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O ano da conclusão de uma farsa

por José Dirceu

O ano de 2012 entrará para a história do Brasil como o de concretização de uma farsa político-jurídica e midiática elaborada e montada com o objetivo maior de, por vias indiretas, atingir o projeto de desenvolvimento do país iniciado com a chegada do companheiro Lula à Presidência da República.

Um projeto que, hoje, bem consolidado e conduzido pela presidenta, Dilma Rousseff, ameaça os antigos detentores do poder porque desarticula as perversas desigualdades sobre as quais esses velhos governantes estruturaram seu domínio sobre as vontades populares.

Sustentados nos meios de comunicação, poder sob forte monopólio e ainda controlado pelas velhas oligarquias, avocaram para si a pretensa prerrogativa de ser voz da opinião pública nacional e passaram a pressionar o Poder Judiciário para que este exibisse ao país a prova incontestável de que a era da impunidade acabou.

E esse marco só teria lugar se o julgamento da Ação Penal 470, apelidada de Mensalão como parte dessa estratégia, resultasse em um desfecho pré-conhecido: a minha condenação como mentor de um inexistente esquema de compra de votos no Congresso Nacional.

Fortemente pressionado — afinal, já no recebimento da denúncia se sabia que o STF (Supremo Tribunal Federal) decidira “com a faca no pescoço”—, o tribunal maior do país não resistiu e sucumbiu.

Trilhou o caminho do julgamento eminentemente político, mesmo sendo uma Casa eminentemente técnica, ainda mais em questões penais.

Tal escolha impede o fortalecimento dos princípios constitucionais fundamentais, o que se daria com o sopesar dos direitos e garantias legais do Estado e dos cidadãos, no lugar de um julgamento em que se aceitou condenar sem provas.

Soou ser mais importante dar uma explicação à “opinião publicada” — não qualquer explicação, mas a única esperada, a condenação. Como se a impunidade não estivesse presente em justas absolvições.

Nessa esteira, cometeu-se toda a sorte de inovações jurídicas: do ineditismo de um julgamento com dezenas de réus sem a possibilidade de duplo grau de jurisdição à utilização parcial de uma teoria jurídica para a dispensa de provas, na qual o próprio autor apontou equívocos de interpretação em sua adoção.

Os vários réus julgados coletivamente, ainda que com direito a outros foros, serviam à composição de um julgamento complexo, ampliando os espaços para decisões contraditórias e imprecisas, em que o ônus da prova cabia ao acusado, não ao acusador. Foi o que se viu.

As poucas vozes dissonantes que tinham espaço na grande mídia não hesitaram. “Dado que uma das peculiaridades do julgamento foi o valor especial das ilações e deduções, para efeito condenatório”, escreveu o colunista Jânio de Freitas, que pautou suas intervenções nas ponderações sobre o que se estava ocultando no processo.

Em inúmeras outras manifestações públicas, a data e o cronograma do julgamento foram criticados, por concorrerem, influírem e serem influenciadas pelo processo eleitoral em curso.

Marcar o julgamento para o mesmo período que as eleições? A cautela e o desejo de isenção recomendariam ou antecipação, ou adiamento, para insular a Corte. Mas não: subverteu-se o bom senso para afirmar que a opção só reforçava o caráter isento que o julgamento deveria ter.

O comportamento do relator da AP 470 também foi aqui e ali criticado, muitas das vezes pelos próprios colegas, como se fosse sua visão “a única verdade possível”, ou como se o resultado do juízo feito por um colegiado não devesse ser alvo de contraditórios e divergências.

Forjou-se um herói nacional, não pelas massas e movimentos sociais, mas das letras e imagens midiáticas.

Assim, foi tratado com desprezo o fato de inexistir relação entre o voto parlamentar e o suposto ato da compra desse mesmo voto, pois isso derrubaria a tese central do chamado “Mensalão”.

Da mesma forma, preferiu-se fechar os olhos ao fato de que a natureza dos recursos utilizados na agência DNA Propaganda não era pública, contrariamente ao que propagou no decorrer do julgamento.

Foi menosprezado o documento do Banco do Brasil que nega o caráter público dos recursos, afinal, a Visanet é, de fato, uma empresa privada e multinacional, cuja sociedade é composta por 24 bancos.

Ademais, o BB é sócio minoritário, sem jamais ter aportado dinheiro na Visanet, o que desfaz a compreensão adotada pelo STF. Também se ignorou o fato de que uma auditoria pública feita pelo BB não encontrou irregularidades nas contas do fundo Visanet.

