Um poeta engajado.

Correria típica de final de semestre letivo: dezenas de provas para corrigir, monografias de conclusão de curso para ler, algumas bancas de mestrado e doutorado para participar, artigos para finalizar e ainda por cima a lembrança de que estou às vésperas da viagem para o Simpósio Nacional da ANPUH e ainda não preparei nada. Enfim, o quadro típico de um professor universitário à beira de um ataque de nervos! Nestas ocasiões pré-síncope, uma das “terapias” que me sustentam é a leitura (ou releitura, em muitos casos) de alguns autores que gosto e um deles, sem dúvida, é o Eduardo Alves da Costa. Poeta que insiste em ser engajado, numa época em que o engajamento soa demodèe, ele é o autor do poema “No caminho com Maiakóvski” que estampou inúmeras camisetas e cartazes nos anos 70 e 80 e que muita gente acha, erroneamente, que é de autoria daquele grande poeta russo:

(...)
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim
E não dizemos nada
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão
e não dizemos nada
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
(...)

No entanto, sua obra vai muito além deste poema e a leitura de seus escritos parece-me cada vez mais necessária, nestes tristes tempos em que o individualismo e o conformismo imperam. A despeito de boa parte do meio acadêmico - e também, é lógico, dos "formadores de opinião" da grande imprensa - defender uma neutralidade axiológica e considerar qualquer tomada de posição – à esquerda, diga-se bem - como uma atitude jurássica, ainda estou entre aqueles que insistem (e resistem).

Dinossauros de todo o mundo, uni-vos!!!

Não Te Rendas Jamais

Procura acrescentar um côvado
à tua altura. Que o mundo está
à míngua de valores
e um homem de estatura justifica
a existência de um milhão de pigmeus
a navegar na rota previsível
entre a impostura e a mesquinhez
dos filisteus. Ergue-te desse oceano
que dócil se derrama sobre a areia
e busca as profundezas, o tumulto
do sangue a irromper na veia
contra os diques do cinismo
e os rochedos de torpezas
que as nações antepõem a seus rebeldes.
Não te rendas jamais, nunca te entregues,
foge das redes, expande teu destino.
E caso fiques tão só que nem mesmo um cão
venha te lamber a mão,
atira-te contra as escarpas
de tua angústia e explode
em grito, em raiva, em pranto.
Porque desse teu gesto
há de nascer o Espanto.

In: Costa, Eduardo Alves da. No Caminho com Maiakóvski – Poesia Reunida. São Paulo, Geração Editorial, 2003.
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Projeto do Senador Azeredo é um Cavalo de Tróia

Parte 1


Parte 2



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As pornográficas escolhas editoriais


Na linha de jornal popular, o Extra das organizações Globo raramente dá destaque para o noticiário político em sua primeira página. Normalmente ela é preenchida com o esporte, notícias sobre mudanças nas regras no funcionalismo público, noticiário local, violência, amenidades etc. A edição de quinta-feira, dia 2, tinha toda a metade do alto tomada pela crise no senado, de forma editorializada, comparando o lugar a um “romance” de Carlos Zéfiro, nosso mais conhecido e cultuado pornógrafo.

Eu, e certamente os leitores do Extra, nada temos contra o jornal se posicionar contra algo que pertence ao nosso universo de reclamações: sabemos que o legislativo é um grande balcão de negócios, repleto de favorecimentos aos seus representantes. Apenas estranhamos a escolha editorial exatamente em um dia cheio de pressões e disputas que têm um norte certo, onde a moralização do senado está a reboque dos interesses na disputa eleitoral em 2010.

Mais estranho ainda é a escolha de não destacar o assunto que discretamente ocupa um pedaço ao lado direito, em foto e pequeno texto, que noticia um acidente de trânsito que matou quatro crianças. Se o desejo do jornal é editorializar a notícia com o objetivo de denunciar desvios de conduta na questão pública, eu, e os leitores do Extra, achamos que há muito mais a dizer naquele fato:

As crianças, alunos do tradicional colégio Pedro II, ocupavam uma van pirata, com seus papéis vencidos, aparentemente viajando em alta velocidade. Onde está o poder público que não fiscaliza os veículos de sua cidade?

Li no noticiário online que a mãe de uma criança disse que era uma van contratada por um grupo de pais por falta de outras opções de transporte.

O transporte de massas no Rio de Janeiro não tem investimentos há muitos anos. Seu metrô liga uma parte muito pequena da cidade. Os trens foram sucateados, com uma histórica estação ferroviária fechada, sem trens para diversos e populosos bairros.

