Ele não pode continuar

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Ricos, Os Males do Mundo

Ainda há pouco recebi de um amigo, por e-mail, este artigo escrito pelo jornalista e consultor de empresas Francisco Viana. É de uma extrema lucidez e merece ser reproduzido e passado adiante. É o que faço agora, sem maiores comentários: a qualidade do texto fala por si só.

No momento em que a política se perde no labirinto da falta de alternativas para um sistema decadente, o capitalismo neoliberal, o presidente Lula desponta como uma voz lúcida e realista. Ele analisa: os países ricos são os culpados pelos males da humanidade; crítica a elite de Wall Street, fala sem meias palavras. Enfim, coloca o dedo na ferida: o neoliberalismo fracassou. Foi um dos maiores engodos da história da humanidade.
É verdade. Não há intolerância nas palavras do presidente. Elas soam como cristalina realidade. Tanto que Obama foi o primeiro a dizer sobre Lula: "Esse é o cara". A informalidade tem duplo significado: reconhece Lula como um igual; valoriza o discurso do presidente brasileiro. O neoliberalismo criou um mundo de aparências, que ilude com o discurso da liberdade. Mas, na prática, a liberdade existe apenas para o capital, que dita as regras, concentra a renda e condena a ética ao ostracismo. É a racionalização da irracionalidade. A frase é de Marcuse e foi dita ainda na década de 60 quando a sociedade unidimensional - carente do elemento crítico - começou a ser modelada.
Lula tem lançado luzes sobre esse dramático ambiente. Estilhaça o monocórdio discurso institucional. Jamais - e essa é a realidade histórica - o Brasil foi protagonista da cena política internacional. Sempre foi coadjuvante. Agora é o presidente americano quem reconhece: Lula, "o cara", é o político mais popular do mundo. Não há racismo algum na sua fala ao lembrar que a crise é de responsabilidade da elite branca de Wall Street. Longe de acender a fogueira dos preconceitos, quis dizer apenas que não foram os excluídos que acenderam o estopim do drama, mas, sim, os seus próprios artífices - os países ricos.
A novidade protagonizada por Lula é que ele transmite o seu discurso falando direto com a sociedade. A mídia reclama, gasta rios de tinta para ridicularizá-lo, mas se perde na própria inconsistência. Lula simboliza a razão dos fatos, não os fatos da razão. Parte da mídia tenta, sem êxito, fazer a sociedade acreditar que seu discurso é preconceituoso porque existem negros em meio aos brancos de Wall Street. Parece brincadeira. Soaria bem em seções de humor.
Por razão dos fatos entenda-se a realidade concreta. Por fatos da razão, a realidade construída artificialmente pela manipulação da realidade. Quando fala, Lula está tecendo o fio mais nobre da política: o exercício da palavra como elemento de transformação da realidade.
Foi o que fizeram os humanistas na transição da Idade Média para o Renascimento, entre os séculos XIV e XV, quando o homem (humanidade) e a sua capacidade de construir a vida foram trazidas para o centro do espaço público. Deixou-se para trás o carcomido discurso religioso que via no homem um ser decaído, carente de salvação, para vê-lo, como ele realmente é, sujeito da sociedade política. Não um objeto, um joguete nas mãos das elites ultrapassadas.
A Idade Média dos dias atuais é a sujeição das multidões aos interesses de uma minoria predatória que exerce seu domínio pela ideologia do capital, acondicionado no éter do consumo, no medo do desemprego e do terrorismo e numa estrutura política que aprisiona a palavra, se esta se erguer em favor de mudanças estruturais.
A fala do presidente Lula, nesse contexto, é renovadora. Aponta no rumo de um novo renascimento, da recriação do humanismo cívico. Os brasileiros precisam ver Lula para além dos resultados da economia. Com ele, a política tende a ganhar nova dimensão. Se Obama vier a ter a lucidez de Lula, os ricos, países ou indivíduos, poderão ser a redenção e não a praga do mundo.
Na transição da Idade Média para o Renascimento foi assim. Foi quando o liberalismo tradicional, aquele que precisa ser resgatado nas suas raízes mais profundas, começou a nascer junto com o republicanismo e as ideias socialistas. Foi a época em que o poder deixou de ser exercido por "direito" divino. Foi a época em que a sociedade despertou para a realidade da construção política da economia e começou a questionar o porquê da existência de ricos e pobres.
Hoje, o que está ruindo é o poder exercido em nome do deus dinheiro. É a máquina que faz da sociedade contemporânea livre para consumir, mas prisioneira de um modelo de vida e um sistema econômico que só colhe o que semeia: crises e mais crises. Repito: o Brasil precisa entender melhor o que o presidente Lula está dizendo.
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A compaixão de Ancelmo Gois


