O editorial do jornal O Globo de 24/06/2009 parece saído de amareladas folhas do nosso passado, em estilo e nos seus propósitos. Ele condensa um arrazoado de valores conservadores contra o atual governo no que toca sua tentativa, ainda tímida, de tentar um contraponto às “verdades “do oligopólio midiático. É uma lição sobre o que pensa um setor que contraria princípios básicos da democracia. Uma demonstração de arbítrio e intolerância, com sérias ameaças. Leiam e reflitam. Segue a “obra” com meus comentários:
Para cooptar
O Globo - 24/06/2009
No primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o pendor dirigista e intervencionista de grupos que o acompanham levou o governo a tentar uma operação legislativa para limitar o trabalho da imprensa. Vem daí o projeto de lei de criação do Conselho Federal de Jornalismo, um organismo paraestatal destinado a tolher redações. A reação foi grande, o Congresso criticou, e Lula, com acerto, voltou atrás.
Mentira! No primeiro mandato de Lula os barões da mídia correram com seus chapéus na esperança dos habituais empréstimos via BNDES para seus falidos negócios. A torneira fechou, começaram a campanha contra o governo. O Conselho não era proposta do governo, mas dos jornalistas, representados por seus sindicatos e sua federação nacional. Nunca foi objetivo tolher redações, mas assegurar um jornalismo ético, sem desvios de interesses. As empresas teriam assento na entidade, poderiam fazer valer seus votos. A publicidade tem órgão que regula suas atividades, o Conar, ninguém imagina que ele possa tolher as agências. Inclusive, as Organizações Globo a ele recorrem com frequência. Advogados, médicos, engenheiros também têm seus organismos de regulamentação. A reação partiu apenas do próprio oligopólio da mídia que, em feroz campanha em seus veículos, derrubou a proposta em poucos dias, garantindo o jornalismo que conhecemos, marcado pela venalidade.
É do mesmo período a tentativa de controle da produção audiovisual por meio da Ancinav, outra iniciativa frustrada deste grupo.
Mais mentira. A mídia foi porta-voz de uma histérica e desmedida reação contra uma proposta que favorecia a pequena produção artística. O fez por seus interesses cruzados com o velho monopólio do setor cultural, que não desejava colocar em risco seu modelo de negócios. Ganharam as Organizações Globo, linha de frente do combate, temerosa de perda de receita em um novo cenário que favoreceria a cultura brasileira.
Não por coincidência, eram propostas ao estilo bolivariano, projeto autoritário de subjugação da sociedade, de inspiração cubana, exportado por Hugo Chávez para Equador, Bolívia, Paraguai e com influência até na Argentina. Não deu certo no Brasil porque suas instituições democráticas são das mais consolidadas na América Latina.
Neste ponto, o editorial parece ter sido redigido pelo professor Hariovaldo Almeida Prado, tamanho o clichê. Seu autor, certamente, não acha que foi autoritarismo o golpe praticado contra Chávez e seus milhões de votos, com a ajuda da mídia venezuelana e muito provavelmente da CIA.
No segundo mandato, o governo Lula optou por uma estratégia mais sutil, da qual constam uma grande ampliação do leque dos beneficiários das verbas publicitárias do Executivo — a rigor, iniciada já no primeiro mandato —, e uma postura mais agressiva, exemplificada pelo blog da Petrobras, lançado em meio a discursos ornados por chavões, mas cujo objetivo era mesmo atemorizar a imprensa profissional. Mas errou na dose ao quebrar a relação de sigilo entre repórter e fonte. Teve de recuar. Não há nada de ilegal no blog da empresa. Havia um retrocesso no terreno da ética, depois corrigido. Também não parece existir ilegalidade na política de distribuição de verbas publicitárias, com prioridade para veículos da imprensa regional. Os números provam o alcance da estratégia: a Secretaria de Comunicação distribuiu, no ano passado, propaganda oficial entre 5.297 veículos. Em 2003, foram 499. Não é ilegal, mas se trata de indiscutível desvio de verba pública para pequenas empresas de comunicação que tendem a ficar dependentes da propaganda oficial —, ao contrário da imprensa profissional de grandes centros. A coluna do presidente, oferecida a jornais populares, é outra evidência do projeto de cooptação de parte da mídia.
É muito descaramento. As pequenas empresas podem ficar dependentes! É como dar comida aos pobres, eles viciam! Mandem os anúncios para as grandes, elas vivem de outros expedientes, não terão azia e má digestão. Por favor, leiam o excelente texto de Franklin Martins que desnuda este argumento do oligopólio da mídia.
Assim como a montagem de uma rede sindical de comunicações no ABC paulista, sustentada por verbas publicitárias oficiais, visa também a influenciar eleitores. Não há justificativa técnica para a inserção de anúncios neste tipo de veículo.
O absurdo é colossal. O argumento é que permitir a democratização da informação leva ao perigo de influenciar eleitores! Como assim? A grande mídia não influencia? Ou terá em seguida outro discurso sobre sua isenção? Desfaçatez tem limites. Aqui já é crime.
Operações como essas são conhecidas. Getúlio Vargas manejou recursos do Banco do Brasil com o mesmo objetivo. A História mostra que o desfecho é sempre uma conta com vários zeros endereçada ao Tesouro Nacional.
O final é primoroso, como se o velho jornal direitista em algum momento de sua história tenha se preocupado com as contas do Tesouro Nacional, logo ele que tanto se beneficiou com verbas de governos amigos. O que parece é existir uma emblemática ameaça. Lembra, no fundo, que Getúlio enfrentou uma pesada batalha da mídia que resultou em seu suicídio. Está claro o recado. Cabe a nós e ao governo dar a devida atenção ao barulho dos tambores. Eles querem briga.
Fonte da imagem: www.genesullivan.com