Resumo da novela

Semana agitada na novela O Novo Jeito de Governar. Uma novela que se arrasta interminavelmente, apesar dos baixos índices de audiência. Vamos aos principais acontecimentos da semana:

Surgiram notas fiscais comprovando que a reforma e a decoração da Casa do Espanto foram pagas com dinheiro público. Decoração de gosto duvidoso, diga-se de passagem. Como sempre, os documentos foram recebidos com o bordão “Não há fatos novos”, acompanhado das risadas da claque ao fundo. O público já não acha a mesma graça. Entre os itens comprados, destacam-se o piso emborrachado, seis luminárias da Casa das Pantalhas, camas infantis e um "belíssimo" puff verde. Alguns espantaram-se com o valor das luminárias – mil reais cada uma. Contudo, para o uso que a Gov faz das pantalhas, o valor não é tão elevado assim. Um vestido de gala de um estilista famoso custaria muito mais. Seis mil reais em pantalhas de gala é uma bagatela!

Dona Benta, digo, Zilá Breitenbach serviu uma saborosa marmelada para os parlamentares que integravam a Comissão de Impeachment. Os que se recusaram a engolir a marmelada, como Raul Pont, foram acusados de serem grosseiros. Dona Benta, digo, Zilá Breitenbach se queixou para a Abelha Rainha. Raul Pont mandou uma carta para a Abelhinha, respondendo à queixa de Zilá e Elvino Bohn Gass mandou outra, respondendo à primeira carta do dia, enviada pela Gov. A Abelhinha ficou com sua caixa de mensagens lotada.

Como dito, a primeira carta que a Abelhinha recebeu foi enviada pela Gov, que resolveu deixar a distância em que se mantinha (da realidade, talvez?) para maltratar a nossa língua pátria. YRC acusou a sua sempre fiel Abelhinha de alguma coisa confusa, tipo engajar-se sistematicamente em uma campanha liderada por Deputados do PT e agentes (?!?) do PSOL, que, numa linha metódica, desde o início do governo (?!?) estão reeditando (?!?) um golpe, apropriando-se da transparência e atribuindo magnitude extremada a gastos inerentes à representação de um alto cargo, mesmo que reconhecidamente gastos com notas transparentes (?!?), à luz do dia e feitos de forma parcimoniosa. Ou algo assim. Os poucos por cento que ainda pretendem votar nela fizeram comentários irados no Blog da Abelhinha, acusando a ela e a RBS de serem de petistas, parciais e golpistas. Esse acontecimento deu um toque (ainda mais) surrealista à novela.

Tia Yeda se preparou para dar mais uma banda nos Esteites. Já estava tudo engatilhado: saída de mansinho na sexta para São Paulo, embarque para a Califórnia para visitar o filho e, se desse tempo, uma reuniãozinha com a galera do Banco Mundial, lá por quinta-feira, para tomar um cafezinho e justificar as diárias. Enquanto isso, Paulo Feijó iria para Punta. Ninguém daria pela falta da dupla.
Mas aí um grupo de servidores ameaçou estragar o feriadão dos dois e entrar na justiça para que Feijó assumisse o governo (?!?). Achando que a transmissão do cargo para o vice seria mais uma reedição do golpe apropriativo da transparência à luz do dia em decorrência da tendência de golpe, que enquanto pessoa e governadora, Tia Yeda resolveu ficar por São Paulo mesmo. Sem agenda oficial, que é feriadão e ninguém é de ferro!
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Quadrinhos: Olé & Repé







 

Bico de pena (nanquim)
meio-tom eletrônico

Olé & Repé é uma série criada em 2000, para uma publicação da prefeitura de Porto Alegre. Como eu gosto mais da crítica do que do elogio, tratei de criar um equilíbrio entre falar das realizações da administração e apontar os problemas da cidade. Como? Através da polêmica entre o gordo (e faceiro)
Olé e o baixinho azedo Repé. Encerrada minha participação na administração municipal (2004), continuo
publicando as tiras no mensário Jornal do Mercado (P.Alegre), desde 2007. Livres de qualquer vínculo "oficial", O&R podem protagonizar aventuras portoalegrenses (e universais)...

