Marcos Coimbra: “2012 NA POLÍTICA: O GOVERNO”
“Um governo que é avaliado como “ótimo” ou “bom” por 62% das pessoas tem muito que comemorar. Uma presidente cujo trabalho é aprovado por 78% da população, também.
São os números da pesquisa CNI/Ibope feita entre os dias 6 e 9 de dezembro, em que foram ouvidas 2002 pessoas.
Dilma chega à metade de seu mandato com avaliação melhor que a de qualquer um de seus antecessores em momento parecido. Desde quando existem dados comparáveis, ninguém obteve números semelhantes.
Fernando Henrique, por exemplo, nunca alcançou esse índice, sequer na época em que atravessava sua fase áurea. A vitória [que o Governo Itamar implantou e propiciou e FHC se apropriou] contra a inflação, a equivalência do real com o dólar, o quilo de frango que valia uma moeda, a sensação de que a economia entrava em rota de crescimento, nada disso fez com que chegasse ao número que Dilma tem hoje.
É uma lembrança que mostra quão inadequada é a interpretação que as oposições, especialmente seu braço midiático, oferecem para a popularidade do governo Dilma.
Na enésima repetição do velho chavão de que “É a economia, estúpido!”, limitam a explicação a um único fator: para elas, as pessoas comuns, que constituem a grande maioria, pensam com a barriga. Quando estão de pança cheia, aprovam o governo.
Trata-se de um equívoco baseado em puro preconceito, segundo o qual o povo só é capaz de avaliações unidimensionais. Ao contrário dos bem pensantes, que conseguiriam fazer raciocínios complexos.
Assim como a população não gostava de Fernando Henrique por vários motivos - ainda que aprovasse sua atuação no controle da inflação -, gosta de Dilma por diversas razões, mesmo reconhecendo que há políticas que não funcionam de maneira satisfatória.
O tamanho da aprovação do governo neste final de ano foi duplamente decepcionante para a oposição partidária e seus aliados. Ao invés de subir, esperavam que caísse, na confluência do desgaste da imagem do PT causado pelo julgamento do mensalão e do agravamento da situação objetiva da economia.
Dilma ultrapassou, no entanto, os percalços. Por mais que os economistas da oposição estejam pintando quadros fúnebres para o Brasil e insistam em falar em crises, as pessoas se sentem satisfeitas com o presente e otimistas em relação ao futuro.
Por maior que seja a culpabilização do PT, ninguém associa a presidente a qualquer malfeito, real ou inventado.
Não é surpresa, portanto, que tenha a vantagem que tem nas pesquisas para a eleição de 2014. Frente a quaisquer candidatos, venceria, com larga margem, a eleição no primeiro turno. Seu desempenho só é inferior ao de Lula - e por pouco.
Para tentar mudar esse quadro de favoritismo, entrou na moda o argumento de que o País “poderia estar melhor” e só não está por “incompetência gerencial do governo”.
Na opinião de nove em dez analistas da mídia conservadora, Dilma não seria a boa gerente que é apresentada.
Trata-se de tese de escassa capacidade de convencimento. Primeiro, porque as pessoas levam mais em consideração os benefícios que estão a seu alcance que os que poderiam, hipoteticamente, obter. Se acreditam que o governo vai bem, porque trocá-lo por algo que não existe?
Em segundo lugar, porque não enxergam alguém melhor que ela. Na opinião da maioria, a oposição teve sua oportunidade nos oito anos em que Fernando Henrique foi presidente e não convenceu. Ao contrário, em retrospecto, mostrou-se inferior aos petistas.
Ainda que a situação da economia piorasse no próximo ano, é difícil que afetasse significativamente a popularidade da presidente e a eleição de 2014.
Como não é isso o mais provável, são poucas as nuvens no horizonte para Dilma. Salvo as de todo dia, com as quais já se acostumou.
Cautela a presidente tem que ter é com a Copa do Mundo. Ela não será cobrada se a seleção for mal, nem aplaudida se for bem nos gramados.
Mas pagará um preço de imagem pessoal muito alto se as pessoas ficarem com o sentimento de que o Brasil perdeu a copa que mais interessa. A da organização do evento e do bom funcionamento das coisas durante sua realização.
Essa, para a população, é mais importante que o hexacampeonato.”
FONTE: escrito por Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi. Artigo publicado no “O Globo” e blog do Noblat (http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?cod_post=480527&ch=n) [Imagem do google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
São os números da pesquisa CNI/Ibope feita entre os dias 6 e 9 de dezembro, em que foram ouvidas 2002 pessoas.
Dilma chega à metade de seu mandato com avaliação melhor que a de qualquer um de seus antecessores em momento parecido. Desde quando existem dados comparáveis, ninguém obteve números semelhantes.
Fernando Henrique, por exemplo, nunca alcançou esse índice, sequer na época em que atravessava sua fase áurea. A vitória [que o Governo Itamar implantou e propiciou e FHC se apropriou] contra a inflação, a equivalência do real com o dólar, o quilo de frango que valia uma moeda, a sensação de que a economia entrava em rota de crescimento, nada disso fez com que chegasse ao número que Dilma tem hoje.
É uma lembrança que mostra quão inadequada é a interpretação que as oposições, especialmente seu braço midiático, oferecem para a popularidade do governo Dilma.
Na enésima repetição do velho chavão de que “É a economia, estúpido!”, limitam a explicação a um único fator: para elas, as pessoas comuns, que constituem a grande maioria, pensam com a barriga. Quando estão de pança cheia, aprovam o governo.
