Lula, Dilma e o PT: fatiados

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  • terça-feira, 4 de dezembro de 2012
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    Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:

    Ainda em 2011, recém-iniciado o governo Dilma, ficaram claras as estratégias do governo vitorioso e da oposição derrotada pela terceira vez. Do lado petista, Dilma caminhou (ainda mais) para o centro, numa tentativa de conquistar setores urbanos (da nova e da velha classes médias) que se haviam afastado do PT durante os dois mandatos de Lula. Dilma aceitou a pauta da “faxina moral”, investiu na imagem da “gerente”, e evitou qualquer conflito com a mídia conservadora que é a verdadeira comandante da oposição no Brasil.

    A presidente emitiu sinais de que concentraria toda sua energia na mudança de paradigma econômico: reduzir os juros, e abrir espaço para uma nova fase de desenvolvimento sem a hegemonia ostensiva do setor financeiro (o que inclui também as tentativas de reduzir os custos de produção, como no caso da energia). O arranjo adotado durante os dois mandatos de Lula, com juros altos e programas sociais massivos (Bolsa-Família, crediário popular, recuperação do salário mínimo, Pro-Uni), serviu para manter os rentistas e grandes empresários calmos – ao mesmo tempo em que trouxe para o PT imensas massas “descamisadas” que, no passado, não votavam no partido de Lula.

    Escrevi, em 2011, que a escolha parecia inteligente: o PT ja tinha os setores de trabalhadores organizados (que votam na aliança de esquerda desde os anos 80) e as grandes massas que o governo Lula tirou da miséria. Dilma conquistaria a classe média, reduzindo ainda mais a margem de manobra da oposição.

    O risco, no entanto, era evidente: tudo ficar igual. Se Dilma assume o discurso tucano do “gerenciamento”, afastando-se de qualquer confronto, evitando a “politização”, qual seria a diferença – no fim das contas – de votar num tucano ou num(a) candidato(a) do PT, em 2014?

    Fragilizada pela terceira vitória lulista, a oposição midiática e o consórcio PSDB/DEM/PPS aceitaram o jogo, mas com uma nuance matreira: passaram a dividir PT, Lula e Dilma em 3 fatias. Lula seria o “atraso” populista, o PT seria quase uma ”quadrilha”, e Dilma seria a única aceitável nesse tripé – a gerente confiável. Se Dilma tomara a decisão de caminhar para o centro (abandonando a Reforma Agrária, engavetando a “Ley de Medios” que Franklin deixou pronta no fim do governo Lula, jogando no lixo avanços na Cultura da era Gil/Juca, entre outros pontos), a oposição tratou de atraí-la cada vez mais: “venha com a gente, longe de Lula e do PT você será bem tratada…”

    A sedução, em parte, parece ter funcionado.

    Assim, terminamos 2012 com a estratégia do “fatiamento” em pleno vapor: o PT recebe o carimbo de “quadrilha” no STF (o que não impediu que o partido conquistasse mais Prefeituras, incluindo a gigantesca São Paulo; mas foi suficiente para evitar uma vitória ainda mais consagradora para a sigla de Lula, que teve recuos inesperados em Salvador e Fortaleza, e resultados apenas razoáveis em cidades médias de todo o país), Lula vira o alvo no caso Rosemary (que, por outro lado, mostra o mergulho de parte do petismo na inaceitável tradição de velhacarias e patrimonialismo brasileiros).

    E Dilma? Os geniais condutores da estratégia de comunicação da presidenta acham que ela se salvará sozinha dos ataques. Acreditam – ou fingem acreditar – no canto de sereia da velha mídia conservadora… Gostam de ver Dilma apontada como a condutora de um “novo PT”.

    Não é preciso ser muito esperto para perceber que não há “novo” ou “velho” PT. O que existe é o PT – com sua história de erros e acertos. O velho e o novo ganham juntos, ou naufragam juntos. A arena da oposição é o “gerenciamento” e o “moralismo” udenista. A arena da centro-esquerda é a política, a defesa do Estado, das reformas democráticas e dos programas sociais. Dilma parece ter-se esquecido disso. Ou achou que seria possível manter isso tudo em banho-maria, enquanto se concentrava no rearranjo da economia?

    Agora, em 2013, veremos iniciar-se a terceira etapa do “fatiamento” – que não foi concebido por Joaquim Barbosa, mas por Mervais e outros quetais. Enfraquecida a imagem de Lula e do PT (atenção, não estou dizendo que a imagem esteja irremediavelmente abalada; as pesquisas mostram que tanto Lula como o PT seguem como referência de defesa dos interesses populares, mas o partido está claramente na defensiva nos últimos meses), veremos se Dilma terá força para reagir aos ataques.

    E eles já começaram. ”Mequetrefe”, diz um colunista sobre a presidenta. Outro comemora o “ano perdido” (2012) na economia. Inicia-se, no noticiário, um giro cuidadoso para incluir Dilma – ao lado de Lula e do PT – na mira dos ataques.

    PT/Lula/Dilma juntos são fortíssimos. Quase imbatíveis. Sozinha, Dilma ainda é forte. Mas o jogo fica embolado. O povo teria que escolher entre uma “gerente” petista ou um “gerente” tucano. O PSDB já percebeu que há espaço pra avançar agora. FHC lançou Aécio. Nas pesquisas, ele está muito atrás de Dilma. Mas pesquisa a essa altura não diz muito. O que importa é o arranjo político.

    Se o PSDB abandona o discurso raivoso da era Serra, e adota um tom mais centrista, a massa de eleitores pode se perguntar: vamos eleger pela quarta vez um(a) presidente(a) petista? Mesmo com tantos escândalos? Se PSDB e PT ficam parecidos, será que não é melhor apostar dessa vez naquele partido que – na mídia – não está carimbado como “quadrilha”? A avenida por onde os tucanos podem avançar é essa: ganhar dos eleitores o benefício da dúvida, o mesmo que o STF deixou de lado em 2012…

    Ah, mas os tucanos tem outro carimbo – governam para os ricos, são privatistas e só pensam em agradar os empresários. Lula e o PT, não – esses governam para o povo. Mas quem está falando de Lula e do PT? Dilma não se afastou dos dois, ao traçar sua estratégia inicial há 2 anos?

    Isso tudo, e mais o crescimento medíocre da economia pelo segundo ano seguido (a “gerente” não gerenciou?) permitem que a oposição – que respirava por aparelhos – ganhe ao menos o benefício de deixar o eleitor em dúvida. PT de novo? Será que não vale a pena mudar?

    Se a eleição de 2014 for acirrada - como imagino que será – Dilma vai enfim perceber o erro que foi ter-se afastado das bases e das bandeiras históricas de Lula e do PT. Sacar na última hora o discurso de que “tucano é privatista” pode não colar – tantos anos depois de FHC ter saído do poder.

    A oposição conseguiu fatiar PT, Dilma e Lula. Eles conseguirão se reagrupar - no imaginário popular – em 2014? Tempo para isso existe, de sobra. Mas o lulismo precisa sair da defensiva. Trocar “gerenciamento” por política.

    Os tucanos querem Aécio para ganhar, apostando num “pós-Lula”. Mas não existe “pós-Lula”. O que está em curso é uma tentativa de derrotar o lulismo. No presente e na história. A ideia é afogar Lula e o PT num “mar de lama” tão intenso quanto aquele que levou Vargas ao suicídio em 1954 . Dilma acha mesmo que pode sair “limpinha” dessa batalha? Não vai funcionar…
     
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