PT diz que investigar Lula é ‘absurdo’ e prepara ato em defesa de ex-presidente
Envio de depoimento de Marcos Valério para apuração na primeira instância do Ministério Público, por decisão da PGR, mobiliza petistas, que acusam o operador do esquema de ‘manobra sórdida’
Denise Madueño, Vera Rosa e Daiene Cardoso
BRASÍLIA - O PT reagiu com veemência à decisão da Procuradoria-Geral da República de mandar investigar as acusações de Marcos Valério Fernandes de Souza contra Luiz Inácio Lula a Silva. Após ser condenado no julgamento do mensalão, o empresário mineiro passou a acusar o ex-presidente de ter sido beneficiado pelo esquema. O partido classifica a atitude como uma "manobra sórdida" e deve transformar a festa de seus 33 anos de fundação, agora em fevereiro, num ato político de desagravo ao seu principal líder.
O Estado revelou na quarta-feira, 9, que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, informou a colegas que irá encaminhar o depoimento de Valério, prestado em 24 de setembro, à primeira instância do Ministério Público Federal - após deixar a Presidência, Lula deixou de ter foro privilegiado e terá seu caso analisado por procuradores federais de Minas, São Paulo ou Distrito Federal.
Gurgel divulgou uma nota oficial na qual afirma ainda não ter tomado a decisão (mais informações abaixo). Fontes da Procuradoria-Geral, porém, confirmaram ao Estado que a decisão de dar prosseguimento ao caso já foi de fato tomada em dezembro.
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), disse considerar "um absurdo" o Ministério Público apurar se houve envolvimento de Lula no mensalão. Na mesma linha, dirigentes do PT apontaram o dedo para Valério, acusando-o de tentar criar um fato político para minimizar o impacto de sua condenação pelo Supremo Tribunal Federal - o empresário foi condenado a mais de 40 anos de prisão e tenta, por meio de novas informações, diminuir a pena ao receber o benefício da chamada delação premiada.
No depoimento prestado à Procuradoria-Geral em setembro, Valério disse que pagou despesas pessoais de Lula, no início de 2003, por meio de depósito na conta da empresa de segurança Caso, de propriedade do ex-assessor da Presidência Freud Godoy.
"É um absurdo que se produza uma nova investigação sobre esse tema, envolvendo o presidente Lula. Esse tema foi investigado à exaustão", disse Maia, ao lembrar que 25 réus foram condenados pelo Supremo. "Além disso, houve uma CPI e todas as pessoas investigadas tiveram suas vidas devassadas. Qualquer tentativa de envolver o presidente Lula nisso não tem cabimento."
Para Maia, Valério "não é confiável". "É um homem condenado a 40 anos de cadeia e busca, agora, criar um fato político para atenuar sua condição. Não me parece razoável que tenha de se reabrir um caso que já foi tratado nas mais diversas instâncias", completou o presidente da Câmara. "É uma manobra sórdida de alguém que tenta sair do buraco", emendou o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP).
Lula sempre negou conhecer Valério, a quem chamou de "mentiroso" e "jogador". O ex-presidente descansa em Angra dos Reis (RJ) com a família e não quer alimentar o assunto.
O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, divulgou nota na quarta-feira na qual afirma que Gurgel "desmentiu" ter a intenção de investigar o petista. Ele criticou o jornal. "Em relação à manchete de primeira página do jornal O Estado de S. Paulo (...) lamento profundamente que o jornal tenha induzido ao erro seus leitores e outros órgãos da imprensa, já que não há hoje nenhuma decisão oficial sobre o assunto por parte da Procuradoria-Geral da República, de acordo com manifestação oficial do órgão desmentindo a matéria. Estranho tal equívoco na primeira página de um jornal tão tradicional como O Estado de S. Paulo, e prefiro acreditar que não existiu nenhum viés mal-intencionado no ocorrido", afirma a nota.
No mesmo depoimento em que acusou Lula, Valério afirmou ter sido ameaçado de morte por Okamotto a fim de que não contasse o que sabia. "Se o Ministério Público tem algum elemento de credibilidade e acha relevante fazer a investigação sobre isso (a acusação de ameaça), acho que tem mais é de fazer. Esse é o papel do Ministério Público", disse Okamotto quando o conteúdo do depoimento foi revelado pelo Estado em dezembro.
Para o secretário de Assuntos Institucionais do PT, Vilson Oliveira, o partido não tem nada a temer. "No aniversário do PT, em fevereiro, vamos fazer um ato político na Câmara em defesa de Lula, do partido e de todos os nossos militantes. É um ato pró-PT."
Além de comemorar 33 anos, o PT completa em 2013 uma década à frente da Presidência, desde a eleição de Lula e agora com Dilma Rousseff. "Não é a primeira vez que tentam criminalizar o legado de Lula", disse o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE). "O procurador pode mandar o depoimento para a primeira instância e vai ver que não tem nada", afirmou o secretário de Assuntos Institucionais do PT. "Ele deveria agir sempre assim, mas das outras vezes não foi tão rápido", ironizou. No ano passado, o PT acusou Gurgel de engavetar investigações que apontavam a ligação entre o então senador Demóstenes Torres e o contraventor Carlos Cachoeira.
Fonte: O Estado de S. Paulo