Quem escreve é Elio Gaspari numa pequena nota publicada em sua coluna de domingo na Folha, sob o título "Alstom":
"Ou o tucanato paulista tem uma estratégia capaz de causar inveja ao comissariado petista que pretende livrar seus caciques das penitenciárias pelo mensalão, ou está numa tática suicida, jogando o escândalo do propinoduto denunciado pela Siemens para dentro da campanha eleitoral do ano que vem. Pelas provas, depoimentos e cifras, esse caso ultrapassa, de longe, o mensalão. Ali não há o domínio do fato, o que há são fatos dominantes".
Para quem não entende do que se trata, como é o meu caso, parece uma mensagem cifrada. Só sei que está-se falando da denúncia de um caso de corrupção com cartéis e propinas envolvendo duas multinacionais e três governos tucanos nas obras do metrô e dos trens urbanos de São Paulo, um caso que se arrasta há mais de 15 anos.
O caso começou a ser investigado na Suíça, a partir de depoimentos e provas apresentados pelos próprios corruptores sobre o seu "modus operandi", sem que no Brasil se consiga chegar aos chamadores corrompidos. Vira e mexe aparece no noticiário o nome de algum bagrinho tucano do segundo ou do terceiro escalão, mas as investigações feitas no Brasil misteriosamente empacam num determinado ponto, e a impunidade sobrevive impávida.
Os leitores têm dificuldades para entender o que está acontecendo, como se pode ver pelas perguntas feitas nesta mensagem de Nicola Granato (Santos, SP) publicada na Folha do último sábado:
"Será que nos casos Alstom e Siemens, só participou essa arraia-miúda constantemente citada nas reportagens? Será que essas pessoas tinham o poder de, sozinhas, decidirem sobre o destino de tantos milhões de reais? Quando começarão a aparecer os verdadeiros beneficiários desse escândalo cautelosamente chamado de cartel?".
Também gostaria de saber as respostas, mas a cada dia fica mais difícil entender o que está acontecendo. No mesmo dia da publicação da carta do leitor, o jornal informa que "sem apoio do Brasil, Suíça arquiva parte do caso Alstom". As autoridades suíças esperaram por dois anos que os procuradores brasileiros se manifestassem sobre o material que para cá enviaram pedindo que fossem interrogados quatro suspeitos, mas não receberam nenhuma resposta, e desistiram.
Imagina-se que o Brasil seria o principal interessado em esclarecer o caso, já que os cofres públicos paulistas foram as maiores vítimas da armação multinacional, mas não é isso que mostra o Ministério Público Federal brasileiro. É inacreditável a justificativa dada para a falta de colaboração das autoridades brasileiras: a Procuradoria da República em São Paulo atribuiu tudo a uma "falha administrativa". De acordo com esta versão, o gabinete do procurador Rodrigo de Grandis, responsável pelas investigações sobre as ações da Alstom no Brasil, arquivou o pedido dos suíços numa pasta errada e isso só teria sido descoberto na última quinta-feira. Que gracinha!, como diria a nossa amiga Hebe Camargo.
Por aí se tem uma ideia do interesse das autoridades judiciárias e policiais brasileiras em esclarecer o caminho do dinheiro que rendeu à multinacional francesa cerca de 1,5 bilhão de reais, mais do que seus próprios executivos planejavam, e alguns capilés de bom tamanho para quem ajudou seus executivos nesta tarefa.
Na página 66 da última Veja, em reportagem na qual denuncia que "esquema de corrupção da multinacional Alstom também atingiu as estatais Eletronorte e Itaipu", ou seja, o governo federal, claro, a revista junta mais uma peça, assim meio de passagem, ao quebra-cabeças da grande maracutaia do PSDB, sob o título 1 bilhão: "Uma conta bancária descrita pela Polícia Federal como "lavanderia de dinheiro" para empresários e políticos foi utilizada pela Alstom para pagamento de propina a integrantes do governo do PSDB em São Paulo, indicam as investigações".
Que empresários, que políticos, quais integrantes do governo em São Paulo? Isso a revista não conta nem as autoridades brasileiras parecem interessadas em saber.
Mas os cidadãos contribuintes não se conformam. "Inaceitável a resposta do procurador Rodrigo de Grandis de que houve "falha administrativa". A investigação foi arquivada, os cofres públicos lesados, e tudo fica por isso mesmo? Quem pune esta irresponsabilidade?", pergunta a leitora Fabiana Tambellini (São Paulo, SP) na Folha de hoje. Boa pergunta.
Quem tiver respostas para esses leitores perguntadores pode mandar aqui para o nosso Balaio. É grátis. Não paga nada.