Crivella lidera com folga e candidato petista dispara em pesquisa no Rio de Janeiro

A aliança PT-PMDB pode mesmo surpreender na eleição carioca. Isso já era esperado. O ritmo de crescimento da candidatura de Alessandro Molon, candidato do PT à prefeitura do Rio de Janeiro, é que pegou todos de surpresa. Semanas atrás aparecia com míseros 1% dos votos. Em nova pesquisa, agora pelo Instituto GERP realizada entre os dias 8 a 11 de abril, o candidato petista saltou para 9%, em empate técnico com Jandira Feghalli (PC do B), que aparece com 11%.

O senador Marcelo Crivella (PRB), também da base de apoio do presidente Lula, lidera a pesquisa, passando de 20% para 30%, enquanto o candidato da aliança PV-PSDB-PPS, Fernando Gabeira, aparece com 22%. Em queda, a candidata do DEM, Solange Amaral, apoiada pelo prefeito-dengue César Maia, que aparece com 4%, num empate técnico com Chico Alencar (PSOL), com 3%.

A gente tem que sempre ficar com um olho atrás com relação às pesquisas, mas de qualquer forma, fica evidente o crescimento da candidatura de Alessandro Molon (PT). Só falta o Lula e o Sérgio Cabral dar um empurrãozinho na candidatura de Molon, levando-o para as inaugurações das obras do PAC na cidade. O problema é o ciúme nas outras candidaturas governistas. Clique aqui para ver a matéria do Jornal O Dia.
Clique para ver...

Reflexões no final de semana



A oposição no divã

Notas e comentários vários nos últimos dias dão sinais de que a oposição ao governo Lula está querendo parar para pensar e rever sua estratégia. É prática já feita muitas vezes, agora parece algo mais sério. Segundo Ancelmo Góis, no Globo, Serra confessou a Marcelo Déda, do PT, governador de Sergipe, que a oposição ainda “não encontrou um discurso para 2010”. Entendam isso também como: “todas nossas tentativas de desmoralizar o governo não deram em nada”.

Apenas neste ano, a oposição, com a ajuda da aliada mídia, tentou criar pânico com um possível apagão elétrico federal, com a febre amarela, com várias denúncias sobre malversação de recursos na utilização de cartões corporativos. Tudo, até agora, sem sucesso para colocar o governo acuado e sem ação. As manchetes escandalosas sobre o apagão sumiram com as chuvas, a febre amarela desapareceu do noticiário quando o alarmismo criava vítimas com overdose da vacina, e as acusações sobre cartões corporativos mudaram de tom quando surgiram informações dos gastos no governo Serra e no governo de FHC. Neste ponto, a tática foi refeita e holofotes deixaram de lado o conteúdo das denúncias, passando a apostar em vazamento de informação, direcionados todos para a ministra, chefe da Casa Civil, possível candidata de Lula à sua sucessão.

E o pior aconteceu aos seus planos. Todo o empenho, todo o papel gasto pela mídia, todas as horas de TV não derrubaram a ministra, nem ao menos sua secretária-executiva, acusada sem provas pelo suposto delito. O efeito de tudo foi o mais indesejado para a oposição. Segundo pesquisa do próprio PSDB para mensurar o estrago feito, o nome de Dilma cresceu depois das denúncias. Foi registrado pelo Jornal do Brasil e repercutido por Eliane Catanhêde, da Folha, esta que antes dizia que Dilma estava morta eleitoralmente. Parece uma síndrome de tiro saindo pela culatra: Lula, mesmo com toda a campanha orquestrada, atingiu recentemente o mais alto índice de aprovação de seu governo, número mais alto do que o de FHC logo após o Plano Real.

Com tanta coisa dando errado, é compreensível que tenham todos a necessidade agora de uma boa terapia coletiva. Mas, com as notícias antecipadas da presença de Antonio Carlos Neto, o grampinho, e Rodrigo Maia, filho do prefeito da dengue no Rio, o tal “guri de merda”, dito por Jobim em uma solenidade, fica difícil acreditar em futuro para tal bando.

Showrnalismo é só para a patuléia

Talvez a conclusão fosse óbvia, mas confesso que só agora caiu a ficha. O jornal Valor Econômico segue um rumo diferente dos outros jornalões. Nesta semana só ele publicou matéria sobre os elogios do Bird ao Bolsa Família com críticas a má vontade da mídia brasileira com o programa. Não é a única matéria que segue pauta diferente do resto.

