Espaços, atores e circunstâncias

Não é de hoje que Aécio Neves, governador de Minas Gerais, e Fernando Pimentel, prefeito de Belo Horizonte, mantêm relações de proximidade e cooperação. Sempre que aparecem juntos em público, a interpretação é uníssona: abriu-se novo espaço para entendimentos entre o PT e o PSDB. O quadro partidário treme e se agita todo, sinal evidente de que há algo naquela aproximação que o incomoda.

Pimentel e Aécio falam a língua do entendimento. Dizem que não agem com os olhos em interesses pessoais, que desejam armar uma aliança mineira sem a preocupação de saber que impacto nacional ela terá. Querem ampliar os espaços de intercâmbio e ganhar mais combustível para governar, mas também melhorar sua posição relativa no jogo político nacional. Andam na contramão de seus partidos, que vivem em guerra latente ou manifesta. De certa forma, atropelam-nos, superpondo-se aos planos políticos e eleitorais das cúpulas.

Dias atrás, a direção nacional do PT endureceu com o prefeito mineiro, afirmando em nota que "não autorizará, em nenhuma hipótese, o PT a participar de qualquer coligação de que faça parte o PSDB em Minas". Alguns dirigentes petistas acreditam que não é razoável afagar o PSDB num momento em que este partido é o principal pólo da “oposição radical” ao Governo Federal. Acham que alianças localizadas entre os dois partidos terminam por levar água ao moinho de Aécio Neves.

No caso do governador, sua movimentação também indica que ele busca consolidar um espaço de manobra exclusivo, indiferente a compromissos partidários e aberto a articulações ampliadas, que podem incluir até uma troca de legenda. No momento, o gestual político dedica-se a sinalizar, para os que disputam o espaço político tucano, que Aécio Neves tem cacife, não pode ser deixado de lado, nem minimizado. Ou seja, em poucas palavras, que é mesmo candidato à Presidência.

Em ambos os casos, a justificativa é uma só: preencher os espaços políticos, ir além das amarras impostas por partidos que já não mais refletem a sociedade, abrir os braços para todos os que queiram construir um “grande projeto” para o Brasil. Simultaneamente, luta-se para que Minas volte ao primeiro plano.

Espaços sempre existem em política. Raramente são desimpedidos e fáceis de ocupar. Derivam de circunstâncias objetivas e atos de vontade, de projetos e concepções, erros e fracassos. Dependem categoricamente dos atores para se converterem em espaços políticos positivos, ou seja, capazes de produzir efeitos construtivos sobre o processo social e o Estado. Caso contrário, ficam ali, vazios e inoperantes, servindo somente, quando muito, como plataformas para manobras de oposição, estocadas de adversários e sonhos mais ou menos delirantes de contestação.

PT e PSDB nasceram de um mesmo veio, a resistência democrática à ditadura e o esforço para dar voz política aos novos personagens que surgiam na cena brasileira por volta do início dos anos 1980. Tal veio se bifurcou em um dado trecho da estrada, gerando uma esquerda social, combativa e zelosa de seus credos, e uma esquerda moderada, institucional e despojada de substância doutrinária. Lula e FHC estavam juntos nos comícios do ABC e na fundação do PT, do mesmo modo que muitos tucanos de hoje foram petistas ontem e vice-versa. Há entre eles muitos pontos em comum, amadurecidos pelos longos períodos de exercício do poder. Com o correr do tempo, a pista bifurcada convergiu para um ponto de indiferenciação, quase a se diluir em uma imponente auto-estrada de mão única. Diferenças subsistiram, é evidente, e em alguns momentos explodem com virulência. Mas já não há mais como distinguir com nitidez programática e marcas de identidade profunda um tucano de um petista. Eles estão separados somente por um estoque de interesses, algumas mágoas acumuladas e muitos cálculos eleitorais. Claro que, por baixo do que aparece, correm rios caudalosos, a carregar idéias de Estado, utopias políticas, agendas de futuro, modos de governar e compromissos sociais. Isso tudo, porém, tem pouca força para emergir, ditar condutas práticas ou modelar discursos. Está sendo sugado pela globalização capitalista e pela “vida líquida”. São coisas que flutuam sem ter onde ancorar.

Se Fernando Pimentel e Aécio Neves acenam com alianças eleitorais de curto prazo mas têm em vista o futuro menos imediato, é porque espaços reais de entendimento existem. Ambos são políticos experientes e expressivos em suas respectivas constelações políticas. Falam, porém, sem o aval de seus partidos, o que pode indicar que estão basicamente a lançar balões de ensaio para 2010 e a demonstrar força perante seus adversários. Seus gestos e discursos não sugerem categoricamente uma aliança preferencial entre PT e PSDB, nem muito menos fusão partidária, mas sim o estabelecimento de uma base que suavize o confronto entre as duas principais organizações políticas do país e os beneficie como governantes e candidatos.

