O PIG é internacional


A Sociedade Interamericana de Imprensa afirma ser uma organização sem fins lucrativos que se dedica a defender a liberdade de expressão e de imprensa em todas as Américas. Mas em seu site há uma boa amostra do que efetivamente pensa sobre liberdade. Leiam trechos do relatório sobre a situação da imprensa em Honduras, resultado da reunião da entidade em Assunção, no Paraguai, em março de 2009:

O clima de liberdade de expressão e da imprensa em Honduras durante os últimos seis meses continua obscurecido por uma nuvem que obstrui o trabalho jornalístico.
(...)
O governo cria um ambiente hostil contra os meios de comunicação, jornalistas e diretores, em muitos casos orquestrados pelo próprio presidente da República, Manuel Zelaya.
(...)
O uso de intimidação, ameaças, ofensas públicas, manipulação da publicidade oficial e advertências de que recorrerão aos tribunais de justiça para os crimes de difamação e calúnia tornou-se uma constante no país.
(...)
O presidente ameaça, acusa, insulta e ataca os meios de comunicação do país por não cobrirem os atos do governo à sua maneira, os acusa de serem porta-vozes de grupos econômicos do país, de orquestrar campanhas políticas da oposição e de serem responsáveis pela violência e pobreza do país.
(...)
Em 21 de outubro o presidente Zelaya disse em cadeia nacional que os meios hondurenhos ainda que informassem e mostrassem ao mundo os danos ocasionados pelas chuvas, não informavam sobre as medidas do seu governo nem as coisas boas que seus funcionários fazem
(...)
Em 15 de novembro, o presidente Zelaya voltou a insultar a imprensa nacional ao ter uma leve altercação com Elmer Iván Zambrano, jornalista da Radio América, ao qual menosprezou ao não querer responder as suas perguntas em um evento em El Salvador.
(...)
Em 4 de dezembro, o Colegio de Periodistas de Honduras (CPH) repudiou as pretensões do governo de criar um observatório nacional sobre os meios de comunicação, aspecto que a SIP criticou.
(...)
Em 21 de fevereiro, o presidente Zelaya reiterou que o El Heraldo e La Prensa são responsáveis pela onda de crimes no país.

Para a SIP, em março, o grande problema da imprensa em Honduras era o seu presidente, que teimava em acusar “injustamente” parte da mídia como parcial, porta-voz de grupos econômicos, de orquestrar campanhas políticas da oposição e de ser responsável pela manutenção da violência e da pobreza no país. Para a SIP, o presidente expressar tal pensamento era crime de calúnia e difamação e atentava contra a... liberdade de expressão! Observem também que em 4 de dezembro o Colégio de Periodistas hondurenhos, com o apoio da SIP, repudiou as pretensões do governo de criar um “observatório nacional sobre os meios de comunicação”. Que coincidência. No Brasil, a mesma SIP estava ao lado do oligopólio midiático brasileiro contra a criação do “Conselho de Jornalismo”. Parece tudo o mesmo circo, de horrores.

Março passou. Em junho, militares comandados pelas oligarquias econômicas de Honduras, depuseram o presidente eleito, Manuel Zelaya, e impuseram severas restrições à mídia não alinhada a seu pensamento. Alguns fatos são bem conhecidos:

• Gabriel Fino Noriega, jornalista da Rádio Estelar, é assassinado no dia 3 de julho por forças paramilitares.

• O Canal 36, a Radio TV Maya e a Radio Globo foram ocupados por militares, seus jornalistas ameaçados de morte e suas transmissões interrompidas.

• A Radio Juticalpa de Olancho foi invadida e sua cabine da transmissão foi metralhada.

• A Rádio Progresso foi invadida, suas transmissões interrompidas, jornalistas foram ameaçados de morte e seu diretor, o padre jesuíta Ismael Moreno, foi detido.

• Vários outros jornalistas hondurenhos e da Telesur, foram agredidos e ameaçados na cobertura dos eventos.

• A internet foi controlada e a rede telefônica passou a ser monitorada.


Como a SIP trata os novos fatos sobre Honduras em sua página na internet? Com um profundo silêncio. A principal manchete fala de crime contra jornalista acontecido em 1991, no México. Nada sobre Honduras. Ao que parece, na ótica da SIP, os “entraves” à liberdade de imprensa em Honduras foram resolvidos.
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A culpa é do Chávez!


