Passei o domingo grudado na TV. Nada diferente de muitos outros que escolhiam a sua programação favorita. Havia os que se deliciavam com a dança de qualquer coisa do Faustão. Ou as diversificadas reportagens do Fantástico, todas revelando os mais precisos detalhes da vida e da morte de Michael Jackson. Ou as lutas de full contact, como gosta meu vizinho marombeiro. Ou toda essa conhecida diversa e fundamental programação repleta de “lições”, drama, suspense e circo.
Minha escolha foi sintonizar o computador na TeleSur. Fiquei horas absorvido em ver o drama de um povo desarmado enfrentando o golpe de suas oligarquias. Em um momento tudo parecia encaminhar para um confronto. A multidão foi parada por centenas de policiais armados que impediam que prosseguissem para o aeroporto. O cerco foi relaxado, sugeria que os golpistas haviam desistido. Notícias chegavam pelas poucas agências que cobriam o acontecimento, e repercutiam no meu Twitter por aqueles que estavam mais próximos. Davam a entender que o golpe estava acabando, fazia sentido com o que cedo já se sabia sobre a retirada de apoio ao golpe de importantes setores empresariais de Honduras. Informação que levou a valorosa repórter Lidieth Diaz, da Rádio Globo de Honduras, em entrevista coletiva pedir a confirmação diretamente a Roberto Micheletti, empossado pela suprema corte do país como presidente. Informação transmitida em meia tela pela TeleSur, junto à manifestação. Fundamental detalhe: ela usou a palavra golpe em sua pergunta. A resposta, não foi sim e nem não, mas algo vago, tipo não importa quem nos apóie, “estamos fazendo o melhor por Honduras, onde você pertence”. Temo por ela agora. E seguiu a retirada das tropas, cercando a pista do aeroporto. O presidente Manuel Zelaya dava entrevista ao vivo para a emissora do avião. Corri para ver outras imagens na TV a cabo. A CNN noticiava um campeonato de golfe. A Globonews reproduzia um Globo Rural. E o avião chegava. No meio da fala do presidente, a repórter pede para interromper com notícias do aeroporto. Policiais jogavam bombas de gás lacrimogêneo na multidão que se aproximava da pista. Tiros foram ouvidos. Notícias de feridos e mortos. Os repórteres da Telesur correm como doidos ao local onde há conflitos, esbaforidos ao celular. A CNN passa a transmitir com repórter distante do local, não fala em mortos, a imagem é da TeleSur. A Globonews mostra a reprise de uma entrevista com um economista. O avião se aproxima. Tensão, o exército coloca caminhões na pista. Ouvimos Zelaya e o piloto do avião venezuelano falar sobre a dificuldade de pouso. O avião segue para Manágua.
Talvez o domingão do Faustão tenha sido mais emocionante para quem viu, mas o meu não perdeu. Sei que não interessa à nossa mídia um assunto deste tipo, onde está em jogo uma lição ao vivo de História para nossos jovens. Onde há o drama de um povo, o suspense na luta de classes ao vivo. Onde há exemplos de coragem de tantos.
Foi um domingo inesquecível. Ainda estou me recuperando. Meu vizinho marombeiro talvez tenha perdido.