Favorito para emplacar 4ª vitória presidencial em 2014, partido teve imagem abalada pelo escândalo do mensalão
Petistas aderiram aos métodos tradicionais da política brasileira e fragmentaram divisão do poder com mais siglas
Fernando Rodrigues
BRASÍLIA - O PT completa dez anos no poder exibindo músculos na política, mas com um forte abalo em uma de suas principais bandeiras antes de chegar ao poder, a ética.
Favorito hoje para emplacar a quarta vitória presidencial seguida em 2014 -tanto Dilma Rousseff quanto Luiz Inácio Lula da Silva lideram com folga as pesquisas de intenção de voto-, a sigla tenta superar o desgaste causado pelo mensalão, maior escândalo da era Lula (2003-10).
Quando o PT chegou ao poder federal com Lula em janeiro de 2003, aderiu com rapidez aos métodos tradicionais da política brasileira.
O partido e seus aliados aparelharam o Estado e abriram espaço para a fisiologia no Congresso.
Não há inovação nessas práticas. O PT apenas emulou, ao seu jeito, o que outros faziam. E usa muitas vezes essa explicação para justificar o que pratica. Foi o caso de Lula à época em que eclodiu o mensalão, em 2005.
"O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente", declarou à época. E mais: "Não é por causa do erro de um dirigente ou outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção".
Essas explicações do então presidente da República e líder máximo do PT serviram de salvo-conduto para tudo o que o partido fez e viria a fazer no exercício do poder.
Mas existem nuanças em relação ao comportamento de outros grupos políticos anteriores. A comparação mais evidente é com o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Tanto FHC como Lula se abriram à política miúda da fisiologia no Congresso. Mas com engenharias distintas.
Nos seus oito anos no comando do Brasil, FHC preferiu construir bancadas governistas menos fragmentadas -com número reduzido de siglas. Concentrou a adesão de deputados nas legendas-âncora de sua administração, PSDB e PFL (hoje DEM).
Já Lula decidiu repelir alianças com alguns partidos maiores, como o PMDB. Optou por horizontalizar sua base, com partidos médios e pequenos. Mas aí teve de cooptar mais agremiações.
O resultado foi simples. Enquanto nos anos FHC a centralização política foi quase total, sob Lula uma miríade de interesses se espalhou, tornando a gestão da fisiologia -demandas paroquiais, legítimas ou não- dos políticos às vezes incontrolável.
Os números das bancadas no Congresso no início de cada mandato são ilustrativos. Quando FHC tomou posse, em 1995, tinha o apoio formal de 387 deputados -dos quais 258 estavam abrigados em apenas três legendas: PSDB, PFL e PMDB.
Já Lula ao assumir, em 2003, tinha uma bancada governista de 336 deputados na Câmara. Ocorre que os três principais partidos lulistas (PT, PL e PSB) somavam apenas 153 deputados.
O passo seguinte na governança política petista foi fatiar os cargos públicos entre os diversos partidos aliados.
O número de ministérios teve de crescer. Eram 27 quando FHC assumiu. Hoje são 38.
Uma base política mais fragmentada é menos controlável. Isso explica por que durante FHC o Congresso teve mais CPIs e nenhuma abalou o governo como o mensalão dos anos Lula.
O tucano conviveu com 54 CPIs, mas teve comando total em todas. Lula enfrentou 42 investigações e perdeu o controle durante a mais relevante, a do mensalão.
FHC também foi hábil ao evitar a abertura de CPIs que poderiam escapar do comando. Um caso relevante ocorreu em 1997, quando o tucano abafou uma investigação sobre a compra de votos a favor da emenda da reeleição.
À época, os deputados envolvidos foram forçados a renunciar aos mandatos. E nove dias depois de o caso eclodir, o PMDB, vital na operação dos interesses políticos tucanos no Congresso, impôs a nomeação de dois ministros.
Lula nunca conseguiu impedir a investigação do mensalão. Não que não tivesse tentado. Mas a política de fragmentação partidária não dava ao petista essa margem. De maneira inadvertida, o petismo e o lulismo ajudaram o Brasil a conhecer um pouco mais como se opera a política no país.
Fonte: Folha de S. Paulo