Completando um mês de golpe em Honduras, a direita e seus porta-vozes na mídia saem do armário, perdendo seus poucos pudores ainda existentes para desfraldar bandeiras pró quartelada. O secretário de redação da sucursal de Brasília da Folha de S.Paulo, Igor Gielow, é explícito nas simpatias em editorial nesta segunda-feira. Diz ele:

A unanimidade em torno da legitimidade de Zelaya parece não incluir a maioria da sociedade de Honduras.


Como assim? Se os golpistas têm e tinham amplo respaldo da sociedade, porque temer uma consulta sobre a possibilidade de se convocar uma constituinte? Afinal, contam com os principais veículos da mídia hondurenha, que tiveram papel fundamental na preparação da quartelada.

Os "golpistas", como são chamados os que estão no poder em tese até a realização de novas eleições, têm respaldo da Justiça e do Legislativo - que seguem abertos.


Em suma: seqüestram o presidente eleito, botam o exército e a polícia contra o povo, calam a mídia que não apóia o golpe e fazem uma eleição que isso será chamado de democracia. Conta outra.

Até aqui, aqueles que querem a volta do presidente deposto não foram jogados ao "paredón".


Não? Mataram vários manifestantes, jogaram bomba em sindicato, perseguem a população em casa, precisam até de um estádio de futebol para as detenções em massa, lembrando o pior de Pinochet e essa violência é “do bem”?

Todos esses são sinais de que o mundo comprou como uma quartelada bananeira um processo muito mais complexo e, no limite, amparado na Constituição.


Na Constituição? A hondurenha que diz no artigo 82 que o direito a defesa é inviolável? Que no artigo 3 diz que não se deve obediência a um governo usurpador que faça uso de armas? Que no artigo 2 diz que a supressão da soberania popular é crime de traição à pátria? Que no artigo 45 diz que é punível todo ato que proíba ou impeça a participação do cidadão na vida política do país?

Mas não é isso que se quer discutir aqui. O problema é Hugo Chávez. Ele preside sobre um modelo renovado de caudilhismo que contaminou meia América Latina. Só que seu "bolivarianismo" só pegou em casa devido à bonança petrolífera. Fora, vingou em Estados falidos como Bolívia e Equador, sempre usando a carta fácil do "povo no poder" contra elites corruptas.


Ah, agora ficou mais claro. Hugo Chávez é o problema. Se defendesse as “elites no poder”, como sempre foi a norma imposta pelas oligarquias atrasadas da América Latina e seus governos, satélites dos interesses americanos, Chávez seria “o cara” para a Folha e nossos filhotes de Gengis Khan.

Pronto, não precisa dizer mais nada.
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Entendendo porque Serra teme Ciro em SP

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Sobre Liberman e Ahmadinejad: alguns breves comentários a partir de um texto de Sérgio Besserman.

Avigdor Liberman durante encontro com o Governador José Serra

No dia 22/07, o economista Sérgio Besserman Vianna publicou em seu blog, no site de “O Globo”, o post que reproduzo abaixo (mantendo os erros de digitação/português do original):

Cadê os outros ?

O secretário de Relações Internacionais do PT, Valter Pomar, chamou o chanceler de Israel, Avigdor Liberman, de racista. Querem saber? Eu tambem acho que o Liberman é racista e acho, além do mais, que a declaração do PT é oportuna. Politica externa é assunto importante da cidadania...
Contudo, há um problema...e ele é grande, enorme mesmo...
Se o PT considera oportuno, como eu considero, criticar o Liberman e , por tabela, o perigoso governo do radical Netanyahu, fica na forte obrigação ética de pronunciar-se com a mesma ênfase sobre o racista, facista, homofóbico, opressor de mulheres, perigoso radical e fundamentalista religioso ignorante presidente do Irã Ahminejad quando de sua visita ao Brasil.
Para não falar do matador de cristãos , genocida, pária e condenado internacionalmente presidente do Sudão Omar Al Bashir, que tambem é , junto com o Ahminejad , queridinho seleto do governo brasileiro.
Fico ao aguardo, na esperança de assistir essa demonstração de independencia do PT em relação ao governo, de uma fortíssima condenação pública desses dois personagens do mal ( como tambem são, na minha opinião, o Netanyahu e o Liberman ) .
Não faze-lo será pusilaneme e, pior, racista !