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A Filosofia da pobreza de Espírito

Autor vê nas teses do filósofo um sistema aberto: não foi por falta de tempo que O Capital ficou inacabado

Minha obsessão em estudar Marx como clássico sempre esteve ligada ao projeto de examinar suas teses em vista das aberturas teóricas e práticas que propiciam. Nunca as vi como um sistema fechado, até mesmo O Capital, sua obra máxima, atira em várias direções, e tenho fortes suspeitas de que não foi por falta de tempo que restou inacabada.

O próprio Marx se recusava a ser identificado como marxista. Suas teses valem antes de tudo para serem prosseguidas. É sintomático que, analisando os Grundrisse, Antonio Negri tenha escrito Marx Oltre Marx. Meu novo título, Marx - Além do Marxismo, obviamente inspirado neste último, tenta sublinhar que a base a ser negada é o marxismo cristalizado numa profissão de fé ou numa corrente de pensamento que não se deixa correr. Se a obra de Marx procura desvendar os meandros das estruturas capitalistas de produção, é seu próprio equipamento intelectual que precisa ser renovado, na medida em que o objeto de estudo explode em várias direções.

Meus críticos irão dizer que tento confinar o marxismo aos muros das universidades, que apenas sublinho o lado filosófico da obra de Marx, quando a tarefa, antes de compreender, é transformar o mundo combatendo o capital. O conhecimento não se integra numa práxis? Mas tanto o capital como o mundo explodiram em várias direções, de sorte que nem mesmo podemos falar deles se não levarmos em conta essa dispersão. Além do mais, como detectar o empuxo transformador quando, hoje em dia, o que se tomou como motor da história, o proletariado, não encontra a unidade do capital social total para se contrapor como classe unificada? Não é por isso que as lutas de classe de hoje se fazem por direitos, por conseguinte, repondo o Estado em vez de contestá-lo?

"Marxismo" e "socialismo" se tornaram palavras equívocas. Enquanto havia Estados e partidos que se diziam marxistas, a adesão a ambos tinha, ao menos, um sentido político razoavelmente determinado. Na medida, porém, em que a revolução desaparece do horizonte efetivo da política, que sentido pode ter se assumir como marxista ou socialista? Não somos todos social-democratas nos seus mais variados sentidos? Diante da obra de Marx, sobra apenas tentar pensá-la pela raiz, vale dizer, a partir dela, como somos obrigados a fazer quando procuramos entender Aristóteles ou Kant, ou até mesmo Wittgenstein. Quando alguém ainda se identifica como marxista ou socialista, sem explicar o sentido dessa invocação, logo desconfio que está querendo fazer política sem sujar as mãos no seu jogo efetivo, muitas vezes contentando-se em votar num candidato cuja irrelevância parece ser compensada pela vácua sonoridade de seu discurso.

A crise econômica atual recoloca o problema do automatismo do capital e das contradições do sistema capitalista de produção. Depois de uma longa hegemonia do pensamento liberal, volta-se a falar em Keynes, e Marx passa a ser olhado sob novas perspectivas. Não é significativo que este opúsculo venha a ser reeditado neste momento? Essa crise atualiza certos conceitos marxistas, em particular aquele de um modo de produção cuja reposição passa por crises específicas. Não sei como as ciências sociais contemporâneas lidarão com esse tópico. Mas não vejo como escapar desse conceito de modo de produção, a não ser deixando de lado a específica historicidade de nosso modo de se repor em sociedade. Não é o próprio conceito de história que precisa ser considerado, nos seus dois vetores, história categorial, de um lado, a história do vir a ser, de outro. Esta me parece a primeira grande contribuição de Marx para o pensamento social.

