Após 8 anos, documentário discute morte de Toninho do PT


SÃO PAULO - Na noite do dia 10 de setembro de 2001, o então prefeito de Campinas Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, foi assassinado a tiros em uma avenida ao lado de um shopping center da cidade. O que seria o acontecimento de maior destaque nacional naquele dia 11, acabou ficando relegado quase ao esquecimento: horas depois do homicídio, Mohamed Atta assumiu o controle do voo 11 da American Airlines e jogou a aeronave de encontro ao World Trade Center. A queda das Torres Gêmeas levantou uma névoa sobre o assassinato do prefeito de Campinas que até hoje não foi dissipada.

Passados oito anos sem esclarecimentos, a história é retomada pelos jornalistas Pedro Henrique França e Guilherme Manechini, no documentário Ecos. O filme, que estreia nesta terça-feira, 31, no festival É Tudo Verdade, em São Paulo, traz depoimentos de Roseana Garcia, ex-mulher de Toninho, Marina Santos, filha do casal, companheiros de militância além de delegados e promotores envolvidos na investigação do caso.


Eleito no ano de 2000, com 59,07% dos votos, Toninho comandou Campinas por apenas oito meses. Na noite do dia 10 de setembro do ano seguinte, quando passava por uma avenida próxima ao shopping center Iguatemi dirigindo seu Fiat Palio, o então prefeito foi alvejado por três tiros. Um deles atingiu o coração. Toninho não resistiu e faleceu dentro do veículo.

Ecos recapitula todos os detalhes do caso e reaviva a grande discussão em torno dos acontecimentos: o assassinato de Toninho foi um crime "comum", cometido por criminosos que apenas queriam se livrar de alguém que atrapalhava sua fuga ou teve alguma motivação política?

O documentário de Pedro Henrique França e Guilherme Manechini mostra que a família repudia a versão apresentada pelo Ministério Público de crime "comum". Em entrevista ao estadao.com.br, Marina afirma: "Eu e minha mãe (Roseana) não temos dúvidas que a motivação do assassinato do meu pai foi política". O filme traz depoimento de Nilson Lucílio, secretário de finanças do governo Toninho, que garante que, antes de ser assassinado, o ex-prefeito mexeu com diversos interesses empresariais e políticos da cidade.

Ecos vai em busca das versões de cada uma das partes envolvidas no caso para que respondam questões óbvias, porém até hoje sem esclarecimento. Foi um crime político ou comum? Quem atirou? Por quê? Foi uma coincidência ter sido o prefeito da cidade?

A 1ª versão

No dia seis de outubro de 2001 o delegado Osmar Porcelli, afirmava ter solucionado o caso. O prefeito de Campinas teria sido alvo de um latrocínio (morte durante assalto) cometido por quatro homens que desciam a avenida em duas motocicletas. Logo depois, um homem é preso e confessa o crime. O suposto autor do crime denúncia os três colegas que teriam agido com ele e todos os envolvidos são detidos. Mais tarde, o Ministério Público descartaria a versão dos "motoqueiros" apontando a quadrilha de Andinho como suspeita do crime.

Os documentaristas ouvem os suspeitos de Porcelli, que garantem só ter confessado o crime mediante tortura. O delegado contesta a versão dos acusados e relembra as circunstâncias da confissão. "Não teve tortura. Fiz o interrogatório acompanhado de mais quatro promotores públicos e eles viram que a confissão foi espontânea", garante Porcelli, em depoimento aos documentaristas.

Chacina em Caraguatatuba

Mas um fato novo dá uma reviravolta no caso. No dia 2 de outubro de 2001 é noticiada uma chacina realizada por policias de Campinas, liderados pelo delegado Marco Manfrim, na cidade litorânea de Caraguatatuba. Foram mortos quatro criminosos da cidade do interior paulista. Entre eles estavam Anso e Valmirzinho, membros da quadrilha de Andinho, o mais temido traficante de Campinas.

A chacina levanta suspeitas quanto ao envolvimento de policiais no assassinato do prefeito de Campinas. Por que os supostos assassinos do prefeito Toninho foram executados, e não presos, por policiais? O ouvidor da polícia Fermínio Fechio atenta: "É gente que se estivesse viva, talvez pudesse dar algum esclarecimento em relação ao homicídio do prefeito".

