Desafiando o câncer, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, oficializou nesta segunda-feira sua candidatura à reeleição, defendendo que sua vitória será a garantia de "futuro" e "independência" para a Venezuela, contra a candidatura do "imperialismo" encabeçada, segundo ele, pela oposição.
Chávez disse que a "batalha" nas urnas tem como centro de disputa o controle da indústria petrolífera, cujo domínio, a seu ver, poderia cair sob controle do governo norte-americano, caso a oposição saísse vitoriosa.
O presidente deixou a sede do governo, em Caracas, em um caminhão aberto, vestido com a tradicional boina vermelha e uma jaqueta com as cores da bandeira venezuelana. A caravana foi cercada por uma multidão de simpatizantes até a sede do Conselho Nacional Eleitoral (CNE).
Ao entregar seu programa de governo para os anos 2013-2019, Chávez se comprometeu a reconhecer o resultado das eleições de 7 de outubro "seja qual for".
A coalizão opositora, até agora, tem hesitado em dar credibilidade ao árbitro eleitoral e ainda não declarou se reconhecerá ou não o resultado das urnas.
"Que bom que reconheçam o CNE no lugar de incursionar no caminho do golpismo. Tomara que respeitem as regras do jogo democrático, as instituições", disse Chávez, ao ameaçar que, caso a oposição se "aventure" em atos de violência, a resposta do governo seria "aprofundar a revolução".
Doença
Denominado por sua campanha como o "candidato da pátria", Chávez cantou, dançou e discursou durante quase três horas. Em uma candidatura cercada por impressões e rumores sobre o estado físico e de saúde do presidente, sua apresentação foi uma demonstração de força diante da enfermidade contra a qual luta há um ano.
"Um ano depois estou frente a vocês, inscrevendo a candidatura", disse. "Vivemos de milagre em milagre, e estou convencido que, com a ajuda de Deus, continuaremos vivendo e vencendo."
Esta é a primeira vez que Chávez participa de um grande ato público desde fevereiro, quando anunciou a reincidência do câncer, com a aparição de um novo tumor.
Sua a inscrição à reeleição minimiza rumores sobre uma piora em seu estado de saúde, cuja extensão e gravidade são tratadas em absoluto segredo pela cúpula do governo e totalmente desconhecidas pela população.
"Me sinto muito bem", declarou Chávez, no sábado, em breve conversa com jornalistas na sede do governo.
O presidente disse ter feito exames de controle e que os resultado sairam "absolutamente bem".
Chávez foi submetido a uma terceira cirurgia, em fevereiro, em Havana, para retirada de uma nova lesão cancerígena, que aparecera na mesma região onde, no ano passado, foi retirado um tumor. Depois disso, foi submetido a cinco ciclos de radioterapia para conter o avanço da doença.
Antes da reincidência do câncer, no entanto, o líder venezuelano havia anunciado estar curado.
Campanha
Apesar de sua ausência, marcada por mais de cem dias fora do país no último ano - entre cirurgias e tratamento com radio e quimoterapia -, Chávez aparece nas pesquisas como favorito para vencer o pleito de outubro.
Recentes pesquisas realizadas por diferentes consultorias revelam que o índice de intenção de votos a favor da reeleição do presidente flutua entre 17 e 20 pontos.
Apenas uma empresa afirma que a margem a favor de Chávez é de apenas cinco pontos, indicando que a disputa contra o candidato opositor Henrique Capriles Radonski seria apertada.
Apesar do favoritismo, os desafios do presidente não são poucos, e o principal não depende exclusivamente de sua vontade: terá de convencer os venezuelanos que terá saúde para se manter na campanha e que poderá governar nos próximos seis anos.
"(Francois) Miterrand, (Fernando) Lugo e outros governantes demonstraram que é possível governar com um câncer", afirmou à BBC Brasil o analista político Modesto Guerrero. "O que não se pode é governar da mesma maneira que antes", acrescentou.
Caso a saúde de Chávez se debilite até a data das eleições, o partido governista PSUV teria até 10 dias antes do pleito para lançar um candidato substituto. Fontes do governo afirmaram à BBC Brasil que este cenário, no entanto, não está contemplado.
'Dilema'
Para o analista político Modesto Emílio Guerrero, o "dilema" venezuelano não será a curto, e sim a médio prazo, a partir do mandato 2013-2019.
Se for reeleito e o câncer não o deixar governar, Chávez teria de convocar novas eleições, caso a ruptura ocorresse antes da metade do mandato. Esse cenário obrigaria uma transição no chavismo e, ao mesmo tempo, renovaria as esperanças da oposição de retomar o poder.
Entre outras mudanças previstas para os próximos três meses está o estilo da campanha. Acostumado nos 14 processos eleitorais anteriores a percorrer todo o país em caravanas, nas quais discursava durante horas, agora Chávez tende a assumir uma campanha de "baixo perfil", com poucas viagens e breves atos públicos.
Outro desafio será reanimar os chavistas descontentes com a atual administração e atrair o setor abstencionista, que gira em torno de 20% do eleitorado.
"Chávez terá que apresentar uma melhor gestão nesses três meses, de apresentar projetos e programas que renove a esperança das pessoas por um futuro melhor", afirmou à BBC Brasil Oscar Schemel, da consultoria Hinterlaces.
Entre as dívidas do governo Chávez, analistas apontam a insegurança e a inflação como as principais.