Obama, o Brasil e o mundo

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  • domingo, 20 de março de 2011
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  •  Como escreveu meu amigo Luiz Mir num post que trocamos pelo Facebook, precisamos deglutir com vagar a visita de Barack Obama ao Brasil.
    Mir observa com acerto que “o mais relevante dessa visita é que ao certificar publicamente a liderança do Brasil na parte sul do continente, Obama nos sobrecarrega de preocupações e custos -- quando o império elege, ele cobra”. É por aí mesmo. O Brasil se tornou um player importante, reconhecido e destinado a pesar cada vez mais no contexto internacional. Sairá de uma posição tutelada, e nessa medida, protegida e “sem responsabilidade”, para outra, impregnada de compromissos e exigências. A primeira consequência disso afeta a diplomacia, que terá de ser ainda mais qualificada. Estamos bem servidos nessa área. Outra consequência afeta a política interna: políticos, técnicos e governantes terão de levar mais a sério a política externa, rompendo definitivamente com a tradição de ignorar o que se passa além-fronteiras. Levar a sério significa, claro, estudar mais, pensar mais, ter maior competência intelectual para compreender a estrutura do mundo.
    A viagem de Obama é importante pelo que representa em termos de reconhecimento do protagonismo brasileiro e de aceitação, pelos EUA, da realidade multilateral do mundo. Num de seus discursos na recepção a Obama, a presidente Dilma Roussef tocou no ponto: “Aqui não nos move o interesse menor da ocupação burocrática de espaços de representação. O que nos mobiliza é a certeza de que um mundo mais multilateral produzirá benefícios para a paz e a harmonia entre os povos”.
    A viagem de Obama ao Brasil não trará grandes novidades em termos efetivos ou no curtíssimo prazo, mas deverá demarcar nova etapa nas relações entre os dois países e deles com os demais. Esse o tom, creio, do excelente artigo do professor Tullo Vigevani no Estadão: “A relação dos EUA com o Brasil tem essencialmente a ver com o novo que há no mundo contemporâneo”, escreveu (http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110320/not_imp694529,0.php). O que significa considerar um lote de questões e interesses complicados, no plano comercial e no estratégico geral. A China, que muitos acham ser a parceira preferencial do Brasil em diversos terrenos, é a bola da vez.  Mas a China, vista como o gigante que se projeta, pode não ser tão sustentável assim (seu “capitalismo comunista” é uma incógnita a toda prova) e há outros gigantes por aí. O capitalismo não corre perigos, embora seja a cada dia mais deletério e nefasto, e ao se reproduzir impõe regras de conduta e de relacionamento não propriamente favoráveis a um mundo melhor.
    É impressionante a quantidade de bobagens que foram ditas, escritas e praticadas sobre a visita de Obama. Maria da Conceição Tavares detonou o cara dizendo que ele virou escravo do "bordel conservador". Outros, num acesso de furor antiimperialista, viram a visita como indício de que novos grilhões estão sendo ativados. Há os que escracham o estilo "soft power" de Obama sem saber do que se trata e os que atiram molotovs para protestar contra a situação líbia.
    Isso prova que ainda patinamos no entendimento da nova estrutura do mundo. Prova, também, que a dialética social existe. Ao mesmo tempo em que Obama visita o Brasil no melhor estilo soft power, os EUA ajudam uma “coligação árabe-ocidental” a descarregar bombas e torpedos em Kadafi, ameaçando abrir uma frente de batalha na Líbia na velha linha do "big stick". São incoerências e paradoxos de um país imperial e de um mundo que, salvo melhor juízo, não comporta posturas muito “racionais” e exige, por isso mesmo, para ser compreendido, procedimentos intelectuais renovados e arejados.
    Fernando Gabeira escreveu dias atrás no Estadão: "O século nos empurra para uma diplomacia preventiva. Qualquer passo nessa direção será bem-vindo, como bem-vindo é Obama". Teve gente que não gostou, achando que a frase faz excessivas concessões à diplomacia norte-americana. Da minha parte, digo que frases são frases e que essa permite que se preste atenção num traço que parece ter condições de se fixar no mundo contemporâneo. Pode-se chamar isso de soft power e dizer que Obama o encarna como poucos. Ou empregar outros valores e categorias. O que não dá é prá achar que as coisas continuam as mesmas como dantes e que Obama nada mais é que um Bush jovial e simpático.
     
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