Mesmo sendo propriedade das Organizações Globo e da Folha, o seu público é a elite econômica, que não paga ingresso para ver as diatribes de um Arthur Virgilio. Os leitores são liberais. Como tal, entendem que em seu mundo, para a permanência do capitalismo, há de existir políticas de compensação, tal como Hayek e outros teóricos do modelo defendiam. Coisa que um Ali Kamel certamente não estudou. Vide ótimo comentário da Kelly.

Os leitores do Valor já estão convencidos, não precisam de conversas moles. Se a mídia precisa fazer propaganda, há de ser em seus outros jornais. E tome denúncias, dossiês, silêncio sobre fatos, tudo misturado a muito apelo, como a quase novela sobre a morte da menina em SP.

Este novo jornalismo, misturado com show, tal como cunhado por José Arbex, é só para a choldra, que pode se sensibilizar com a farsa inventada nas redações.
Clique para ver...

O drama da oposição política

Duas matérias que saíram hoje na Folha de São Paulo evidenciam o drama que vive a oposição – PSDB, DEM e PPS – às voltas das eleições municipais deste ano. Na primeira, a matéria da Folha mostra que a oposição só governa hoje 25 das cem principais cidades brasileiras. Aponta ainda como fator de enfraquecimento da oposição o fato de que apenas 64% dos prefeitos que lhes restaram são pré-candidatos, contra 76% dos partidos governistas.

A Folha também destacou em outra matéria a luta do DEM para permanecer entre os grandes partidos. O isolamento do partido de direita, disputando hoje o mesmo eleitorado do PSDB, até então seu principal aliado político. De fato, o partido terá grande dificuldade em manter as prefeituras que possui nas grandes cidades. Em São Paulo e Rio de Janeiro, o partido dificilmente manterá à frente dos executivos municipais. Clique aqui para ver as matérias publicadas originalmente no Congresso em Foco.
Clique para ver...

Marta Suplicy e a nova norma do TSE

A Folha de São Paulo destacou hoje que norma do TSE põe em risco a candidatura de Marta Suplicy à prefeitura de São Paulo. A primeira observação a ser feita é que o título da matéria poderia ser outro: “Norma do TSE põe em risco a candidatura de Alckmin em SP”. Explico. É que a nova norma do TSE fixa a aprovação da prestação contas em eleições anteriores como exigência para registro de candidatura no país. Acontece que tanto a candidatura de Marta Suplicy em 2004 quanto de Geraldo Alckmin em 2006 não foram aprovadas, portanto, os dois pré-candidatos estariam na mesma situação. É claro que a situação de Alckmin é mais confortável, pois não foram ainda rejeitadas, apenas o parecer é para sua rejeição. Mas também não foram aprovadas, como diz o texto da nova norma.

O curioso é que o TSE mais uma vez faz nova interpretação de lei antiga para as eleições. Ou seja, o Congresso não pode mudar a lei, mas o TSE pode reinterpretá-la constantemente, e sempre mudando de posição. A lei pode ser antiga, mas ninguém antes conhecia a nova interpretação, portanto, o TSE não deixa de ser uma espécie de legislador positivo. Para ver a matéria originalmente publicada pela Folha de São Paulo clique aqui.
Clique para ver...

Preconceitos da imprensa brasileira, segundo o BIRD

Uma visão de fora de nossa imprensa foi exposta pelo Banco Mundial. Segundo o banco, a mídia brasileira é preconceituosa na análise dos programas sociais do governo Lula. Em vez de concentrar nos aspectos positivos e nas possíveis melhorias dos programas, a imprensa centra principalmente nos supostos desvios dos programas sociais.

A preocupação do BIRD é quanto ao risco da opinião pública brasileira de não compreenderam os objetivos dos programas sociais. Ou seja, a mídia não exerce o seu papel de informar adequadamente a opinião pública. A verdade é que ela costuma fornecer desinformação para seu público. Nesse sentido, o déficit de informação aqui é gigantesco, em qualquer assunto que entra na pauta política.

Esse blog já escreveu sobre o partidarismo (clique aqui para ler) que se vê na mídia brasileira. Ultimamente, a mídia nem é mais direitista, esquerdista ou centrista, mas defensora de interesses puramente partidários. Passaram a ser meros defensores de projetos ou estratégias ligados ao PSDB, DEM e PPS, independente do mérito da questão. Ninguém mais defende nossos jornalões, até o BIRD pulou fora desse barco.

