A Vida Vivida – Vinicius de Moraes

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  • quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
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  • Quem sou eu senão um grande sonho obscuro em face do Sonho
    Senão uma grande angústia obscura em face da Angústia
    Quem sou eu senão a imponderável árvore dentro da
    noite imóvel
    E cujas presas remontam ao mais triste fundo da terra?

    De que venho senão da eterna caminhada de uma sombra
    Que se destrói à presença das fortes claridades
    Mas em cujo rastro indelével repousa a face do mistério
    E cuja forma é prodigiosa treva informe?

    Que destino é o meu senão o de assistir ao meu Destino
    Rio que sou em busca do mar que me apavora
    Alma que sou clamando o desfalecimento
    Carne que sou no âmago inútil da prece?

    O que é a mulher em mim senão o Túmulo
    O branco marco da minha rota peregrina
    Aquela em cujos abraços vou caminhando para a morte
    Mas em cujos braços somente tenho vida?

    O que é o meu Amor, ai de mim! senão a luz impossível
    Senão a estrela parada num oceano de melancolia
    O que me diz ele senão que é vã toda a palavra
    Que não repousa no seio trágico do abismo?

    O que é o meu Amor? senão o meu desejo iluminado
    O meu infinito desejo de ser o que sou acima de mim mesmo
    O meu eterno partir da minha vontade enorme de ficar
    Peregrino, peregrino de um instante, peregrino de todos os instantes

    A quem repondo senão a ecos, a soluços, a lamentos
    De vozes que morrem no fundo do meu prazer ou do meu tédio

    Qual é o meu ideal senão fazer do céu poderoso a
    Língua
    Da nuvem a Palavra imortal cheia de segredo
    E do fundo do inferno delirantemente proclamá-los
    Em Poesia que se derrame como sol ou como chuva?

    O que é o meu ideal senão o Supremo Impossível
    Aquele que é, só ele, o meu cuidado e o meu anelo
    O que é ele em mim senão o meu desejo de encontra-lo
    E o encontrando, o meu medo de não o reconhecer?

    O que sou eu senão ele, o Deus em sofrimento
    o temor imperceptível na voz portentosa do vento
    O bater invisível de um coração no descampado ...
    que sou eu senão Eu Mesmo em face de mim?
     
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