História.

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  • terça-feira, 8 de setembro de 2009
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  • Paul Klee - "Angelus Novus"

    No início de setembro de 1939, a invasão alemã na Polônia deu início à Segunda Guerra Mundial que, ao seu final, deixou um saldo de mais de cinquenta milhões de mortos, praticamente o triplo da Primeira – aquela que na época foi chamada de “a guerra que iria pôr fim a todas as guerras” – com seus quase 20 milhões de vítimas fatais. Em 1920, após a tragédia sem precedentes do conflito de 1914-1918, o pintor suíço-alemão Paul Klee pintou o seu célebre quadro “Angelus Novus”. Vinte anos depois, sob o impacto da assinatura do Pacto Germano-Soviético e da invasão da Polônia, o filósofo Walter Benjamin lançou suas “Teses sobre o Conceito de História” (publicadas em português, pela Editora Brasiliense, no livro "Obras Escolhidas: Magia e Técnica, Arte e Política", com tradução de Sergio Paulo Rouanet). A partir da análise do quadro de Klee, ele enxerga o drama e a dor da sua época e, de forma profética, antevê os horrores dos anos seguintes - dos quais ele seria uma das vítimas - e expõe a sua trágica visão sobre a História:

    Existe um quadro de Paul Klee que se intitula “Angelus Novus”. Ele representa um anjo que parece ter a intenção de distanciar-se do lugar em que permanece imóvel. Seus olhos estão encarquilhados, sua boca aberta, suas asas estendidas. Tal é o aspecto que deve ter necessariamente o anjo da história. Ele tem o rosto voltado para o passado. Onde se nos apresenta uma cadeia de eventos, ele não vê senão uma só e única catástrofe, que não cessa de amontoar ruínas sobre ruínas e as joga a seus pés. Ele bem que gostaria de se deter, acordar os mortos e reunir os vencidos. Mas do paraíso sopra uma tempestade que se abate sobre suas asas, tão forte que o anjo não as pode tornar a fechar. Essa tempestade o empura incessantemente para o futuro, para o qual ele tem as costas voltadas, enquanto diante de si as ruínas se acumulam até o céu. Essa tempestade é o que nós denominamos progresso.

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    A Segunda Guerra Mundial também vitimou o grande historiador francês Marc Bloch, fundador - com Lucien Febvre – da “Revue des Annales” (1929). Militando na Resistência Francesa, Bloch foi detido pelos nazistas e fuzilado em junho de 1944. Na prisão, escreveu a sua “Apologia da História ou o Ofício do Historiador” (A edição brasileira é da Jorge Zahar), dedicada ao seu filho Étienne. É deste livro que retiro o trecho abaixo:

    (...) mesmo que julgássemos a história incapaz de outros serviços, seria certamente possível alegar a seu favor que ela distrai. Ou, para ser mais exato – pois cada um procura as distrações onde lhe apraz, - tal se afigura, incontestavelmente, a um grande número de homens. Pessoalmente, tão longe quanto a minha memória abarca, a história sempre me divertiu muito. Como sucede com todos os historiadores, creio eu. De outro modo, por que razões teriam escolhido tal ofício? Aos olhos de quem não seja tolo chapado, todas as ciências são interessantes. Mas cada sábio quase só encontra uma cuja prática o divirta. Descobri-la para consagrar-se a ela, é o que se chama propriamente vocação.

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    Eric Hobsbawm, um dos maiores historiadores contemporâneos, também vivenciou de perto os horrores da Segunda Guerra. Filho de um britânico e de uma austríaca, ambos judeus, ele passou seus primeiros anos de vida em Viena e Berlim, de onde saiu em 1933, fugindo das perseguições nazistas. Durante a guerra, serviu no exército britânico, onde atuou no Setor de Inteligência. O trecho abaixo foi retirado de uma palestra que ele ministrou, na década de 1990, em uma Universidade do leste europeu, após o colapso do chamado“Socialismo Real” e que está na coletânea de ensaios intitulada "Sobre História" (Cia. das Letras):

    O que eu quero lembrar a vocês é algo que me disseram quando comecei a lecionar em uma Universidade. “As pessoas em função das quais você está lá”, disse meu próprio professor, “não são estudantes brilhantes como você. São estudantes comuns com opiniões maçantes, que obtêm graus medíocres na faixa inferior das notas baixas, e cujas respostas nos exames são quase iguais. Os que obtêm as melhores notas cuidarão de si mesmos, ainda que seja para eles que você gostará de lecionar. Os outros são os únicos que precisam de você”. Isso não vale apenas para a universidade, mas para o mundo. Os governos, o sistema econômico, as escolas, tudo na sociedade, não se destina ao benefício de minorias privilegiadas. Nós podemos cuidar de nós mesmos. É para o benefício da grande maioria das pessoas, que não são particularmente inteligentes ou interessantes (a menos que, naturalmente, nos apaixonemos por uma delas), não têm um grau elevado de instrução, não são prósperas ou realmente fadadas ao sucesso, não são nada de muito especial. É para as pessoas que, ao longo da história, fora de seu bairro, apenas têm entrado para a história como indivíduos nos registros de nascimento, casamento e morte. Toda a sociedade na qual valha a pena viver é uma sociedade que se destina a elas, e não aos ricos, inteligentes e excepcionais, embora toda a sociedade em que valha a pena viver deva garantir espaço e propósito para tais minorias. Mas o mundo não é feito para o nosso benefício pessoal, e tampouco estamos no mundo para nosso benefício pessoal. Um mundo que afirme ser essa o seu propósito não é bom e não deve ser duradouro.

     
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