[OBS deste blog 'democracia&política': Acho certo todos os crimes serem investigados e os criminosos corretamente condenados.
O que acho errado, e até muito jocoso, é o PGR, o STF, toda a mídia direitista e setores da PF serem grosseira e ostensivamente hemisféricos.
Por exemplo, o PGR julgou análogos e bem maiores crimes do mensalão tucano como "simples crimes eleitorais" (de "caixa 2") e "já prescritos" (após engavetados tanto tempo). O PGR sugeriu ao STF o arquivamento! O STF não o arquivou, mas, espertamente, de maneira disfarçada, foi generoso com os tucanos. Dispersou o processo deles ("fatiou") para o trâmite espalhar-se sem alarde em várias instâncias e recursos e em infinitos prazos. "Estranhamente", o STF não autorizou isso na ação contra o PT. Na Ação Penal 470 todos foram julgados e condenados no STF, erradamente privados do direito aos julgamentos e aos recursos que teriam em todas as demais instâncias. E o julgamento impressionantemente midiático, verdadeiro "showmício", coincidiu, "miraculosamente", com o processo eleitoral deste ano.
É esse o cenário da triste comédia partidária que assistimos e continuamos a assistir. É a velha e permanente luta da direita para assumir o poder.
Vejamos o texto e o vídeo abaixo de Bob Fernandes:]
AO CASSAR MANDATOS, O SUPREMO FAZ POLÍTICA
“Cinco a quatro. Portanto, é óbvio que o Supremo Tribunal estava rachado quanto à cassação ou não do mandato dos três deputados condenados no julgamento do chamado "mensalão" -Valdemar Costa Neto (PR-SP), João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT). Na noite de segunda-feira, 17, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), já reagia:
- "A decisão do STF é precária. A Corte não estava com sua composição completa. A cassação é uma decisão da Câmara, ou do Senado, expressa na Constituição Federal. A vontade dos constituintes é clara em relação ao tema. Nosso trabalho é cumprir a Constituição na integralidade. Se o STF vai contra isso, é um sinal claro de ingerência de um poder sobre o outro.”
No mundo das frases feitas e dos clichês, diz-se que "decisão da Justiça se cumpre e não se discute". No mundo real, isso é só uma frase feita. O maior problema na Justiça brasileira é exatamente esse: as decisões são contestadas por quem tem dinheiro ou poder. E até a última vírgula.
Por exemplo. O Judiciário já julgou e decidiu: a União e os Estados devem mais de R$ 100 bilhões aos cidadãos. Dívidas de precatórios. Governantes que não pagaram tais dívidas deveriam, a rigor, serem responsabilizados e presos. Mas ninguém foi e nem será preso. Por quê? Porque decisões nos tribunais são técnicas, mas são também políticas. E, ao menos na aplicação das decisões, levam em consideração o chamado "ambiente". Seja social, seja, neste caso em particular, o político e midiático.
Essa decisão do Supremo é técnica; não faltam caminhos para uma decisão "técnica". O Brasil tem cerca de 180 mil leis. Sempre haverá uma brecha legal, "técnica". Mas essa decisão é também política, no sentido mais amplo da expressão [partidária, pró-direita, pró-demotucanos]. Se coaduna com certo ambiente social; aquele que tem voz e espaços tradicionais. Diz respeito ao que, neste momento, reverbera e impacta o cenário político e social.
Quatro dos cinco ministros disseram que a cassação de mandatos é um ato que cabe exclusivamente ao Congresso, como exposto no artigo 55, parágrafo segundo da Constituição. Os demais enxergaram uma brecha para o Supremo decidir de maneira oposta.
Importante: há um ano, os mesmos Celso de Mello, Luiz Fux, Marco Aurélio e Gilmar Mendes julgaram caso semelhante. E, então, entenderam, e votaram, com opinião contrária ao que agora manifestaram. A eles não faltará talento e verve para justificar esse “neovoto”.
A justificativa maior para o Supremo cassar os três deputados é que não teria sentido eles não perderem o mandato. Porque já condenados no caso conhecido como mensalão. De fato, até uma pedra, a princípio, não entenderia como alguém condenado, seja quem e onde for, pode exercer mandato.
Mas há um fato maior. Determinado pela Constituição. Quem elege é o eleitor, o povo. Quem cassa, e isso está explicito no espírito da lei, é o Legislativo. Ou, o mesmo povo na eleição seguinte. E o Legislativo que se explique aos eleitores, que se autoavacalhe se não cumprir o que manda o bom senso. E os cidadãos que cobrem o que deve ser cobrado. Como cobraram, e arrancaram, a “Ficha Limpa”.
Certamente, assim pensam quatro dos nove ministros. E, há um ano, assim também entenderam os ministros que, agora, mudaram de opinião.
Com razão, se duvida da capacidade do Congresso de cassar os seus. Mas razão terá também quem afirmar que o Supremo e os tribunais Brasil afora não funcionam, não decidem dezenas de milhares de casos. Casos que, há anos, às vezes décadas, dormem nas suas gavetas. E nem por isso outro poder irá usurpar as prerrogativas do Supremo, dos tribunais, do Judiciário.
A decisão do Supremo é técnica. Mas é, também, política. E pode levar a uma crise se o Congresso, mesmo esse Congresso aí, reagir. Como enuncia Marco Maia – que, diga-se, já não será o presidente da Câmara logo depois que os poderes Legislativo e Judiciário voltarem das férias.
Para essa decisão, não faltou cálculo… Falando em cálculo, e para uma reflexão que não seja não futebolística: desde o fim dos regimes oligárquicos, há 82 anos, o Brasil viveu apenas 42 anos de democracia plena- ou seja com eleições livres e mandatos completados. O resto, quase a metade, foram ditaduras. Ou, arremedos de democracia.”
FONTE: vídeo e texto de Bob Fernandes no portal “Terra Magazine”. O autor foi redator-chefe da revista “CartaCapital”. Trabalhou em “IstoÉ” (BSB e EUA) e “Veja”. Repórter da “Folha de S.Paulo” e “JB”, fez "São Paulo, Brasil" no “GNT/TV Cultura”. Comentarista da “TVGazeta” e “Rádio Metrópole” (BA) (http://terramagazine.terra.com.br/bobfernandes/blog/2012/12/18/ao-cassar-mandatos-o-supremo-faz-politica/). [Trechos entre colchetes e imagem do google adicionados por este blog 'democracia&política'].