Após a leitura deste texto - que me foi enviado, via e-mail, por um colega -, decidi postar aqui alguns breves comentários a respeito das questões por ele levantadas:

1- Em primeiro lugar, conscientemente ou não, Besserman cai em um discurso recorrente entre boa parte dos judeus progressistas: embora critiquem a direita israelense, eles não deixam de compará-la a líderes muçulmanos, como se estivessem justificando, assim, os inúmeros crimes contra a humanidade cometidos pelo Estado de Israel. Na verdade, o que tal discurso oculta é a crença inconfessável - pelo menos para esses setores - de que Israel é, na verdade, uma “ilha de civilização” em meio a “barbárie muçulmana”. Logo, o limite da "visão progressista" desses judeus é a sua impossibilidade de criticar o Estado israelense, preferindo então personalizar as críticas a partidos e líderes da direita judaica. O problema é que a História mostra que as violações dos direitos humanos cometidas por Israel ocorreram – e ocorrem – independentemente de quem esteja no governo, seja a centro-esquerda trabalhista, o Khadima ou o Likud;

2- Em segundo lugar, o bravo economista tucano procura estabelecer em seu texto – agora sim de forma consciente e deliberada - uma conexão direta entre a posição do Partido dos Trabalhadores e a posição do governo brasileiro em relação a Liberman. Ora, na sopa de letrinhas que é o quadro partidário brasileiro, é extremamente louvável que um partido político assuma, mesmo que minimamente, algumas posturas de ordem ideológica, concordemos ou não com elas. Agora, associar a posição do PT à do governo brasileiro é ignorância ou má-fé, visto que embora sendo o Partido dos Trabalhadores a força política majoritária na ampla coligação – ampla até demais, para o meu gosto – que hoje governa o Brasil, qualquer observador minimamente isento da política externa brasileira consegue notar que a mesma tem se guiado muito mais pela lógica pragmática de defesa dos interesses nacionais, do que pela lógica das opções partidárias. Neste sentido, o governo brasileiro, come il faut, mantém relações com Israel, com o Irã, com a China, com os EUA, com o Azerbaijão e com inúmeros outros Estados soberanos espalhados pelo mundo;

3- Outra questão a ser ressaltada é o fato de que a mídia brasileira tão combativa ao denunciar as violações dos direitos humanos no Irã de Ahmadinejad e ao criticar a intenção do governo brasileiro em recebê-lo, por ocasião do que seria a sua – posteriormente cancelada – visita ao Brasil, manteve um estranho silêncio em relação ao curriculum (ou melhor, folha corrida) de Liberman, preferindo, ao invés disto, dar destaque ao seu encontro com o presidenciável tucano José Serra, como fez “O Globo”;

4- E, last but not least, não dá para deixar de ressaltar que a expressão “Direitos Humanos” tem sido – juntamente com a palavra “ética” – uma das mais prostituídas do idioma pátrio nos últimos anos, sendo usada de acordo com a conveniência de quem a pronuncia. Como será que aqueles que hoje criticam o que chamam de “excessivo pragmatismo” da Política Externa do Governo Lula reagiriam, caso o Brasil, em nome da defesa dos direitos humanos, decidisse romper relações com Israel ou - afinal, a prisão de Guantânamo continua no mesmo lugar - com os EUA?

Na verdade, todo este papo é só mais um bom exemplo daquilo que os nossos avós chamavam de conversa para boi dormir...
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Dilemas do realismo político



Observadores isentos e cidadãos comuns terão certamente dificuldade para entender a passividade com que os políticos brasileiros estão a enfrentar a situação de desgaste que vem corroendo o Senado Federal desde ao menos o final do mês passado.

Como entender que aquele que é considerado o fecho de ouro do sistema político brasileiro possa ser mantido em banho-maria, sangrando a céu aberto, largado à própria sorte? Terá o Senado ficado sem aura e relevância, a ponto das turbulências que ocorrem em seu interior sequer alterarem a rotina política e governamental? E onde andará a “auto-estima” dos senadores, que não parecem se importar com a perda de prestígio da instituição?

A crise do Senado é visível, mas ela não se limita a ele. Podemos qualificar com rigor sua amplitude, até para não abusar da palavra “crise”. Não estamos diante de uma situação terminal, nem muito menos na ante-sala de uma bancarrota política. Também não estamos na presença de uma “crise orgânica”, do Estado em seu conjunto, ou de uma “crise de hegemonia”, a partir da qual tudo estaria fora de eixo.

Mas procede falar em crise porque as instituições não estão respondendo ao que delas espera a sociedade e começam a se converter numa caricatura de si mesmas. Não se trata de um problema do senador Sarney, deste ou daquele partido, ou mesmo do Poder Legislativo. O Judiciário persegue há tempos a sua reforma. Sequer a Presidência da República funciona a contento, em que pesem a popularidade do presidente e os acertos de seu governo.

