Niemeyer, o comunismo e a arquitetura

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  • sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
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  • Desenho de Oscar Niemeyer

    Oscar Niemeyer foi um grande arquiteto. Fiel à essência da arquitetura, foi também um humanista e um intelectual permanentemente atento à vida e às condições dos setores mais pobres e excluídos. Comunista, militante do PCB, foi uma pessoa grandiosa. Cultuou o moderno sem se descolar das raízes nacionais, emprestando à arquitetura uma irreverência que ganhou mundo.

    Seu grande legado foi a arquitetura. O que ele fez com sua criatividade, com sua prancheta, projetou a arquitetura brasileira no mundo. Ajudou a embelezar a vida e as cidades. Junto com outros gênios como Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha, que seguiram trajetórias parecidas, ajudou a consolidar a arquitetura como uma arte e uma técnica a serviço do homem.

    Sua morte em dezembro de 2012, aos 104, anos enseja muitas reflexões.

    Como costuma fazer habitualmente, Reinaldo Azevedo foi contra a corrente e desancou Oscar Niemeyer em seu blog, reproduzindo artigo que escreveu quando o arquiteto fez 99 anos. Antes da republicação, fez um comentário eloquente: "Morreu o arquiteto Oscar Niemeyer, aos 104 anos. Pensava e escrevia coisas detestáveis. Dele se pode dizer o que disse Millôr Fernandes sobre um colega seu de Pasquim: “Metade é gênio, e metade é idiota”.

    Muita gente concorda com isso e várias pessoas manifestaram-se em tons parecidos com o de Azevedo. Acham que Niemeyer precisa ser criticado porque era comunista dos brabos, ou pelo menos deveriam todos se lembrar disso para "colocá-lo em seu devido lugar". Se o cara pensava mal, parte de sua obra deve ter sido contaminada, parecem querer dizer, e alguns dizem mesmo.

    Os anticomunistas militantes, o pessoal mais à direita, que gosta de se apresentar como "conservador", formam a parte mais ativa dessa linha de avaliação. Invariavelmente, baixam o nível, pois sua forma de fazer crítica política, estética ou ideológica jamais faz concessões ao bom gosto, à educação ou ao refinamento. Outros, mais liberais, criticam o stalinismo de Niemeyer, que o teria feito tomar posições equivocadas e falar besteira demais, ainda que isso não sirva para desmerecer sua obra. Entre uns e outros, flutua Reinando Azevedo: "A estupidez política de Niemeyer, que defendia regimes homicidas, não condena a sua obra. Mas a sua obra também não absolve a sua estupidez política".

    É uma discussão antiga e interminável essa. Cultura e política. Poderia um reacionário escrever coisas da perspectiva generosa do homem, algo libertário ou que mostrasse a verdadeira face da vida? Alguns filósofos marxistas, como Lukács, responderam firmemente que sim, chamando isso de "vitória do realismo".

    Os que criticam o comunismo de Niemeyer deveriam proceder do mesmo jeito quando analisassem sua obra de arquiteto.

    Da minha parte, mantenho tranquilamente a opinião de que Niemeyer teve extraordinária importância na cultura brasileira e na arquitetura mundial. Mas gostaria de acrescentar o seguinte.

    Oscar era mesmo meio stalinista. Um homem do seu tempo, que abraçou o comunismo como um credo e o praticou de forma inflexível, agarrado às suas convicções e sem arredar pé um centímetro delas. Foi pouco dialético, pouco arejado. Não o conheci pessoalmente, mas acompanhei suas relações com o PCB durante os anos em que atuei no partido e mesmo depois. Oscar jamais foi um renovador no âmbito partidário ou do marxismo, nunca aceitou a ideia de democracia como valor universal, sempre pensou que a revolução viria por uma explosão dos indignados e famélicos do mundo. Acho que não entendeu as transformações que ocorreram no capitalismo e no mundo moderno. Poderia ser criticado por isso, se fosse o caso.

    Mas não é o caso, pois Oscar jamais foi um político e muito menos um formulador político. Tomou posições políticas muitas vezes de forma ingênua, passional, fiel a suas convicções ou obediente às diretrizes partidárias. Não deveria, portanto, ser criticado naquilo que julgam ser seu "pensamento político", que nunca foi por ele formulado, explicitado ou esclarecido. Ele atuou, digamos assim, como um pensador passivo, um repetidor. Na arquitetura, porém, foi um criador, e aí está o seu legado.

    É isso, simples assim. Fazer um auê a esse respeito agora que o cara morreu é tão primitivo e equivocado quando acender velas para ele e tratá-lo como um santo ou alguém a ser canonizado. E não ajuda em nada a que se compreenda melhor seu papel e especialmente o significado de sua arquitetura.
     
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