O que o exército de Israel não quer que saibamos


por Noam Sheizaf no Amálgama* – Os vídeos do navio Mavi Marmara divulgados pelas Forças de Defesa de Israel (FDI) estão dando o tom das notícias em Israel durante as últimas 48 horas. O efeito tem sido espantoso: eles silenciaram todas as perguntas sobre a operação e fizeram o público se alinhar junto ao governo e o exército, como mostra uma pesquisa do Maariv. Eles fizeram com que israelenses saíssem às ruas, protestando em frente à embaixada da Turquia e em protestos menores pelo país.

Mas, por mais incrível que pareça, já fazem quase três dias que o exército atacou o navio e ainda não sabemos nada sobre o ataque propriamente, fora o fato de que alguns homens no Mavi Marmara agrediram os soldados quando estes desceram por helicóptero no convés superior. Também temos razões para acreditar que esse ataque foi planejado com antecedência, mas que armas de fogo não estavam envolvidas.

Em outras palavras: sabemos apenas o que Israel quis que soubéssemos.

Neste ponto é extremamente importante dizer o que não sabemos: Não sabemos os nomes e nacionalidades dos passageiros mortos. Não sabemos por certo quantas pessoas foram feridas. Não sabemos onde elas foram mortas, quando e como morreram. Não sabemos se e quando foi prestado tratamento médico a essas pessoas. Haviam câmeras de segurança no convés, mas Israel não nos mostra o que foi filmado, exceto o material que serve a seus propósitos. Os clipes de visão noturna liberados pelo exército acabam bem antes dos tiros começarem.

Não sabemos o que aconteceu antes dos civis agredirem os soldados. Alguns passageiros alegaram que os soldados abriram fogo antes mesmo de pisarem no navio, mas não sabemos se isso é verdade.

Mais importante, não sabemos nada sobre a batalha em si – se foi mesmo uma batalha. Parece ter sido uma longa batalha, já que temos uma rápida gravação em que pode-se ouvir a deputada israelense Hanin Zoabi pedindo por ajuda e implorando aos soldados em inglês e hebraico para que parassem de atirar (é o segundo áudio nessa página). A essa altura, já haviam passageiros feridos e podemos supor que os ataques aos soldados tivesse parado. Mas o tiroteio continuou.

Algumas dessas informações poderiam ter sido disponibilizadas se as FDI não tivessem confiscado todo o material do Mavi Marmara. O que é ainda pior é que o exército está agora editando os filmes e os liberando de forma que se encaixem em sua própria narrativa. Esse filme, do convés superior, parece ter sido feito por um passageiro ou membro da tripulação. O filme abaixo, mostrando os passageiros se preparando para o ataque israelense, foi feito pela câmera de segurança do navio.

Há um ótimo post no blog The Lede, do New York Times, sobre os clipes liberados pelas FDI. Nele, Robert Mackey observa que as imagens que o exército liberou carecem de contexto. Minha única observação é que elas foram deliberadamente tiradas de contexto.

A forma como Israel está retendo informação é muito preocupante. Se o exército não tem nada a esconder, por que não liberar o material? Naturalmente, Israel também está se recusando a tratar das perguntas maiores, tais como por que a flotilha foi atacada em águas internacionais, e, se esse foi o caso, se os passageiros não tinham o direito de resistir à tentativa dos soldados de adentrarem seu navio.

O pior efeito dessa guerra de relações públicas ocorre no público israelense, que agora vê toda a flotilha como um empreendimento terrorista. Pode-se ver os efeitos desse humor nacionalista na maneira com que os membros do Knesset quase atacaram fisicamente a deputada Zoabi hoje (o vídeo, aqui). De fato, a campanha do governo foi tão bem sucedida que muitos protestaram após a liberação dos passageiros detidos, alegando que os terroristas deveriam ser “levados à justiça”.

Tudo isso leva à conclusão de que apenas uma investigação internacional poderia nos dar alguma luz sobre os eventos no Mavi Marmara. Mesmo assim, as chances das FDI darem acesso completo aos materiais disponíveis e aos soldados são pequenas, na melhor das hipóteses.

* Noam Sheizaf, Tel Aviv, nasceu em 1974, serviu por cinco anos no exército israelense e hoje é jornalista, tendo trabalhado em veículos como Ynet.co.il e Maariv. Seu blog em inglês, Promised Land, é parceiro do Amálgama, cedendo conteúdo para tradução e reprodução. [tradução: Daniel Lopes]

Leia também DANDO NOME AOS BOIS: O QUE HOUVE FOI 'PIRATARIA' E 'SEQUESTRO' e Robert FisK: O jornalismo e as palavras do poder

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Como fazer um dossiê em dez minutos


O jornal O Globo publicou que um "suposto dossiê" contra a filha de José Serra motivou crise na campanha de Dilma. Ontem, Serra disse que a responsabilidade é da candidata do PT, e mais uma vez o Globo fala de crise. A campanha de Dilma reagiu, negando o fato e a tentativa do tucano de criar factóides.

