O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, retornou secretamente ao país e se refugiou na embaixada brasileira. Na noite de segunda-feira, Zelaya conclamou seus simpatizantes a realizar uma marcha rumo à capital, Tegucigalpa. O governo de fato decretou toque de recolher.
Militares e policiais de Honduras cercaram a embaixada brasileira em Tegucigalpa (capital do país) na madrugada desta terça-feira, dispersando a manifestação de apoiadores do presidente deposto, Manuel Zelaya, que passaram toda a noite em frente ao prédio da representação brasileira.
O porta-voz Orlin Cerrato disse que os zelaystas foram retirados "em cumprimento da lei", depois que o atual presidente Roberto Micheletti impôs toque de recolher e exigiu que o Brasil entregue Zelaya - que está refugiado desde que voltou em segredo ao país depois de quase três meses de exílio .
A embaixada também teve a eletricidade, a água e o telefone cortados, o que levou o Brasil a solicitar apoio da embaixada dos Estados Unidos para que, em caso de necessidade, emprestem diesel para o gerador e enviem agentes para garantir a segurança.
A polícia de Honduras, porém, negou que pretenda entrar na embaixada para capturar o presidente deposto. "Isso não pode ser feito, porque estamos falando de convenções internacionais, e é preciso respeitar as leis internacionais", disse Cerrato à agência France-Presse.
Zelaya fala em paz - Manuel Zelaya declarou nesta terça-feira que conversou com alguns policiais e militares para buscar uma saída para a crise institucional e afirmou que o atual presidente tenta "isolar" o país para impedir a entrada de missões internacionais.
"Eu acho que precisamos buscar uma aproximação direta para que esta aproximação leve à paz. Lutar pelos pobres nunca deve ser um crime, lutar para restabelecer a democracia não deve ser um crime", declarou ele, que foi derrotado e expulso de Honduras após o golpe de Estado de 28 de junho.
Zelaya afirmou que o atual presidente, Roberto Micheletti, impôs o toque de recolher e fechou os aeroportos para impedir a chegada de missões internacionais em busca de uma saída negociada para a crise. "Estão cuidando da circulação de aviões e nos aeroportos internacionais para evitar que venham as missões internacionais", disse.
Lula pede solução - Em Nova York, onde participa da Assembleia Geral da ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu aos governantes de Honduras que aceitem uma solução negociada e democrática que permita o retorno de Manuel Zelaya ao poder.
"O que deveria acontecer normalmente é que os golpistas deveriam dar espaço a quem tem o direito de estar neste lugar, que é o presidente democraticamente eleito pelo povo", afirmou Lula, em entrevista coletiva, pedindo, ainda, que seja respeitada a "imunidade da embaixada brasileira".
O presidente disse que conversou por telefone com Zelaya e pediu que ele "tivesse muito cuidado de não dar pretexto algum aos golpistas para recorrer à violência". Lula esclareceu que o Brasil não pretende atuar como mediador na crise, papel que corresponde à Organização de Estados Americanos (OEA), cujo secretário-geral, José Miguel Insulza, está em permanente contato com o chanceler brasileiro, Celso Amorim.
Segundo Lula, a comunidade internacional já não pode tolerar a presença de um governo golpista na América Latina. "Não estamos mais nos problemas da década de 60 e não podemos aceitar que, por divergências políticas, alguém se ache no direito de dispor de um presidente democraticamente eleito".
Negociação - Insulza, por sua vez, afirmou que a única medida que cabe ao país é a negociação com o governo de Roberto Micheletti. "Não cabem muitas alternativas a não ser entrar em negociação", declarou em entrevista em Washington à rádio Cooperativa de Santiago.
Ele afirmou ainda que a OEA apoia a medida de Zelaya de ter se refugiado na embaixada do Brasil em Tegucigalpa. "Com certeza, apoiamos esta decisão e pedimos tanto para a sede brasileira como para o senhor Zelaya todas as garantias que correspondem", completou.
"O que deveria acontecer agora é os golpistas darem um lugar a quem tem direito a este lugar, que é o presidente democraticamente eleito pelo povo", disse nesta tarde o presidente Lula. Se fosse apenas um conselho ao governo interino de Honduras, já bastaria para caracterizar a ingerência em questões internas de outro país. Mas o tom e o vocabulário configuram um ultimato: ou Manuel Zelaya volta ao poder ou...
Ou nada, avisam os fatos. Os "golpistas" cortaram o fornecimento de luz, água e telefone. É pouco para que o Brasil declare guerra a Honduras. É o suficiente para isolar Zelaya e fazer o Itamaraty constatar que se meteu numa enrascada de bom tamanho por falta de juízo.