Mas o mais aviltante foi verificar a divergência na utilização da teoria do domínio do fato. Tal teoria, escolhida para me condenar sem provas, serviu para sustentar o argumento de que minha posição à época não permitia que se tivessem cometidos crimes sem meu conhecimento.

Isso aos olhos de parte dos ministros do STF, pois, para o autor dessa mesma teoria, o jurista alemão Claus Roxin, “o dever de conhecer os atos de um subordinado não implica corresponsabilidade” e “a posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato”, pois “o mero ter que saber não basta”.

Roxin reafirmou o ululante: para condenar, há que haver provas!

Costuma-se dizer que decisão judicial não se discute, cumpre-se. De fato, devem ser cumpridas, sob pena de caos institucional. Mas, sempre que se entender apropriado, devem ser discutidas. Contestadas, criticadas e, se possível, corrigidas. Pois é isso que faz toda instituição crescer e vicejar —inclusive o Judiciário, que não é um Poder absoluto.

Não será esta a primeira vez que minha fibra e a firmeza de minhas convicções e lutas serão postas à prova.

Já disse outrora que entrei e saí do governo sem patrimônio, sem praticar qualquer ato ilícito ou ilegal, seja na condição de dirigente do PT, seja na de parlamentar ou de ministro de Estado.

Minha condenação se dá sem provas e a má aplicação da teoria do domínio do fato não apagará isso.

Como nas vezes anteriores, seguirei lutando. Para provar minha inocência e para que sigam acesas as chamas dos ideais e sonhos que ajudei a construir, a compartilhar, a defender e a realizar, dentro e fora do governo.

Após o ano da concretização de uma farsa, que 2013 seja o ano do ressurgimento da verdade.

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¿Por qué no lo matan?

Escrito por Luiz Carlos Barreto

Fidel Castro estava fascinado pela beleza e graça das irmãs Nabuco -Nininha e Vivi-, filhas dos anfitriões dona Maria do Carmo e José Nabuco, que abriram as portas da mansão da rua Icatu, no Rio de Janeiro, para recepcionar o líder da vitoriosa revolução Cubana.

Ela viera para agradecer ao embaixador brasileiro em Cuba que, durante os duros tempos de luta contra o ditador Batista, deu apoio aos guerrilheiros do exército fidelista. Intelectuais e políticos de todas as tendências se misturavam nos salões. Todos procuravam Fidel para tirar um papo, mas o comandante só tinha olhos para Nininha e Vivi. O pessoal da esquerda, quando conseguia um pouco de atenção, aproveitava para falar mal de Carlos Lacerda, governador da Guanabara.

Cansado e irritado, meio em tom de "broma", de ouvir as queixas contra Lacerda, Fidel, querendo se ver livre, mandou: "¿Lacerda es un hombre como nosotros? ¿Tiene brazos, piernas? ¿Camina por la calle?" "Si, si", disse um dos "reclamões". "¿Entonces por qué no lo matan?", disse Fidel, encerrando o papo.

O episódio não me sai da cabeça quando leio, quase todo dia, notícias sobre José Dirceu nos jornais. O tom é sempre de acusação, tratando de atos e práticas ilegais como se ele, na sua trajetória de animal político militante corajoso, só tivesse contabilizado ações negativas.

Sua trajetória é sempre contada a partir de 2004, como se tivesse nascido com o "mensalão". Não se fala na sua trajetória de líder estudantil que se entregou de corpo e alma à luta contra a ditadura militar. Prisão, exílio, retorno ilegal ao Brasil, clandestinidade -Dirceu jogou sempre toda sua energia pela democracia. Anistiado, se filiou ao PT, coerente com sua visão de mundo.

Sua disciplina, sua vocação de estrategista, sua capacidade de trabalho e seu talento de transformar teoria em ação o elevaram a líder do PT. Afirmou-se assumindo sem medo a tarefa de acomodar no partido as diversas tendências, desde as mais radicais de esquerda às quase conservadoras, consolidando o primeiro partido de massa do Brasil.

Dirceu, apesar de sua formação de classe média e conhecimento acadêmico, teve a capacidade e humildade de entender o papel reservado a Lula. Reconhecendo a sua inegável qualidade de líder de massa, soube estruturar com o PT e a sua militância a grande revolução pacífica e democrática acontecida em toda a história republicana do Brasil.

