Por Alberto Carlos Almeida, de São Paulo
Com frequência sou chamado para fazer previsões de resultados eleitorais. No último artigo desta coluna chamei a atenção para o fato de que Dilma Rousseff tende a derrotar José Serra no primeiro turno com uma margem de 15 a 20 pontos percentuais. Essa não é a previsão completa. Com tamanho favoritismo de um governo federal bem avaliado, não é possível evitar que a avalanche de votos para presidente respingue, ao menos, nas campanhas relacionadas com a Presidência. Nesse caso, são duas: deputados federais e senadores.
A previsão completa afirma que o PT vai crescer bastante na Câmara dos Deputados, tendendo a eleger algo em torno de 120, e o PT e seus aliados terão maioria no Senado. O cenário futuro só não é completamente catastrófico para o PSDB porque eleição nacional é uma coisa e eleição estadual, outra inteiramente diferente. Por isso, o PSDB caminha para eleger os governadores de Paraná, São Paulo, Minas, Goiás e Pará. Pode ser que vença também em Roraima e Rondônia, mas não são Estados-chave.
Apenas um breve parêntesis no que tange a Minas: o que torna Antonio Anastasia favorito é o mesmo que faz de Dilma virtual vencedora na eleição nacional: o eleitorado local vai votar naquele com mais chances de dar continuidade ao bem avaliado governo Aécio Neves. Anastasia saiu de zero e foi para 20%. Hélio Costa tem em torno de 40%. É apenas uma questão de tempo que 10 pontos percentuais de Costa migrem para Anastasia, resultando no empate. Depois, com um pouco mais de tempo, Anastasia tende a virar e derrotar Costa já no primeiro turno.
Feita a previsão completa, cumpre justificar neste artigo a grande bancada de deputados federais que o PT tende a eleger. Em primeiro lugar, mostrei quatro artigos atrás que cem é o número mágico quando se trata de cadeiras na Câmara dos Deputados. O todo-poderoso PMDB de 1986 veio perdendo deputados até se estabilizar em torno de cem. O crescimento do PSDB e o fortalecimento do antigo PFL durante os anos Fernando Henrique Cardoso se estabilizaram em torno de cem deputados. O PT elegeu oito deputados em 1982, cresceu, cresceu, cresceu, mas não ultrapassou a barreira dos cem. Por isso, naquele artigo previ que tanto PT quanto PMDB tenderiam a eleger algo em torno de cem deputados federais.
Há, porém, um dado novo no que diz respeito ao PT. Na primeira semana deste mês, um interessante texto na "Folha de S. Paulo" documentou a existência de uma forte associação entre a preferência partidária pelo PT e a proporção de deputados que o partido elege. Em 1990, a pesquisa do Datafolha indicou que 10% do eleitorado brasileiro nutria simpatia pelo PT. Naquele mesmo ano, o PT elegeu 7% de todos os deputados da Câmara. Quatro anos mais tarde, de acordo com o mesmo instituto, a preferência partidária pelo PT subiu para 13% e o PT elegeu 10% de todos os deputados federais. Em 1998, a preferência partidária ficou estável em 11% e o PT também, com 11% de deputados federais. A grande mudança ocorreu em 2002, quando disparou a simpatia pelo PT, indo a 20%, e o partido elegeu quase 18% de todos os representantes da Câmara.
O mensalão não impediu Lula de ser reeleito, mas feriu o PT. Por isso, em 2006 caiu a simpatia pelo partido: 16%. Coincidência ou não, caiu também o número de deputados eleitos: 16% do total. Agora em 2010, a simpatia pelo PT, em julho, portanto bem antes da eleição, atingiu o nível recorde de 25%. É possível que em setembro essa mesma simpatia esteja um pouco maior. Aliás, todos os dados de simpatia partidária acima, com exceção de 1990, foram colhidos em agosto ou setembro. Se o PT ficar com uma simpatia partidária entre 27 e 30%, fazendo uma projeção conservadora, tende a eleger entre 22 e 25% de todos os deputados. Isso resulta em no mínimo 110 deputados e no máximo 130. Uma bancada bastante expressiva.