"Roteiro" surreal

Em janeiro de 2002, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo passa o caso de Toninho para a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Novos depoimentos são colhidos. Surge a versão de que Andinho e mais três membros de sua quadrilha (Anso, Fininho e Valmirzinho), abordo de um Vectra prata, teriam sido autores dos disparos.

Mas qual foi o motivo para que atirassem no prefeito? Para o DHPP, foi um "crime comum": Andinho e membros de sua quadrilha desciam uma importante avenida em alta velocidade. Coincidentemente, o único veículo que não abriu caminho foi o do prefeito da cidade, dirigido pelo próprio. Assim, por atrapalhar a passagem de Andinho, Toninho foi morto com três tiros.

Embora a motivação tenha ficado nebulosa, o MP e o DHPP não têm dúvidas quanto a autoria. "Por exames periciais e provas testemunhais se chegou a conclusão de que o crime foi praticado por Andinho e os membros de seu grupo", garante o promotor Fernando Vianna, em depoimento colhido por França e Manechini. Em junho de 2002, Anso, já morto, foi apontado como autor dos disparos. Andinho foi indiciado por participação no homicídio.

Motivação política

As autoridades nunca relacionaram o assassinato de Toninho do PT a alguma motivação política. No filme, entretanto, Nilson Lucílio, secretário de finanças do governo de Toninho, lembra que ex-prefeito bateu de frente com diversos setores quando comandava a cidade. "Reduzimos o contrato de merenda escolar em 40% do valor. Locação de carro, reduzimos o valor em 30%, vigilância em 40% e o lixo em 30%."

Roseana, a viúva de Toninho, enumera as brigas judiciais que seu ex-marido havia comprado durante os 20 anos de atuação como homem público. "O Antônio tinha processo contra Mendes Júnior, Camargo Corrêa, Quércia. Antônio moveu ação popular contra Norberto Odebrecht", diz ela, para provocar: "E ele nunca mexeu com interesses empresariais?"

Reabertura das investigações

Em setembro de 2007, as investigações foram reabertas. Marina Santos, filha de Toninho, afirma não se tratar de um grande alento. "As investigações serão conduzidas pela Polícia Civil, a mesma que apresentou a tese rejeitada pelo juiz Torres. Isso não irá mudar nada", afirma Marina em entrevista ao estadao.com.br.

O que mãe e filha desejam é a entrada da Polícia Federal no caso. No início de 2008, Roseana conseguiu uma audiência com o ministro da Justiça, Tarso Genro, que lhe disse que colocaria a PF para investigar a morte de seu marido. Marina afirma que o requerimento para que a Polícia Federal comece a agir está "debaixo de um pilha enorme".

"Isso terá que ser avaliado ainda, vai demorar. Caso o Tarso Genro determinasse, a investigação começaria na hora", reclama a filha de Toninho.

Andinho

Andinho segue preso na Penitenciária de Segurança Máxima de Presidente Bernardes, respondendo por outros crimes, a maioria de sequestro.


É Tudo Verdade - Ecos, de Pedro Henrique França e Guilherme Manechini

São Paulo: Cinemateca - Terça (1/9), às 20h30; sexta (4/9), às 14h30

Rio de Janeiro: Instituto Moreira Salles - sábado (5/9), às 14 horas; domingo (6/9), às 20 horas

Estadão
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Entrevista com o Cabo Anselmo

Vídeo

Quem não viu a entrevista de José Anselmo dos Santos ao programa Canal Livre, da Band, no final da noite de domingo, pode dar uma olhada no site “A Verdade Sufocada”.


O programa está completo, dividido em partes.