O sistema capitalista se mostrou muito mais lábil do que se imaginava. Por certo essa maleabilidade não apagou suas contradições, continua sendo um extraordinário processo de criação de riqueza e de miséria, mas desapareceu de cena aquele vetor da história, o proletariado, que poderia contestá-lo pela raiz. Além do mais, as experiências do socialismo real mostraram a impossibilidade de uma produção da riqueza social sem as informações produzidas pelo mercado. Para Marx, dado o mercado, ele naturalmente se desdobraria no sistema do capital. Nosso desafio é impedir essa continuidade, por conseguinte, dar liberdade suficiente para que os agentes marquem os preços de seus produtos, sem que sejam levados pelo automatismo de um sistema produtivo, que se transforma num robô visando produzir e acumular riquezas em vista da simples acumulação.

Diante da tarefa de conciliar dois processos contraditórios, uma economia de mercado e uma política que se legitime na medida em que impeça a alienação desses mesmos mercados, pouco vale lamentar-se diante da miséria criada pela exploração capitalista. Mas qual seria a prática adequada para lidar com esses processos contraditórios? Creio que, nessa explosão dos mercados e na necessidade de repô-los num patamar mais humano e racional, no fundo se percebe a urgência de uma política capaz de se controlar a si mesma, em resumo, uma política democrática.

Se a questão é política, então façamos política. Mas eficaz, que tome como ponto de partida as condições dos sistemas políticos atuais, e examinemos teórica e praticamente suas possibilidades de mudança. Foram desmoralizados os arautos do novo homem, ou políticos que imaginavam suprimir o Estado à medida que o reforçavam. Marx desconfiava da democracia formal e, depois da Comuna de Paris, acreditou que uma ditadura do proletariado seria mais democrática do que ela. Mas esse conceito de ditadura serviu para justificar o lema "Todo poder aos sovietes", e hoje sabemos o golpe que ele significou na democracia russa.

Não me parece mais adequado pensar numa política que desemboque numa negação política, a partir da qual uma nova história teria início. Desconfio dos profetas do "novo homem" ou dos Zaratustras da vida. Aceito a política como ela é, mas sempre procurando seu dever ser. Por conseguinte, política democrática, sempre inacabada, precisando começar de novo.

Sob esse ângulo privilegio os textos de Marx que mostram como ações humanas terminam tendo consequências imprevistas e até mesmo indesejadas por elas enquanto atos individualizados. Sob esse aspecto, interessa-me particularmente o conceito hegeliano de alienação, mas torcido de tal forma que escape dos perigos do idealismo absoluto. Daí a necessidade de ler esses textos com lupa fina, cuidando de detectar as torções por que passam os conceitos quando tratam de configurar uma nova forma de práxis dialética. Por isso, depois de minha introdução, achamos conveniente apresentar alguns textos do próprio Marx, mas traduzidos de tal forma que pelo menos deixam transparecer essas torções conceituais. É o que procura fazer a tradução de Luciano Codato. Tarefa difícil, a ser retomada pelos leitores, porque o próprio Marx, numa carta ao tradutor d"O Capital para o francês, aconselha que deixe de lado essas nuances, pois os franceses não são dados a elas. Espero que os leitores de língua portuguesa compreendam a importância filosófica dessas torções.

José Arthur Giannotti
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O Princípio e o Fim.