Este blog defende as idéias do Manifesto de Mídia Livre. Vejam o artigo abaixo:

Rui Falcão*

Uma avaliação do Banco Mundial (BIRD) sobre como a imprensa brasileira (escrita) cobre os fatos associados ao Bolsa Família constitui-se em testemunha eloqüente do preconceito, da má vontade, má fé e ignorância de grandes veículos de comunicação em relação ao programa e, por extensão, à implementação de ações do governo Lula em cumprimento ao preceito constitucional que obriga o Estado brasileiro a respeitar os direitos sociais.

Infelizmente, os leitores em geral, com exceção dos assinantes do jornal Valor Econômico, não puderam ter acesso ao conteúdo do documento, por razões óbvias: os meios de comunicação aos quais coube a carapuça recusaram-se até agora a divulgá-lo. É, pois, com o propósito de fazê-lo chegar ao conhecimento geral que transcrevo aqui o resumo, com base no que foi noticiado no Valor.

O Banco Mundial observa, de início, que a imprensa brasileira acompanha o Bolsa Família com atenção raramente vista em casos semelhantes no mundo, e tem preferência por mostrar mais as suas falhas que as suas virtudes. Assim, por exemplo, diz o estudo, a imprensa está mais preocupada com os desvios do programa – como a inclusão irregular de beneficiários – do que com eventuais imperfeições, como a existência de excluídos que deveriam ser contemplados e que por algum motivo não o foram ainda.

O documento informa que o Banco Mundial, ao contrário da imprensa nacional, avalia positivamente o programa e sugere a outros países que imitem a experiência brasileira. E, com tato diplomático, os pesquisadores do BIRD, para prevenir a opinião pública desses países quanto ao risco de incompreensão da natureza e dos objetivos do programa, a exemplo do que ocorre no Brasil, decidiram levar a eles também o debate estampado nas páginas dos jornais brasileiros. “O Bolsa Família é como jabuticaba, uma criação original do Brasil, que deu certo”, afirmou a pesquisadora Kathy Linders, do Departamento de Desenvolvimento Humano do Banco Mundial, uma das responsáveis pelo estudo, em entrevista ao jornal Valor Econômico.

Para a pesquisa, foram escolhidos seis jornais, três deles de circulação nacional, e acompanhados desde 2001, quando tiveram início, no governo FHC, programas de transferência de renda condicionada aos mais pobres, como o Bolsa-Escola e o Bolsa-Alimentação, reunidos pelo governo Lula no Bolsa Família.

Parêntesis, para um comentário: como era de esperar, o Banco Mundial, ao pressupor uma continuidade entre os programas de ambos os governos, deixa de lado a radical diferença doutrinária e política que distingue um do outro: os programas sociais de FHC, cunhados na ideologia neoliberal, limitavam-se a ajudar os pobres, aliviá-los das agruras da pobreza, assumida não como um produto da desigualdade gerada pela prevalência do poder das elites na gestão dos recursos públicos, mas como uma fatalidade, enquanto os do governo Lula visam a resgatar uma dívida social do Estado brasileiro, a atender aos direitos sociais, inscritos na Constituição Federal de 1988.

Para os neoliberais do Banco Mundial, e para os tucanos, que lhe são subservientes, as reivindicações sociais e culturais podem ser aspirações legítimas, mas jamais direitos. A visão neoliberal rejeita todo enfoque coletivo do direito: o indivíduo é o único sujeito juridicamente titular de direitos; e os violadores do direito somente podem ser indivíduos que devem assumir, como indivíduos, a plena responsabilidade. Ou seja, a pobreza é assunto restrito unicamente à esfera privada, nada cabendo ao Estado senão promover a “filantropização” das políticas sociais — no lugar do atendimento aos direitos sociais —, mediante estímulo a ações de “responsabilidade social” empresarial e iniciativas pontuais de primeiras-damas, como o programa “Comunidade Solidária” de FHC.

A visão neoliberal vê o mercado – e não o Estado - como o principal coordenador dos conflitos de interesse na sociedade e concebe essa sociedade composta por indivíduos atomizados. Dentro dessa lógica da suposta inexistência da sociedade, substituída pelo mercado, os indivíduos passam a ter de sobreviver por conta própria no mercado, em que são obrigados a competir uns com os outros e a incorporar maneiras de se tornarem competitivos. Aos menos capazes de se aliviar do fardo das desigualdades, resta perecer, assim como falecem as empresas ineficientes.
Retomando o estudo do Banco Mundial: desde 2001, quando o governo FHC passou a dar alguma atenção para os programas sociais, de cunho assistencial, o debate na imprensa foi pautado por avaliações favoráveis às transferências de renda. Já as críticas aos problemas de implementação aumentaram sensivelmente após 2003, ano em que assumiu o governo Lula. O número de artigos sobre a Bolsa Família publicados entre 2003 e 2006 foi quase o dobro do total de artigos sobre o tema, no governo FHC, observa o estudo.

