A polêmica entre a Universal e os jornais: A liberdade de imprensa e o direito de demandar o Judiciário

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  • quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
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  • A polêmica entre a Igreja Universal do Reino de Deus e os jornais Folha de S. Paulo, A Tarde, O Globo e Extra é assunto espinhoso. Os fiéis da igreja entraram com ações na justiça em todo o país questionando reportagens dos veículos que supostamente empregaram tons ofensivos e preconceituosos, além de fazerem acusações sem provas. Desconheço o teor das reportagens, mas trata-se de um direito legítimo, garantido pela Constituição.

    A liberdade de imprensa é um daqueles pilares que sustentam a democracia. Em notas, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) condenaram as ações judiciais de fiéis da Universal. O argumento é que as ações buscam intimidar jornalistas e jornais, usando o Poder Judiciário contra a liberdade de imprensa, o livre exercício do jornalismo e o direito do cidadão à informação. É, nesse caso, o argumento não é bom.
    Não é a primeira vez que associações e grandes jornais advogam a tese de atentado à liberdade de imprensa e do exercício do jornalismo em razão de ações no Judiciário. Dessa vez, o problema é que segundo os jornais, há uma avalanche de ações na Justiça. De certo, isso pode ensejar questionamento no Judiciário. Tal tese, porém, é inconsistente com o direito daqueles que se sentem prejudicados de buscarem o Judiciário.
    Se há abusos no chamado direito de petição, caberia ao Judiciário coibir punindo os proponentes das ações. Do contrário, se o Judiciário entender pertinentes as ações, que obrigue os responsáveis a reparem o dano. Não se pode é simplesmente advogar o direito dos meios de comunicação não serem processados. Isso seria absurdo.

    O histórico dos meios de comunicação no Brasil não é bom. A lista de reportagens e matérias jornalísticas contendo inverdades ou insuficiência (ou ausência mesmo) de provas é elevada. O prejudicado nem sempre tem seu dano reparado na mesma proporção. Em geral, a vítima não é a imprensa, mas os cidadãos ou os adversários dos barões da imprensa.

    Numa outra linha de análise, o presidente Lula discordou de que a série de ações judiciais movidas pela igreja contra os veículos de comunicação possa representar uma ameaça à liberdade de expressão. Questionado sobre o assunto, Lula disse entender que a igreja apenas busca no Judiciário, um dos “pilares da democracia”, uma forma de se defender ao se sentir atingida.
    “E acho que a liberdade de imprensa pressupõe isso. Pressupõe a imprensa escrever o que quiser, mas pressupõe também que a pessoa que se sinta atingida vá à Justiça para provar sua inocência. Não pode ter liberdade de imprensa se apenas um lado achar que está certo”, afirmou o presidente.
    “Liberdade de imprensa pressupõe uma mistura de liberdade e responsabilidade. As pessoas escrevem o que querem depois ouvem o que não querem. Esta é a liberdade de imprensa que nós queremos”, continuou.
    Ao comentar especificamente o caso da Folha de São Paulo, Lula disse que, se um dia o jornal se sentir atingido pela Igreja Universal, também poderá optar por processar judicialmente a igreja. “E assim a democracia vai se consolidando no Brasil”.

    Alguns jornais e editoriais afirmam que Lula equivoca-se sobre a liberdade de imprensa. Confunde direito de ir ao Judiciário com abuso de ações para a intimidação da liberdade de imprensa. Mais uma vez, o argumento é pouco válido. É a velha fórmula de tentar desqualificar o presidente quando este faz alguma declaração que não agrada. A tática é covarde e foge das explicações. Como disse, se há realmente abuso, porque não deixem por conta do Judiciário. Se não há nada de errado nas reportagens, nenhuma inverdade ou acusação sem provas, certamente esses jornais terão êxito no Judiciário.

    Lula acertou na mosca. Se a Folha se sentir atingida pela Universal, que busque também o Judiciário. É assim mesmo. Não podemos esquecer que tanto a ABI quanto a ANJ são associações representativas de classes (uma dos jornais e a outra dos jornalistas). É comum que defendam o direito de não serem processados. Podem dizer que não é isso que estão defendendo, apenas questionam o abuso de ações. O argumento é fraquinho, afinal o Judiciário também existe para apreciar tal abuso, se existente.

    Nesse caso específico da briga entre a Universal e outros importantes veículos de comunicação, não podemos deixar de assinalar que possivelmente interesses comerciais estejam em jogo. É uma evidência. Como bem assinalou Nassif na sua série de reportagens com denúncias contra a Veja, é muito tênue a linha que separa jornalismo dos negócios.

    As reportagens podem ser simples matérias, produto do chamado “jornalismo investigativo”, mas a suspeita paira no ar. É uma questão de contexto. O império de comunicação erguido pela Universal desafia os tradicionais impérios familiares que dominam a imprensa no Brasil. Se o império da igreja foi construído com recursos supostamente de origem dos dízimos, o que há de ilegal nisso. Os interesses nem sempre estão claros.

    O respeito à liberdade de imprensa deve ser assegurado, assim como o direito de demandar o Judiciário contra seus abusos. E não são poucos. Mas também se deve assegurar a liberdade religiosa, inclusive o direito dos fiéis de pagarem o dízimo. Uma equação às vezes complicada. É o jogo. Adeus à simplicidade.

    Em tempo: São recorrentes na imprensa denúncias de lavagem de dinheiro da Universal. Difícil de entender, pois a igreja tem imunidade tributária. Então, a igreja não precisa lavar o dinheiro. Existem contradições em ambos os lados.
     
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