Trata-se de um equívoco baseado em puro preconceito, segundo o qual o povo só é capaz de avaliações unidimensionais. Ao contrário dos bem pensantes, que conseguiriam fazer raciocínios complexos.
Assim como a população não gostava de Fernando Henrique por vários motivos - ainda que aprovasse sua atuação no controle da inflação -, gosta de Dilma por diversas razões, mesmo reconhecendo que há políticas que não funcionam de maneira satisfatória.
O tamanho da aprovação do governo neste final de ano foi duplamente decepcionante para a oposição partidária e seus aliados. Ao invés de subir, esperavam que caísse, na confluência do desgaste da imagem do PT causado pelo julgamento do mensalão e do agravamento da situação objetiva da economia.
Dilma ultrapassou, no entanto, os percalços. Por mais que os economistas da oposição estejam pintando quadros fúnebres para o Brasil e insistam em falar em crises, as pessoas se sentem satisfeitas com o presente e otimistas em relação ao futuro.
Por maior que seja a culpabilização do PT, ninguém associa a presidente a qualquer malfeito, real ou inventado.
Não é surpresa, portanto, que tenha a vantagem que tem nas pesquisas para a eleição de 2014. Frente a quaisquer candidatos, venceria, com larga margem, a eleição no primeiro turno. Seu desempenho só é inferior ao de Lula - e por pouco.
Para tentar mudar esse quadro de favoritismo, entrou na moda o argumento de que o País “poderia estar melhor” e só não está por “incompetência gerencial do governo”.
Na opinião de nove em dez analistas da mídia conservadora, Dilma não seria a boa gerente que é apresentada.
Trata-se de tese de escassa capacidade de convencimento. Primeiro, porque as pessoas levam mais em consideração os benefícios que estão a seu alcance que os que poderiam, hipoteticamente, obter. Se acreditam que o governo vai bem, porque trocá-lo por algo que não existe?
Em segundo lugar, porque não enxergam alguém melhor que ela. Na opinião da maioria, a oposição teve sua oportunidade nos oito anos em que Fernando Henrique foi presidente e não convenceu. Ao contrário, em retrospecto, mostrou-se inferior aos petistas.
Ainda que a situação da economia piorasse no próximo ano, é difícil que afetasse significativamente a popularidade da presidente e a eleição de 2014.
Como não é isso o mais provável, são poucas as nuvens no horizonte para Dilma. Salvo as de todo dia, com as quais já se acostumou.
Cautela a presidente tem que ter é com a Copa do Mundo. Ela não será cobrada se a seleção for mal, nem aplaudida se for bem nos gramados.
Mas pagará um preço de imagem pessoal muito alto se as pessoas ficarem com o sentimento de que o Brasil perdeu a copa que mais interessa. A da organização do evento e do bom funcionamento das coisas durante sua realização.
Essa, para a população, é mais importante que o hexacampeonato.”
FONTE: escrito por Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi. Artigo publicado no “O Globo” e blog do Noblat (http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?cod_post=480527&ch=n) [Imagem do google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
GOVERNO DIVULGA RETROSPECTIVA COM AÇÕES E CONQUISTAS DE 2012
“2012 foi um ano de muitas conquistas para o Brasil, pautado, sobretudo, pelo crescimento econômico e pela inclusão social. Mesmo em tempos de crise mundial, o brasileiro presenciou o crescente investimento em programas sociais, fundamental para garantir novas oportunidades de trabalho, emprego e formação, melhoria da infraestrutura nacional e recordes na redução da pobreza extrema no país.
No sábado, o Planalto divulgou breve retrospectiva com as principais ações e conquistas realizadas ao longo do ano. Programas para a erradicação da miséria no Brasil e a elevação do país como referência no investimento em educação e esportes marcaram o ano de 2012 da presidenta Dilma Rousseff à frente do Planalto.
O destaque é para o programa “Brasil sem Miséria”, que retirou 16,4 milhões de brasileiros da pobreza extrema, e o lançamento do “Brasil Carinhoso”. Somente em outubro, foram repassados R$186,3 milhões a 2,16 milhões de famílias, beneficiando quase três milhões de crianças de 0 a 6 anos.
No “Bolsa Família”, o balanço do governo é de que foram transferidos R$17,3 bilhões aos beneficiários do programa. Mais de 50 milhões de pessoas foram beneficiadas nesse período a um custo de 0,46% do PIB brasileiro. Em 2012, 96,7% das 15,1 milhões de crianças e jovens beneficiários do “Bolsa Família” superaram a frequência escolar exigida pelo programa (agosto/setembro).
Na economia, o maior destaque é a redução da taxa média de juros nos últimos 12 meses, para 10,2%, que possibilitou a expansão do crédito e a diminuição da tarifa de energia. Os consumidores passam a pagar contas de luz 16,2% mais baratas. Para as indústrias, a tarifa vai variar de 12% a 28%, dependendo da tensão elétrica utilizada. A média deve ficar em 20% de redução.
Até outubro, foram criados 1,7 milhões de postos de trabalho no país. Somente no governo da presidenta Dilma Rousseff (desde 2010), já foram criados quatro milhões de novas vagas. O Brasil registra, atualmente, o menor nível de desemprego da história.
Em breve relato, o governo mostra que o “Programa Minha Casa, Minha Vida” entregou mais de 970 mil moradias em 2012.
SAÚDE & EDUCAÇÃO
Na saúde, o governo registra a realização de mais de 12,3 mil transplantes no SUS (Sistema Único de Saúde), aumento de 12,7% em relação a 2011. Também, aumentou 22% a quantidade de doadores de órgãos.
