E as bombas de napalme são brinquedos),
Onde come, brincando, só a fome,
Só a fome, astronauta, só a fome.

José Saramago, “Poemas Possíveis”, 1966.
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