Cartões Corporativos, transparência e ética: o caso Matilde Ribeiro

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  • quarta-feira, 30 de janeiro de 2008
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  • Alguns assuntos espinhosos entram na pauta política. Um exemplo é o caso do uso indevido de cartões corporativos pela ministra Matilde Ribeiro. Não gosto de entrar na seara da ética, pois entendo que é uma canoa furada. Sempre haverá algum grupo descontente porque não está no poder que se envereda pela ética, na expectativa de enfraquecer o governo ditando boas maneiras para a sociedade. O problema é que são grupos que não resistem a uma investigação sobre seu comportamento na gestão dos bens públicos. Mas isso é outra história, o assunto aqui é outro. Trata-se de avaliar os cartões corporativos, a transparência e a ética pública inserido no contexto de desvio de finalidade por ministros de Estado.

    Ninguém em sã consciência acredita que papel é melhor solução que os cartões corporativos para promover transparência dos gastos para a sociedade. A sistemática anterior de portar dinheiro, notas e outros papéis para posterior prestação de contas ficou para trás. É algo obsoleto, tendo em vista a informática e o cartão que vieram para fazer a mesma coisa automaticamente. E, além disso, tudo fica registrado, seguro, não dá para o usuário falar depois que não utilizou o cartão, que tal despesa não foi feita por ele. Portanto, aumentar a utilização do cartão corporativo é uma medida acertada e que dá maior transparência.

    Da mesma forma, o portal da transparência do governo federal é uma evolução na questão da transparência dos gastos públicos. Uma prova disso é que os gastos irregulares da ministra Matilde Ribeiro estavam lá, disponíveis para quem quisessem acessar na internet. Numa sociedade que exige cada vez mais transparência dos gestores públicos – e isso é positivo -, a existência de meios que possibilitam aos administrados saberem das despesas de seus gestores é de vital importância. Mais uma vez, é uma medida acertada que vai ao encontro dos anseios da sociedade.

    O problema é que de volta e meia a imprensa faz um verdadeiro patrulhamento dos gastos com cartões corporativos. Algumas vezes, a imprensa está coberta de razão, como é o caso do uso do cartão corporativo para pagar despesas de free shooping pela ministra Matilde Ribeiro. Em outras vezes, como no caso do titular da Secretaria da Pesca, Altemir Gregolim, não é possível entender todo esse estardalhaço. O caso do Ministro dos Esportes, Orlando Silva, é outra questão que merece um crédito para a imprensa, apesar da quantia ser muito pequena, R$ 8,40 (oito reais e quarenta centavos).

    É preciso separar o joio do trigo. O que é abuso daquilo que é absolutamente normal. Em 2006, em plena eleição, a imprensa publicou como escândalo o simples fato do uso do cartão corporativo ter tido uma elevação muito grande em sua utilização. Vendeu-se naquela ocasião a idéia de que o cartão coorporativo referia-se a gastos da Presidência da República, que supostamente estavam fora de controle. Porém, uma análise mais minuciosa do cartão coorporativo naquele período evidenciava que houve um brutal acréscimo de sua utilização para se fazer censos do IBGE em regiões isoladas.

    O que houve não foi uma explosão de gastos da Presidência da República, mas simplesmente mais utilização do cartão coorporativo. Para aqueles que acreditam que papel é mais seguro que o cartão – o que é um engano -, poderiam acreditar que o uso de papéis pudesse combater possíveis desvios – que não foram identificados na época – com o uso do cartão. Mas isso é ilógico, pois o cartão possui um nível de transparência muito maior.

    A questão envolvendo a ministra Matilde Ribeiro é emblemática. Muita gente não concorda nem sequer com sua existência, sob o argumento de que é desnecessária uma pasta para cuidar da Igualdade Racial. Seria apenas um ministério para alojar petistas na máquina pública. Entendo que possa haver pastas desnecessárias no governo, mas num país em que os negros ocupam o fim da fila, e sofrem mais acentuadamente a exclusão social, ter uma pasta para cuidar desse assunto é um avanço. E mesmo que acreditasse que essa pasta não serve para nada, não posso deixar de notar que os negros de hoje sentem-se mais representados no governo. Isso se deve em grande medida à própria existência de uma secretária com status de ministério para cuidar das questões raciais. Portanto, a meu ver, trata-se de uma evolução, não o contrário.

    A outra questão é ética. Ninguém precisa dizer que devo pagar minhas contas com o meu próprio dinheiro. Que o dinheiro público é da coletividade, não para ser usado para fins pessoais. Dizer que o gasto irregular – para fins pessoais - do cartão corporativo foi realizado por engano não convence. E que o dinheiro foi devolvido após sair na mídia convence menos ainda. É uma transgressão ética imperdoável. E também ilegal, pois o cartão corporativo não existe para tal fim. É inexplicável o acontecido. Uma autoridade não pode ser dar um luxo de cometer esse tipo de “erro”, mesmo que haja devolvido o dinheiro posteriormente.

    A lição que fica registrada é que a transparência é boa para a sociedade. Tirando os sensacionalismos, os cartões corporativos são bons instrumentos de transparência. Na mesma linha, o portal da transparência na internet é uma boa iniciativa. A combinação dos dois instrumentos pode revelar à sociedade despesas indevidas de ministros do Estado com cartões corporativos. Dificilmente isso aconteceria com simples uso de papéis.
     
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