Mas a vida é dinâmica e poderá exigir que se leve a sério a idéia de formar um bloco político que compense o vazio de lideranças efetivas que tipifica o Brasil magnetizado pelo carisma de Lula. Se vier a ser este o caso, será inaugurado um novo caminho, cujos desdobramentos poderão beneficiar a governabilidade e democratização do país, ainda que não contenham necessariamente isso. Será, porém, um caminho explosivo, pois tenderá a implicar, mais que um reencontro entre PT e PSDB, a completa diluição desses partidos em constelações políticas mais ou menos invertebradas e sem alma. Cristalizar-se-á assim uma institucionalidade política mais suscetível a personalidades e movimentos que a organizações. Não há como prever, mas dá para imaginar, que eficácia democrática teria uma institucionalidade deste tipo. (Publicado em O Estado de S. Paulo, 26/04/2008, p. A2)

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Para os amigos, tudo

O podre governo de Álvaro Uribe segue ruindo e nossa mídia continua olhando o quadro com distanciamento e extrema ponderação. Um bom exemplo é o editorial da Folha de hoje, “Uribe e os paramilitares”. Segue um relato frio dos fatos recentes, como a prisão de Mario Uribe, estreito colaborador e primo do presidente, sem citar seu envolvimento com o tráfico de drogas. Ao final, de forma distanciada, o jornal especula que “talvez esteja se desenhando a "hecatombe" que Uribe uma vez mencionou como único fator que poderia levá-lo a tentar modificar uma vez mais a Constituição de modo a permitir-lhe disputar o terceiro mandato".

Quer dizer, no meio de uma saraivada de evidências do envolvimento do governo com as milícias de direita, seus métodos bárbaros, formação de quadrilha, envolvimento com o tráfico de drogas e plano de mudanças na constituição para conquistar um terceiro mandato, o jornalão não dedica nenhuma crítica, mantendo uma distanciada serenidade.

É o mesmo jornal que repete as mentiras sobre o envolvimento das Farc com o narcotráfico, que faz de Chávez o maior tirano da AL, que vive especulando sobre um possível terceiro mandato de Lula. Para tudo isso, não há economia de adjetivos.

Para Uribe, tirano, narcotraficante, chefe de quadrilha, a fleuma.
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Aliança PT-PSDB (Pimentel-Aécio) é vetada pela Executiva Nacional do PT

Uma resolução da Comissão Executiva Nacional do PT vetou ontem a aliança envolvendo o PT e PSDB em Belo Horizonte. A aliança costurada pelo prefeito Fernando Pimentel (PT) e o governador mineiro Aécio Neves (PSDB) em torno da candidatura de Márcio Lacerda (PSB), atual Secretário de Desenvolvimento Econômico do governo de Minas. O acordo favorecia as candidaturas de Pimentel para o governo de Minas e de Aécio para Presidência da República em 2010. O inusitado da aliança é justamente colocar um projeto regional do PT (governo de Minas) acima de seu projeto nacional (sucessão de Lula). Pimentel ao privilegiar a aliança com os tucanos criou fissuras na base de sustentação do PT na capital mineira. O PSDB, seu adversário, vinha sofrendo de inanição em Belo Horizonte, pois só elegeu um único vereador na última eleição municipal.

Com a insistência de Pimentel, os partidos da base no município – PMDB, PR, PV, PTB, PC do B e PRB (para citar alguns) – intensificaram as negociações políticas buscando posicionamento na eleição municipal, o que pode comprometer uma futura candidatura petista. O PT tinha a faca e o queijo na mão. Tinha tudo para formar uma ampla aliança em torno dos partidos de sua base em Belo Horizonte. Mas o prefeito e seus aliados preferiram o caminho de privilegiar os partidos de oposição política no município – PSDB e PSB -, em detrimento daqueles partidos que garantem a sustentação do PT no governo municipal. Era a condição para uma futura candidatura de Pimentel ao governo de Minas com a benção de Aécio Neves.

O resultado agora é incerto. O que se sabe é que Aécio acabou criando divisões dentro do PT e seus aliados. Em outras palavras, o governador mineiro sai vitorioso. A verdade é que Aécio ganharia independente do desfecho final. Se a aliança fosse concretizada, colocaria no lugar de um petista um aliado de sua confiança na capital mineira. De qualquer forma, sua imagem de conciliador foi reforçada, enquanto o PT sofre o constrangimento de vetar a aliança. Além disso, criou um fato político favorável à candidatura de Márcio Lacerda (PSB), um desconhecido do eleitor de Belo Horizonte, mesmo sem a presença do PT. O candidato do PSB deve ampliar sua aliança com o PPS. Se trouxer mais outros partidos – PV e PMDB, por exemplo - começa a incomodar o ninho petista.

Ficou mais difícil a tarefa de buscar aliados para uma candidatura petista visando permanecer à frente da administração municipal. Além disso, ficou nítido que os aliados do Pimentel não tem candidato competitivo na eleição municipal. O candidato do prefeito é Roberto de Carvalho (PT), um candidato com perfil difícil de emplacar, velho conhecido do eleitor da cidade. O melhor candidato do partido é mesmo o deputado estadual André Quintão (PT), afilhado político do ministro Patrus Ananias. Porém, em razão da maioria que o prefeito conquistou no diretório municipal do partido, dificilmente sairia candidato. E mais difícil ainda seria obter o apoio do prefeito, fundamental para o sucesso de uma candidatura em Belo Horizonte. A manobra de Pimentel foi uma clara antecipação das articulações com vistas às eleições de 2010. O prefeito buscou um atalho para evitar uma disputa direta com Patrus Ananias lá na frente, mas acabou mesmo é antecipando essa disputa. Assim, o partido e seus principais líderes no Estado saem enfraquecidos.

Clique aqui para ver a “Resolução da Executiva Nacional do PT”.

Clique aqui para ver “PT veta aliança com PSDB em Belo Horizonte para preservar 2010, diz Cardozo

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