“Favela não gosta de miséria”, diz MV Bill

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  • sábado, 18 de abril de 2009
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  • Em entrevista polêmica, MV Bill diz que quem gosta de miséria não é a favela, é intelectual, e descarta categoricamente uma candidatura para cargo eletivo. O rapper apóia a construção do muro para impedir o crescimento desordenado das favelas, mas reclama da ausência de diálogo com as comunidades envolvidas. 

    Faltando pouco mais de um ano para as eleições, o Rio de Janeiro já conta com um poderoso candidato para o pleito de 2010: o rapper MV Bill, que recentemente teve sua candidatura “lançada” por Caetano Veloso - e apoiada logo em seguida pelo cineasta Cacá Diegues.
    Legitimidade para tanto não falta: uma pesquisa do IBPS (Instituto Brasileiro de Pesquisa Social) realizada no mês de março mostra que 23% dos entrevistados (cerca de 1,8 milhão de eleitores) “provavelmente” ou “com certeza” votariam em Bill para deputado federal; caso se candidatasse ao Senado, contaria com o apoio de 19% da população (aproximadamente 1,4 milhão de votos).
    Apesar do entusiasmo inicial, Bill diz que hoje a política formal está fora de seus planos. No entanto, fosse ele um parlamentar eleito pelo Rio de Janeiro, daria seu apoio a uma controversa intervenção em curso na cidade: a construção de muros de contenção em favelas da capital fluminense. 
    A iniciativa deve construir quase 11 quilômetros de muros para conter a expansão de 19 comunidades, além de evitar a devastação de áreas de proteção ambiental. Cerca de R$ 40 milhões serão gastos na ação, bancada pela administração de Sérgio Cabral (PMDB-RJ). O governo estadual licitou seis quilômetros de muros ao redor da Rocinha e Chácara do Céu, na zona sul, e Pedra Branca, na zona oeste. 
    MV Bill discorda daqueles que consideram os muros um fator a mais de segregação para as comunidades pobres da cidade. Para ele, até ajudam a conter o crescimento desordenado das favelas. “Pior que o muro de concreto, é o muro construído de preconceito. Ele que dividiu a favela”, diz a Terra Magazine. 
    - Quem gosta de miséria não é a favela, é intelectual que consegue ver poesia nesse cenário de tristeza, nessa precariedade. 
    Confira a entrevista com MV Bill: 
    O que acha da construção de muros para conter a devastação ambiental e a expansão de favelas? 
    MV Bill - Acho que tem se falado muito em contar a expansão da favela, mas também tem outra questão, que é conter o desmatamento das florestas. Se olhar para conter o desmatamento, começa a ser positiva a discussão sobre a construção, até porque a maioria dos favelados que eu conheço não querem o crescimento da favela e muito menos o desmatamento. Embora essa seja uma iniciativa impopular, ninguém teve nenhuma outra solução.   
    Críticos dizem que a construção dos muros acaba por segregar os moradores dessas comunidades. Você concorda? 
    Eu não sei, cara. A favela, independente do muro, já é segregada por um muro imaginário, construído à base de preconceito, distanciamento, desnível social, desconhecimento. Eu acho que depende do nosso olhar nesse momento, principalmente num momento em que está havendo muita integração entre a favela e o asfalto.   
    Então os muros não são um fator a mais para segregar a favela do asfalto? 
    Não. Eu acho que, pior que o muro de concreto, é o muro construído de preconceito, é visível e invisível ao mesmo tempo. Ele que dividiu a favela.   
    A construção acaba sendo boa para os próprios moradores da favela… 
    É, para conter o crescimento desordenado, porque cresceu demais. E esse crescimento hoje não permite que muitas das favelas tenham espaço para construção.   
    Uma pesquisa do Datafolha mostrou que a aprovação ao muro é maior entre as pessoas mais pobres, da própria favela. Esse é um dado esperado? 
    É esperado, porque quem gosta de miséria não é a favela, é intelectual que consegue ver poesia nesse cenário de tristeza, nessa precariedade. Até por uma questão de segurança não tem como deixar as favelas crescerem mais, porque a maioria delas já estão com todos os espaços tomados, nas encostas dos morros. Como não tem mais espaço, as construções começam a ser feitas em lugares de alto risco, para a família que constrói aqui e para as famílias que vivem embaixo. As favelas hoje não suportam mais nenhum tipo de crescimento.   
    O escritor José Saramago chegou a comparar a construção dos muros no Rio de Janeiro ao Muro de Berlim e aos muros que separam Israel da Faixa de Gaza. Acha que isso é um exagero? 
    Eu não cheguei a ver a declaração, mas são visões completamente diferentes. Eu fico mais com a visão de quem é de dentro (das favelas).   
    Não deveria haver diálogo com os moradores dessas comunidades antes da construção dos muros? 
    Essa é uma reclamação recorrente… Esse é um erro cometido pela maioria dos governos do Brasil todo: não dialogar com a comunidade que está recebendo a política pública. A falta de diálogo acaba não trazendo uma compreensão do que se precisa realmente dentro de uma comunidade. E ouvindo essas pessoas (das comunidades), é possível ter uma política pública mais embasada. Acho que isso acaba sendo um grande erro; o diálogo com a comunidade só vai ter a acrescentar. O diálogo é importantíssimo. Seria a política pública chegando para quem precisa, e orientada para quem sente na pele as necessidades do dia a dia.   
    Recentementente você teve seu nome lançado como candidato. A princípio, você rejeitou entrar na política institucional. Como está amadurecendo essa idéia? 
    Eu continuo pensando em não concorrer a cargo nenhum. Fico feliz com a movimentação que tá rolando, inicialmente me fizeram pensar, rever minha posição, mas hoje eu acho melhor não mexer na política. Ver os resultados me faz repensar toda hora. Saber que mais de dois milhões de jovens se identificam com o meu pensamento é uma coisa empolgante.   Eles te vêem como um representante deles mesmos… Pô, isso é uma coisa que dá uma puta satisfação. É o maior feedback que a gente pode ter para o nosso trabalho. Porém, a política formal está fora dos meus planos. Eu prefiro continuar trabalhando (junto às comunidades)

     
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