Nos primeiros dois anos, a desconfiança das classes dominantes em relação ao governo Lula era enorme, como confidenciou-me um parrudo banqueiro: "Não sabíamos qual seria o exato momento que o governo Lula viraria a mesa". Não se pensava noutra coisa a não ser evitar que Dirceu tivesse tempo e espaço para isso. Num desses almoços de entidades empresariais, ouvi o seguinte: "Zé Dirceu é a cabeça pensante, Lula é o líder mobilizador do sentimento popular. Vamos cortar a cabeça que o corpo cai".

Os oito anos de Lula serviram para destruir o mito de virada de mesa; o que o Lula virou mesmo foi o jogo do poder, priorizando políticas para as áreas social e econômica, o que resultou no Brasil de hoje, cada vez mais sólido internamente e respeitado internacionalmente. O governo Lula mostrou também que José Dirceu não é uma cabeça sem corpo e que nem Lula é um corpo sem cabeça. Eles são carne e osso, são "hombres como nosotros y caminan por las calles".

"¿Entonces por qué no los matan?"


LUIZ CARLOS BARRETO, 84, é produtor cinematográfico. Produziu, entre outros, "Lula, o Filho do Brasil", "Dona Flor e seus Dois Maridos", "O que é Isso, Companheiro?", "O Quatrilho" e "Bye, Bye, Brasil"
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Teórico do Domínio do Fato pode participar de defesa de Dirceu

Claus Roxin confirma interesse em escrever parecer para recursos que serão apresentados pelo ex-ministro da Casa Civil ao Supremo Tribunal Federal e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Jurista alemão desautorizou o uso pelo STF de sua doutrina. Segundo ele, não basta poder mandar; é preciso, efetivamente, mandar


Há mais um capítulo reservado para o embate jurídico da Ação Penal 470. O jurista alemão Claus Roxin confirmou que foi procurado pela defesa do ex-ministro José Dirceu e demonstrou interesse em fornecer pareceres relacionados à doutrina do "domínio do fato", desenvolvida por ele.

Ouvido pelo jornalista Luciano Alarcon, que o procurou em Munique e escreveu texto especial para a Folha deste domingo, Roxin afirmou que ainda não conhece o caso "em detalhes", mas disse que, em breve, "terá com certeza um conhecimento mais aprofundado do assunto".

Advogado de Dirceu, José Luiz de Oliveira Lima embarca para a Alemanha no fim do mês e tem agenda marcada com Roxin.

No início do processo, o procurador Roberto Gurgel falou em "provas tênues" contra José Dirceu e da inexistência do "ato de ofício". Passou a defender que, em crimes mais complexos, de quadrilha, fosse utilizada a teoria do "domínio do fato", segundo a qual a pessoa em posição hierárquica superior também devesse ser incriminada.

O tema gerou intensa discussão no plenário, com um aparte feito pelo revisor Ricardo Lewandowski, que alertou sobre as precauções que deveriam ser tomadas em relação à doutrina alemã, usada em casos muito específicos – como, por exemplo, para incriminar figuras do regime da antiga Alemanha Oriental pelos disparos feitos por soldados contra alemães que tentavam saltar o Muro de Berlim.

Em entrevista recente, Roxin afirmou que a teoria do domínio do fato não elimina a necessidade de provas. Ou seja: não basta poder mandar. É preciso também que fique provado que alguém, efetivamente, mandou.

Depois da entrevista de Roxin, alguns analistas passaram a relativizar o uso da teoria do domínio do fato na condenação de Dirceu. Foi o caso, por exemplo, de Merval Pereira, que afirmou que o ex-ministro foi condenado em função de "provas torrenciais" contra ele, e não pelo domínio do fato, ajustando, assim, seu discurso.
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Revogar a sentença injusta

Prisão de Zé Dirceu e Genoíno: Revogar a sentença injusta 
Vermelho

Está fora de questão que a Suprema Corte do País merece respeito e suas decisões devem ser cumpridas. Mas não está vedado o direito de opinar, direito sagrado conquistado com muita luta pelo povo brasileiro e constitucionalmente assegurado. Tampouco é proibido lutar para que decisões injustas, como as que foram tomadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na tarde da última segunda-feira (12), sejam revistas e revogadas.

A condenação de José Dirceu e José Genoíno a penas de prisão é uma inominável injustiça, fruto de um julgamento politizado, realizado sob pressões antidemocráticas, por meio de procedimentos e conceitos juridicamente questionáveis, alheios à jurisprudência nacional, de atropelos de normas e, sobretudo, de menosprezo aos mais elementares sentimentos de justiça.

