Ao longo dos últimos anos, nossa mídia fabricou um João Pedro Stedile como um bárbaro, um vândalo, um retrógrado economista. Sua entrevista a Folha não me parece conter nada de anacrônico. Ela é serena, embora firme e contundente. Gostei de sua resposta clara sobre as laranjas da Cutrale:
FOLHA - Ao destruir alimentos, o MST não teme perder o apoio das camadas mais pobres da população, como das 12 milhões de famílias que dependem do Bolsa Família para comprar sua própria comida?
STEDILE - Cerca de 98% da produção de suco no pais é exportada. Esse suco não vai para a mesa dos pobres, com ou sem Bolsa Família. Já o nosso modelo para a agricultura brasileira quer assegurar produção de alimentos, a geração de emprego e renda no meio rural. Queremos produzir comida e, inclusive, suco de laranja para chegar à mesa de todo o povo brasileiro. Não para o mercado externo. Mesmo assim, a área de exploração da laranja [no país] diminuiu em 400 mil hectares nesses dez anos, pela exploração que a Cutrale impõe aos agricultores.
Fica claro, se é que ainda existem dúvidas, que a produção da Cutrale é formada apenas por commodities. Aquilo não vai para o cardápio do povo brasileiro nem quando transformado em suco. Sem entrar no assunto da ilegalidade das terras, a produção da empresa passa longe dos interesses reais do povo brasileiro. Mas o repórter insiste em fazer uma intriga, como se aquelas laranjas fossem alimento. Não são.
Agora, gostaria de ver nossa mídia fazendo contas, mostrando gráficos com os valores do prejuízo da Cutrale com o quanto ela gasta e gastou especificamente em doações nas eleições parlamentares de 2006. Peguem os dados oficiais do TSE, abaixo, em reais, e transformem em dúzias de laranjas. Ou pés de laranja. Vejam quantas laranjas uma empresa gasta para agradar a República. Ou, se preferirem, por quantas frutinhas um parlamentar se vende. Clique para ampliar: