O império de Washington subiu no telhado

por Alfred W. McCoy e Brett Reilly
traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu
publicado no blog Vi O Mundo

Num dos mais bem-vindos movimentos das forças da história, a justaposição de dois extraordinários eventos deixou a nu a arquitetura do poder global dos EUA, e todos afinal podem vê-la. Em novembro do ano passado, WikiLeaks fez chover sobre o mundo quantidades diluvianas de telegramas diplomáticos, recheados dos mais abusivos comentários formulados por diplomatas dos EUA sobre governantes de todo o planeta, da Argentina ao Zimbabwe, e estampados nas primeiras páginas dos jornais. Em seguida, poucas semanas depois, o Oriente Médio explodiu em manifestações pró-democracia e contra ditadores, muitos dos quais aliados íntimos dos EUA, alianças sobre as quais os telegramas publicados por WikiLeaks não deixam dúvidas.

De repente, viu-se o esqueleto da ordem mundial construída pelos EUA e que depende significativamente de líderes nacionais que são “elites subordinadas” fiéis a Washington, mas que, de fato, não passam de bando sortido de autocratas, aristocratas e militares ditadores. Quando se viram os aliados, viu-se também a lógica mais ampla, que quem não visse jamais conseguiria explicar, que preside todas as decisões de política exterior dos EUA ao longo de meio século.

Por que a CIA se arriscaria, em 1965, no auge da Guerra Fria, em operações como derrubar líder prestigiado como Sukarno na Indonésia, ou por que encorajaria o assassinato do católico Ngo Dinh Diem em Saigon em 1963? A resposta – à qual afinal se chega agora, graças às publicações de WikiLeaks e ao “despertar árabe” – é que nos dois casos tratava-se de subordinados selecionados por Washington, os quais, de repente, se insubordinaram e tornaram-se descartáveis.

Por que, meio século depois, Washington trairia todos os seus princípios democráticos declarados e apoiaria o presidente do Egito Hosni Mubarak contra milhões de egípcios nas ruas, só para, quando já não havia como mantê-lo no comando, indicar para substituí-lo, pelo menos no primeiro momento, o seu chefe de segurança Omar Suleiman, conhecido como chefe dos serviços de tortura que eram arrendados aos serviços de tortura de Washington? A resposta é que os dois eram também subordinados selecionados por Washington, que serviam bem aos interesses dos EUA em estado considerado chave no Oriente Médio.

Em todo o Grande Oriente Médio, da Tunísia e Egito ao Bahrain e Iêmen, manifestantes democráticos, nas ruas ameaçam varrer do mapa todas as elites subordinadas, consideradas crucialmente necessárias para manter o poder dos EUA. Sempre foi assim: todos os impérios modernos dependeram de delegados que traduzissem o poder global em termos de controles locais. Mas, quando aquelas elites locais começaram a dar sinais de interesse em implantar agendas próprias, o colapso dos impérios começou a aparecer nas cartas.

Assim como as “revoluções de veludo” que varreram o leste europeu em 1989 tocaram as trombetas do fim do império soviético, assim também as “revoluções do jasmim” que se espalham pelo Oriente Médio podem bem estar sinalizando o começo do fim do poder global dos EUA.


Militares no comando

Para entender a importância das elites locais, é preciso considerar os primeiros dias da Guerra Fria, quando uma Casa Branca desesperada procurava alguma coisa, qualquer coisa, que tivesse qualquer mínima chance de deter o que Washington via como sentimento pró-comunistas e antiamericano no mundo. Em dezembro de 1954, o Conselho de Segurança Nacional reuniu-se na Casa Branca e traçou uma estratégia para domar todas as forças nacionalistas mais poderosas que se constituíam, naquele momento, em todo o mundo.

Na Ásia e na África, meia dúzia de impérios europeus que até então haviam garantido a estabilidade da ordem global por mais de um século estavam-se pulverizando, dando origem a cem novas nações, muitas das quais – do ponto de vista de Washington – suscetíveis de serem cooptadas pela “subversão comunista”. Na América Latina, o problema era o avanço da oposição de esquerda, entre as massas urbanas que não paravam de crescer e entre os camponeses sem terra.

Depois de examinar as “ameaças” que se formavam contra os EUA na América Latina, o influente Secretário do Tesouro George Humphrey declarou aos seus colegas do Conselho de Segurança Nacional que todos parassem “de falar tanto em democracia” e cuidassem, imediatamente, de “apoiar ditaduras de direita que tivessem políticas pró-EUA”. Foi quando, em momento de brilhante insight estratégico, Dwight Eisenhower interrompeu, para observar que Humphrey dizia, de fato, que todos passassem a raciocinar em temos de “Tudo bem, se for o nosso filho da puta”.

É momento histórico para nunca esquecer, porque o presidente dos EUA acabava de articular, com clareza cristalina, o princípio constitutivo do sistema de dominação global que Washington implementaria daquele dia em diante e pelos 50 anos seguintes: trocar qualquer princípio democrático por uma dura realpolitik de apoiar qualquer líder que apoiasse os EUA. E assim se construiu uma rede planetária de líderes nacionais (muitas vezes também nacionalistas) dispostos a por as necessidades de Washington acima de qualquer necessidade local.

Durante a Guerra Fria, os EUA favoreceram ditadores militares na América Latina, ditadores aristocráticos no Oriente Médio e uma mistura de democratas e ditadores na Ásia. Em 1958, golpes militares na Tailândia e no Iraque repentinamente viraram os holofotes para os militares do Terceiro Mundo, exibindo-os como forças às quais os EUA poderiam recorrer e com as quais poderiam contar. Foi quando o governo Eisenhower decidiu trazer líderes militares estrangeiros para treiná-los nos EUA e, assim, facilitar “o gerenciamento” das forças de mudança geradas pelo desenvolvimento daquelas nações emergentes. Dali em diante, Washington faria jorrar ajuda militar para cultivar os exércitos dos aliados e possíveis aliados em todo o planeta, ao mesmo tempo em que “missões de treinamento” seriam usadas para construir laços cruciais entre militares dos EUA e oficiais dos exércitos em todo o mundo; e, onde as elites subordinadas não parecessem suficientemente subordinadas, para ajudar a identificar líderes alternativos.

Nos casos em que presidentes civis se insubordinassem, entraria em ação a CIA, promovendo golpes que poriam no poder governos militares confiáveis – substituindo o primeiro-ministro do Irã Mohammad Mossadeq, que tentou nacionalizar o petróleo iraniano, pelo general Fazlollah Zahedi (então o jovem Xá) em 1953; o presidente Sukarno, pelo general Suharto na Indonésia na década seguinte; e, claro, o presidente Salvador Allende pelo general Augusto Pinochet no Chile em 1973, para citar apenas esses três casos.

Nos primeiros anos do século 21, a confiança de Washington nos militares nos seus estados-clientes só aumentou. Os EUA entregavam 1,3 bilhões de dólares ao ano ao Egito, como ajuda militar, e investiam só 250 milhões de dólares em programas de desenvolvimento econômico do país. Resultado disso, quando as manifestações populares sacudiram as bases do regime no Cairo em janeiro passado, os EUA imediatamente pensaram em uma “transição pacífica” com troca de generais. Nas palavras do New York Times, “investimento de 30 anos que rendeu bons dividendos, quando generais dos EUA e agentes de inteligência conheciam todos os nomes cogitados para formar um novo governo, amigos e colegas com os quais trabalharam e serviram”. “Transição pacífica”, no Egito, com apoio do exército, para manter a ditadura militar.

Em outros locais no Oriente Médio, Washington, desde os anos 1950s, sempre acompanhou a preferência britânica por aristocratas árabes, cultivando aliados como um Xá (no Irã), vários sultões (Abu Dhabi, Oman), vários emires (Bahrain, Kuwait, Qatar, Dubai), vários reis (Arábia Saudita, Jordânia, Marrocos). Em toda essa região vasta e volátil, do Marrocos ao Irã, Washington cortejou regimes monárquicos aos quais ofereceu alianças militares, sistemas de armas norte-americanos, apoio da CIA para a segurança local, paraíso seguro nos EUA para o dinheiro daquelas monarquias, e favores especiais às elites locais, entre as quais estudo e formação acadêmicas para os príncipes e nobres, com livre acesso às universidades norte-americanas ou escolas de formação de militares do Departamento de Defesa em todo o planeta.

Em 2005, a secretária de Estado Condoleezza Rice fez patético resumo de todo esse trabalho: “Há 60 anos, os EUA procuram a estabilidade à custa da democracia no Oriente Médio. Não conseguimos nem uma, nem outra”.


Mas, antes, funcionava…

Os EUA não são a primeira potência a construir poder imperial baseado em laços pessoais com líderes locais. Nos séculos 18 e 19, a Grã-Bretanha reinou sobre os oceanos (como os EUA depois reinariam nos céus), mas, em terra, como todos os impérios passados, tudo sempre dependeu de alianças locais que servissem de representantes locais, para o controle direto, local, das sociedades humanas, sempre mais voláteis que céus e mares. Não fosse assim, como, em 1900, uma nação insular, de apenas 40 milhões de almas, com exército de apenas 99 mil soldados, comandaria um império global de 400 milhões de seres humanos, quase um quarto de toda a humanidade?

De 1850 a 1950, a Grã-Bretanha controlou suas colônias formais mediante uma extraordinária rede de aliados locais – dos chefes das ilhas Fiji e sultões da Malásia a maharajas indianos e emires africanos. Simultaneamente, mediante elites subordinadas, os britânicos controlavam um “império informal” ainda mais amplo, que incluía imperadores (de Pequim a Istanbul), reis (de Bangkok ao Cairo) e presidentes (de Buenos Aires a Caracas). No auge, em 1880, o império informal britânico na América Latina, Oriente Médio e China era maior, em população, que as colônias formalmente ligadas à ‘metrópole’ na Índia e na África. Todo esse gigantesco império global, sobre cerca de metade de todos os seres humanos sobre o planeta, dependeu, sempre, de frágeis laços de cooperação com as elites locais.

Mas repentinamente, depois de 400 anos de ininterrupta expansão imperial, os cinco maiores impérios europeus de ultramar foram varridos do mapa, em apenas 25 anos de descolonização. Entre 1947 e 1974, os impérios belga, britânico, holandês, francês e português sumiram da Ásia e da África, dando lugar a uma centena de novas nações, das quais mais de 50 são hoje estados soberanos. À caça de explicação para mudança tão rápida e tão radical, muitos especialistas concordam com Ronald Robinson, historiador do império britânico, autor de famosíssima frase: “quando somem os seus governantes indígenas, os impérios morrem”.

Durante a Guerra Fria que coincidiu com essa era de rápida descolonização, as duas superpotências globais voltaram aos mesmos métodos e usaram com regularidade suas respectivas agências de espionagem para manipular os governos dos novos estados independentes. A KGB da URSS e suas agências delegadas, como a Stasi na Alemanha Oriental e a Securitate na Romênia forçaram uma uniformidade política entre os 14 estados satélites soviéticos na Europa do Leste e desafiaram os EUA, em todos os estados leais aos norte-americanos no Terceiro Mundo. Simultaneamente, a CIA monitorou de perto a lealdade de seus presidentes, autocratas e ditadores nos quatro continentes, com golpes, suborno e penetração nos serviços de segurança nacionais e, sempre que necessário, derrubaram governos inconvenientes.

Numa era de sentimento nacionalista, contudo, a lealdade das elites locais mostrou-se assunto mais complexo do que se esperava. Muitas daquelas elites eram arrastadas por lealdades conflitivas e muitas vezes por sentimentos arraigados de nacionalismo, o que obrigava os EUA a vigiá-las de perto. Aquelas elites eram tão criticamente importantes e qualquer insubordinação implicava questões tão amplas, que a CIA passou a trabalhar rotineiramente em operações clandestinas para ‘mantê-las em rota’, operações que geraram algumas das maiores crises da Guerra Fria.

Ante o crescimento da crise em seu sistema global de controle no mundo de depois da II Guerra Mundial, restaram poucas alternativas a Washington, além de trabalhar com fantoches locais os quais – mesmo que em posições mais fracas – ainda tentavam maximizar o que viam como interesse nacional de suas nações (tanto quanto viam como seu interesse mais diretamente pessoal). Mesmo no auge do poder global dos EUA, nos anos 1950s, quando a dominação norte-americana ainda não enfrentava desafios graves, Washington foi forçada a barganhar com alguns líderes locais, como, por exemplo, Raymond Magsaysay nas Filipinas, o ditador sul-coreano Syngman Rhee e com Ngo Dinh Diem no Vietnã do Sul.

Na Coreia do Sul, nos anos 1960s, por exemplo, o general Park Chung Hee, então presidente, condicionou o uso de tropas de seu país a bilhões de dólares para investimento – primeiro passo do que seria depois o “milagre” econômico sul-coreano. No processo, Washington pagou e obteve o que mais queria: 50 mil soldados e mercenários coreanos, para sua guerra no Vietnã, cada dia mais impopular.


No mundo pós-Guerra Fria

Depois de derrubado o Muro de Berlim em 1989, o que marcou o fim oficial da Guerra Fria, Moscou rapidamente perdeu seus estados-satélites, da Estônia ao Azerbaidjão, à medida que estados leais aos soviéticos saltavam do barco imperial que naufragava. Para Washington, que se sentiu “vitoriosa” e já se preparava para ocupar o lugar de “única superpotência” no planeta, começaria ali processo idêntico, mas um pouco mais lento.

Ao longo das duas décadas seguintes, a globalização gerou um sistema multipolar de potências emergentes em Pequim, Nova Delhi, Moscou, Ancara e Brasília – ao mesmo tempo em que um poder desnacionalizado e corporativo reduzia a dependência das economias em desenvolvimento, que deixavam cada dia mais de depender de um único estado, por mais ‘imperial’ que quisesse ser. Com sua capacidade para controlar elites pelo mundo cada dia menos efetiva, Washington teve, então de encarar a concorrência política e ideológica do fundamentalismo islâmico, dos sistemas de regulação da União Europeia, do capitalismo de Estado chinês e de uma onda crescente de nacionalismo econômico na América Latina.

Na medida em que o poder de influência dos EUA declinava, as tentativas de Washington para controlar suas elites subordinadas locais pelo mundo começaram a falhar, algumas vezes espetacularmente. O caso mais espetacular de fracasso desse tipo foi o golpe tentado para depor Hugo Chavez da Venezuela, fracasso, de fato, retumbante, em 2002. Outro caso, a tentativa de tirar da órbita soviética a Georgia do aliado Mikheil Saakashvili em 2008. E, isso, sem falar na nêmesis de Washington, Mahmoud Ahmadinejad, que enfrentou tentativa de golpe nas eleições de 2009 no Irã e lá continua, até hoje. Onde, antes, sempre bastaram os golpes da CIA ou muito dinheiro, foi necessário, no governo Bush, toda uma massiva invasão militar, com guerra, para tirar do posto um único adversário, ditador ex-aliado que, de repente, começara a criar problemas, Saddam Hussein. E mesmo assim, os EUA viram bloqueados seus planos para “troca de regime” na Síria e no Irã, quando esses dois estados contribuíram para criar uma guerrilha devastadora contra as forças dos EUA, dentro do Iraque.

Do mesmo modo, apesar dos bilhões de dólares consumidos em ajuda externa, Washington ainda não conseguiu controlar o presidente que os próprios norte-americanos puseram no poder no Afeganistão, Hamid Karzai, que, em resposta memorável aos enviados norte-americanos que não lhe davam sossego, disse que “Se querem um fantoche para chamar de parceiro, nada feito. Se querem um parceiro, sim, podemos conversar.”

Depois, no final de 2010, WikiLeaks começou a publicar aqueles milhares de telegramas diplomáticos dos EUA que abrem via ampla, sem qualquer controle ou censura, para que se veja, ‘ao vivo’, o enfraquecimento do poder de Washington, que já não domina o sistema de poder delegado que construiu e no qual muito investiu durante 50 anos. Ao ler aqueles documentos, o jornalista israelense Aluf Benn do jornal Haaretz, viu “a queda do império americano, o declínio de uma superpotência que comandou o mundo com seu exército e supremacia econômica.” Nunca mais, escreveu ele “os embaixadores dos EUA serão recebidos nas capitais do planeta como ‘altos comissários’. São vistos hoje como o que hoje são: burocratas cansados, que consomem seus dias ouvindo tediosamente o que não querem ouvir, cada interlocutor empenhado em seu discurso próprio, sem jamais conseguirem convencer os interlocutores locais sobre quem é a superpotência e quem é o estado-cliente.”

É verdade. O que os documentos publicados por WikiLeaks mostram é um Departamento de Estado que labuta para manter um sistema global indisciplinável, de elites locais cada dia mais insubordinadas; um Departamento de Estado que usa de todos os meios – que se serve da mais pura intriga tentando recolher informação e inteligência, de gestos de amizade para tentar obter alguma solidariedade, de ameaças para obrigar a cooperar e que desperdiça bilhões de dólares para comprar uma influência que nunca é suficiente. No início de 2009, por exemplo, o Departamento de Estado instruiu suas embaixadas em todo o mundo a agir como polícia imperial para recolher informação sobre líderes locais, inclusive “endereços de e-mail, números de telefones e faxes, impressões digitais, fotos, DNA e imagens SCAN da íris”.

Não há evidência mais clara de que, como qualquer subgovernador de colônia periférica, o Departamento de Estado depende hoje de informação de algibeira para incriminar adversários, do que a ordem, do Departamento de Estado à embaixada do Bahrain, para que reunisse detalhes sórdidos sobre os príncipes coroados do reino, que os comprometessem aos olhos de uma sociedade islâmica. Textualmente: “O que sabemos que incrimine os príncipes? Algum deles bebe álcool? Usa drogas?”

Com arrogância de quem foi enviado do império até anteontem, os diplomatas dos EUA ainda se autoconsideram senhores de todo o poder e descartam “os turcos neo-otomanos que aparecem pelo Oriente Médio e os Bálcãs”. Ou supõem que conheçam todas as fraquezas das elites subordinadas, como, por exemplo, “a loura voluptuosa que presta serviços de enfermagem ao coronel Muammar Gaddafi”, ou o “medo pânico” que os golpes militares inspiram ao presidente do Paquistão Asif Ali Zardari, ou sobre os 52 milhões de dólares “de fundos roubados” na conta do vice-presidente Ahmad Zia Massoud, do Afeganistão.

Mas, à medida que sua influência declina, Washington está descobrindo que muitos de seus aliados selecionados a dedo nas elites locais ou se tornam cada vez menos controláveis ou cada vez mais irrelevantes, sobretudo no estratégico Oriente Médio. Em meados de 2009, por exemplo, o embaixador dos EUA na Tunísia relata que “o presidente Ben Ali… e seu governo perderam qualquer contato com o povo tunisiano” e dependem “da polícia para controlar o povo”, ao mesmo tempo em que “a corrupção cresce nos círculos mais íntimos do poder” e “aumentam os riscos de instabilidade do regime, para o longo prazo”. Pois mesmo assim, o enviado dos EUA só recomenda que Washington “desconsidere a crítica popular” e passe a confiar “na sinceridade das informações que se obtêm nos altos círculos” – exatamente a mesma política que não produziu reforma alguma, até que as ruas derrubaram o ditador, apenas 18 meses depois dessa informação ‘de inteligência’.

Assim também , no final de 2008, a embaixada dos EUA no Cairo temia que “a democracia egípcia e os esforços de defesa dos direitos humanos estão sendo sufocados”. Mas, como disse a própria embaixada, “nada parece sugerir que se venha a assistir a complicações para os interesses regionais dos EUA, no caso de os laços entre EUA e Egito virem a ser gravemente enfraquecidos”. Quando, poucos meses depois, Mubarak visitou Washington, a Embaixada do Cairo insistiu para que a Casa Branca “restaure o senso de calorosa amizade que tradicionalmente caracterizou a parceria EUA-Egito”. E por isso, em junho de 2009, apenas 18 meses antes de Mubarak ser derrubado, o presidente Obama saudou seu ditador tão útil como “aliado confiável, um pilar de estabilidade e bonança na Região”.

Enquanto a crise na praça Tahrir no Cairo só fazia crescer, um respeitado líder da oposição, Mohamed ElBaradei, reclamava amargamente que Washington “está empurrando todo o mundo árabe na direção da radicalização, com essa política inábil de apoiar a repressão”. Depois de 40 anos de domínio dos EUA, o Oriente Médio, disse ele, não passava de “um punhado de estados fracassados que nada acrescentam à humanidade ou à ciência” porque “as pessoas são ensinadas a não pensar nem agir e, consistentemente, recebem educação inferior.”

Dado que não há guerra global capaz de simplesmente varrer do mundo um império, o declínio de uma grande potência sempre é lento, doloroso processo de esgotamento. Além das duas guerras dos EUA no Iraque e no Afeganistão, que se aproximam de alguma coisa que mais parece derrota que vitória, o capital do império vê-se atacado por grave crise fiscal, a moeda do reino perde valor de troca, e aliados de muito tempo constroem laços econômicos e até militares com a rival China. A tudo isso, impossível não acrescentar a possível perda de leais delegados em todo o Oriente Médio.

Há mais de 50 anos, Washington aproveita-se de um sistema global de poder baseado em elites locais subordinadas. Esse sistema facilitou a expansão da influência norte-americana por todo o mundo, com surpreendente eficácia e (em termos relativos) satisfatória economia de forças. Hoje, esses aliados leais já mais se parecem império desconexo, ou estados abertamente insubordinados. Make no mistake, como gosta de dizer o presidente Obama, que ninguém se engane: o fim de meio século de laços do velho tipo, indica, claramente, que Washington subiu no telhado.
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ÉTICA, HONESTIDADE E MORAL

Pois,
confunde-se a ética com honestidade e moral.
Vários políticos falam de ética, como se fossem honestos e moralmente corretos, e o povo, esse nosso povo, medíocre em cultura, assim os relaciona;
-Quem tem ética, tem moral e é honesto.
A bem da verdade seria, eticamente, honestamente e moralmente correto, mas infelizmente, somente os imbecis fazem essa leitura.
Uns deputados quando colocam "tiririca" na comissão de educação estão sendo eticamente corretos com seus pares, desonestos com a comissão de educação e imorais.
Colocar a "martaxa relax e goza" na presidência do senado é realmente eticamente correto, moral e honesto com a qualidade da casa de tolerância que é o nosso senado.
Ser ético, não siginifica ter moral e ser honesto.
Exemplo disso vem das associações criminosas que são altamente éticas.
Para ser mais exato cito o acidente do legacy com o avião da Gol.
Os controladores que erraram desde São José dos Campos até Manaus, passando por Brasília, foram éticos em defender seus colegas, foram desonestos em não admitirem seus erros, e imorais ao tentarem coloca a culpa nos pilotos e ou equipamento "transponder".
Pouca gente sabe que o "transponder" "pifado" não evita o voo de nenhuma aeronave.
Desligá-lo pode ter sido um erro ou uma fatalidade, e aí faltou honestidade aos pilotos.
Qualquer um que assista um erro de um colega e o esconde está sendo ético, desonesto e imoral.
As CPIs de nossa política são éticas, desonestas e imorais.
Um governo governar por medidas provisórias é juridicamente legal, mas totalmente anti-ético.
Já visto pelo lado setorial da câmara dos deputados é desonesto para com suas funções aceitarem esse modelo de conduta.
É imoral com a democracia deixar-se subestimar-se por outro poder, quando deveriam ser separados e independentes.
A imoralidade jurídica é uma afronta ao povo, pois temos um Supremo Tribunal que vive de "affairs" com os outros dois poderes.
O nosso poder executivo é anti-ético, desonesto e imoral.
Até um ditador honesto é aceitável, apesar de tolher-se a liberdade, o fato de não sê-lo corrupto é uma bênção.
A nossa democratura é igual como se tivéssemos um regime ditatorial, provavelmente pior.
Aqui não é o ditador que enriquece, é uma camarilha, uma caterva política.
Eu penso que o salário de aposentado poderia ser menor, se os mesmos tivessem os planos de saúde que o governo proporciona com milionários pagamentos às empresas de saúde privadas, aos seus servientes.
Isso seria uma grande demonstração de honestidade governamental.
A imoralidade está que o povo dependente do SUS, sustenta essa mordomia paga, aos políticos e juristas que possuem salários para arcarem com essas despesas.
A falta total de ética é que eles aceitam como se fosse um direito.
Eu poderia citar os messes de paralisação de nossos congressistas e juristas da mesma forma, seria admissível.
Quando vejo o povo maltratado pelos funcionários públicos que se acham terem esse direito, esquecendo a ética do dever público, nosso clamor é imoral, nossa justificativas são de fato desonestas.
A inflação vai tirar comida de nossas mesas, mas que ética, honestidade e moral tem o povo que os elege e reelege?
Quando se desconhece o sentido dessas palavras tudo é honesto.
Até quando?

 
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ABERTAS AS INSCRIÇÕES PARA O ENCONTRO DE BLOGUEIROS DO RS



Os organizadores do BlogProgRS estão mais faceiros que mosca em tampa de xarope. Está certo que fazer um evento desses é mais complicado que receita de creme Assis Brasil. Estamos sofrendo mais que joelho de freira na Semana Santa. Ainda bem que o pessoal aqui é sério que nem cusco em chalana. Corremos o risco até de lotar as dependências da Câmara Municipal de Porto Alegre, palco da grande reunião, e o lugar ficar mais apertado que coleira de guaipeca. 
Pelo sim, pelo não, garanta sua vaga. Não tem mistério. Você clica aqui no BlogProgRS, toma pé das atividades programadas e já faz sua inscrição na hora. Mole, mole. Mais fácil que tirar doce de guri.
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NADA JUSTIFICA ASSASSINATOS NA SÍRIA

O Poder é igual em todo o lugar.

 Para mantê-lo os ditadores e poderosos usam dos mesmos meios em todos os lugares.

Nada justifica a matança de centenas de civis sírios por parte do Ditador Assad. A única justificativa é a sua manutenção no Poder a qualquer custo. A perpetuação do  Estado de Emergência em que a Síria vive mergulhada há décadas, e a continuidade desta família no Poder. Antes o pai, agora o filho.

Nenhum democrata, nenhum socialista ou comunista, a pretexto de que a Síria tem um governo de “esquerda” pode compactuar com essa tragédia em que seu povo está enredado.

O que deve caracterizar sempre uma posição de esquerda é a luta pela democracia, pela liberdade e a preservação dos valores humanistas.

Qualquer coisa fora disto é fascismo, crime contra a humanidade, assassinatos e torturas.
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A Primeira Internacional e a Comuna de Paris

por Eduardo Mancuso, historiador

Segundo o Dicionário do pensamento marxista, a Associação Internacional dos Trabalhadores – a Primeira Internacional – “foi uma federação internacional das organizações da classe trabalhadora de vários países da Europa Central e Ocidental, onde o movimento operário estava renascendo, na década de 1860, após as derrotas de 1848-1849. Embora tenha sido fundada pelos esforços espontâneos dos trabalhadores de Londres e Paris, que manifestavam sua solidariedade com o levante nacional polonês de 1863, Marx (de 1864 a 1872) e Engels (de 1870 a 1872) iriam desempenhar o papel chave em sua liderança.”

Ao contrário da Liga dos Comunistas (liderada por Marx e Engels entre 1847 e 1852), a Primeira Internacional apresentava um caráter político bastante amplo. Reunia tanto sindicalistas ingleses, simpatizantes franceses de Proudhon, socialistas alemães, democratas radicais e anarquistas de diversos países. Portanto, quando redige e aprova seu Manifesto Inaugural, que afirma que “a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”, Marx teve a preocupação de garantir bases programáticas para a cooperação entre todas as correntes que compunham a Internacional, assim como métodos democráticos de funcionamento, que incluíam a eleição do seu Conselho Geral em congressos anuais. Além disso, os critérios de participação admitiam tanto membros individuais como organizações locais e nacionais dos trabalhadores. Marx dizia inclusive que se deveria “deixar cada seção estruturar livremente seu próprio programa teórico”.

As principais atividades da Internacional em seus primeiros anos de vida incluíam a luta contra a prática organizada pela burguesia de fura-greves, os maus tratos aos prisioneiros irlandeses por parte do império britânico, as guerras, bem como campanhas pelo sufrágio universal para conquistar o direito de voto da classe operária. Mas com o crescimento da Internacional como referência de luta e de solidariedade entre os trabalhadores europeus, Marx consegue incorporar ao programa da organização reivindicações de caráter socialista, como a defesa da propriedade pública das minas, das ferrovias, das terras aráveis e florestas, assim como das comunicações.

A Comuna de Paris de 1871 representa um momento decisivo da história da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT). Os partidários franceses da Internacional desempenham um papel importante no “assalto ao céu” (nas palavras de Marx), e o Conselho Geral, sediado em Londres, organiza uma campanha de solidariedade internacional em defesa da Comuna, além de aprovar como resolução política a homenagem e justificativa histórica do movimento revolucionário do povo parisiense redigida por Marx - A guerra civil na França. Os fuzilamentos que marcam a repressão sangrenta deflagrada contra a Comuna de Paris, e seus reflexos nos demais países europeus, com perseguições, prisões e exílios massivos dos setores de vanguarda das classes populares, vão selar o destino da luta de classes por todo um período histórico e da própria Internacional.

