Relator do mensalão assumirá a cadeira que era de Carlos Ayres Britto
Joaquim Barbosa, como presidente do STF e relator do Mensalão - Lula Marques/Folhapress
Apesar de carregar a fama de ser severo e áspero, pouco afeito a contemporizações, Barbosa toma posse com o desafio de pacificar os ânimos que ele mesmo não fez questão de apaziguar nos últimos tempos. Também chega ao posto em um momento em que passou a ser reconhecido nas ruas pela exemplar condução da ação penal do mensalão, o maior esquema de corrupção já montado em um governo brasileiro. Pelas mãos de Barbosa, mensaleiros que comandavam o esquema, entre eles o ex-ministro José Dirceu, foram condenados e deverão cumprir pena na cadeia.
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Com a experiência de quem já presidiu o STF, o ministro aposentado Carlos Velloso explica: “A importância dessa função é muito alta. Por isso, eu acredito que o seu peso impede qualquer excesso. Penso que esses debates acalorados, vistos no mensalão, não existirão”. “O chefe tem de marcar presença pelo exemplo de boas atitudes, tem de ser moderado. Por isso eu digo que o Joaquim será um presidente normal. Não há nada a temer”, avalia Velloso.
Voz assídua na mediação dos embates entre Barbosa e o revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski, o ministro Marco Aurélio Mello afirma que, por não haver hierarquia os ministros, o novo presidente do tribunal estará apenas “conduzindo iguais”. “Não dá para se pretender, apenas pelo fato de se estar na presidência, enfiar goela abaixo. Ele coordena iguais, não subordinados”, opina. Além disso, o ministro argumenta que quem assume o papel de coordenador deve ter uma grande capacidade de aceitação da voz contrária, principalmente quando se trata da diversidade na interpretação de processos. “Ele, às vezes, se mostra inconformado quando se diverge da posição que ele veicula, mas a dissidência no colegiado é a tônica. Que ele se mire na condução dos trabalhos feitos pelo Ayres Britto em termos de entendimento e na busca pelo melhor”.
Milagres e celeridade - Criado há 204 anos, o Supremo Tribunal Federal é visto pelo ex-ministro Carlos Velloso como uma casa com costumes já definidos. Por isso, nem a força de vontade ou o estilo duro de Barbosa seriam suficientes para causar uma grande transformação. “Não será uma gestão tão diferente porque os costumes e os modos de tratamento foram consolidados ao longo desses anos. Nem os milagreiros acreditam em milagre. A esperança é apenas que as coisas melhorem”, pondera.
Apesar de o comportamento de Barbosa ser uma incógnita, embora reservadamente ele próprio já tenha começado a conversar com os demais ministros, o que se aposta é na agilidade do presidente na resolução dos processos. Na opinião de Carlos Velloso, o maior problema atual da Suprema Corte está justamente na demora do julgamento dos processos, além da quantidade de recursos que chegam ao tribunal. O presidente terá ainda de saber lidar com a pressão por aumento de salário dos magistrados e mediar as discussões sobre a quem cabe aplicar a cassação dos mandatos dos réus do mensalão, se ao STF ou à Câmara dos Deputados, Casa de origem dos mensaleiros condenados.
CNJ - Se o Supremo exige um presidente com tratamento igualitário entre o colegiado, à frente do Conselho Nacional de Justiça, onde também assumirá a chefia, espera-se que Barbosa dê continuidade aos processos contra magistrados corruptos e atue para coibir a atuação de filhos de juízes como advogados em tribunais. “Tudo indica que o combate à corrupção entre magistrados será um dos focos e que ele será bastante rigoroso. O presidente do Supremo tem poder de interferência e prerrogativa maiores. Dando o tom à pauta do CNJ, imagino que vá ter maior rigor em relação a desvios e disciplinares”, acredita o advogado criminal Pierpaolo Bottini.
Social - Com a função de elaborar a agenda de julgamentos no plenário do tribunal, a trajetória de Joaquim Barbosa pode indicar quais pautas terão prioridade em sua gestão. Na opinião do advogado Luís Roberto Barroso, temas mais delicados e de cunho social, como a proteção dos direitos dos índios e as pesquisas em células tronco, devem ganhar maior destaque nos julgamentos do tribunal.