O “Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego” (PRONATEC) recebeu registro, no balanço anual, com a oferta de 2,5 milhões de vagas para jovens e trabalhadores em cursos profissionalizantes. E mais de 20 mil estudantes foram beneficiados em 2012 com bolsas de estudos do programa “Ciência sem Fronteiras”.
Na educação, o governo da presidenta Dilma ressalta o crescimento de 127% no número de escolas do ensino fundamental que aderiram ao programa “Mais Educação”, oferecendo atividades educacionais no contraturno.
O governo destaca, ainda, que o desmatamento da Amazônia continua em queda: 27% menor em comparação com o ano anterior.
OBRAS DO PAC
As obras de infraestrutura são consideradas outra grande conquista do país. 38,5% das obras e ações de grande complexidade do PAC 2 (Programa de Aceleração do Crescimento) foram concluídas, com investimento de R$272,7 bilhões executados em 2011 e 2012.
Dois novos estádios foram inaugurados em 2012 e outros quatro serão entregues em 2013. Estão em andamento 31 ações em 13 aeroportos: Brasília, Belo horizonte, Campinas, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Porto Alegre, Recife, Salvador, Guarulhos/SP, São Gonçalo do Amarante/RN e Galeão/Rj. Os investimentos já somam R$ 7,35 bilhões.
Além desses preparativos para a Copa do Mundo de 2014, o governo Dilma também prepara os 200 atletas olímpicos e paraolímpicos brasileiros classificados entre os 20 melhores do mundo em suas modalidades, para os jogos olímpicos do Rio em 2016.”
FONTE: portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=202307&id_secao=1) [Imagem do google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
No sábado, o Planalto divulgou breve retrospectiva com as principais ações e conquistas realizadas ao longo do ano. Programas para a erradicação da miséria no Brasil e a elevação do país como referência no investimento em educação e esportes marcaram o ano de 2012 da presidenta Dilma Rousseff à frente do Planalto.
O destaque é para o programa “Brasil sem Miséria”, que retirou 16,4 milhões de brasileiros da pobreza extrema, e o lançamento do “Brasil Carinhoso”. Somente em outubro, foram repassados R$186,3 milhões a 2,16 milhões de famílias, beneficiando quase três milhões de crianças de 0 a 6 anos.
No “Bolsa Família”, o balanço do governo é de que foram transferidos R$17,3 bilhões aos beneficiários do programa. Mais de 50 milhões de pessoas foram beneficiadas nesse período a um custo de 0,46% do PIB brasileiro. Em 2012, 96,7% das 15,1 milhões de crianças e jovens beneficiários do “Bolsa Família” superaram a frequência escolar exigida pelo programa (agosto/setembro).
Na economia, o maior destaque é a redução da taxa média de juros nos últimos 12 meses, para 10,2%, que possibilitou a expansão do crédito e a diminuição da tarifa de energia. Os consumidores passam a pagar contas de luz 16,2% mais baratas. Para as indústrias, a tarifa vai variar de 12% a 28%, dependendo da tensão elétrica utilizada. A média deve ficar em 20% de redução.
Até outubro, foram criados 1,7 milhões de postos de trabalho no país. Somente no governo da presidenta Dilma Rousseff (desde 2010), já foram criados quatro milhões de novas vagas. O Brasil registra, atualmente, o menor nível de desemprego da história.
Em breve relato, o governo mostra que o “Programa Minha Casa, Minha Vida” entregou mais de 970 mil moradias em 2012.
SAÚDE & EDUCAÇÃO
Na saúde, o governo registra a realização de mais de 12,3 mil transplantes no SUS (Sistema Único de Saúde), aumento de 12,7% em relação a 2011. Também, aumentou 22% a quantidade de doadores de órgãos.
O “Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego” (PRONATEC) recebeu registro, no balanço anual, com a oferta de 2,5 milhões de vagas para jovens e trabalhadores em cursos profissionalizantes. E mais de 20 mil estudantes foram beneficiados em 2012 com bolsas de estudos do programa “Ciência sem Fronteiras”.
Na educação, o governo da presidenta Dilma ressalta o crescimento de 127% no número de escolas do ensino fundamental que aderiram ao programa “Mais Educação”, oferecendo atividades educacionais no contraturno.
O governo destaca, ainda, que o desmatamento da Amazônia continua em queda: 27% menor em comparação com o ano anterior.
OBRAS DO PAC
As obras de infraestrutura são consideradas outra grande conquista do país. 38,5% das obras e ações de grande complexidade do PAC 2 (Programa de Aceleração do Crescimento) foram concluídas, com investimento de R$272,7 bilhões executados em 2011 e 2012.
Dois novos estádios foram inaugurados em 2012 e outros quatro serão entregues em 2013. Estão em andamento 31 ações em 13 aeroportos: Brasília, Belo horizonte, Campinas, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Porto Alegre, Recife, Salvador, Guarulhos/SP, São Gonçalo do Amarante/RN e Galeão/Rj. Os investimentos já somam R$ 7,35 bilhões.
Além desses preparativos para a Copa do Mundo de 2014, o governo Dilma também prepara os 200 atletas olímpicos e paraolímpicos brasileiros classificados entre os 20 melhores do mundo em suas modalidades, para os jogos olímpicos do Rio em 2016.”
FONTE: portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=202307&id_secao=1) [Imagem do google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
O ENIGMA POLÍTICO ARGENTINO
Por Emir Sader
“Se a situação argentina tem suas complexidades, ela se torna completamente incompreensível à luz da cobertura que a mídia brasileira – que se pauta pela mídia de direita da Argentina – faz. Não conseguiram entender por que Nestor Kirchner e não Carlos Menem se elegeu presidente, por que Cristina se elegeu como sucessora dele e se reelegeu em seguida. É tal a visão catastrófica que se transmite da Argentina que não conseguem dar conta de por que Cristina se reelegeu no primeiro turno.