- a informação é do blog de Jorge Serrão -
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MOVA RS

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A Internet nos deixa estúpidos


Para o americano Mark Bauerlein, é preciso tirar os jovens da rede para que passem mais tempo com os pais - e, assim, fiquem mais inteligentes

por Eduardo Szklarz

Será que a era digital faz bem aos nossos neurônios? Para o professor americano Mark Bauerlein, a resposta é não: se você tiver menos de 30 anos, considere-se membro da geração mais estúpida da história. É desse jeito, sem meias palavras e com altas doses de provocação, que ele descreve os estragos gerados pela era digital, em seu livro The Dumbest Generation (“A Geração Mais Burra”, inédito no Brasil). Bauerlein diz que os jovens andam tão distraídos com celulares, MSN e orkut que deixam de prestar atenção em assuntos importantes, como história e política. Encerrados em seu casulo tecnológico, onde só falam com pessoas da mesma idade, os jovens estão vivendo como Peter Pan – numa eterna adolescência alienada dos conhecimentos mais elementares. Professor de inglês da Universidade Emory, nos EUA, Bauerlein analisa essa transformação citando dados: em 2001, 52% dos teens americanos não sabiam que a União Soviética foi aliada dos EUA na 2ª Guerra Mundial. Ou: os jovens de 15 a 24 anos lêem só 8 minutos por dia, mas passam quase 4 horas vendo TV. “Nenhum grupo na história abriu tamanha fissura entre suas condições materiais e suas realizações intelectuais”, diz.

Como a internet piora a inteligência dos jovens?

Eu me refiro principalmente a 4 elementos: curiosidade intelectual, conhecimento histórico, consciência cívica e hábitos de leitura. Os jovens têm lido cada vez menos nos EUA. E estou dizendo livros, jornais e revistas, que ainda são o principal e o mais importante acesso ao conhecimento.

Mas a web não pode ser útil para o conhecimento?

Poderia, mas os garotos não se importam com essas coisas. Eles não visitam um site de um grande museu para ver as pinturas. Preferem visitar seu perfil pessoal na internet ou fazer upload das fotos da última festa, ou escrever em seu blog como odeiam a escola. Segundo o instituto Nielsen Media Research, 9 entre os 10 sites mais populares entre os adolescentes são redes de relacionamento. É isso que as ferramentas significam para eles: um meio social.

Como a internet está mudando nossa sociedade?

Para ser saudável, qualquer sociedade precisa ter uma forte interação entre jovens e adultos. Uma relação em que os adultos possam criticar os garotos por serem ignorantes, inexperientes e egoístas. Quando eu era adolescente, ia à escola, jogava basquete com meus amigos, evitava meus inimigos e, ao voltar para casa, a vida social terminava. Durante o resto do dia, eu tinha de estar junto dos meus pais e escutá-los conversar sobre dinheiro, responsabilidades da casa, a Guerra do Vietnã... Hoje, um garoto de 15 anos vai para casa e se fecha no quarto para falar pelo celular, entrar no blog e mandar mensagens de texto. Os adolescentes estão formando seu próprio universo, longe da realidade adulta.

Essa falta de convivência é falha dos pais?

Pais e professores deram muita liberdade e responsabilidade aos jovens. Muitos pais gostam de internet, TV e videogames porque eles servem de babás. Por isso, os adolescentes só se preocupam com eles mesmos. Se os pais não forem ativos e vigilantes, os garotos vão basear toda a sua realidade – suas idéias, valores e gostos – uns nos outros.

E qual seria a solução? Proibir a internet?

De forma nenhuma. O problema não é a tecnologia, e sim como a pessoa a utiliza. O desafio é quebrar o domínio de redes de relacionamento.

É possível tirar os jovens da internet?

É possível estabelecer um momento em que eles desliguem o celular, apaguem o computador e leiam um jornal, uma revista ou um livro. Nessa “hora da leitura”, os meninos podem ler o que quiserem. Não têm que ler Jorge Luis Borges ou Moby Dick. O importante é que possam ficar sentados, sem interrupção, e focar-se no texto. Depois disso, podem voltar a jogar videogame! A idéia é colocar um muro entre eles e os amigos durante uma pequena parte do dia.

Acha que isso vai dar certo?

Já vem dando certo com alunos meus. Quando lhes digo que precisam passar um tempo desplugados, ou não fazer o dever com a TV ligada, vejo que eles relaxam. Acho que muitos jovens já estão cheios de tantas conexões, celulares e e-mails. Realmente gostariam de dar um tempo. Mas pense no que aconteceria. Imagine que você está na faculdade e não tem orkut. Você está fora! A pressão é enorme. É como se tivesse 5 anos e ninguém quisesse brincar com você.