Sei que muitos ficaram curiosos pelo conteúdo do "suposto dossiê", já que os jornais não se preocuparam com esta informação. Num esforço de utilidade pública, nosso blog ensina o passo-a-passo para se fazer um dossiê contra Serra em pouquíssimos minutos:

1) Use o Google. É ferramenta poderosa para se fazer dossiês. (Não espalhe, poucos a conhecem, guarde para você a informação)

2) Na caixa de pesquisa digite dois nomes entre aspas: "Verônica Serra" e "Daniel Dantas".

3) Nos milhares de resultados, você verá que algumas informações se repetem: a empresa Decidir.com, Inc. registrada em Miami no dia 3 de maio de 2000, sob o número P00000044377, tem como sócias Verônica Dantas Rodemburg, irmã de Daniel Dantas, do Banco Opportunity, e Verônica Allende Serra, filha do governador José Serra. A empresa tem filiais na Argentina, Chile, México, Venezuela e Brasil. Seu site oferecia oportunidades de negócios, inclusive na área de licitações públicas no Brasil.

4) Junte os documentos mais importantes que comprovam o fato, como, por exemplo, o registro da empresa no Departamento de Estado da Flórida.

5) Escolha uma capa bonita e está pronto o seu dossiê.

Há outras maneiras de se fazer o mesmo, não com necessariamente mais trabalho. Sugiro consultar um especialista no assunto, o jornalista Diogo Mainardi. Em coluna de 8/4/2009, acusou o irmão do ministro Franklin Martins de se locupletar na ANP com royaties do petróleo. A mídia o repercutiu durante semanas. O que foi provado? Apenas que a fonte do jornalista era um rápido "dossiê" preparado por um ex-araponga da ANJ, repleto de recortes de jornais.

Tucanos ficam aloprados com a palavra dossiê.

Em tempo: se é pra derrubar Serra, e se isso ainda será necessário, o melhor seria fazer um dossiê sobre Ricardo Sérgio de Oliveira.
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A difícl viagem aos anos de chumbo


Meu amigo Luiz Sérgio Henriques, editor da revista eletrônica Gramsci e o Brasil, publicou dia 31 de maio passado um belo artigo no Estadão. Belo na forma, antes de tudo, porque seu autor é um estilista da palavra. E belo na postura, porque se trata de uma peça corajosa, que não teme enfrentar com realismo uma questão difícil, delicada e estratégica: a do ajuste de contas com os mortos, torturados e desaparecidos durante os anos da ditadura militar.

Já faz tempo que diferentes setores da opinião democrática brasileira tentam passar a limpo os crimes cometidos naqueles anos de chumbo. Trata-se, como diz Luiz Sérgio, de uma atitude nobre e digna, com a qual só se pode concordar: "chorar e enterrar os próprios mortos está na base da convivência humana, tal como a concebemos. E sobre isso não é possível transigir".

Precisamente por estar tão carregado de justiça e razão mas ao mesmo tempo ser tão dramático e pungente, o pleito muitas vezes escorrega e escapa do controle. Não conseguimos avançar cabalmente nesse terreno. A anistia tem sido vista ora como geral e irrestrita para todos (caso em que incluiria os que mataram e torturaram), ora como geral e irrestrita somente para os que agiram por convicção política, caso em que excluiria os torturadores que agiram por obrigação profissional. Há muita dificuldade de se acertar as contas com esse passado sem despertar monstros adormecidos, que habitam o imaginário político e se ocultam nas dobras da vida. O país, afinal, experimenta um longo período democrático, e talvez não seja fácil, nessa calmaria institucionalizada, encontrar brechas por onde repor agendas anteriores sem abalar demais o sistema.


Há ainda outra questão, central no artigo de Luiz Sérgio: como voltar aos anos de chumbo? Como revisitá-lo não só para passá-lo a limpo e conquistar a justiça necessária, mas aproveitá-lo como recurso para pensar e construir o futuro? Com que repertório teórico e conceitual? Dado que são as esquerdas que podem fazer isso de modo mais desprendido, estariam elas sabendo empregar essa indispensável viagem ao passado para se rever, se autocriticar e seguir em frente?

Ganharemos quase nada se voltarmos ao passado em nome da justiça e não conseguirmos nos desprender dos erros cometidos e sem superarmos a visão de sociedade e de Estado -- e sobretudo a visão de política e de reforma social -- com que boa parte das esquerdas operou durante os anos de chumbo. Afinal, como escreve Luiz Sérgio:

"Pode-se dizer que ninguém mais fala em luta armada. Verdade. Pode-se dizer, também, que ninguém defende "ditaduras progressistas", embora, em nuestra América, o pecado more ao lado e nem todos saibam resistir à tentação. Seja como for, resta por fazer um exame rigoroso de velhas categorias, que, desconfio, talvez resistam sob nova aparência. Se isso for verdade -- se a esquerda ainda não tiver esboçado os contornos de uma novíssima trama de conceitos políticos baseada na paz e nos direitos --, toda volta ao passado de chumbo e toda exigência de reparação correm o risco de se perder em recriminação facciosa ou irrealista, alheia aos valores universais que deveriam constituir uma esquerda democrática".

O artigo pode ser lido na íntegra clicando aqui.

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Querer é Poder????

Tribuna Impressa - 09/05/10.
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Fichas Sujas ou Limpa????


O Liberal - Americana - 21/05/10.
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