Os pesquisadores constataram que, entre os “temas quentes” da imprensa, os relatos sobre fraudes e controles, que ocupavam 10% das matérias durante o governo FHC, passaram a constar de 50% dos artigos publicados, em 2004, no governo Lula. Nos anos seguintes, com a implementação das providências de controle e revisão do cadastro tomadas por Lula, o tema perdeu importância relativa, até ocupar menos de 20% dos artigos em 2006.

Os técnicos do Banco Mundial comentam também que a imprensa nem sempre diferencia entre problemas causados por fraudes e irregularidades burocráticas, de um lado, e desconhecimento de regras ou erros em formulários, de outro, o que, na avaliação dos especialistas, dá aos leitores uma impressão equivocada sobre a natureza dos “desafios” do programa. A propósito, enfatizam que um terço das notícias sobre irregularidades tem como fonte o próprio governo, as suas agências de controle ou os ministérios. Somente em mais de um quarto das notícias foi a imprensa quem investigou e encontrou problemas. Está aí uma notícia que a imprensa em geral jamais fez chegar ao conhecimento do leitor, acrescentamos nós, num evidente propósito de desqualificar o sistema de acompanhamento e controle do programa por parte do governo Lula.
Segundo informa Valor Econômico, em reunião com autoridades do Ministério do Desenvolvimento Social e da Presidência da República, em 01/04/2008, os técnicos do banco sugeriram “campanhas e cursos para que os jornalistas adotem os termos técnicos no tratamento noticioso das irregularidades dos programas”.

Seria muito profícuo que tais campanhas e cursos começassem por informar que existem diferentes abordagens da pobreza e distintos modos de combatê-la. A maneira de definir e lidar com a pobreza revela conflitos sociais, ideológicos e políticos entre grupos de interesses, entre classes, partidos políticos e agências multilaterais, entre outros. A imprensa brasileira está longe de ser neutra nesse debate, como mostra o estudo do Banco Mundial.

A seguir, tais campanhas e cursos poderiam contribuir para remover preconceitos sociais e morais existentes na sociedade brasileira, que inspiram boa parte das críticas da imprensa ao Bolsa Família. E por detrás de uma abordagem limitada de pobreza (à renda, por exemplo), as campanhas e cursos poderiam apontar a existência da dimensão da desigualdade — questões de acesso à educação, ao trabalho, contextos políticos e sociais perversos e sua reprodução, étnicos, de gênero e de reconhecimento social, gerados, entre outros, por uma situação econômico-social iníqua, que privilegia elites minoritárias, há séculos no controle do poder do Estado e que impede a grande maioria do povo brasileiro de se apoderar da própria cidadania.

O discurso moral dos “falcões do colunismo” distingue o bom pobre do mau pobre. Graças a esse artifício, evitam indispor-se com seus eleitores contrapondo-se frontalmente a um programa aprovado pela maioria do povo brasileiro, ao mesmo tempo em que abrem espaço à sua retórica de desqualificação, por supostamente produzir efeitos inversos aos pretendidos, serem ineficazes e eleitoreiros.

Parte das críticas ressalta o efeito indesejável da concessão de benefícios. Um deles é que os benefícios seriam tantos que os beneficiários passam a não querer trabalhar mais. Essa visão reflete, mais do que um preconceito, falta de informação sobre a situação na qual boa parte da população brasileira vive. De fato, o Bolsa Família gera alívio imediato na economia familiar, mas não é suficiente para que as famílias vivam unicamente dele.

Ademais, como observa a pesquisadora Sarah Mailleux Sant’Ana, o trabalho é compreendido pelos beneficiários do Bolsa Família não apenas como um modo de obter renda, mas também como meio de inserção social que lhes permite serem reconhecidos e respeitados como cidadãos úteis ao conjunto da sociedade. A maioria das pessoas desempregadas oficialmente ou que não têm empregos estáveis realiza trabalhos informais e temporários para aumentar a renda familiar, mas também trabalhos não remunerados que fortalecem os laços de solidariedade.