A França de 1871 politicamente era o resultado da derrota da Revolução de 1848. A correlação de forças entre as classes resultava assim, desses acontecimentos, com uma classe operária debilitada e uma burguesia dividida incapaz de dirigir a sociedade, criando assim as condições para que o aparato de Estado se impusesse como árbitro entre as classes colocando-se acima delas, e dessa forma governasse garantindo estabilidade ao sistema capitalista. Em 1851, Luis Bonaparte (Napoleão III) e suas hostes arrebatam o poder político das frações burguesas em disputa, através de um golpe de Estado que garante a estabilidade da sociedade capitalista amortecendo os enfrentamentos entre as classes dominantes e a classe operária em um contexto em que nenhuma das duas classes era capaz de impor-se sobre a outra. Essa era a síntese do regime bonapartista na definição de Marx. Esse acontecimento histórico é analisado de forma brilhante por Marx, alguns anos antes, no clássico “O Dezoito Brumário de Luis Bonaparte”.

Assim nasce o Segundo Império na França, e sob esse regime se incrementa a atividade industrial e as finanças, como também a corrupção na caricatura de corte imperial em torno de Napoleão III. O chauvinismo francês foi enaltecido pelo regime e a política exterior se caracterizou pela reclamação das fronteiras perdidas em 1814 para as forças da Santa Aliança que derrotaram os exércitos de Napoleão Bonaparte. Dessa forma acontece a guerra com a Prússia em 1870, porém as tropas francesas sofrem uma derrota esmagadora diante do exército prussiano, que aprisiona o próprio imperador na Batalha de Sedan. Quando a notícia chega a Paris a capital se levanta e é proclamada a Segunda República.

Todos os parisienses capazes de empunhar armas, a maioria operários, são organizados na Guarda Nacional, formada para defender a cidade do exército prussiano que estava às suas portas. Os deputados do antigo legislativo de Paris constituem um Governo de Defesa Nacional, mas este tinha mais medo dos operários armados que das tropas prussianas, e assim iniciam as negociações com vistas à rendição com a esperança de desarmar rapidamente o proletariado parisiense. Em 28 de janeiro de 1871 Paris se rende. A Guarda Nacional conserva suas armas e é selado um armistício com os prussianos.

Então o governo tenta desarmar os operários e Paris se subleva. No dia 26 de março é eleita e em 28 de março é proclamada a Comuna de Paris. Surge o primeiro Estado dos trabalhadores da história. A criatividade revolucionária das massas parisienses concretiza a forma de organizar seu controle social e sua gestão política na Comuna de Paris. Segundo Marx a Comuna resolve a incógnita histórica sobre o poder dos trabalhadores. O Estado burguês começa a ser destruído com a abolição do exército permanente: a força armada era a Guarda Nacional, ou seja, o povo em armas.

A Comuna se organiza em assembléias territoriais, por distrito e por bairro, que elegiam seus representantes para o organismo central, que centraliza a administração da cidade. Todos os representantes são eleitos e seus mandatos revogáveis a qualquer momento e os cidadãos que assumem as tarefas nas diversas áreas (judicial, distribuição de alimentos, supervisão da produção) também são eleitos e revogáveis, e o seu salário não supera o de um operário qualificado.

A Comuna toma medidas para tentar ganhar a maioria da classe média de Paris, prorroga o pagamento de dívidas e abole a cobrança de juros nesse período, e também busca o apoio do campesinato francês exigindo que o pagamento dos custos econômicos da guerra recaia sobre os capitalistas e latifundiários e defende a anistia pelas hipotecas sobre as terras. A Comuna de Paris convida toda a França a seguir o exemplo da capital, que a sociedade se organize em comunas associando-se livremente umas com as outras. Porém, a Comuna não logra furar o bloqueio do governo francês sediado em Versalhes e das tropas prussianas nos arredores da cidade. Em maio de 1871 a Comuna de Paris é derrotada, a cidade invadida pelo exército e os fuzilamentos ceifam mais de 30 mil revolucionários. Mas a possibilidade concreta de um governo dos trabalhadores e de um futuro comunista para a humanidade entra em cena pela primeira vez na história.

Em 1872, no Congresso de Haia, na Holanda, a Primeira Internacional consegue reunir delegados de treze países europeus, da Austrália e dos Estados Unidos. O Congresso aprova a inclusão nos Estatutos do entendimento que “a conquista do poder político torna-se o grande dever do proletariado”, além da expulsão dos anarquistas liderados por Bakunin (por tentarem organizar uma sociedade secreta dentro da Internacional), e a proposta (apresentada por Marx e Engels) de mudar a sede da organização da Europa para Nova York. A derrota da Comuna e a mudança de sede marcam, na prática, o fim da AIT, dissolvida formalmente em 1876. Mas a luta pela “constituição da classe operária em partido político”, no sentido histórico, apenas havia começado.
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