Os ônibus dominam o transporte público, todos da iniciativa privada, com interesses econômicos em linhas rentáveis, deixando espaço para a proliferação de vans, em grande parte não legalizadas.

Estas empresas dominam o transporte público com regras de oligopólio, organizadas em sua federação, a Fetranspor, que tem recursos suficientes para investir em ricas campanhas de vereadores, deputados estaduais, prefeitos e até boa propaganda, inclusive na mídia.

Todas estas relações já foram objeto de interesse na criação de CPI na câmara carioca, mas até hoje nunca foi instalada.

Estou certo que os leitores do Extra, que viajam horas em um ônibus lotado, que são maltratados como a jovem Luana Macedo, de 12 anos, que morreu no mesmo dia, na Barra da Tijuca, arrastada com as pernas presas à porta de um ônibus, têm melhores sugestões de pauta para a primeira página.

Mas, temem que os donos do jornal, por motivos outros, não contemplem o verdadeiro interesse público, que está aqui no dia-a-dia de um caótico e assassino sistema de transporte, não em Brasília. Esta é a verdadeira pornografia.

Talvez a escolha explique o motivo do Extra a cada dia perder muitos de seus leitores.
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Crise não é só do Senado

É verdade que o estopim da bomba está hoje aceso no colo do presidente do Senado, José Sarney. Fica até difícil acreditar que uma raposa da política como o senador, que por enquanto só não foi deus no Brasil, não tenha se dado conta do ambiente que se propôs a presidir. Ele se empenhou para ser eleito, teve de brigar para isso, não foi um nome consensual. É impossível que não perceba que o terreno para manobras se encurtou dramaticamente nos últimos dias. Agora, caso nada se faça e aconteça, ou o Senado se arrasta numa crise sem fim ou seu presidente perde toda autoridade moral para conduzir a casa. O afastamento de Sarney parece ser o único desfecho possível.

As coisas são assim não por amor à ética ou à moral, mas porque essa é a saída que pode oxigenar a instituição, que vai mal das pernas há tempos. O Senado responde por uma função importante na engenharia institucional brasileira. A ele é atribuído o papel de amortecer eventuais "arroubos" da Câmara, defender e engrandecer a República. Não tem feito nem uma coisa nem outra. E se ele falha, a institucionalidade fica capenga, funciona mal e tem suas deficiências, que não são poucas, agravadas. Falhando a institucionalidade, vêm à tona a mediocridade. Só não fica pior porque é também nesses momentos que aumentam as chances dos melhores.

Por tudo isso, há uma interrogação hoje pendurada sobre a cabeça do Poder Executivo e do principal partido de sustentação política da Presidência, o PT. Por que manter Sarney? Pela manutenção da aliança com o PMDB e para evitar que as oposições se apossem do comando do Senado. É a resposta mais fácil, fiel ao "realismo político" que se tem tentado imprimir às ações da Presidência. Mas manter Sarney é prolongar o estado de sofrimento do Senado e injetar turbulência na vida política do país. Não é pacificar, nem encontrar alguma solução para a crise que arrasta a instituição para o caos.

O realismo é precioso em política, onde nem tudo o que brilha é ouro. Em política, as coisas certas não são feitas necessariamente pelas melhores pessoas, e o mal nem sempre é obra do mau. Max Weber falou isso no famoso ensaio sobre a política como vocação. E todo mundo sabe que nos ambientes políticos as evidências não correspondem implacavelmente aos fatos.

Que há desejo de oposição por trás da carga contra Sarney é óbvio. Que as oposições se beneficiarão com o eventual afastamento de Sarney é mais óbvio ainda, dado especialmente o pacto de sangue que a Presidência selou com o senador e com seu partido. O Governo Lula e o PT precisam mesmo avaliar com cuidado o quadro e o caminho a seguir.

Mas o realismo não pode se chocar demais com as tradições que dão identidade aos partidos e aos políticos, sob pena de destroçá-la. Nossa época não é muito favorável a coerências doutrinárias ou a fidelidades. Mas os partidos e os políticos que se querem competentes e leais ao povo precisam lutar de algum modo contra isso. No mínimo para dar mais vigor ético e valorativo à política, para manter atados os fios que os ligam à sua própria história. O realismo, além do mais, não pode ir contra as expectativas da opinião pública democrática ou contra a voz das ruas. Não precisa obedecer servilmente a elas, é evidente. A questão é de sintonia.

Falei sobre a crise do Senado à rádio CBN na noite de ontem. Eventuais interessados poderão acessar o link e ouvir a entrevista.


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Notícia para quem precisa

É um alento perceber que a mídia já não consegue mais sustentar o assunto Michael Jackson. Meus ouvidos agradecem.
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