Se quisermos escapar do peso negativo da palavra “crise”, podemos dizer que existe hoje, no país, um grave mal-estar político e institucional.

Isso ocorre não somente porque o presidente do Senado entalou numa esparrela que a cada dia fica mais sufocante e lhe dilapida o patrimônio político acumulado ao longo de décadas de atuação. É difícil acreditar que um político experiente e sagaz como o senador Sarney não tenha se dado conta do ambiente que se propôs a presidir e não consiga achar uma saída que o salve de uma despedida melancólica da vida pública. Afinal, ele se empenhou para ser eleito, teve de brigar para isso, não foi um nome consensual. É impossível que não perceba que o terreno para manobras e protelações se encurtou dramaticamente nos últimos dias. A diluição da autoridade moral da presidência da casa alastra-se por todo o Senado, com direito a respingar nas demais instituições políticas, do Legislativo ao Executivo.

A crise, que à primeira vista parece represada e assim é tratada, revela-se então de corpo inteiro, impregnando e maculando a estrutura institucional e os quadros políticos.

Não fosse assim, o sistema já teria reagido. Não estaria a assistir passivamente ao seu enfraquecimento. O cenário é preocupante: se o sistema político não reage não será porque o país dele não necessita e nele não se reconhece? Ou seja, para que as coisas continuem como estão, nessa malemolência irritante e normalizada, não é preciso que as instituições funcionem bem. Não cairemos no precipício, mas também não iremos para frente. Daqui a pouco aparecerá alguém propondo acabar com elas.

O Senado responde por uma função importante na engenharia institucional brasileira. A ele é atribuído o papel de amortecer eventuais falhas ou "arroubos" da Câmara, equilibrar a representação e engrandecer a República. Não tem feito nem uma coisa nem outra. E se não funciona, ou funciona mal, a institucionalidade fica capenga e tem suas deficiências, que não são poucas, agravadas. Falhando a institucionalidade, vêm à tona a mediocridade e o vazio. Só não fica pior porque é também nesses momentos que aumentam as chances de que os melhores quadros assumam suas responsabilidades.

Por tudo isso, há uma interrogação pendurada sobre a cabeça do Poder Executivo e do principal partido de sustentação política do presidente, o PT. Por que blindar a presidência do Senado e banalizar a crise? Para manter a aliança com o PMDB e evitar que as oposições se apossem do comando do Senado. É a resposta mais fácil, fiel ao "realismo político" que se tem tentado imprimir às ações da Presidência. Mas tal resposta prolonga o sofrimento do Senado e injeta turbulência na vida política nacional. Não pacifica, não melhora a situação, não soluciona nenhum dos problemas políticos do país.

O realismo é precioso em política. Nesse universo, nem tudo o que brilha é ouro e nem sempre as coisas certas são feitas pelas melhores pessoas ou o mal deriva do mal. Max Weber falou isso no famoso ensaio sobre a política como vocação. E todo mundo sabe que nos ambientes políticos as evidências não correspondem necessariamente aos fatos. Que há desejo de oposição por trás da carga contra Sarney é óbvio. Que as oposições acabarão por se beneficiar com um seu eventual afastamento é igualmente esperado, dado o pacto de sangue que a Presidência selou com o senador e seu partido. Mas um pouco de oposição é tudo o que um governo democrático necessita, até para não se acomodar ou não achar que manda na sociedade toda. As oposições querem usar a crise do Senado para crescer eleitoralmente e melhorar sua performance em 2010? Que o façam, qual o problema? O que não dá para aceitar é que o governo acredite que sairá incólume com a blindagem do Senado.

Nenhum realismo pode se chocar demais com as tradições que dão caráter aos partidos e aos políticos, sob pena de destroçá-la. Nossa época não é muito favorável a identidades doutrinárias, lealdades ou fidelidades. Os partidos e os políticos que se querem coerentes, porém, precisam lutar contra isso. No mínimo para manter atados os fios que os ligam à sua própria história e com isso dar mais vigor ético à política.

Nenhum realismo, além do mais, pode ir contra as expectativas da opinião pública democrática, o bom-senso ou a voz das ruas. Não deve obedecer servilmente a essas coisas, claro, mas não tem como ignorá-las, sob pena de deixar de ser realismo. É uma questão de sintonia. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 25/07/2009, p. A2].

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