Para o Brasil, a grande lição do processo do mensalão é a de que o STF está pronto a cumprir uma de suas funções na democracia brasileira e condenar à prisão mesmo corruptos de mais alto escalão. Mas esse julgamento é oportunidade única de aprendizado também para os ministros.
O primeiro e mais importante legado é sobre limites. Mais do que em qualquer outro processo, o STF percebeu até onde deve ir. E onde precisa parar. É certo agora que as instituições continuam firmes mesmo quando os ministros punem aqueles que atentaram contra os bens públicos e a democracia. Ao proteger a união homossexual e as cotas raciais, o STF enfrentou resistência por julgar temas poderosos. Mas agora julgou pessoas poderosas do Legislativo e do Executivo - e não houve instabilidade institucional.
A decisão pela cassação de mandato parlamentar mostrou também a linha que o STF não deve cruzar. É certo que, depois de esgotados os recursos, a Câmara de Deputados cassará rapidamente os três condenados. Mas os ministros precisavam deixar que o Parlamento assumisse a responsabilidade. O STF não pode tomar para si a missão de resolver todos os problemas. Isso, a sociedade não exige e a democracia não permite.
Decidiu bem, portanto, o ministro Joaquim Barbosa ao negar a prisão imediata dos réus, mesmo que constitucionalmente pudesse fazê-lo. Se desafiar repetidamente o Congresso, o STF deixará o Legislativo acuado. As cogitações absurdas de asilar deputados na Câmara e votar mais de 3.000 vetos presidenciais em uma sessão são prova recente da imprevisibilidade de uma instituição que se sente ameaçada.
A outra lição é também valiosa: mais que em qualquer época anterior, o STF está em evidência. Isso significa nível muito maior de transparência, pois as pessoas sabem quem os ministros são, querem informar-se sobre as decisões, querem saber como os ministros chegam ao STF. Mais visibilidade significa mais responsabilidade. O Supremo ganhou a merecida atenção do povo brasileiro.
Ivar A. Hartmann é pesquisador da FGV Direito, Rio
Fonte: O Globo