A sentença proferida na tarde da última segunda-feira é o epílogo de um processo que, desde a fase da denúncia, mostrou-se não como o “mais atrevido e escandaloso esquema de corrupção da história do país”, como até hoje é apresentado na mídia. O processo é uma mancha de opróbrio na vida democrática nacional desde a promulgação da Constituição de 1988.

Durante todo o processo, partindo de nosso próprio ponto de vista político, pautamos a cobertura dos fatos e a expressão de opiniões pela mais alta consideração, respeito e reverência para com a Corte, e alimentamos a expectativa de que o Supremo Tribunal Federal, no cumprimento de sua missão constitucional, julgaria a Ação Penal 470 com discernimento jurídico, absoluta isenção e rigor técnico, cujo pressuposto era julgar exclusivamente baseado nos autos.

A sentença proferida contra líderes do Partido dos Trabalhadores nada tem de atitude objetiva. Baseia-se em uma teoria estranha à jurisprudência brasileira, como o “domínio funcional do fato”, pune sem que o condenado tenha praticado ato de ofício e ignora um dos princípios elementares dos direitos humanos que é a presunção da inocência.

O processo foi todo ele politizado, desde que o antigo procurador geral, e, depois, o atual e finalmente o ministro-relator do STF, consideraram a priori que houve da parte dos líderes do PT a prática dos crimes de corrupção ativa e formação de quadrilha e que, no caso de um deles, sobressaiu-se como chefe que, como tal, “sabia de tudo”.

A politização do processo atingiu níveis extremos. Pretende-se que com a decisão de trancafiar o companheiro José Dirceu numa prisão, a “República foi refundada”. Difunde-se o conto de que o STF puniu o autor de “um crime de lesão gravíssima à democracia, que se caracteriza pelo diálogo e opiniões divergentes dos representantes eleitos pelo povo”. Em considerações nada condizentes com a verdade dos fatos, referindo-se à articulação política conduzida pelo ex-ministro José Dirceu no início do primeiro mandato de Lula, argui-se que ”foi esse diálogo democrático que o réu quis suprimir pelo pagamento de vultosas quantias em espécie a líderes e presidentes de partidos."

Mais: do plenário do STF, em transmissão direta em rede nacional de televisão, ouviram-se coisas tais como que Dirceu "colocou em risco a independência dos poderes", o que teria “diminuído e enxovalhado pilares importantíssimos de nossa sociedade". Frases de efeito como esta, combinadas com a grandiloquência de pronunciamentos emoldurados por citações doutas e acadêmicas, tentaram convencer a opinião pública de que se praticou a “macrodelinquência no governo” e que os réus eram “marginais no poder”.

Difundidas ad nauseam, essas e outras afirmações foram e são usadas para desqualificar históricos combatentes pela democracia e líderes provados da esquerda como políticos que estavam à frente de manobras para mutilar a democracia no país.

Igualmente, pretende-se macular o governo do ex-presidente Lula - o primeiro de um líder originário das fileiras das lutas operárias e em que foram para o centro do poder forças de esquerda, historicamente massacradas pelos regimes reacionários das classes dominantes – como um governo antidemocrático e corrupto, e assim estigmatizar o PT e o conjunto das esquerdas. O objetivo visado é impedir a continuidade de uma experiência bem sucedida e o exercício de um modo progressista de governar o país.

O pano de fundo é evidente – a luta das classes dominantes retrógradas para retomar o controle da situação política nacional e impedir a evolução do País por meio de reformas estruturais democráticas com conteúdo social e patriótico.

As forças progressistas deste país, incluídos os partidos de esquerda, os democratas, os patriotas, os defensores da Constituição cidadã e os movimentos sociais, respeitando a ordem democrática e as instituições, não podem calar-se diante da ignomínia em que se constituíram as sentenças proferidas, diante da flagrante injustiça contra figuras que integram seus quadros dirigentes, sob pena de também se cobrirem de opróbrio. A solidariedade total aos companheiros apenados há de se traduzir também em uma luta por meios legítimos para que a sentença seja revogada.
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Injusta sentença

Dediquei minha vida ao Brasil, a luta pela democracia e ao PT. Na ditadura, quando nos opusemos colocando em risco a própria vida, fui preso e condenado. Banido do país, tive minha nacionalidade cassada, mas continuei lutando e voltei ao país clandestinamente para manter nossa luta. Reconquistada a democracia, nunca fui investigado ou processado. Entrei e saí do governo sem patrimônio. Nunca pratiquei nenhum ato ilícito ou ilegal como dirigente do PT, parlamentar ou ministro de Estado. Fui cassado pela Câmara dos Deputado e, agora, condenado pelo Supremo Tribunal Federal sem provas porque sou inocente.

