Agnaldo Timóteo e Coronel Telhada

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  • sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
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  • Por Leonardo Sakamoto, em seu blog:
    A partir do momento em que saiu a pesquisa Boca de Urna do Ibope, apontando que o segundo turno ficaria entre José Serra e Fernando Haddad, virei o radar de preocupações para a composição da Câmara Municipal de São Paulo. Naquele momento, muita gente afirmou que a exclusão de Celso Russomanno da disputa era a prova de que ainda há esperança para a cidade. Permitam-se, humildemente, discordar.
    A composição do legislativo municipal é uma radiografia interessante para tentar entender quem é o paulistano, o que ele pensa e como é influenciado, por representar interesses mais específicos. Creio que a composição que saiu das urnas mostra uma São Paulo mais conservadora do que, particularmente, gostaria que fosse. Voltaram pessoas comprometidas, entrou gente nova com capacidade de propor mudanças, saíram alguns cacarecos, mas também ficaram, debutaram ou retornaram nomes preocupantes que, certamente, vão dar o que falar.
    No final das contas, remexendo os escombros deixados pelo primeiro turno, houve algumas notícias alvissareiras e outras tantas preocupantes. Vou trazer uma de cada.
    Não tinha dúvidas que o Coronel Paulo Telhada, ex-comandante da Rota, por exemplo, receberia expressiva votação. Computados os votos, teve 89.053 apoios, ficando em quinto lugar. Telhada incitou seus seguidores no Facebook contra o repórter André Caramante, da Folha de S.Paulo, por conta da reportagem “Ex-chefe da Rota vira político e prega a violência no Facebook”. O Sindicato dos Jornalistas de São Paulo chegou a encaminhar a autoridades um documento solicitando proteção para o jornalista.
    As postagens na rede social levaram o Ministério Público Eleitoral a pedir a impugnação de sua candidatura. Mas, por enquanto, serviram apenas para ameaçar a liberdade de imprensa e exilar um bom repórter, que teve que sair do país.
    Muitos paulistanos têm orgasmos múltiplos com os discursos do terrorismo de Estado e da flexibilização dos direitos civis no intuito de vencer a “guerra” contra os bandidos. Acham o máximo declarações como “tem gente que ainda quer defender essa raça de safados [...] e algumas ‘organizações’ querem defendê-los como vítimas da injustiça da polícia”. Ignoram que a função da força policial não é julgar, condenar e executar a pena e, sim, cumprir a lei. Se com o devido processo legal já cometemos barbaridades, imagine sem ele.
    A ditadura se foi, sua influência permanece. O impacto de não termos prestado as contas de nosso passado se faz sentir no dia-a-dia nas blitz, nos distritos policiais, nas salas de interrogatórios, nas periferias das grandes cidades, nos grotões da zona rural, com o Estado aterrorizando parte da população (normalmente mais pobre) com a anuência da outra parte (quase sempre mais rica). Estamos em guerra contra a violência, contra as drogas, contra inimigos externos. Ninguém explicou, contudo que essa guerra é contra os valores que nos fazem humanos e que, a cada batalha, vamos deixando um pouco para trás. É necessária uma revisão sobre o papel, os métodos e a estrutura da polícia. Setores dela estão impregnados com a ideia de que nada acontecerá com eles caso não cumpram as regras. E a outra parte sabe que a sociedade está pouco se lixando para ela e suas famílias, pagando salários ridículos e cobrando para que se sacrifiquem em nome do patrimônio alheio.
    Se o Coronel Ubiratan Guimarães, que chefiou (no chão) o massacre de 111 presos no Carandiru, há 20 anos, não tivesse morrido – segundo a polícia – pelo gatilho de sua própria namorada (cujo julgamento está marcado para novembro deste ano), teria sido facilmente reeleito como deputado estadual. Seu número, para deixar claro qual era o mote de sua campanha, era 14.111.
    A boa notícia é que, dentro da taxa de renovação de 40% que atingiu o legislativo municipal neste pleito, finalmente Agnaldo Timóteo dará adeus ao Palácio Anchieta.
    O vereador do PR recebeu 12.009 votos e não se reelegeu. Ele que já usou o cargo para defender torturadores da ditadura também afirmou, com seu jeito peculiar, que “deveríamos colocar a bunda para a lua e agradecer” aos militares. Phino.
    Contudo, o que nunca vai sair da minha memória é a patética intervenção a favor da exploração sexual juvenil há cinco anos. Em um discurso na Câmara, ele disse que o visitante que vem ao país atrás de sexo não pode ser considerado criminoso. “Ninguém nega a beleza da mulher brasileira. Hoje as meninas de 16 anos botam silicone, ficam popozudas, põem uma saia curta e provocam. Aí vem o cara, se encanta, vai ao motel, transa e vai preso? Ninguém foi lá à força. A moça tem consciência do que faz”, declarou. “O cara (turista) não sabe por que ela está lá. Ele não é criminoso, tem bom gosto.”
    Como já disse aqui, alguns dizem que ele não reflete sobre o que fala, é um conservador caricato apenas. Não dispendo a ele a complacência que se dá aos políticos patéticos porque ele não é bobo. Timóteo simboliza aqueles que não vêem o Estado como espaço de efetivação da cidadania, mas sim de batalha. Em que o mais forte, esperto ou rápido, vence. De certa forma, como alguns políticos-policiais.
    Timóteo se beneficia de sua imagem como cantor e que leva parte da população a votar nele. Tem o dom da palavra, consegue falar com um público amplo e coloca soluções fáceis na mesa que são consumidas com facilidade. De certa forma, como Celso Russomanno.
    Mas ele não é causa e sim consequência. Verbaliza a visão de uma parte da sociedade que, mal informada e com medo de si mesma, reproduz processos que mantém a opressão, a dor e o preconceito.
    O tempo é implacável. Timóteo, provavelmente, gastou o seu capital de imagem. Contudo, as posições que ele defende não se vão com ele, porque não pertencem a ele. A Câmara Municipal, quer gostemos ou não, é um espelho da cidade e esses posicionamentos serão incorporados por outros eleitos ou reeleitos.
    Todos os pontos de vista relevantes merecem ter representação no legislativo municipal. A tristeza é que, alguns deles, são provas que falta muito para sermos uma sociedade em que se respeita os direitos fundamentais. Tenho esperança de que, um dia, com muito diálogo e paciência, a composição da Câmara mostre um reflexo melhor. Um do qual não sintamos uma certa vergonha.
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