A Argentina sofreu uma das modalidades mais radicais de neoliberalismo na América Latina. Depois de duas crises de hiperinflação, Menem impôs uma solução radical e artificial ao problema: por um decreto, se estabelecia a paridade entre o peso e o dólar. A Argentina renunciava a ter política monetária, ficando a cotação da sua moeda atrelada à do dólar, definida pelo “Federal Reserve” dos EUA. Não se emitiria peso se não houvesse entrada de dólares. Subitamente, se elevou o poder aquisitivo da moeda e dos argentinos, de maneira totalmente artificial, numa bomba de tempo que não poderia demorar para explodir.
Os candidatos temiam prometer que terminariam com a paridade, porque todo argentino sabia que teria os seus pesos enormemente desvalorizados, porque os depositava considerando que teriam o correspondente em dólares. Se podia comprar carros em prazos longos, sem juros, com a fantasia da paridade, mas a dívida era assinada em dólares. Ainda mais que todos foram se endividando, apoiados na paridade e na confiança de que esse esquema não seria alterado.
Menem, como todos os presidentes neoliberais latino-americanos, saiu derrotado e deixou a bomba de tempo explodir nas mãos de Fernando de la Rua, do Partido Radical. A paridade terminou, houve uma espécie de rebelião popular cobrando dos bancos seus depósitos, que tinham passado da paridade com o dólar, para 4 a 1. De la Rua saiu rapidamente de helicóptero da Casa Rosada, depois de reprimir manifestações em Buenos Aires, com 27 mortos no centro da cidade.
Depois da instabilidade institucional, com vários pessoas sucedendo-se na presidência em poucos dias, nas eleições Menem ganhou no primeiro turno, prometendo que dolarizaria totalmente a economia argentina (o que levaria ao desastre a Argentina e inviabilizaria qualquer processo de integração da região). Diante da evidente derrota para Nestor Kirchner no segundo turno – pelos apoios que este recebeu dos outros candidatos -, Menem se retirou e Kirchner foi eleito.
Kirchner conseguiu recuperar a Argentina do maior desastre econômico e social da sua história, fazendo com que a economia crescesse a ritmos anuais de 6 a 9% ao ano, durante cerca de 8 anos. Mas arrastou problemas da herança do Menem.
Entre esses, uma dívida descomunal e a privatização de todo o patrimônio público – entre ele, o da YPF, que tinha obtido a autossuficiência em petróleo para a Argentina. O governo Kirchner impôs a renegociação dos papéis da dívida, que foi aceito por grande parte dos seus proprietários. Mas os restantes 8% bloqueiam, até hoje, o acesso da Argentina a créditos internacionais.
Outra herança foi o déficit energético, que fez com que o governo passasse a subsidiar o consumo de energia e a importá-la, o que se tornou peso brutal nos gastos públicos.
Mas a Argentina retomou ritmos altos de crescimento – mesmo se agora muito dependente da exportação de soja – e os Kirchner consolidaram os apoios populares a seus governos, mesmo diante de ofensivas da direita – como a dos proprietários de soja, quando o governo decretou aumento nos impostos sobre exportação.
A conjuntura atual é a condensação de uma serie de questões pendentes. Por exemplo: a manifestação de 8 de novembro passado reuniu, basicamente, setores da classe média da cidade de Buenos Aires, com os lemas contrários à reeleição da Cristina e contra a aplicação da Lei de Meios. No ano que vem, haverá eleições parciais para o Congresso. Se Cristina obtiver 2/3 dos votos – objetivo difícil – poderá submeter a revogação da Constituição, para se candidatar a um terceiro mandato.
Caso não o consiga, se abre cenário muito complexo, porque não há um candidato à sua sucessão indiscutível entre as forças que a apoiam e pode se abrir disputa que dividirá, ainda mais, o peronismo. Um candidato conservador dentro do peronismo – Scioli, governador da província de Buenos Aires – se lançou e tem o apoio de setores opositores a Cristina dentro do peronismo.
A Lei de Meios tinha no dia 7 de dezembro uma data chave, porque terminava o prazo do recurso que o grupo Clarín havia conseguido na Justiça para adiar a aplicação da lei de democratização, pela qual o grupo terá que se desfazer da longa lista de canais a cabo que tem – 254 – para ficar com 24, que é o que permite o caráter antimonopólico da nova lei.
Seguiu-se uma greve e outras manifestações protagonizada pelo setor da CGT que se opõe ao governo de Cristina – dirigido por Moyano pelo setor da CTA de ultraesquerda, além da Federação Agrária, que congrega os produtores de soja. Com reivindicações basicamente salariais, mas com um tom político fortemente opositor, apontando para um bloco de forças que pode vir a se coesionar para tentar bloquear os 2/3 que Cristina busca no Parlamento e, depois lançar um candidato – talvez o próprio Scioli – em 2014.
A economia argentina perde fôlego, vulnerabilizada pelas dificuldades de financiamento externo, pela diminuição do ritmo de crescimento do Brasil – seu principal mercado – pela inflação real, pelos déficits orçamentários – em boa parte advindos dos subsídios à energia. O clima de bonança que cercou a reeleição de Cristina – que além disso conseguiu promover um processo de mobilização de setores jovens do peronismo, a partir da morte de Nestor e das comemorações do bicentenário do país – passou.