Chega a ser piedoso o gesto de Ancelmo Gois, colunista do Globo, ao tentar levantar a moral do pai da assessora fantasma do senador. Disse ele:


Você pode gostar ou não de FH. Você pode gostar ou não de Lula. Mas o fato é que os dois, cada um a seu modo, fazem grande sucesso no exterior.

FH, no seu tempo como presidente, brilhava em reuniões com outros chefes de estado pelo charme e pela imensa bagagem intelectual.

Lula, por causa de sua história pessoal, popularidade e carisma encanta a todos que cruzam seu caminho. Com Obama não foi diferente.



O pai da fantasma brilhava? Quando? Como? Não é verdade. Ele foi e continua sendo visto internacionalmente apenas como mais um típico político conservador da América Latina, com currículo manchado com a compra de votos com recursos públicos para sua reeleição, é o que está dito por nada menos que a Newsweek, a revista que a Veja tentou imitar. E não menos lembradas são suas radicais idéias neoliberais que o levaram a desmontar o estado para benefício de grupos econômicos amigos.

É um mito a sapiência do pai da assessora fantasma. A mídia, sua aliada, sempre trabalhou por esta imagem, que não é verdadeira. Sua carreira acadêmica sempre foi pífia comparada à de sua falecida esposa. É conhecido entre políticos e jornalistas o fato que o pai da fantasma sempre falou mal várias línguas. Recentemente, o professor Idelber Avelar, há mais de 20 anos lecionando em universidade americana, cunhou a expressão “inglês de Yásigi” para definir o que o pai da moça falava na língua de Shakespeare.

Apesar de todo o esforço da mídia, Lula, com seu headphone ligado ao incansável tradutor, andando à vontade pelos salões, conversando com todos, fez mais ali pelo Brasil no exterior do que todos os anos de marra de um presidente conservador, hoje apenas o pai de uma assessora fantasma de senador.
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Momentos internacionais (versão bilingue)


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Todos partidos para o castelo de areia

Maria Inês Nassif, do Valor Econômico
02/04/2009

Então, ficamos combinados: quando uma operação policial pegar um partido com a boca na botija, fazendo caixa dois com dinheiro de empreiteira, o responsável pela investigação deve acessar o site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e copiar e colar (ctrl C, ctrl V) o nome de todos os partidos registrados oficialmente.

Segundo os líderes dos partidos de oposição que foram citados na Operação Castelo de Areia - uma investigação originalmente motivada por denúncias de que a empreiteira Camargo Corrêa teria cometido supostos crimes financeiros, de lavagem de dinheiro e de evasão fiscal - é pouco elegante denunciar como implicados na Operação apenas aqueles contra os quais foram levantadas provas. Não acusar o PT, o PV e o PTB é prova do partidarismo da Polícia Federal, que teria sido governista, segundo seus detratores, mesmo apontando igualmente, como beneficiários de supostas doações ilegais que teriam sido feitas pela construtora, os partidos governistas PP, PSB, PDT e PMDB.

A regra não conta, todavia, quando o PT e seus aliados são o centro da investigação. No escândalo do “mensalão”, o caso levado de forma mais discreta foi o do caixa dois da campanha do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que usou em 1998 o mesmo esquema que o PT e seus aliados, para arrecadar dinheiro de campanha. Não seria de bom tom, afinal, dar grande publicidade ao caso do tucano mineiro.

O grosso dos que esperam julgamento no STF, por conta de suposto envolvimento no “mensalão”, é governista. Nesse caso, pode-se dizer que a PF é oposicionista? Deixou de ser quando mencionou o PSDB, o DEM e o PPS em outra investigação? Se a Operação Castelo de Areia for julgada no futuro pelo STF, e este considerar que o suposto caixa dois da Camargo Corrêa não fez réus, e o suposto caixa dois do “mensalão” sim, a Corte será governista ou oposicionista? No caso do “mensalão”, o trabalho conjunto do Ministério Público Federal constituiu o que o presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, Gilmar Mendes, chamou de “algo lítero-poético-recreativo”? Ou esteve adstrito às funções constitucionais das instituições envolvidas? O que diferenciou, então, o caso do “mensalão” da Operação Castelo de Areia?