A pena de 10 anos e 10 meses que a suprema corte me impôs só agrava a infâmia e a ignomínia de todo esse processo, que recorreu a recursos jurídicos que violam abertamente nossa Constituição e o Estado Democrático de Direito, como a teoria do domínio do fato, a condenação sem ato de ofício, o desprezo à presunção de inocência e o abandono de jurisprudência que beneficia os réus.

Um julgamento realizado sob a pressão da mídia e marcado para coincidir com o período eleitoral na vã esperança de derrotar o PT e seus candidatos. Um julgamento que ainda não acabou. Não só porque temos o direito aos recursos previstos na legislação, mas também porque temos o direito sagrado de provar nossa inocência.

Não me calarei e não me conformo com a injusta sentença que me foi imposta. Vou lutar mesmo cumprindo pena. Devo isso a todos os que acreditaram e ao meu lado lutaram nos últimos 45 anos, me apoiaram e foram solidários nesses últimos duros anos na certeza de minha inocência e na comunhão dos mesmos ideais e sonhos.

José Dirceu
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Mostre as algemas, Zé!

Condenado, sem passaporte e prestes a ser sentenciado a uma das mais duras penas da história judicial brasileira, José Dirceu não tem alternativa a não ser exibir, com orgulho, as algemas preparadas por Joaquim Barbosa, assim como fez quando foi preso pelo regime militar; leia o texto inédito do poeta Lula Miranda, exclusivo para o 247

Por Lula Miranda

Foi o que teria dito a José Dirceu, em Setembro de 1969, um dos presos políticos naquele histórico momento de resistência à ditadura militar em que 15 prisioneiros do regime de exceção e arbítrio, que se instaurara no Brasil, foram libertados em troca do embaixador americano – na fotografia aparecem 13, apenas uma mulher.

Exceção e arbítrio. Palavras malditas. Palavras-emblema de tempos sombrios.

Segundo relato de Flavio Tavares, hoje jornalista e escritor, ele teria sussurrado aos companheiros na ocasião: “Vamos mostrar as algemas”. Fez isso num insight “de momento” ao notar que os presos que estavam ali perfilados, alguns agachados, como um time de futebol campeão, numa forçada pose para uma foto que viria a se tornar histórica, escondiam as algemas. E por que escondiam as algemas aqueles jovens? Talvez por vergonha. Talvez porque estivessem preocupados em como aquela imagem poderia machucar ainda mais seus familiares e parentes mais próximos. Ou talvez, simplesmente, porque já estavam por demais combalidos e abalados moral e emocionalmente para se preocuparem com aquele peculiar adereço do arbítrio. Não se sabe ao certo, tampouco importa. Mas, insistiu Tavares, naquele “insight” que, ao contrário, em vez de esconder, as exibisse.

Mostre as algemas, Zé! Exorto-lhe nos dias que correm hoje. Dias de incipiente e vilipendiada democracia.

Na foto, podem verificar, percebe-se nitidamente o Zé Dirceu exibindo, intrépido, as malditas algemas.

Eu que não fui amigo daquele jovem idealista algemado de outrora, tampouco conheci o suposto homem “todo-poderoso” do governo; logo eu que o combati na disputa política, até com palavras duras, eu que nunca o vi mais magro, ouso lhe fazer a mesma súplica:
Mostre as algemas, José Dirceu!

Não tenha vergonha de nada; tenha orgulho. Você ainda será, por vias transversas, um preso político. Sim, orgulho! Em que pese a maledicência covarde daqueles que, assim como naqueles dias sombrios de 1969, hoje lhe apontam o dedo, xingam e condenam. São os mesmos – “imortais”, “eternos” porta-bandeiras da (falsa?) moral. Ora se são!

Mostre as algemas, Zé!

Exiba a todos, daqui e para o resto do mundo! Mostre a todos o que se faz aqui no Brasil a homens como você, que prestaram valorosos serviços à pátria; que lutaram com destemor contra a ditadura; que ajudaram a eleger o Lula; que empenharam a sua vida e juventude no afã de mudar um pouco a feia face desse país tão injusto com seus filhos, ajudando a implantar políticas públicas que tiraram milhões da miséria e do desalento.