Uma espécie de inferno astral abateu-se sobre o governo, somando-se às mobilizações da oposição, a apropriação de um navio argentino em Gana por um mandato de uma instância judicial norte-americana, pelo não pagamento de parte da dívida argentina, além de uma ordem de uma outra instância judicial dos EUA, que buscava obrigar o governo argentino a, primeiro, pagar esse monto pendente, antes de seguir pagando as cotas aos que aceitaram renegociar a dívida.
Essas duas últimas questões foram superadas - pelo menos temporariamente. O governo intensificou a ofensiva contra o Clarín, tudo indica que possa colocar em prática a desmonopolização do grupo, mesmo se os prazos se alongam. Ao mesmo tempo, recuperou para o Estado o espaço que ocupava a “Sociedade Rural Argentina”, depois de ter nacionalizado a YPF, privatizada pelo governo Menem.
Os embates entre o governo e a oposição se seguirão em várias frentes: a externa, aquela aglutinada por forças sindicais e a do Clarín e os setores de direita que apoiam a esse grupo. Se a soma das frentes causa problemas do governo, sua heterogeneidade faz com que tenham dificuldade de traduzir em força política unificada por uma candidatura presidencial competitiva.
Caso Cristina não possa concorrer e o governador da província de Buenos Aires unifique as forças hoje dentro e fora o governo, especialmente do campo peronista, a sucessão argentina de 2014 será uma dura prova para a continuidade do governos dos Kirchner. Uma prova para a capacidade de Cristina de construir um sucessor que possa dar continuidade aos governos que resgataram a Argentina do caos herdado já há quase 10 anos. O primeiro capítulo dessa disputa dominará o cenário político de 2013: as eleições parlamentares e a possibilidade do governo obter 2/3, reformar a Constituição e Cristina se candidatar a um terceiro mandato. Essa disputa define o cenário da sucessão presidencial de 2014.”
FONTE: escrito pelo cientista político Emir Sader no site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=1163).
“Se a situação argentina tem suas complexidades, ela se torna completamente incompreensível à luz da cobertura que a mídia brasileira – que se pauta pela mídia de direita da Argentina – faz. Não conseguiram entender por que Nestor Kirchner e não Carlos Menem se elegeu presidente, por que Cristina se elegeu como sucessora dele e se reelegeu em seguida. É tal a visão catastrófica que se transmite da Argentina que não conseguem dar conta de por que Cristina se reelegeu no primeiro turno.
A Argentina sofreu uma das modalidades mais radicais de neoliberalismo na América Latina. Depois de duas crises de hiperinflação, Menem impôs uma solução radical e artificial ao problema: por um decreto, se estabelecia a paridade entre o peso e o dólar. A Argentina renunciava a ter política monetária, ficando a cotação da sua moeda atrelada à do dólar, definida pelo “Federal Reserve” dos EUA. Não se emitiria peso se não houvesse entrada de dólares. Subitamente, se elevou o poder aquisitivo da moeda e dos argentinos, de maneira totalmente artificial, numa bomba de tempo que não poderia demorar para explodir.
Os candidatos temiam prometer que terminariam com a paridade, porque todo argentino sabia que teria os seus pesos enormemente desvalorizados, porque os depositava considerando que teriam o correspondente em dólares. Se podia comprar carros em prazos longos, sem juros, com a fantasia da paridade, mas a dívida era assinada em dólares. Ainda mais que todos foram se endividando, apoiados na paridade e na confiança de que esse esquema não seria alterado.
Menem, como todos os presidentes neoliberais latino-americanos, saiu derrotado e deixou a bomba de tempo explodir nas mãos de Fernando de la Rua, do Partido Radical. A paridade terminou, houve uma espécie de rebelião popular cobrando dos bancos seus depósitos, que tinham passado da paridade com o dólar, para 4 a 1. De la Rua saiu rapidamente de helicóptero da Casa Rosada, depois de reprimir manifestações em Buenos Aires, com 27 mortos no centro da cidade.
Depois da instabilidade institucional, com vários pessoas sucedendo-se na presidência em poucos dias, nas eleições Menem ganhou no primeiro turno, prometendo que dolarizaria totalmente a economia argentina (o que levaria ao desastre a Argentina e inviabilizaria qualquer processo de integração da região). Diante da evidente derrota para Nestor Kirchner no segundo turno – pelos apoios que este recebeu dos outros candidatos -, Menem se retirou e Kirchner foi eleito.
Kirchner conseguiu recuperar a Argentina do maior desastre econômico e social da sua história, fazendo com que a economia crescesse a ritmos anuais de 6 a 9% ao ano, durante cerca de 8 anos. Mas arrastou problemas da herança do Menem.
Entre esses, uma dívida descomunal e a privatização de todo o patrimônio público – entre ele, o da YPF, que tinha obtido a autossuficiência em petróleo para a Argentina. O governo Kirchner impôs a renegociação dos papéis da dívida, que foi aceito por grande parte dos seus proprietários. Mas os restantes 8% bloqueiam, até hoje, o acesso da Argentina a créditos internacionais.
Outra herança foi o déficit energético, que fez com que o governo passasse a subsidiar o consumo de energia e a importá-la, o que se tornou peso brutal nos gastos públicos.
Mas a Argentina retomou ritmos altos de crescimento – mesmo se agora muito dependente da exportação de soja – e os Kirchner consolidaram os apoios populares a seus governos, mesmo diante de ofensivas da direita – como a dos proprietários de soja, quando o governo decretou aumento nos impostos sobre exportação.
