No “Manifesto Antropofágico” (1928), Oswald de Andrade afirmava: “Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente”. Disto, não discordo: a antropofagia é a marca da identidade nacional brasileira. Se quisermos teorizar mais, podemos recorrer à Boaventura de Souza Santos: a nossa cultura é uma “Cultura de Fronteira” caracterizada pelo acentrismo, pelo cosmopolitismo, pela dramatização e a carnavalização das formas e pela carga barroca. Portanto temos horror à xenofobia. Mas ser cosmopolita não significa aceitar o colonialismo cultural imposto pela globalização totalitária. De novo o “Manifesto Antropofágico”: “Contra todos os importadores de consciência enlatada. A existência palpável da vida. E a mentalidade pré-lógica para o Sr. Lévy-Bruhl estudar. (...) Contra a verdade dos povos missionários, definida pela sagacidade de um antropófago, o Visconde de Cairu: – É mentira muitas vezes repetida (...) A nossa independência ainda não foi proclamada. Frase típica de D. João VI: – Meu filho, põe essa coroa na tua cabeça, antes que algum aventureiro o faça! Expulsamos a dinastia. É preciso expulsar o espírito bragantino, as ordenações e o rapé de Maria da Fonte. Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud – a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama”. Por que toda esta digressão? Hoje no mundo anglo-saxão comemora-se o “Halloween”. O Problema é que nas colônias do Império do Norte isto também começou a ser feito. Os cursinhos de inglês iniciaram esta moda há alguns anos atrás. Depois as escolas regulares também começaram a fazê-lo. Hoje até as escolas públicas dos morros e das periferias aderiram à onda: nossas crianças pobres se vestem de bruxas como as americanas e dizem “Travessuras ou Gosturas?”. Mas não comem como as americanas (Salve, Carlos Lyra!). Por isto, meus aplausos aos Deputados Aldo Rebelo e Ângela Guadagnin que, em 2005, apresentaram o projeto de lei que institui o dia 31 de outubro como o “Dia do Saci”, em todo o Brasil (em alguns estados, como São Paulo, isto já está vigindo através de leis estaduais). “Tupi or not tupi, that is the question. Contra todas as catequeses”. O que temos de sangue celta está diluído no sangue misturado de nossos ancestrais portugueses (juntamente com o de judeus, árabes, germânicos, romanos, gregos, fenícios e os que mais passaram pela Península Ibérica)que, por sua vez, aqui em Pindorama também se misturaram com ameríndios, africanos, japoneses,alemães e tantos outros que se diluíram nesta imensa "nova civilização , mestiça e tropical, orgulhosa de si mesma", como a definiu o mestre Darcy Ribeiro. Portanto, basta de "Halloween"! Viva o Dia do Saci!
Manifesto Sacizista
Elaborado pela SOSACI(Sociedade dos Observadores de Saci)
Um espectro ronda a indústria da cultura. Como já ocorrera durante a I Guerra Mundial – quando os chamados “povos civilizados” se matavam entre si nos campos da Europa, como lembra Monteiro Lobato em seu “Inquérito”, escrito em 1917 –, o espectro do Saci voltou para dar nó na crina das potências que invadem os outros países com uma “indústria cultural” predadora e orquestrada.
O Saci é reconhecido como uma força da resistência cultural a essa invasão. Na figura simpática e travessa do insigne perneta, esbarram hoje, impotentes, os x-men, os pokemon, os raloins e os jogos de guerra, como esbarravam ontem patos assexuados e ratos com orelhas de canguru.
É tempo, pois, do Saci expor abertamente seus objetivos, lançando um manifesto e denunciando o verdadeiro espectro: o espectro do imperialismo cultural. Para tanto, outros expoentes do imaginário cultural brasileiro – como o Boitatá, a Iara, o Curupira e o Mapinguari – reuniram-se e redigiram o presente manifesto.
A cultura popular é um elemento essencial à identidade de um povo. As tentativas insidiosas de apagar do imaginário do povo brasileiro sua cultura, seus mitos, suas lendas, representam a tentativa de destruir a identidade do nosso país. A história de todas as culturas até hoje existentes é a história de opressores e oprimidos. Hoje, como ontem, o Saci apóia, em qualquer lugar e em qualquer tempo, qualquer iniciativa no sentido de contestar a arrogância, a prepotência e a destruição de que é portadora a indústria cultural do império.
O Saci não se reivindica como símbolo único e incontestável da cultura popular brasileira. O Saci trabalha pela união e pelo entendimento das várias iniciativas culturais que devolvam ao nosso povo a valorização de sua identidade cultural. O Saci não dissimula suas opiniões e seus objetivos e proclama, abertamente, que estes só podem ser alcançados por um amplo movimento de resistência cultural, denunciando os malefícios da indústria cultural imperialista. Que ela trema à idéia de uma resistência cultural popular. Nesta, o Saci nada tem a perder a não ser seus grilhões. E tem um mundo a ganhar.
Sacis de todo o Brasil, unamo-nos!