Substitua os astros hollywoodianos por Guido Mantega e Dilma Rousseff, e o leitor terá uma analogia próxima ao que está ocorrendo na política monetária brasileira. Não porque são foras-da-lei, mas por estarem encurralados. Segundo diversos economistas, o arsenal de medidas anticrise usado pelo governo brasileiro está perto do esgotamento, e as previsões de um crescimento econômico mais brando confirmam que a ameaça está à porta.
Três dados que vieram a público nesta semana levantaram preocupação com os rumos do consumo no Brasil, que tem sido o principal pilar do crescimento econômico recente do país e o alvo preferencial das ações de estímulo à economia. Na segunda-feira, a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) apresentou os dados de vendas de setembro: queda de 31,4% em relação a agosto. Ontem, o Indicador de Atividade do Comércio da Serasa Experian, que mede o movimento de consumidores nas lojas de todo o país, mostrou um recuo de 1,8% no mês passado. E o índice de consumidores que pretendem efetuar compra de bens duráveis no quarto trimestre de 2012 atingiu 56%, o que representa uma queda de 22 pontos porcentuais em relação a igual período do ano passado. Este último dado, também de ontem, faz parte de pesquisa sobre intenção de compra realizada pelo Programa de Administração do Varejo (Provar), de São Paulo.
Para Marcelo Curado, professor de Macroeconomia na Universidade Federal do Paraná, os dados apontam para um esgotamento das medidas expansionistas adotadas pelo governo – como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre automóveis e eletrodomésticos e a redução dos encargos para o financiamento de veículos. Mesmo assim, é preciso olhar para os números como alguma reserva.
“Em alguns setores há uma relativa sazonalidade”, observa. “A redução do IPI para os carros, por exemplo, fez com que os consumidores antecipassem uma série de compras. Em consequência, não há fôlego para manter o crescimento no período imediatamente posterior.”
Feitas as ressalvas, Curado diz que a eficácia desses instrumentos, que o governo tem usado desde 2009, é decrescente. “Esse tipo de política vem sendo usada no mundo inteiro, mas sabe-se que seus efeitos são limitados ao curto prazo”, diz.
O professor Christian Luiz da Silva, líder do grupo de pesquisa em Gestão Pública e Desenvolvimento da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), atribui esse esgotamento ao atendimento das necessidades mais imediatas dos brasileiros. “Quando há demanda reprimida, a resposta do consumidor é rápida”, explica. “Quando a demanda está pelo menos parcialmente atendida, a tendência é que essa demanda não responda de forma tão automática.” Além disso, a elevação do endividamento faz com que o estímulo ao crédito perca eficiência – afinal, quem está com o nome sujo não consegue mais comprar.
Se o arsenal perdeu eficácia, que opções sobram?
Se as medidas adotadas nos últimos três ou quatro anos perderam a eficácia, que alternativas sobram ao governo? Segundo Luciano D’Agostini, professor da FAE e doutor em Desenvolvimento Econômico, poucas – e nenhuma capaz de dar resultados imediatos. “O PIB continuará fraco nos próximos períodos”, sentencia. Para o ano que vem, dificilmente passará de 3% – o último relatório semanal Focus, com dados coletados pelo Banco Central junto a consultorias e bancos, ainda aponta 4% de expansão em 2013.
Para ele, as medidas ao alcance do governo agora devem ser voltadas a destravar fatores limitantes, em especial o investimento do setor privado. “O governo tem de tentar aumentar o salário das famílias, flexibilizar a política tributária e estabelecer uma política cambial”, arrisca. “O câmbio é um problema, porque o governo americano tem agido de forma expansionista, desvalorizando sua moeda”, diz.
A ampliação dos benefícios hoje existentes, como a redução do IPI, é uma atitude mais difícil. “Desonerações mais generalizadas seriam boas para o país, mas é uma medida difícil pelo impacto que teria sobre as contas públicas”, comenta Marcelo Curado, da UFPR.
Christian Luiz da Silva, da UTFPR, observa que o alongamento da dívida pública – que vem sendo feito paulatinamente – pode ajudar a gerar fluxo de caixa para o investimento do governo. Mas essa medida, sozinha, seria pouco. “Políticas industriais, de incentivo à ciência e tecnologia e a outros setores considerados estratégicos, são essenciais”, afirma.
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