A conjuntura atual é a condensação de uma serie de questões pendentes. Por exemplo: a manifestação de 8 de novembro passado reuniu, basicamente, setores da classe média da cidade de Buenos Aires, com os lemas contrários à reeleição da Cristina e contra a aplicação da Lei de Meios. No ano que vem, haverá eleições parciais para o Congresso. Se Cristina obtiver 2/3 dos votos – objetivo difícil – poderá submeter a revogação da Constituição, para se candidatar a um terceiro mandato.
Caso não o consiga, se abre cenário muito complexo, porque não há um candidato à sua sucessão indiscutível entre as forças que a apoiam e pode se abrir disputa que dividirá, ainda mais, o peronismo. Um candidato conservador dentro do peronismo – Scioli, governador da província de Buenos Aires – se lançou e tem o apoio de setores opositores a Cristina dentro do peronismo.
A Lei de Meios tinha no dia 7 de dezembro uma data chave, porque terminava o prazo do recurso que o grupo Clarín havia conseguido na Justiça para adiar a aplicação da lei de democratização, pela qual o grupo terá que se desfazer da longa lista de canais a cabo que tem – 254 – para ficar com 24, que é o que permite o caráter antimonopólico da nova lei.
Seguiu-se uma greve e outras manifestações protagonizada pelo setor da CGT que se opõe ao governo de Cristina – dirigido por Moyano pelo setor da CTA de ultraesquerda, além da Federação Agrária, que congrega os produtores de soja. Com reivindicações basicamente salariais, mas com um tom político fortemente opositor, apontando para um bloco de forças que pode vir a se coesionar para tentar bloquear os 2/3 que Cristina busca no Parlamento e, depois lançar um candidato – talvez o próprio Scioli – em 2014.
A economia argentina perde fôlego, vulnerabilizada pelas dificuldades de financiamento externo, pela diminuição do ritmo de crescimento do Brasil – seu principal mercado – pela inflação real, pelos déficits orçamentários – em boa parte advindos dos subsídios à energia. O clima de bonança que cercou a reeleição de Cristina – que além disso conseguiu promover um processo de mobilização de setores jovens do peronismo, a partir da morte de Nestor e das comemorações do bicentenário do país – passou.
Uma espécie de inferno astral abateu-se sobre o governo, somando-se às mobilizações da oposição, a apropriação de um navio argentino em Gana por um mandato de uma instância judicial norte-americana, pelo não pagamento de parte da dívida argentina, além de uma ordem de uma outra instância judicial dos EUA, que buscava obrigar o governo argentino a, primeiro, pagar esse monto pendente, antes de seguir pagando as cotas aos que aceitaram renegociar a dívida.
Essas duas últimas questões foram superadas - pelo menos temporariamente. O governo intensificou a ofensiva contra o Clarín, tudo indica que possa colocar em prática a desmonopolização do grupo, mesmo se os prazos se alongam. Ao mesmo tempo, recuperou para o Estado o espaço que ocupava a “Sociedade Rural Argentina”, depois de ter nacionalizado a YPF, privatizada pelo governo Menem.
Os embates entre o governo e a oposição se seguirão em várias frentes: a externa, aquela aglutinada por forças sindicais e a do Clarín e os setores de direita que apoiam a esse grupo. Se a soma das frentes causa problemas do governo, sua heterogeneidade faz com que tenham dificuldade de traduzir em força política unificada por uma candidatura presidencial competitiva.
Caso Cristina não possa concorrer e o governador da província de Buenos Aires unifique as forças hoje dentro e fora o governo, especialmente do campo peronista, a sucessão argentina de 2014 será uma dura prova para a continuidade do governos dos Kirchner. Uma prova para a capacidade de Cristina de construir um sucessor que possa dar continuidade aos governos que resgataram a Argentina do caos herdado já há quase 10 anos. O primeiro capítulo dessa disputa dominará o cenário político de 2013: as eleições parlamentares e a possibilidade do governo obter 2/3, reformar a Constituição e Cristina se candidatar a um terceiro mandato. Essa disputa define o cenário da sucessão presidencial de 2014.”
FONTE: escrito pelo cientista político Emir Sader no site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=1163).
EUA SOB COMANDO DE RUPERT MURDOCH
Rupert Murdoch
Carl Bernstein
POR QUE A MÍDIA DOS EUA IGNOROU A TENTATIVA DE MURDOCH DE ASSALTAR A PRESIDÊNCIA?
“Periódicos como o ‘Washington Post’ subestimaram o caso por medo do dono da ‘News Corporation’ ou por falta de discernimento? A gravação da conversa entre o general e o editor é um documento formidável, um testemunho do desembaraço com que Murdoch passa por cima da ordem civil e política estadunidense sem nem se preocupar com as finezas tradicionais ou fingir independência e honestidade jornalística.
Por Carl Bernstein, no inglês “The Guardian”
Finalmente, temos evidência irrefutável do último e mais audacioso atentado de Rupert Murdoch – frustrado, ainda bem, pelas circunstâncias - contra as instituições democráticas estadunidenses. O assalto tinha escala similar ao sequestro e corrupção que o magnata da mídia realizou nas principais instituições democráticas da Grã-Bretanha.
No caso americano, o objetivo de Murdoch parece não ter sido menor do que usar seu império midiático – especialmente a “Fox News” – para financiar e apoiar a candidatura do general David Petraeus à presidência nas eleições deste ano.