Mostre a p* dessas algemas, cara! Para o bem e para o mal. Para o orgulho dos amigos e regozijo dos inimigos.

Confesso que esperava que o julgamento do STF fosse “emblemático”, justo. Não “justo” pelo mesmo metro, critério ou “premissas” com que a imprensa insuflou e ensandeceu as galerias. Mas justo “de verdade”: que fossem condenados os culpados, aqueles que tivessem suas culpas efetivamente comprovadas. Sim, que fosse uma firme sinalização rumo ao fim da impunidade no Brasil. Mas não foi isso exatamente o que se viu. Não foi isso que testemunhamos. Houve erro e exagero. Do Supremo. Da mídia grande em geral. Uma caricatura. Entre erros e acertos, a injustiça foi soberana.

Os ministros demonstraram-se, desgraçadamente, um tanto tíbios, vaidosos e suscetíveis à pressão e clamor da turba, de modo irresponsável manipulada e insuflada pela opinião publicada.

Você foi condenado sem provas. Isso é fato, irretorquível. Foi condenado sem provas, repito. Foi condenado com base em suposições e suspeitas, com bases em capciosos “artifícios” jurídicos, tais como a hoje célebre “teoria do domínio do fato”. Uma excrescência, uma espécie de “licença poética” do golpismo – com o perdão dos poetas, por aqui aproximar as palavras “poética” e “golpismo”.

Eu poderia “achar” que você era culpado. O meu vizinho poderia achar que você era culpado. O taxista poderia achar. Todo mundo poderia “achar” que Zé Dirceu era culpado. Mas um juiz, seja do Supremo ou de 1ª instância, não pode, em absoluto, “achar” que você ou qualquer outro é culpado. Isso é uma ignomínia – como você tem se cansado de dizer, reiteradas vezes, em suas manifestações. Não nos cansemos de, indignados, exclamar: uma excrescência, uma ignomínia!

Zé, mostre as algemas! Elas são o espúrio troféu que lhe ofertam os verdugos!

Nunca pensei em sair do meu país, Zé, agora já penso com carinho e desconforto nessa possibilidade. Como posso viver num país em que minhas garantias fundamentais de cidadão não são respeitadas?!

Que país é esse?! Que Justiça é essa?!

Quebrou-se a pedra fundamental de toda nossa estruturação jurídica: a presunção da inocência. Em seu lugar colocaram a presunção da culpa. Parece piada, de mau gosto, decerto, mas não é. Como já disse antes, repito: não se é permitido fazer graça com a desgraça alheia. E sua vida foi desgraçada, Zé.

Mostre as algemas!

Veja bem, se você – insisto, reitero – um homem que tantos serviços prestou ao país, um homem respeitado por intelectuais, políticos e autoridades do mundo todo foi enxovalhado dessa maneira, submetido à execração pública pela mídia. Desonrado, chamado de “quadrilheiro”, “mensaleiro”, “ladrão”, o que fariam com um “poeta marginal” como eu? Um homem qualquer, sem galardão algum, sem cânone, sem mérito.

Parafraseando certa atriz de cenho angelical, “namoradinha” desse mesmo Brasil: tenho medo.

Não sei que monstro o STF e a grande imprensa estão ajudando a criar. Mas uma coisa eu lhe asseguro: é assustador.

Para aqueles que, sem questionar, acham justa a sua condenação e prisão eu pergunto; para os “inocentes úteis” que aceitam sem titubear esses consensos forjados e essas verdades absolutas que a grande mídia sopra, todos os dias, em nossas consciências nos telejornais e nas manchetes dos jornais estampadas nas bancas; faço-lhes a pergunta que não quer calar: porque criminalizam e prendem somente os petistas e mais alguns “mequetrefes” da chamada “base aliada” do governo Lula?

Por que essas práticas de sempre na política, hipocrisia à parte, agora “ilícitas” e “criminosas”, só são permitidas aos “de sempre”? Por que os sessenta e tantos investigados no chamado “mensalão mineiro” [não é tucano?!] não foram acusados/denunciados? E não serão jamais – pois para estes o crime é eleitoral; é caixa 2, já prescreveu [“Dois pesos, dois mensalões” – by Jânio de Fritas]. Já quando são petistas os agentes da ação... é corrupção; é “golpe”; são “práticas espúrias”, “criminosas” de um partido, digo de uma “quadrilha”, em “sua sanha de se perpetuar ad eternum no poder”. Não, essas palavras não vieram da tribuna do Senado ou da Câmara dos Deputados, não saíram da boca de algum político da oposição, mas – pasmem! – foram proferidas por ministros do Supremo. Por ministros do Supremo, repito! Juízes na Ação Penal nº 470. Vejam a que ponto chegamos!!!

Mostre as algemas, Zé! Mostre as algemas!

Essas tais “práticas ilícitas” ou “criminosas” não deviam ser permitidas a ninguém - não é mesmo? A Justiça não deveria ser igual para todos?!

Qual a resposta a esse singelo por quê?

Por que só os petistas são condenados, execrados e presos?

A resposta também é simples: para que o poder permaneça nas mãos dos "de sempre", nas mãos dos eternos “donos do poder”. As chamadas “regras do jogo”, até as bastardas, servem apenas para a parte podre das nossas elites; quando é para os “do lado de cá” aí deixa de ser “regra do jogo”, passa a ser crime; “práticas espúrias”; “compra de voto”.

Faço um singelo convite a todos: vamos pensar o país, no qual a gente vive, um pouco além da hipocrisia, do partidarismo, do "falso moralismo" e dos "manchetismos grandiloquentes" de uma imprensa que serve aos interesses de determinada classe social e ideologia. Mais temperança e equilíbrio aos juízes Supremos e nem tão supremos assim, o chamado “cidadão comum”.

Não podemos nos dobrar a esse estado de coisas. Não podemos nos calar e assim sermos cúmplices e testemunhos silentes dos erros dos tribunais. Repito: o Supremo exagerou; a mídia exagerou.

Quadrilha?! Onde? Compra de votos?! Penas de reclusão superiores a 30 anos! Há aí um nítido erro na tipificação dos crimes, nas condenações e exagero na dosimetria das penas. O que é uma pena. Pois isso poderá até favorecer aos condenados, pois essas condenações injustas e essas penas exageradas certamente serão revistas algum dia, por esse ou por outro tribunal. Espero, sinceramente, que sejam revistas por esse mesmo colegiado, pois ali também estão homens de valor. E que essa vergonha, esse grave equívoco não se perpetue.

Nesse momento, só me resta dizer...

Mostre, com orgulho, as algemas, José Dirceu!


Lula Miranda é poeta, cronista e Economista. Foi um dos nomes da poesia marginal na Bahia na década de 1980. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa, Fazendo Média e blogs de esquerda
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Raimundo Pereira demonstra que viga mestra da tese do Supremo é falsa

Raimundo Pereira, jornalista conhecido pelo rigor com que checa as informações que usa, abre a reportagem a ser publicada na sua Revista Retrato do Brasil, edição nº 64, nas bancas a partir do próximo 1º de novembro, com a afirmação de que “não houve o desvio de 73,8 milhões de reais do Banco do Brasil, viga mestra da tese do mensalão”. E parte para a demonstração dessa afirmação. 

A matéria disseca, analisa a fundo, a tese que Raimundo definiu como a “viga mestra” do mensalão. Escreve: “Essencialmente, a tese do mensalão é a de que o petista Henrique Pizzolato teria desviado de um “Fundo de Incentivo Visanet” 73,8 milhões de reais que pertenceriam ao Banco do Brasil. Seria esse o verdadeiro dinheiro do esquema armado por Delúbio e Valério sob a direção de José Dirceu. Os empréstimos dos bancos mineiros não existiriam. Seriam falsos. Teriam sido inventados pelos banqueiros, também articulados com Valério e José Dirceu, para acobertar o desvio do dinheiro público.”

A tese, segundo Raimundo, é falsa. “O desvio dos 73,8 milhões de reais não existe” e “os autos da Ação Penal 470 contêm um mar de evidências de que a DNA de Valério realizou os trabalhos pelos quais recebeu os 73,8 milhões de reais”. 

Raimundo não afirma isso por simples boa fé ou por algum interesse em livrar este ou aquele réu: no site da revista ele dá acesso a 108 apensos da Ação Penal 470 com documentos em formato pdf “equivalentes a mais de 20.000 páginas e que foram coletados por uma equipe de 20 auditores do BB num trabalho de quatro meses, de 25 de julho a 7 de dezembro de 2005 e depois estendido com interrogatórios de pessoas envolvidas e de documentos coletados ao longo de 2006”.

