“Em termos de doação de leite, ela já tá quase alcançando o Kid Bengala”.
Era uma piada?
A  Bandeirantes foi condenada a pagar 5 mil reais diários de multa porque  Danilo Gentili dedicou alguns bons minutos de seu programa à  pernambucana Michele Rafaela Maximino, que doou mais de 300 litros de  leite para hospitais de Pernambuco. Ela tenta entrar para o Guinness.
"A  justiça está sendo feita, pelo menos. Ele falou essas barbaridades e eu  estava fazendo um incentivo às mães a doarem leite”, disse Michele. "Eu  passava na rua e o povo falava : ‘Olha a vaca de Danilo Gentili'!’.  Fiquei várias noites sem dormir. Um peito secou”.
Defensores  de Gentili se queixaram da sentença. Censura! Censura onde, se ele não  foi proibido de falar? Exerceu sua liberdade de expressão e Michele, que  se sentiu ofendida, foi à Justiça, o que é direito dela. Ganhou.
Como  muita coisa no Brasil, o humor está alguns anos atrasado. Hoje há mais  comediantes de stand up do que gente. Gentili faz um humor agressivo e  ofensivo. É tido como um humorista politicamente incorreto. Não é. O  politicamente incorreto, em sua boa forma, expõe e destrói preconceitos.  Gentili faz o contrário.
Gente  como Andrew Dice Clay, George Carlin, Lenny Bruce, entre outros, são  expoentes dessa escola. Eddie Murphy também. Carlin e Bruce morreram,  Clay e Murphy sumiram. Murphy tirava sarro de negros, como Chris Rock.  Uma diferença é que eles são negros. A outra é que eles são engraçados e  inteligentes. Rock fez um excelente documentário chamado “Cabelo Ruim”.
O  que a turma de Gentili faz é outra coisa. Não é humor. É só covardia. É  a transposição para a TV do valentão que fica no fundo da classe  xingando a gorda, o quatro-olho, o macaco, o aleijado, o judeu, o  retardado etc. Todos os grandes incomodavam o poder. Bruce criticava a  Justiça americana.  Algum poderoso foi ridicularizado por Gentili? Claro  que não. Rafinha Bastos mexeu com a mulher de um empresário que era  amigo de Ronaldo Fenômeno. Em dois dias estava fora da Bandeirantes.
A  melhor comédia que se faz hoje já transcendeu isso. Jerry Seinfeld  criou a sitcom definitiva falando sobre o nada. Sim, tinha piada de  bicha ("não que tenha nada de errado com isso", diria George Costanza).  Larry David, co-autor da série, é a estrela de “Curb Your Enthusiasm”,  em que não perdoa o judaísmo -- o judaísmo DELE. ELE é o trapalhão, ELE é  o grosso.
Ricky  Gervais, inventor de “The Office”, estreou um seriado na Netflix em que  interpreta um deficiente mental. É terno -- e divertido. Louis CK lota  teatros tirando sarro de suas duas filhas pequenas. Num de seus  esquetes, imagina Deus voltando à Terra e dando uma bronca: “Que porra  vocês fizeram? Até os ursos polares? Quem vazou óleo? Eu dei tudo o que  vocês queriam e vocês fazem isso?” Russell Brand detonou a Hugo Boss num  evento em que era um dos premiados.
Eles  falam palavrões e são contundentes. Nenhum deles é vendedor de incenso.  São agressivos e polêmicos. Abordam assuntos quentes. Não faz diferença  se são de esquerda ou de direita. Tem de ser engraçado. E eles sabem  que voltar suas baterias contra uma moça que doa leite não é provocação  esperta, não é comédia. É apenas o triunfo da estupidez. Agora, nessa  área, pelo menos, nenhum deles bate Danilo Gentili.