O filósofo David Weinberger diz que a internet incentiva o conhecimento compartilhado. Concorda?

Essa idéia de conhecimento como um processo coletivo é interessante, mas ainda existem muitas incertezas sobre ela. Por exemplo, no caso do conhecimento histórico. Muitos se perguntam qual o sentido de saber sobre dom Pedro 2º quando dá para procurá-lo na Wikipédia. Mas a questão é: estudamos dom Pedro 2º só para saber quando ele nasceu, as coisas que ele fez e o ano em que morreu? Ou estudamos figuras históricas como essa para desenvolver idéias sobre caráter, honra, inteligência e moral?

Como assim?

As informações devem remeter a algo mais profundo, que faça você pensar sobre quem é ou nas coisas em que acredita. Quem são os seus heróis? E os seus vilões? Portanto, as pessoas que defendem a idéia de conhecimento coletivo talvez não entendam o quanto é importante essa formação individual.

Weinberger também diz que mais importante do que o conhecimento é a compreensão dos fatos...

Sim, concordo, mas a compreensão é um processo bastante lento. E a internet agita tanto os garotos que muitos professores nos EUA já acham difícil mandar os alunos ler um livro com mais de 200 páginas. Os adolescentes não conseguem se concentrar por muito tempo. Um argumento complexo ou um poema difícil viraram coisas irritantes para ser assimiladas.

Na Antiguidade grega, as velhas gerações já criticavam o comportamento das mais novas. Há algo de novo nessa história?

É realmente uma história velha, mas acho que precisa ser repetida. Os adolescentes nunca cresceram com tanto dinheiro nem com tanto acesso a livrarias, museus, faculdades e entretenimento. Muitos deles pensam: “Nós somos os maiores!” Precisamos botar um freio nisso e mostrar que eles não são tão especiais, tão diferentes nem tão brilhantes assim. É natural que pensem dessa forma, faz parte da natureza humana – e a internet inclusive cultiva essa atitude.

Mark Bauerlein

• Tem 49 anos e vive com a família em Atlanta, EUA.

• Gosta de romances policiais de Raymond Chandler, John MacDonald e Jim Thompson. Para leitura “séria”, prefere Dostoiévski e Dante.

• Tem ficado mais tempo na internet do que gostaria, respondendo a e-mails de pessoas revoltadas com seu livro The Dumbest Generation. Mas ele leva o debate com humor. “Isso mostra que os jovens se importam”, diz.

• Está voltando a praticar artes marciais, depois de machucar o joelho treinando chutes de caratê.
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A crise internacional: as verdadeiras e as falsas questões

Valor Econômico - 31/08/2009

Estamos entrando no terço final de 2009 com uma visão mais clara sobre os fatores que levaram à crise financeira que nos atingiu a partir do colapso do banco Lehman Brothers. Um dos pontos centrais na sua construção foi certamente a questão da regulação e controle das instituições financeiras. Mesmo não sendo a origem propriamente dita da crise, a regulação falha permitiu que os elementos de fragilidade no sistema assumissem enormes proporções. Depois de termos vivido um longo período em que prevaleceu a ilusão da racionalidade intrínseca aos mercados financeiros, hoje há novamente o reconhecimento das fragilidades e dos riscos sistêmicos associados a seu funcionamento.

Não tenho dúvidas de que um novo entendimento sobre o controle da atividade financeira nascerá a partir das lições duramente aprendidas nestes dois últimos anos. Esta minha posição nasce também a partir do acompanhamento de fatos ocorridos recentemente. Cito ao leitor do Valor dois que me impressionaram nos últimos dias: o presidente da poderosa agência que regula os mercados futuros nos Estados Unidos - a CFTC - falando à imprensa revela que já há consenso nesse órgão de que os mercados de derivativos financeiros precisam ter uma regulação própria. Ele - que foi funcionário do Tesouro americano entre 1997 e 2001 - cita que, em 2000, no governo Clinton, essa mesma questão foi discutida no âmbito dessa agência federal e a decisão foi a de deixar o mercado totalmente livre de regulação externa, o que, em sua análise, foi um erro muito grave.

