Depois de ter conseguido irritar as hostes rubro-negras com meu último post (este é um dos maiores prazeres de um vascaíno!), publico aqui trechos de uma ótima crônica do Eduardo Galeano chamada “Fervor da Camisa”, que fala justamente sobre o futebol e a paixão dos torcedores. Ela está em um belo livro – excelente leitura para estes dias de Copa do Mundo – intitulado “Futebol ao Sol e à Sombra” (editado no Brasil pela L&PM), em que o escritor uruguaio, em pequenos e preciosos textos, discorre sobre as várias copas do mundo (de 1930 a 2002), sobre grandes jogadores e seus gols inesquecíveis, sobre os usos políticos do futebol, sobre a FIFA e suas ligações perigosas e, sempre de forma apaixonada e poética, sobre o esporte como um dos principais fenômenos sociais de nossos tempos.
O escritor uruguaio Paco Espínola não se interessava por futebol. Mas uma tarde, no verão de 1960, procurando o que escutar no rádio, Paco pescou por casualidade a transmissão de uma partida. Era o clássico local. O Peñarol levou uma goleada – 4 a 0 – do Nacional.
Quando caiu a noite, Paco estava tão triste que decidiu jantar sozinho, para não amargurar a vida de ninguém. De onde vinha tanta tristeza? Ele já estava quase acreditando que era uma tristeza sem razão, que era só a simples pena de ser mortal neste mundo, quando de repente, percebeu que estava triste porque o Peñarol tinha perdido. Ele era torcedor do Peñarol e não sabia.
Quantos uruguaios estavam tristes como ele? E quantos, ao contrário, subiam pelas paredes de felicidade? Paco viveu uma revelação tardia. Normalmente, os uruguaios pertencemos ao Nacional ou ao Peñarol desde o dia em que nascemos. A pessoa diz, por exemplo, “Eu sou do Nacional”. Assim é desde princípios do século. Os cronistas daqueles tempos contam que, nos bordéis de Montevidéu, as profissionais do Amor atraíam clientes sentando-se na porta vestindo somente as camisas do Nacional ou do Peñarol.
Para o torcedor fanático, o prazer não está na vitória do próprio time, mas na derrota do outro. Em 1993, um jornal de Montevidéu entrevistou alguns rapazes que, durante a semana, ganhavam a vida carregando lenha, e nos domingos aproveitavam a vida gritando pelo Nacional nos estádios. Um deles confessou: “Para mim, ver uma camisa do Peñarol dá nojo. Quero que perca sempre, mesmo que jogue contra estrangeiros” (...)
Creio que foi Oswaldo Soriano quem me contou a história da morte de um torcedor do Boca Juniors, em Buenos Aires. Aquele torcedor havia passado a vida inteira odiando o River Plate, como era sua obrigação, mas no leito de agonia pediu que o envolvessem na bandeira inimiga. E assim pôde comemorar, num último suspiro:
- Morre um deles (...)
O escritor uruguaio Paco Espínola não se interessava por futebol. Mas uma tarde, no verão de 1960, procurando o que escutar no rádio, Paco pescou por casualidade a transmissão de uma partida. Era o clássico local. O Peñarol levou uma goleada – 4 a 0 – do Nacional.
Quando caiu a noite, Paco estava tão triste que decidiu jantar sozinho, para não amargurar a vida de ninguém. De onde vinha tanta tristeza? Ele já estava quase acreditando que era uma tristeza sem razão, que era só a simples pena de ser mortal neste mundo, quando de repente, percebeu que estava triste porque o Peñarol tinha perdido. Ele era torcedor do Peñarol e não sabia.
Quantos uruguaios estavam tristes como ele? E quantos, ao contrário, subiam pelas paredes de felicidade? Paco viveu uma revelação tardia. Normalmente, os uruguaios pertencemos ao Nacional ou ao Peñarol desde o dia em que nascemos. A pessoa diz, por exemplo, “Eu sou do Nacional”. Assim é desde princípios do século. Os cronistas daqueles tempos contam que, nos bordéis de Montevidéu, as profissionais do Amor atraíam clientes sentando-se na porta vestindo somente as camisas do Nacional ou do Peñarol.
Para o torcedor fanático, o prazer não está na vitória do próprio time, mas na derrota do outro. Em 1993, um jornal de Montevidéu entrevistou alguns rapazes que, durante a semana, ganhavam a vida carregando lenha, e nos domingos aproveitavam a vida gritando pelo Nacional nos estádios. Um deles confessou: “Para mim, ver uma camisa do Peñarol dá nojo. Quero que perca sempre, mesmo que jogue contra estrangeiros” (...)
Creio que foi Oswaldo Soriano quem me contou a história da morte de um torcedor do Boca Juniors, em Buenos Aires. Aquele torcedor havia passado a vida inteira odiando o River Plate, como era sua obrigação, mas no leito de agonia pediu que o envolvessem na bandeira inimiga. E assim pôde comemorar, num último suspiro:
- Morre um deles (...)