No primeiro semestre de 2011, menos de dois meses antes da revelação do papel central que Murdoch desempenhou no escândalo envolvendo seus periódicos britânicos, o criador e presidente da “Fox News”, Roger Ailes, enviou uma emissária ao Afeganistão para persuadir Petraeus a recusar a oferta, feita pelo presidente Obama, de tornar-se diretor da CIA e, em vez disso, concorrer à nomeação à presidência do Partido Republicano, com a promessa de ser bancado por Murdoch. O próprio Ailes renunciaria ao cargo de presidente da “Fox News” para comandar a campanha, de acordo com a conversa entre Petraeus e a emissária Kathleen T. McFarland, uma “analista” da “Fox News” e membro do “Conselho de Segurança Nacional” em três administrações republicanas.
Tudo isso é revelado numa gravação do encontro entre Petraeus e McFarland obtida por Bob Woodward, cuja descrição da conversa, acompanhada pelo áudio da gravação, foi publicada no “Washington Post”. Curiosamente, a reportagem foi impressa na seção de “Estilo”, e não na primeira página. Na internet, ela foi veiculada também abaixo do logo “Estilo”, no dia 3 de dezembro.
De fato, tão desesperador quanto o menosprezo que Ailes e Murdoch nutrem por valores jornalísticos e por um processo eleitoral transparente, e tão marcante quanto a avidez do emissário em prometer o apoio da “Fox” a Petraeus, tem sido a falta de interesse da imprensa e dos políticos norte-americanos sobre o ocorrido. Não se sabe se o desinteresse é causado por medo do poderio de Murdoch e Ailes ou da pouca surpresa que traz a postura dos magnatas da mídia.
O tom da reação da mídia foi dado desde que se falou do caso pela primeira vez: o “Post” relegou a matéria à seção referente a fofocas sobre celebridades. “Bob conseguiu um furo importante, uma matéria barulhenta, perfeita para a seção “Estilo”. Uma primeira página não se justificaria”, disse Liz Spayd, editora-chefe do “Washington Post”, quando perguntada sobre o ímpar posicionamento da matéria na edição do dia 3 de dezembro.
Matéria barulhenta? A primeira página “não se justificaria”? Ninguém poderia imaginar tamanha falha de um dos predecessores de Spayd, até em função da qualidade do registro que o “Post” tinha em mãos.
“Avise a Ailes se eu me candidatar”, anuncia Petraeus em gravação digital cristalina, “mas eu não o farei. Se um dia eu o fizer, eu me lembrarei da oferta... ele disse que saria da “Fox” e bancaria minha candidatura...”
McFarland esclareceu as condições: “é o patrão que vai financiar. Roger [Ailes] só vai dirigir. E o resto de nós estará na organização“, confirmando, assim, o que os críticos da “Fox News” sempre mantiveram sobre a conduta do canal de notícias.
Uma coisa deve ser sublinhada aqui: se a emissária trabalhasse para o presidente da “NBC”, para o editor do “New York Times” ou do “Washington Post”, a gritaria seria enorme, principalmente da “Fox News” e da América republicana/Tea Party, e só se abrandaria com uma investigação por parte do Congresso e a renúncia dos editores do periódico ou canal de tevê. Ou até que houvesse evidência plausível e convincente de que tudo fosse mentira. E, obviamente, o caso permaneceria na primeira página e nos noticiários vespertinos durante semanas.
A gravação da conversa entre o general e o editor é um documento formidável, um testemunho do desembaraço com que Murdoch passa por cima da ordem civil e política estadunidense sem nem se preocupar com as finezas tradicionais ou fingir independência e honestidade jornalística. O caso Ailes/Petraeus esclarece que os objetivos de Murdoch nos EUA eram tão abomináveis e pérfidos quanto no caso das escutas telefônicas, que aniquilou qualquer dúvida sobre a capacidade de Murdoch de corromper qualquer um dos elementos essenciais da ordem civil britânica – a imprensa, os políticos e a polícia.
Murdoch e Ailes ergueram um império midiático de poder incomparável nas culturas norte-americana e britânica. Mas, ao invés de exercer tal poder de maneira judiciosa ou melhorar os padrões jornalísticos com seus recursos intermináveis, os dois, irrefletidamente, investem numa agenda sensacionalista, em controvérsias forjadas e em messianismo ideológico. A gravação é uma evidência poderosa da metodologia e do alcance do império de Murdoch.
A corrupção por Murdoch de instituições democráticas fundamentais em ambos os lados do Atlântico é um dos casos de maior importância e alcance político e cultural dos últimos 30 anos, uma narrativa em curso sem igual. Como no caso de Richard Nixon, muita atenção foi dirigida à necessidade de encontrar provas concretas do que já não era mais uma dúvida, isto é, que os instrumentos elementares da democracia (a presidência no caso Nixon, os privilégios da mídia livre no caso Murdoch) foram empregados de maneira equivocada e abusiva para os fins particulares daqueles que deveriam servir o bem comum.
No caso Nixon, o sistema funcionou. Suas ações foram investigadas pelo Congresso, o sistema judiciário sustentou que nem o presidente dos Estados Unidos da América estava acima da lei, e ele foi forçado a renunciar ou enfrentar um impeachment. As democracias britânica e estadunidense não se saíram tão bem com Murdoch, cujo poder e corrupção não foi reprimido por um terço de século.
A decisão mais importante que um jornalista toma é a de julgar se algo é ou não notícia. Talvez, nenhuma história tenha sido tão evitada por nós quanto a da marcha de Murdoch sobre a democracia. Quando a cobertura das escutas telefônicas, na qual o “Guardian” insistiu por meses, atingiu massa crítica, um ex-capanga de Murdoch disse o seguinte: “este escândalo e todas as suas implicações não poderiam ter ocorrido em outro lugar. Só poderia ter sido na órbita de Murdoch. As delinquências do “News of the World” foram cometidas em escala industrial. Foi Murdoch quem inventou e estabeleceu esta cultura de redação, na qual se deve fazer o que for preciso para conseguir uma matéria e na qual os fins sempre justificam os meios”.