Segundo afirma, a auditoria foi buscar provas de que o escândalo existia de fato. Encontrou documentos que provaram o contrário. Com base nas conclusões dos auditores, Raimundo afirma que “o uso dos recursos do Fundo de Incentivo Visanet pelo BB foi feito, sob a gestão do petista Henrique Pizzolato, exatamente como tinha sido feito no governo FHC, nos dois anos anteriores à chegada de Pizzolato ao banco. E mais: foi sob a gestão de Pizzolato, em meados de 2004, que as regras para uso e controle dos recursos foram aprimoradas”.

O jornalista diz que, tendo analisado toda a documentação da auditoria, encontrou questionamentos e problemas. “Mas de detalhes. Não é disso que se tratou no julgamento da AP 470 no entanto. A acusação que se fez e que se pretende impor através do surto do STF é outra coisa. Quer apresentar os 73,8 milhões gastos através da DNA de Valério como uma farsa montada pelo PT com o objetivo de ficar no poder, como diz o ministro Ayres Britto, "muito além de um quadriênio quadruplicado”.”

Em seguida, Raimundo Pereira classifica a conclusão a que chegou o tribunal de “delírio”. Escreve: “A procuradoria da República e o ministro Barbosa sabem de tudo isso [basicamente, da conclusão da auditoria, de que a parte do FIV a que o BB tinha direito foi repassada à agência de publicidade para pagar serviços que foram comprovadamente realizados e que, no final das contas, levaram o BB à liderança no uso da bandeira Visa no Brasil]”. E conclui: “Se não o sabem é porque não quiseram saber: da documentação tiraram apenas detalhes, para criar o escândalo no qual estavam interessados”.

Viga mestra é a que sustenta a construção. Se ela é retirada, ou tem algum problema grave, a própria construção não consegue permanecer de pé.

Leia a íntegra da reportagem no site Brasil 247, clicando sobre o título “A vertigem do Supremo”.
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Condenado por ser ministro


Nunca fiz parte nem chefiei quadrilha 

Mais uma vez, a decisão da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal de me condenar, agora por formação de quadrilha, mostra total desconsideração às provas contidas nos autos e que atestam minha inocência. Nunca fiz parte nem chefiei quadrilha.

Assim como ocorreu há duas semanas, repete-se a condenação com base em indícios, uma vez que apenas o corréu Roberto Jefferson sustenta a acusação contra mim em juízo. Todas as suspeitas lançadas à época da CPI dos Correios foram rebatidas de maneira robusta pela defesa, que fez registrar no processo centenas de depoimentos que desmentem as ilações de Jefferson.

Como mostra minha defesa, as reuniões na Casa Civil com representantes de bancos e empresários são compatíveis com a função de ministro e em momento algum, como atestam os testemunhos, foram o fórum para discutir empréstimos. Todos os depoimentos confirmam a legalidade dos encontros e também são uníssonos em comprovar que, até fevereiro de 2004, eu acumulava a função de ministro da articulação política. Portanto, por dever do ofício, me reunia com as lideranças parlamentares e partidárias para discutir exclusivamente temas de importância do governo tanto na Câmara quanto no Senado, além da relação com os estados e municípios.

Sem provas, o que o Ministério Público fez e a maioria do Supremo acatou foi recorrer às atribuições do cargo para me acusar e me condenar como mentor do esquema financeiro. Fui condenado por ser ministro.

Fica provado ainda que nunca tive qualquer relação com o senhor Marcos Valério. As quebras de meus sigilos fiscal, bancário e telefônico apontam que não há qualquer relação com o publicitário. 

Teorias e decisões que se curvam à sede por condenações, sem garantir a presunção da inocência ou a análise mais rigorosa das provas produzidas pela defesa, violam o Estado Democrático de Direito. 

O que está em jogo são as liberdades e garantias individuais. Temo que as premissas usadas neste julgamento, criando uma nova jurisprudência na Suprema Corte brasileira, sirvam de norte para a condenação de outros réus inocentes país afora. A minha geração, que lutou pela democracia e foi vítima dos tribunais de exceção, especialmente após o Ato Institucional número 5, sabe o valor da luta travada para se erguer os pilares da nossa atual democracia. Condenar sem provas não cabe em uma democracia soberana.

Vou continuar minha luta para provar minha inocência, mas sobretudo para assegurar que garantias tão valiosas ao Estado Democrático de Direito não se percam em nosso país. Os autos falam por si. Qualquer consulta às suas milhares de páginas, hoje ou amanhã, irá comprovar a inocência que me foi negada neste julgamento. 

São Paulo, 22 de outubro de 2012

José Dirceu

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