No capítulo 2 do meu livro "Por Que Lula?", que trata da eleição de 2002, chamo a atenção para o fato de que nas eleições para deputados estaduais e federais o partido que menos dependia de dinheiro para conquistar votos era o PT, além de também contar com a maior simpatia entre as quatro grandes agremiações. Que há correlação entre a simpatia partidária e o voto proporcional no PT não há dúvidas. A grande questão é saber qual é o mecanismo causal que liga uma coisa a outra. Os céticos dirão que se trata de uma coincidência - o que, no linguajar técnico, significa "correlação espúria". Eles afirmarão, corretamente, que há muitas mediações entre a simpatia partidária e a conversão de votos em cadeiras: o sistema eleitoral, as coligações etc. Há as vicissitudes regionais e muitos outros fatores que, combinados, resultaram nessa feliz, porém enganadora, coincidência.
Pode ser que, contrariando os céticos, a simpatia partidária seja uma "proxy", uma aproximação, da disposição de votar em deputados do PT. Essa disposição, em seguida, é viabilizada tanto do lado da oferta, o mundo político, quanto do lado da demanda, os eleitores. Aliás, a simpatia partidária é a própria demanda. Quem gosta do PT tende a votar no PT, ainda mais quando sabemos que os outros partidos não têm a mesma consistência do PT quando se trata desse indicador. A grande questão, então, é como a conversão de simpatia em cadeiras é viabilizada pelo lado da oferta.
Sabemos que, em função de disputas internas regionais, coube ao ex-prefeito do Recife João Paulo, que administrou a cidade por oito anos, o prêmio de consolação de disputar uma vaga na Câmara dos Deputados. É possível que João Paulo seja o candidato mais votado de Pernambuco, elegendo em seu vácuo uma grande bancada de deputados petistas. Sabemos de João Paulo porque ele é ex-prefeito do Recife. É provável, todavia, que haja muitos outros "João Paulo" petistas espalhados pelos Estados, não em todos, mas em vários. Adicione-se a isso o voto de legenda no PT, que é dos maiores entre todos os partidos políticos. Adicione-se a isso o esforço final de campanha, em geral organizado, que os petistas fazem para pedir votos a legisladores que apoiem o Poder Executivo.
Somando-se os fatores pelo lado da oferta, é possível, sim, encontrar mecanismo causal entre simpatia partidária e bancada federal petista. Em menos de 60 dias saberemos se isso funcionará pela sexta eleição consecutiva. Antes de finalizar: essa associação não funciona para os demais partidos.
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O que esperar nas três primeiras semanas? Como Dilma abrirá no primeiro turno uma margem de 15 a 20 pontos percentuais, devemos esperar que a associação entre Dilma e Lula, já nos primeiros dias da propaganda na TV, faça a candidata petista crescer forte nas pesquisas. Em geral, esse crescimento ocorre até a última semana de agosto ou a primeira semana de setembro. Foi assim com o Pitta de Maluf e com o Conde de César Maia.
Assim, as pesquisas publicadas a partir de agora indicarão um crescente distanciamento entre Dilma e Serra. Nos nossos modelos de análise da opinião pública, não esperamos que Serra caia abaixo dos 30%. Ele tende a ficar gravitando em torno desse número.
Hoje, de acordo com o Datafolha, Serra tem 33%. Se ele perder mais 3 pontos percentuais, isso tende a ir para Dilma, que, nesse caso, ampliaria a vantagem dos atuais 8 para 14 pontos percentuais. Os demais pontos de vantagem de Dilma virão de eleitores que hoje se declaram indecisos.
Creio ainda que entre os dias 7 e 10 de setembro e 3 de outubro as variações serão menores e causadas mais por eventos pontuais, como ocorreu no passado com o "dossiê dos aloprados". Naquele episódio, a variação foi pequena e não fez Lula perder a dianteira. Ele caiu alguns pontos percentuais e isso fez que a eleição fosse para o segundo turno. Passado o efeito de mídia do dossiê falso, Lula voltou a abrir a margem que tinha anteriormente.
Delineado este cenário, será inócuo o esforço de Serra junto ao eleitorado de Minas e de São Paulo. A campanha do candidato tucano anunciou que ele concentrará os esforços nesses Estados. É como se existisse um passe de mágica a ser encontrado em meio a esse eleitorado. A mágica desaparece quando se pergunta com qual discurso Serra abordará o eleitor mineiro e o paulista que avaliam o governo Lula como ótimo ou bom. Como Serra vai persuadir esse eleitor a não votar em Dilma? Segundo o Datafolha, Dilma com 37% já está tecnicamente empatada com Serra (40%) no município de São Paulo. Assim, não será surpresa se o tucano for derrotado por Dilma em sua própria base eleitoral.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: menos Imposto, mais Consumo"