Dirceu, Genoino e outros oito podem requerer novo julgamento

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  • terça-feira, 23 de outubro de 2012
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  • A pequena margem que garantiu a condenação de dez réus por 6 a 4 foi alcançada com votos duros, que escancararam o caráter político do julgamento do “mensalão”. O ministro Marco Aurélio Mello (foto) chegou ao limite de reler seu discurso de posse na presidência do TSE, em 2006, no auge do escândalo que envolveu o PT. “Ao usar a voz da urna, o povo brasileiro certamente ouvirá o eco vitorioso da cidadania, da verdade”, recomendou. Nesta terça-feira (22) os ministros decidirão o que fazer com os empates.

    Najla Passos e Vinicius Mansur

    Após sete anos de forte campanha midiática, os réus do “mensalão” denunciados por crime de formação de quadrilha, incluindo a cúpula do PT, foram condenados com pequena margem: 6 votos a 4. Com isso, eles podem ingressar com embargos infringentes, medida prevista no artigo 333 do regimento interno do Supremo Tribunal Federal (STF) que, se acatada, assegura novo julgamento aos réus condenados com pelo menos quatro votos divergentes. 

    A sessão desta segunda (22) deu continuidade à análise do capítulo 2 do processo, iniciada na semana passada, com a condenação de 11 dos 13 réus pelo relator, Joaquim Barbosa, e a absolvição de todos eles pelo revisor, Ricardo Lewandowski. A pequena margem que garantiu a condenação foi conseguida com votos duros, que escancararam o teor político do julgamento, com vistas a influir no resultado das urnas do próximo domingo (28). 

    O mais impressionante deles foi o do ministro Marcos Aurélio Mello, que releu seu discurso de posse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2006, no auge do escândalo do “mensalão”. 
    O ministro revelou que, à época, pediu que o então presidente Lula não comparecesse ao evento porque precisava “dar um recado” sobre os “tempos muito estranhos envolvendo a vida pública”, que levaram o país não só a “uma crise de valores, senão um fosso moral e ético que parece dividir o país em dois segmentos estanques: o da corrupção, seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma ilimitada e duradoura, e de uma grande massa comandada que, apesar do mau exemplo, esforçasse para sobreviver e progredir. Não passa dia sem depararmos com manchete de escândalos”.

    Para combater a corrupção, o discurso relido de Marco Aurélio evocou “o poder revolucionário do voto com o qual, eleição após eleição, estamos os brasileiros a nos aperfeiçoar”, disse que “ao usar a voz da urna, o povo brasileiro certamente ouvirá o eco vitorioso da cidadania, da verdade” e que impunha-se ao eleitor “a conscientização, a análise do perfil, da vida pregressa daqueles que se apresentem [candidatos]”, pois “somente dessa forma o eleitor responderá às exigências do momento, ficando credenciado, em passo seguinte, eleitor, à cobrança”.

    Em seu voto, o magistrado condenou 11 dos 13 acusados e ironizou: “Mostraram-se os integrantes em número de 13. É sintomático o número. Mostraram-se afinados (...). Pareciam a máfia italiana”. Marco Aurélio absolveu os ex-diretores do Banco Rural, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório.

    Com o revisor

    Três ministros seguiram o revisor, Ricardo Lewandowiski, e absolveram todos os 13 réus denunciados por formação de quadrilha. Primeira a votar nesta tarde, a ministra Rosa Weber manteve posição já destacada em votos anteriores, de que a tipificação da quadrilha exige que ela seja formada para a prática de crimes e que pressuponha alarma e perturbação da ordem social. “Quadrilha é a estrutura que causa perigo por si mesma, o que nada tem a ver com concurso de agentes”, justificou.

    A ministra alegou também que a tipificação do crime de quadrilha exige a pré associação dos agentes para a confecção de crimes variados. “Só existe quadrilha na acepção legal quando os agentes visam a uma quantidade indeterminada de delitos”, acrescentou. Rosa se amparou em decisão do Tribunal de Justiça da Alemanha sobre crime equivalente naquele país. “Não identifico em qualquer hipótese, à luz dos fatos descritos nos autos, o dolo de criar ou participar de uma organização autônoma com vistas à prática de crimes indiscriminada”, sintetizou. 

    O ministro Joaquim Barbosa interveio. Descartou os argumentos jurídicos e optou pelo discurso emocional do suposto tratamento diferenciado entre crimes de pobres e ricos. “Eu estou com a impressão de que nós estamos caminhando para algo que eu denominaria uma exclusão sociológica de crimes de formação de quadrilha. A ideia que começo a perceber é que só praticariam o crime de formação de quadrilha as pessoas que praticam latrocínio, sequestro, roubo... os chamados crimes de sangue”, criticou.