O outro fato que merece nossa atenção está estampado na edição de sexta-feira do site da Bloomberg. A SEC, outra agência regulatória do governo americano e responsável pelo mercado de títulos em geral, contratou um respeitado professor universitário para ser o responsável pela análise de risco nas operações sob sua supervisão. "Nós estamos criando um novo foco na análise de riscos para podermos identificar as áreas da indústria de títulos financeiros que podem representar riscos para os investidores" disse o presidente da SEC à agência de notícias. É preciso lembrar que, nos anos Bush, a SEC foi um dos centros do movimento pela liberdade total dos mercados.

Quem acompanha o dia a dia dos mercados financeiros sabe que o pensamento ultraliberal em relação à regulação dos mercados financeiros foi dominante desde a década de 1980, mas especialmente a partir do governo Clinton. Bush deu continuidade a essa visão. Os perigos associados a essa postura ficaram ainda maiores em função do aparecimento de uma série de inovações financeiras que criaram segmentos do mercado sem nenhum acompanhamento pelos órgãos reguladores. Além desses espaços sem lei, instrumentos legítimos de busca de eficiência das instituições financeiras e que funcionaram adequadamente durante muito tempo foram sendo desvirtuados. Como não havia a disposição das autoridades de acompanhar os movimentos das instituições financeiras, os riscos associados a essa evolução também não foram identificados com antecedência.

Tomemos o exemplo tão discutido do pagamento de bônus aos executivos das instituições financeiras. Essa prática, usada para estimular talentos, nasceu em instituições financeiras organizadas sob a forma de associação de sócios. Nesse tipo de instituição, a maioria dos funcionários que recebe bônus participa também no capital da empresa. Além disso, essas empresas não tinham ações colocadas no mercado junto a investidores. Elas funcionavam como uma grande cooperativa de funcionários, de maneira que o pagamento de bônus por performance a cada período não causava distorções em relação ao valor futuro dos lucros dos acionistas. Esse sistema funcionou de forma correta por décadas no mercado financeiro. Mas a partir do momento em que se aprofundou a separação entre beneficiários dos bônus e os detentores de ações, a racionalidade do sistema foi destruída e uma nova fonte de risco criada. Neste momento, os mecanismos que criavam estímulos positivos se tornaram instrumentos perigosos e destrutivos. O exemplo do ocorrido com o Citi e a Merrill Lynch, entre outros, é ilustrativo dessas mudanças.

Esse envelhecimento de todo um arcabouço institucional construído ao longo de muitos anos é o resultado direto de uma postura errada em relação à questão da regulação externa dos mercados. A interferência dos governos é a única forma capaz de equilibrar os interesses individuais, principalmente em função da assimetria de informações que existe no sistema financeiro moderno. No modelo ideal de regulação deveria haver a centralização das informações sobre as transações financeiras em um único órgão regulador. Mas isto certamente levaria à criação de uma burocracia enorme e que dificilmente conseguiria ser eficiente. Uma segunda alternativa seria a manutenção dos vários órgãos reguladores hoje existentes e a centralização apenas no caso das grandes unidades financeiras integradas e que representam riscos sistêmicos. Nesse caso o Banco Central assumiria esse papel.

Outra lição da crise atual e que será certamente incorporada no desenho de um novo sistema de regulação é que, no mundo integrado que existe hoje, o sistema de regulação e controle das operações financeiras não pode estar restrito às fronteiras nacionais. Uma das causas da crise recente foi exatamente a existência de espaços vazios de regulação entre um país e outro e que foi aproveitado por várias empresas para fugir da regulação. O exemplo mais claro dessa esperteza é o da AIG, que criou uma empresa em Londres para fugir da supervisão dos órgãos americanos no mercado de companhia de seguros.

Usando aqui a imagem dos movimentos de um pêndulo, podemos dizer que o risco agora passa a ser o de exagero na regulação. Os custos associados à liberdade excessiva dos mercados financeiros foram tão grandes que existe hoje um clima de caça às bruxas. Por isso o papel das cabeças mais lúcidas neste momento é o de evitar exageros, pois a liberdade legítima dos mercados precisa ser preservada para manter sua eficiência.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

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