A fita obtida por Bob Woodward deveria ser o desfecho da história de Murdoch, tanto no Reino Unido quanto nos EUA, para que ficasse claro que nenhuma instituição, nem mesmo o presidente norte-americano, está acima da democracia. Se Murdoch financiasse uma campanha presidencial exitosa para Petraeus com “o resto de nós na organização”, como disse Kathleen McFarland, ele teria demonstrado controle sobre todas as instituições democráticas norte-americanas, controle ainda mais seguro do que o exercido sobre a Grã-Bretanha.
Felizmente, Petraeus não desejava a presidência. O general estava contente com a ideia de tornar-se diretor da CIA.
“Está tudo montado”, disse a emissária referindo-se a Ailes, Murdoch e “Fox News”. “Nunca vai acontecer”, respondeu Petraeus. ‘Você sabe que nunca vai acontecer, não vai mesmo. Minha mulher pediria divórcio’.”
FONTE: escrito por Carl Bernstein, no jornal inglês “The Guardian”. Artigo publicado no site “Carta Maior” com tradução de André Cristi (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21453
COMPLEMENTAÇÃO
O SISTEMA POLÍTICO DOS EUA SOB COMANDO DE RUPERT MURDOCH
Rupert Murdoch
Por Jonathan Cook, no “Commondreams”, dos EUA
“Uma conversa gravada mostra que, no primeiro semestre de 2011, Murdoch pediu a Roger Ailes, chefe da ‘Fox News’, que fosse ao Afeganistão persuadir o general David Petraeus, antigo comandante das forças militares norte-americanas, a concorrer à presidência como candidato do Partido Republicano nas eleições deste ano. Murdoch prometeu financiar a campanha de Petraeus e apoiar o general com o aparato midiático da ‘Fox News’.
Os esforços de Murdoch não adiantaram porque Petraus não quis concorrer. “Diga a Ailes que se um dia eu concorrer”, diz Petraeus na gravação, “apesar de que não vou, mas se um dia eu concorrer a proposta será aceita”.
O caso de Petraeus é perturbador para a imprensa, justamente porque desmonta a fachada democrática da política norte-americana, uma imagem construída cuidadosamente para que o eleitorado estadunidense se convença de que decide sobre o futuro político do país.
Bernstein está corretamente horrorizado não só com o ataque frontal à democracia mas com a atitude do “Washington Post” na publicação da matéria. O furo jornalístico foi enterrado na seção de “Estilo” do jornal e a editora do “Post” disse que a reportagem, apesar de “barulhenta”, não “justificaria uma primeira página”.
Alinhando-se à editora, o resto da grande mídia norte-americana ignorou ou menosprezou a reportagem.
Nós podemos assumir que Bernstein escreveu seu artigo sob pedido de Woodward, que assim demonstraria de forma encoberta o ultraje a que foi sujeito por seu jornal. A reportagem, com efeito, deveria causar um escândalo político. A dupla, presumivelmente, esperava que a história incitasse audiências no Congresso sobre o abuso de poder cometido por Murdoch, assim como aconteceu na Grã-Bretanha, onde investigações revelaram como o magnata controlava os políticos e a polícia britânicos.
Como observa Bernstein, “a corrupção por Murdoch de instituições democráticas fundamentais em ambos os lados do Atlântico é um dos casos de maior importância e alcance político e cultural dos últimos 30 anos, uma narrativa em curso sem igual.”
Bernstein só é incapaz de compreender porque os manda-chuvas da mídia não vêem as coisas como ele vê. Ele demonstra grande desalento perante “a falta de interesse da imprensa e dos políticos norte-americanos sobre o ocorrido. Não se sabe se o desinteresse é causado por medo do poderio de Murdoch e Ailes ou da pouca surpresa que traz a postura dos magnatas da mídia.”
Na verdade, nenhuma das explicações de Bernstein para tamanha falha é convincente.
Uma razão bastante mais provável para a aversão ao caso Ailes/Petraeus por parte da mídia norte-americana é que o caso oferece perigo à barreira construída pela mesma mídia que, com sucesso, oculta a cômoda relação entre as corporações (possuidoras da mídia) e os políticos do país.
O caso revela a charada da disputa eleitoral. Poderosas elites manipulam o sistema com dinheiro e a mídia que eles comandam reduzem a escolha dos eleitores a dois candidatos quase idênticos. Esses candidatos sustentam as mesmas opiniões em 80% das questões. Mesmo as diferenças são resolvidas por trás dos panos pelas elites, seja por meio de lobistas, da mídia ou de Wall Street.
A reportagem de Woodward não prova que Murdoch ameaça a democracia. Ela revela a absoluta dominação do sistema político norte-americano pelas grandes corporações. Essas corporações controlam o que vemos e ouvimos e incluem, obviamente, os donos do “Washington Post”.
Triste é notar que os jornalistas da mídia corporativa são incapazes de enxergar além dos parâmetros que os donos da mídia impõem. E isso inclui mesmo os mais talentosos da categoria: Woodward e Bernstein.”
FONTE (da complementação): escrito por Jonathan Cook, no “Commondreams”. O autor venceu o prêmio de jornalismo “Martha Gellhorn” em 2011. Seus dois últimos livros são sobre a Palestina. Artigo transcrito no site “Carta Maior” com tradução de André Cristi (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21452).
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