Sábado chuvoso e eu cá sem o mínimo saco para sair de casa. Mas, ao mesmo tempo, não consigo me concentrar nas milhares de coisas que tenho para fazer neste fim-de-semana prolongado (terminar um artigo, corrigir trabalhos, elaborar avaliações, pôr em dia as leituras...). A chuva bate na janela, por onde vejo a cidade vazia e sonolenta. Definitivamente o mau tempo faz com que as pessoas fujam das ruas. Ouço a voz aveludada de Madeleine Peyroux a cantar “Weary Blues” e tenho uma xícara de chocolate quente ao meu lado (Sim, é verdade: eventualmente eu bebo líquidos não-alcoólicos!). Começo a pensar nos tantos livros que caíram em minhas mãos nestes quarenta anos de vida – definitivamente não estou no pique de trabalho – e tento me lembrar qual foi o melhor começo de uma obra literária que eu já li. Lembro-me logo de “Crônica de uma Morte Anunciada”, do Gabriel García Marquez: “No dia em que o matariam, Santiago Nasar levantou-se às 5h30m da manhã para esperar o navio em que chegava o bispo. Tinha sonhado que atravessava um bosque de grandes figueiras onde caía uma chuva branda, e por um instante foi feliz no sonho, mas ao acordar sentiu-se completamente salpicado de cagada de pássaros”. Fantástica abertura, mas não é esta. “A Jangada de Pedra”, do Saramago? “Quando Joana Carda riscou o chão com a vara de negrilho, todos os cães de Cerbère começaram a ladrar, lançando em pânico e terror os habitantes, pois desde os tempos mais antigos se acreditava que, ladrando ali animais caninos que sempre tinham sido mudos, estaria o mundo universal próximo de extinguir-se”. Maravilhosa, mas também não é esta. Talvez a aparente simplicidade do começo de “O Deserto dos Tártaros”, do Dino Buzzati: “Nomeado oficial, Giovanni Drogo deixou a cidade numa manhã de setembro para alcançar o forte Bastiani, seu primeiro destino. Pediu que o acordassem de noite ainda e vestiu pela primeira vez o uniforme de tenente. Quando terminou, olhou-se no espelho à luz de um lampião de querosene, mas sem sentir a alegria que imaginava”. Não, também não. Vem-me então à cabeça a abertura de um livro lido pela primeira vez na adolescência e depois relido incontáveis vezes: “Um conto de duas cidades”, do Charles Dickens. Decididamente, esta é a melhor de abertura de todos os livros (de ficção) que li:

Foi o melhor dos tempos, foi o pior dos tempos, foi a era da sensatez, foi a era da tolice, foi a época da crença, foi a época da incredulidade, foi a estação da Luz, foi a estação das Trevas, foi a primavera da esperança, foi o inverno do desespero, tínhamos tudo à nossa frente, tínhamos nada à nossa frente, íamos todos direto para o céu, íamos todos direto para o lado contrário – em suma, era um período tão parecido com o atual, que algumas de suas autoridades mais destacadas insistiam em que ele fosse recebido, para o bem ou para o mal, apenas no grau superlativo de comparação.

Continuo a divagar e começo a pensar também sobre qual teria sido o melhor final dos livros que já li. Gosto muito da maneira como Umberto Eco termina “O Nome da Rosa”: “Está fazendo frio no scriptorium, dói-me o polegar; deixo esta escritura, não sei para quem, não sei mais sobre o quê: stat rosa pristina nomine, nomina nuda tenemus”. Mas não, não é este . Talvez “O Estrangeiro”, do Camus: “Para que tudo se consumasse, para que me sentisse menos só, faltava-me desejar que houvesse muitos espectadores no dia da minha execução e que me recebessem com gritos de ódio”. Ótimo, mas ainda não é o melhor. Forçando a memória, lembro-me então de um fecho maravilhoso para uma obra perfeita: “Cem Anos de Solidão”, do García Marquez. É este:

Entretanto, antes de chegar ao verso final já tinha compreendido que não sairia nunca daquele quarto, pois estava previsto que a cidade dos espelhos (ou das miragens) seria arrasada pelo vento e desterrada da memória dos homens no instante em que Aureliano Babilonia acabasse de decifrar os pergaminhos e que tudo o que estava escrito neles era irrepetível desde sempre e por todo o sempre, porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a terra.

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Trilha sonora da noite: Madeleine Peyroux, com "Weary Blues".


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