A censura da Secretaria Municipal de Educação do RJ a Theodor de Bry.

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  • quinta-feira, 11 de junho de 2009
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  • Esta semana, o jornal “O Dia”, do Rio de Janeiro, publicou denúncias de pais de alunos da Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro, que se declararam “horrorizados” com a presença da imagem do empalamento de um índio, em um livro didático do quarto ano do Ensino Fundamental – “Projeto Pitanguá — História”, da Editora Moderna – distribuído pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), do Ministério da Educação. A imagem em questão é uma gravura feita no século XVI pelo editor e gravador belga Theodor de Bry e mostra índios tupinambás aprisionando tribos inimigas. Pessoalmente, como historiador, considero absolutamente exageradas as reações dos pais, bem como as repercussões do episódio, visto que aquela imagem deve ser entendida dentro de um determinado contexto (afinal, é para isto que as crianças vão à escola!), já que representam o olhar de um europeu sobre sociedades absolutamente distintas de todas que eles conheciam até então. Além disto, ao ler o comentário de uma das mães entrevistadas (“Tomei um susto quando vi a gravura. Nunca tinha visto uma cena dessa. Na sala de aula, a figura agitou os estudantes, que já estavam comentando o fato antes mesmo de a matéria ser dada”), não pude deixar de pensar - com a experiência de quem, antes da carreira acadêmica, atuou como professor do Ensino Básico por alguns anos - que a agitação dos alunos se deu muito mais por uma leitura com conotações sexuais da imagem, do que por conta da violência retratada por ela. Afinal, em quaisquer desenhos animados japoneses - que passam livremente na programação matutina e vespertina de quase todos os canais de televisão aberto ou por assinatura - aparecem cenas tão ou mais violentas do que esta e, o que é pior, sem o “filtro” que o professor representa na escola, ao trabalhar com a leitura de imagens em suas turmas, visto que ele tem a preocupação de colocá-las em seu devido contexto. Mas, para além de toda esta discussão, o que me deixou, realmente, com uma enorme pulga atrás da orelha foram as declarações da Secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro, Cláudia Costin (ex-ministra de FHC e ex-secretária de estado de Alckmin, em São Paulo), transmitidas ontem à tarde, pela Rádio CBN. A secretária declarou que a prefeitura não tinha nenhuma responsabilidade sobre a escolha daquele livro didático, que os mesmo havia sido escolhido e enviado pelo MEC, que a secretaria o recolheria imediatamente, que ele seria substituído por um novo material (apostila) que já está em elaboração pela secretaria e, finalmente, que, em breve, a Rede Municipal de Ensino passaria a ter o seu material didático próprio. Ora, em primeiro lugar, causa-me muito estranhamento que alguém com o currículo da secretária ignore as regras para a escolha de livros do PNLD – que, aliás, foram elaboradas durante o governo a quem ela serviu tão bem – e afirme que esta escolha é responsabilidade do MEC, quando na verdade ela é feita da seguinte forma: 1- As editoras enviam os livros, sem nenhuma identificação, para o MEC; 2- O MEC os envia para uma Universidade Federal credenciada que formará uma comissão de professores para uma “avaliação cega” da obra; 3- Esta comissão atribui um conceito ao livro, justificando o por quê do mesmo; 4- Estes conceitos (e comentários) são publicados no guia que o MEC envia para as escolas para que os professores escolham as obras que preferirem; 5- Depois de feita a escolha, o MEC compra o livro junto às editoras e as envia para as escolas; desconhecer isto ou é má-fé ou é muita desinformação para alguém que ocupa tal cargo na segunda maior cidade do país. Em segundo lugar, me parece muita coincidência que tais denúncias levem a secretária a afirmar, imediatamente, que está em estudos a elaboração de um material didático próprio para a Rede Municipal. Levando em consideração os recentes acontecimentos envolvendo o material didático da Rede Estadual Paulista e as notórias ligações – repercutidas em vários blogs, em especial, no Cloaca News - do Secretário de Educação de São Paulo, Paulo Renato de Souza (de quem Cláudia Costin foi colega no ministério de FHC) com várias empresas do ramo de livros didáticos e de livros apostilados, fico pensando se não há algo no ar, além dos aviões de carreira. No momento em que os livros apostilados de São Paulo estão sendo alvo de inúmeras críticas, esta ridícula censura a uma obra-de-arte do século XVI e as declaradas intenções da secretária municipal do Rio de Janeiro parecem-me totalmente fora de contexto. Ou será que estão dentro?
     
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