E daí, ficamos também assim: o controle exercido pelo Ministério Público sobre a Polícia Federal é “algo lítero-poético-recreativo”, e portanto o MP e a PF estão fora de controle, pelo menos no caso da Operação Castelo de Areia e na Operação Satiagraha, as que são objeto das indignações do presidente do STF. Diz Mendes: “Muitas vezes o Ministério Público Federal é parte naquilo que chamamos de ação abusiva da polícia (…). Quando o Ministério Público atua em conjunto com a polícia, quem vai ser o controlador dessa operação?” Ele defende uma “vara especializada no controle das atividades policiais”, que poderia ser instituída “facilmente” pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do qual o presidente do STF é também presidente - ou seja, supõe-se que uma simples canetada de Mendes tem o poder de eliminar o controle constitucional que o MPF tem sobre a polícia. Isso quer dizer que a Constituição se submete ao CNJ? E, se assim for feito, Mendes, como o “presidente do Judiciário”, passaria exercer o controle sobre a polícia e, com a sua serenidade e neutralidade, evitaria o “aparelhamento do aparato policial, um aparelhamento político” da PF, e a excessiva complacência do MPF?

A Operação Castelo de Areia foi movida pelo Ministério Público, investigada pela Polícia Federal e monitorada pela 6ª Vara da Justiça, da qual é titular o juiz Fausto De Sanctis, que o CNJ do ministro Mendes processa pelas sentenças discordantes tomadas por ele contra as suas próprias. Uma ação da PF que foi acionada pelo MP e teve o controle de uma autoridade judicial não é um complô partidário - é assim que legitimamente se processam as investigações. Isso está longe de ser um clube “lítero-político-recreativo”.

Na verdade, dá para apostar que os procuradores, policiais e juízes envolvidos num trabalho dessa envergadura tenham pouco tempo para frequentar clubes lítero-político-recreativos. Apenas nenhum promotor, policial ou juiz pediu licença ao STF para concluir quais eram os crimes passíveis de indiciamento e quem os cometeu, nem submeteram suas conclusões ao STF, porque não é esse o papel da alta Corte nesse momento. Vai ser no futuro, se algum indiciado recorrer de sentenças ou procedimentos que considerem injustos ou ilícitos. Como, normalmente, pessoas com poder econômico costumam recorrer até a última instância judicial, o STF em algum momento vai se posicionar sobre o caso. E como parlamentares podem estar implicados, o caso deve parar direto no Supremo. Outra razão para Mendes não emitir juízos sobre o trabalho do MP, da PF e do juiz de primeira instância: afinal, vai julgá-lo mais para a frente.

A PF virou alvo do presidente do STF desde a deflagração da Operação Satiagraha que, entre outras coisas, botou duas vezes na cadeia o empresário Daniel Dantas. Mas ainda assim, não percebe o risco que está correndo. As decisões que toma, mesmo técnicas, não estão apenas sendo combatidas por divergências quanto a métodos. O trabalho de descrédito da PF, do juiz De Sanctis e de mais alguns que têm levado adiante investigações por crimes de colarinho branco é para acuar toda a instituição policial. Se os grupos internos dão munição para essa ofensiva externa contra os seus adversários de corporação, por conta de uma disputa de poder, não perceberam que a PF é atingida sem poupar ninguém - e que esse movimento de opinião pública incitado por algumas figuras públicas torna cada vez mais arriscado, para qualquer grupo dela, a investigação de casos politicamente complicados, que envolvam interesses econômicos mais poderosos.

Outro risco que se corre é a instituição STF ficar identificada como aquela que pode estar permeável a interesses. Num país altamente injusto, a mais alta Corte perder sua imagem de mediadora - e justa - e fixar-se como aquela que zela exclusivamente por grandes interesses, é o fim de esperanças de uma parcela da população altamente desassistida. É melancólico.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras
E-mail: maria.inesnassif@valor.com.br
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