Outro preconceito refere-se ao destino dos benefícios. Nas Ciências Sociais, aprende-se que a categoria economia não é compreendida pelas pessoas somente pela renda, mas também pela ação (e sentido) social que a renda e os laços sociais criam. No trabalho de campo, realizado por Sant”Ana, observou-se que a maioria das famílias entrevistadas gasta os recursos recebidos na sobrevivência direta e imediata, mas outras fazem investimentos. A imprensa ignora o papel social, de expectativa de reconhecimento e inclusão, associado a esses investimentos. É o caso de duas beneficiárias: uma comprou um tanque para lavar roupa para fora, que o aluga para vizinhas e o empresta para amigas; outra parcelou a compra de um aparelho de DVD com parte do Bolsa Família para criar um cinema comunitário em sua casa, cobrando R$0,50. Nas festas de crianças, os filmes são oferecidos gratuitamente. Ao proceder dessa maneira, o que elas têm em mente é não somente capitalizar a renda, investir para que possam gerar mais renda, mas também fortalecer seus laços sociais e solidários, observa a pesquisadora, potencializando dessa forma as possibilidades de sua inserção social e de reconhecimento como cidadãos livres e ativos.

Nesse sentido, gastar parte do dinheiro do Bolsa Família no cabeleireiro para participar de um casamento pode ser considerado não um desvio de finalidade, mas um investimento de trocas simbólicas: o gasto na boa apresentação pessoal é uma deferência para com os noivos e convidados. Reciprocamente, em um momento posterior de necessidade, as pessoas assim honradas poderão retribuir de modo solidário. As mulheres que cuidam das crianças dos outros gratuitamente asseguram que, quando precisarem, seus filhos também serão cuidados.

Isso é dizer que sobreviver é assegurar o atendimento das necessidades biológicas e ao mesmo tempo assegurar um lugar (social) na comunidade. A escala da renda não é o bastante: pode-se ser rico (financeiramente) e fraco (socialmente); pobre (financeiramente) e forte (socialmente), afirma Sant’Ana. Sobreviver é ser capaz de se manter socialmente. Nesse sentido, as trocas são indispensáveis: mais que a movimentação de dinheiro e de bens, é a sensação de compartilhar de um destino comum que importa. É preciso relacionar-se, criar aliados, ou seja, abrir-se, ser visto para que os objetos necessários (móveis, tanques, bicicletas) circulem.

É desse modo que os próprios beneficiários percebem o Bolsa Família. A grande maioria dos entrevistados demonstra satisfação, não diretamente com a materialidade do benefício (a transferência de renda), mas com outras iniciativas, como o Programa Nacional de Agricultura Familiar, o acesso à eletricidade, o acesso aos remédios nas farmácias populares, o acesso à saúde e melhorias na escola. A relação com a vizinhança, de acordo com os entrevistados, também melhorou com o fortalecimento de laços de solidariedade e de novas amizades. Por aí se pode observar que o programa desempenha um papel relevante na garantia de uma autonomia mínima, na capacidade de planejar o futuro, no consumo e na qualidade alimentar, entre outros.

Outro preconceito, que poderia ser desfeito nas campanhas e cursos, é que o Bolsa Família seria um instrumento político de manipulação eleitoral, uma recaída no clientelismo clássico. Esquece-se, assim, deliberadamente que na esfera pública de direitos inscreve-se a obrigação do Estado de assegurar o direito à subsistência a todos os habitantes de uma nação. A esse respeito lembra-se que sob os auspícios do governo Lula, em setembro de 2006, foi aprovada no Congresso Nacional a Lei Orgânica da Segurança Alimentar, que consolida a concepção de uma renda mínima como direito do cidadão. Essa lei dissocia o direito à subsistência de iniciativas de um partido político ou de um governo e insere-o na agenda social brasileira como obrigação legal do Estado. A não garantia desse direito representa uma violação dos direitos fundamentais e lesão do direito à vida.

Também faz parte do conjunto de preconceitos morais dos falcões do colunismo a obsessão por responsabilizar os pobres pela situação precária em que vivem. A denúncia desse preconceito, indissociável do pensamento neoliberal, poderia ser utilizada pedagogicamente nas campanhas e cursos sugeridos pelo Banco Mundial, para suscitar a discussão na imprensa sobre o papel do Estado no resgate da dívida social.

Rui Falcão é jornalista, advogado e deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores. Foi deputado federal, presidente do PT e secretário de governo na gestão Marta Suplicy.
Clique para ver...
 
Copyright (c) 2013 Blogger templates by Bloggermint
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...