O juiz Alderico Rocha Santos, responsável pelos processos da Operação Monte Carlo na Justiça Federal em Goiânia, critica o desembargador Fernando Tourinho Neto, do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF-1), devido à atuação no processo que envolve o contraventor Carlinhos Cachoeira. Por ofício, Santos diz que Tourinho "tem imposto constrangimento e elevada carga de estresse aos juízes que atuaram no processo".
O juiz da Operação Monte Carlo, Alderico Rocha Santos, enviou um ofício de três folhas com críticas ao desembargador Tourinho Neto, responsável pelo caso no Tribunal Regional Federal, em Brasília. Santos diz no documento que Tourinho "tem imposto constrangimentos e elevada carga de estresse" a ele e a outros dois magistrados que atuam no processo onde figuram Carlinhos Cachoeira e outros réus. O juiz também acusou o desembargador de beneficiar o bicheiro com fases processuais que não estão previstas na lei.
O texto é uma resposta da 11ª Vara da Justiça Federal de Goiás a uma reclamação protocolada no TRF pelo laboratório farmacêutico Vitapan, que tem como sócios Andréa Aprígio de Souza e Adriano Aprígio de Souza, respectivamente ex-mulher e ex-cunhado de Cachoeira. A empresa alegou que o juiz teria desrespeitado uma decisão do TRF sobre o bloqueio de suas contas bancárias. Diante da reclamação, Tourinho teria enviado a Alderico um pedido de explicações.
O desembargador, por diversas vezes, mandou soltar Cachoeira, sem sucesso. O contraventor deixou a Penitenciária da Papuda na última terça, graças a um alvará de soltura. "Este juiz não cassou ou sequer afrontou a decisão da 2ª Seção desse tribunal. (...) A decisão deste juiz, ora recorrida, fundou-se em novos elementos de provas colhidos no bojo de inquéritos policiais instaurados para apurar crimes de lavagem de dinheiro por parte dos sócios e 'laranjas' da empresa Vitapan", afirmou Santos no ofício. "A propósito, causam estranheza os termos censórios utilizados por esse doutor relator, tanto em relação a este juiz quanto aos demais colegas que atuaram no processo, Paulo Augusto Moreira Lima e Daniel Guerra Alves, do tipo "o juiz está na iminência de pular o corguinho" (...), tendo em vista que se tratam de valorosos juízes, honestos, éticos e que não possuem qualquer interessa na causa ou de descumprir ordem de Instância Superior."
Santos colocou ainda que nem os advogados, que geralmente agem por pressão de seus constituintes ou imbuídos de paixão pela causa, usam termos "grosseiros" como os utilizados pelo desembargador. Segundo o juiz, as palavras usadas passam a ideia falsa aos demais membros da Corte de Justiça de que os juízes de primeira instância estariam "apaixonados pela causa". "Não é verdade, pois são magistrados, profissionais e corajosos, talvez não tão quanto Vossa Excelência, por ter a coragem de ser o mesmo magistrado a suspender um processo e depois reconhecer o excesso de prazo", criticou, se referindo a liminar concedida por Tourinho que suspendeu o processo contra Cachoeira.
Por fim, o juiz disse que enviou cópia do ofício para o Ministério Público Federal a fim de ser investigada a prática de improbidade administrativa. "Quer seja por parte deste magistrado ou do doutor relator (Tourinho)."
Carlinhos Cachoeira
Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.
Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram diversos contatos entre Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (GO), então líder do DEM no Senado. Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais, confirmou amizade com o bicheiro, mas negou conhecimento e envolvimento nos negócios ilegais de Cachoeira. As denúncias levaram o Psol a representar contra Demóstenes no Conselho de Ética e o DEM a abrir processo para expulsar o senador. O goiano se antecipou e pediu desfiliação da legenda.
Com o vazamento de informações do inquérito, as denúncias começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas, o que culminou na abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira. O colegiado ouviu os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás, que negaram envolvimento com o grupo do bicheiro.
O governador Sérgio Cabral (PMDB), do Rio de Janeiro, escapou de ser convocado. Ele é amigo do empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta, apontada como parte do esquema de Cachoeira e maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos.
Demóstenes passou por processo de cassação por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Casa. Em 11 de julho, o plenário do Senado aprovou, por 56 votos a favor, 19 contra e cinco abstenções, a perda de mandato do goiano. Ele foi o segundo senador cassado pelo voto dos colegas na história do Senado.