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A salvação da lavoura


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A propósito

Por falar em agrotóxicos e estarmos novamente enfrentando uma seca, segue abaixo uma charge de 2004, ainda atual.

Pensando bem, ter conseguido publicar charges deste tipo durante cinco anos no Jornal do Comércio, até sermos demitidos, foi um milagre!


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Quando o Roundup já não faz efeito

Brasil Livre de Transgênicos *
Fonte: Adital
A resistência que o mato desenvolve aos herbicidas (agrotóxicos do tipo "mata-mato") nas lavouras plantadas com sementes transgênicas tolerantes a estes produtos é um problema desde sempre previsto.

Segundo fontes da própria indústria de biotecnologia 62% dos transgênicos plantados hoje em todo o mundo são deste tipo: com a modificação genética, pode-se pulverizar o veneno sobre a lavoura, eliminando-se todas as plantas do terreno, menos a plantação transgênica (a soja transgênica tolerante ao Roundup representa, sozinha, mais da metade dos transgênicos plantados). Outros 15% são plantas inseticidas (Bt), ou seja, são tóxicas e matam as larvas que atacam as lavouras; e o restante (21%) combina as duas características: são inseticidas e também tolerantes a herbicidas -- o que faz com que a tolerância a herbicidas seja uma característica presente em 83% dos transgênicos plantados globalmente.

O mato desenvolve resistência quando um mesmo veneno é largamente usado, ciclo após ciclo. Em outras palavras, o veneno vai deixando de fazer efeito.

Com a difusão das sementes transgênicas, aumentou-se enormemente na agricultura o uso do herbicida a elas associado. Nos EUA estimativas conservadoras indicam que entre 1996 (ano da introdução das lavouras transgênicas) e 2008 o uso de glifosato (princípio ativo do Roundup, da Monsanto) tenha aumentado em 174 mil toneladas.

No Brasil, a Anvisa estima que entre 2004 (primeiro ano em que, graças à Medida Provisória 131, pode-se plantar soja transgênica legalmente) e 2007 as vendas de glifosato tenham saltado de 60 mil para mais de 110 mil toneladas, embora no mesmo período, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a área plantada com soja no país tenha diminuído cerca de 8%.

O resultado não poderia ser outro: cada vez mais espécies de mato vêm se mostrando resistentes ao glifosato, provocando prejuízos aos agricultores e fazendo-os voltar a usar herbicidas mais antigos e ainda muito mais tóxicos do que o já terrível glifosato, como o paraquat e o 2,4-D (um dos dois componentes do famoso Agente Laranja, usado como desfolhante na Guerra do Vietnã e conhecido por ter provocado milhares de mortes e malformações congênitas). Em muitos casos, agricultores têm recorrido à capina manual para controlar o mato que o glifosato já não elimina.

Já tratamos deste tema neste Boletim por diversas vezes. O que nos faz voltar a ele novamente é o destaque que tem sido dado à questão nas últimas semanas.

Em 26 de julho o jornal gaúcho Zero Hora publicou uma entrevista com o pesquisador Stephen Powles, diretor da Escola de Biologia Vegetal da Universidade Wersten Australia e também da WA Herbicide Resistance Initiative (Iniciativa sobre Resistência a Herbicidas, na tradução livre).

Segundo o próprio jornal, "dos 38 milhões de hectares plantados com lavouras de soja, milho e algodão transgênicos no Brasil, cerca de 4 milhões -- 10,5% da área -- estão infestados com plantas daninhas resistentes ao glifosato".

Segundo o especialista entrevistado, "Se [o Brasil] não agir agora, terá o mesmo fim que os Estados Unidos -- um milhão de hectares inutilizados, onde o glifosato não pode mais ser usado, nem mesmo em sistema de rotatividade com outras culturas e herbicidas."

Em outra entrevista, concedida ao site AGNetwork em abril último, o pesquisador Charles Benbrook, outro grande especialista no assunto e atualmente cientista chefe da ONG Organic Center, já havia relatado que milhares de hectares foram abandonados pela agricultura nos EUA devido à infestação de ervas invasoras resistentes ao glifosato, como o amaranthus, que crescem e se alastram ao ponto de danificar as colheitadeiras mecânicas de algodão.

Em 27/07 foi a vez do site AgroLink comentar as dificuldades enfrentadas pelos agricultores brasileiros adeptos à transgenia com a proliferação da buva resistente ao glifosato. Segundo a matéria, "O grande problema é que há cerca de quatro anos a buva era facilmente eliminada pelo glifosato. Porém, o gene do vegetal sofreu mutações e agora resiste ao produto."

Em 25 de julho o jornal Post-Dispatch, da cidade sede da Monsanto, St. Louis - Missouri, EUA, também tratou da questão e relatou o fenômeno do abandono de áreas por agricultores devido à superinfestação de mato resistente ao glifosato. Segundo a matéria, as várias espécies de mato resistente ao glifosato já estão presentes em 22 estados americanos.

Ainda segundo a reportagem, "a Monsanto reconhece que pode ter subestimado a rapidez com que as plantas invasoras se tornariam resistentes ao agrotóxico", e está até mesmo oferecendo subsídios de US$ 30 por hectare a agricultores do Sul dos EUA como incentivo para que usem produtos de outras empresas (mais caros que o Roundup) de modo a conservar a viabilidade do produto. Buscando contornar o problema, a Monsanto anunciou também o lançamento de um "novo" herbicida, chamado Warrant (em inglês, "garantia"), para ser usado em soja e algodão (trata-se do herbicida acetocloro, registrado no Brasil para café, cana, milho e soja e comercializado pela Monsanto aqui sob a marca Kadett).

Também em seu informativo oficial no Brasil, a Monsanto admite o problema da resistência das ervas invasoras e informa que está "reduzindo seu portfólio de produtos a base de glifosato e desenvolvendo soluções integradas para o manejo de ervas daninhas nas plantações que usam a tecnologia Roundup Ready."

Segundo Benbrook, a estratégia da Monsanto é "reembalar" sua tecnologia, incluindo o uso de outros herbicidas, mas a partir do programa Roundup Ready: sem redução da área tratada e sem redução na quantidade de glifosato usada, apenas adicionando-se outros herbicidas na mistura para controlar o mato. Segundo o especialista, é como "jogar gasolina para apagar o fogo".

Benbrook explica ainda que, neste momento, todas as grandes empresas de biotecnologia estão correndo para desenvolver e comercializar variedades de milho, soja e algodão geneticamente modificadas para tolerar pelo menos dois, mas às vezes três ou mais herbicidas (aqui no Brasil a CTNBio já deu sinal verde para plantio experimental da soja transgênica da Dow resistente ao veneno 2,4-D). Como resultado, o preço das sementes aumentará 30% ou 40%, além de os agricultores terem que aplicar três ou quatro herbicidas -- múltiplas aplicações de glifosato e mais os outros herbicidas. Além disto custar dinheiro, irá piorar o problema do mato resistente.

Aliás, o aumento na quantidade de veneno aplicado já é uma das primeiras consequências do desenvolvimento de resistência pelo mato. Blake Hurst, um produtor de milho e soja de Missouri e vice presidente do conselho do Missouri Farm Bureau, uma organização de produtores, relatou ao Post-Dispatch: "Estamos pulverizando mais. É preciso fazer rotação de agrotóxicos e variar os modos de ação, e provavelmente teremos que voltar aos agrotóxicos mais antigos".

E quem foi mesmo que disse as lavouras transgênicas permitiriam aos agricultores reduzir o uso de agrotóxicos? [Número 501 - 06 de julho de 2010].
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