    Ele lembrou que, no decorrer desta ação, a corte condenou várias pessoas que cometeram crimes contra a administração pública. “Compra de parlamentares não pode ser cometida sem que haja concerto entre pessoas, porque dinheiro não dá em árvores. É preciso que haja crime de sangue para que a paz seja abalada? Não basta este crime de pecuniarização da vida política?”, questionou.

    A ministra Carmem Lúcia pediu para antecipar seu voto e contra-argumentou. Segundo ela, outras decisões da corte comprovam que é possível condenar por formação de quadrilha os praticantes de crime de colarinho branco, desde que a tipicidade seja comprovada, o que ela não acreditava ser o caso deste julgamento. Para a ministra, a ação em pauta trata de pessoas que chegaram a cargo de poder ou que faziam parte de empresas de maneira legítima, e ali naqueles cargos praticaram um ilícito penal. Portanto, têm que responder pelos crimes que praticaram, e não serem tratadas como se tivessem chegado ao poder apenas para cometê-los. 

    Em um voto relâmpago, o ministro Dias Toffoli apenas informou que acompanharia o revisor.

    Com o relator

    O ministro Luiz Fux seguiu integralmente o relator. Conforme ele, “restou incontroverso neste plenário que três núcleos se uniram em torno de um projeto delinquencial comum”. Para justificar a opção por quadrilha e não coautoria, se amparou no tempo em que os crimes foram praticados e em um entendimento abstrato do conceito de paz pública. “Essa quadrilha atuou por quase três anos e só acabou em função de um escândalo. Não é normal na doutrina coautoria por tanto tempo”, argumentou.

    O ministro Gilmar Mendes também entendeu que houve formação de quadrilha. Com base em acórdão de autoria do colega Celso de Mello, defendeu que, para formação de quadrilha, é necessário concurso de pelo menos quatro pessoas, com o objetivo de prática criminosa, de forma estável e permanente. “O crime de quadrilha não se confunde com concurso, que é eventual e temporário”, justificou. 

    Mendes ainda ressaltou que os dirigentes do PT tinham um projeto de poder que combinava dois fatores: expansão do partido e formação da base aliada. E que não se furtou a usar de meios ilícitos para concretizá-lo. “Não se pode cogitar o normal da ordem publica e social quando se tem um partido político cooptando parlamentares”.

    Já o decano, Celso de Mello, começou seu voto dizendo que, em mais de 44 anos de atuação na área jurídica, nunca viu o delito de quadrilha “tão nitidamente caracterizado”. E chegou a compará-lo aos crimes cometidos pelo tráfico de drogas, que mitiga o Rio de Janeiro, ou ao PCC, que atemoriza São Paulo. Para rebater argumentos do revisor, Mello afirmou que os integrantes de uma quadrilha não precisam viver necessariamente das atividades dela e que esta ação criminosa em grupo afetou a paz pública ao se instalar “no núcleo mais íntimo e elevado de um dos poderes da República”. 

    Em um voto carregado de adjetivos, Mello afirmou que “a essa sociedade de deliquentes, o direito penal brasileiro dá um nome: o de quadrilha ou bando”. Pouco depois, destacou que o STF não está criminalizando a política: “Estamos a condenar não atores políticos, mas protagonistas de sórdidas tramas criminosas”.

    O presidente Ayres Britto seguiu a mesma linha do decano. Defendeu a existência da quadrilha e destacou que “o que estamos julgando é um modo espúrio, delituoso de fazer política”.

    Resultados

    Ao final, foram condenados por 6 votos a 4 o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, o ex-presidente do PT, José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delubio Soares, o publicitário Marcos Valério, os ex-sócios dele Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, o advogado Rogério Tolentino, a ex-diretora das agências de Valério, Simone Vasconcelos, e os ex-dirigentes do Banco Rural: Kátia Rabello e José Roberto Salgado.

    A ex-funcionária do Banco Rural, Ayanna Tenório, foi inocentada por unanimidade. Já a ex-funcionária de Valério, Geiza Dias, foi absolvida, mas só não contou com o voto de Marco Aurélio. O ministro também inocentou o ex-diretor do Banco Rural, Vinicius Samarane, provocando o sétimo caso de empate no julgamento. Nesta terça-feira (22) os ministros decidirão o que fazer com os empates, mas as manifestações até o momento indicam que os réus serão favorecidos neste caso.
     
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