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O medo da "Ley de Medios" no Brasil

Por Valéria Nader e Gabriel Brito, no Correio da Cidadania:

Após cinco anos de sua idealização, a Argentina conseguiu concretizar a vigência de uma nova Lei de Mídia, redigida a fim de regulamentar a arena das comunicações e reordenar a ocupação do espectro eletromagnético, quebrando os monopólios da mídia comercial. Neste contexto, vários anos se passaram com os mesmos grupos empresariais dominantes bombardeando o governo de Cristina Kirchner, que estaria a “atentar contra a liberdade de expressão”.

Dessa forma, é para elucidar a chamada Lei de Serviços de Comunicação Audiovisuais que o Correio da Cidadania entrevistou o estudioso das comunicações, e editor da revista Caros Amigos, Laurindo Lalo Leal Filho. Com anos de estudo sobre os diferentes níveis de regulação midiática encontrados mundo afora, Lalo assegura que a nova lei é da mais alta consistência, além de amplamente debatida na sociedade: “são dois os grandes aspectos: o teórico-acadêmico e o da sustentação política”.

Como se trata de uma legislação que assegura grande parte das concessões audiovisuais para veículos de comunicação estatais e comunitários, abrindo grande campo para que movimentos e expressões sociais, inclusive minoritários, se manifestem, não foi nada imprevisível o rancor da mídia burguesa, cujos veículos comerciais se apresentam como únicos arautos da democracia.

“A Sociedade Interamericana de Imprensa (órgão que representa a mídia comercial nas Américas) é uma organização que não possui nenhuma legitimidade em relação à sociedade e às populações sobre as quais ela pretende influenciar. É uma organização empresarial, de um setor comercial das comunicações, defendendo os interesses de quem representa”.

Para avançarmos no debate da democratização das comunicações, Laurindo Lalo também recomenda que a lei argentina seja estudada nas escolas de comunicação do país, o que poderá gerar uma real compreensão de sua importância. Uma boa saída para o Brasil, haja vista nosso atual estágio de monopólio midiático, ao lado das dificuldades a serem enfrentadas para a aprovação de uma lei com tal conteúdo em um Congresso densamente permeado pelos interesses dos donos de concessões rádio-televisivas.

“Acredito que não só este governo, mas todos têm um receio muito grande de enfrentar esses poderosos grupos de comunicação. Acho que o fantasma do golpe de 64 perdura até hoje. É uma disputa bastante difícil, mas que aqui no Brasil já está passando da hora”.

A entrevista completa com o jornalista pode ser lida a seguir.

Como o senhor analisa o projeto da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisuais, promulgada pelo governo argentino em 2009 e que passou a vigorar a partir do último dia 7 de dezembro, ainda que sob embargo de instâncias intermediárias da justiça local?

Por ora está embargado, é preciso aguardar um pouco, mas nos próximos tempos devemos ter nova decisão. De toda forma, avalio que essa lei de regulação audiovisual é a mais moderna e avançada de todo o mundo no momento. Serve como exemplo para a América Latina. São dois os objetos centrais da formulação da lei – de 2007. O primeiro é de que foi construída a partir de uma ampla análise jurídica e até acadêmica das legislações hoje existentes em países democráticos de todo o mundo, em relação à radiodifusão. Ela incorpora o que há de mais moderno e avançado em legislações da Europa, EUA e até América Latina.

A lei é muito consistente do ponto de vista teórico, pois, incorporando um pouco de cada uma das leis estudadas, avança para além delas, inclusive sobre os recentes avanços tecnológicos, respondendo também às exigências tecnológicas de hoje. Tenho dito que é muito importante que as escolas de comunicações estudem essa lei, discutindo-a com seus alunos, pois a partir daí vão descobrir como os países democráticos estão estruturados para dar conta das novas tecnologias da comunicação hoje em dia, no campo do audiovisual.

O segundo aspecto que dá consistência à lei é o fato de ter sido formulada através de um amplo debate na sociedade. É uma lei claramente construída de baixo pra cima. Quem tiver paciência de olhá-la por inteiro, poderá perceber que vários artigos e determinações são oriundos de propostas feitas por entidades do movimento social, dentre outras representações da sociedade, incluindo empresariais. Não foi formulada por um grupo fechado, de políticos ou acadêmicos, e imposta à sociedade. Começou com algumas e chegou, ao final de sua elaboração, a contar com praticamente 300 organizações sociais. É uma lei amplamente democrática, consolidada a partir da vontade popular.
Portanto, são dois os grandes aspectos: o teórico-acadêmico e o da sustentação política.

A seu ver, quais são os pontos mais importantes e que justificariam a aprovação da “Ley de Medios”?

O primeiro e mais polêmico, que segue dando pano pra manga e foi o que mais dificultou a aprovação da lei, é aquele que rompe um processo não só argentino, mas latino-americano, de concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucos grupos. Esse é o aspecto central, pois faz com que a lei amplie a liberdade de expressão na Argentina. Ou seja, um espectro eletromagnético hoje ocupado por poucos grupos passa a ser ocupado por um número maior de atores. Setores da sociedade que estão calados por não terem espaço de colocarem suas vozes terão agora a oportunidade. Como diz o documento “Hablemos todos”, todos têm o direito de falar.

Assim, esse é o aspecto prático mais importante da lei, dividindo o espectro de forma mais equilibrada, seja para as emissoras públicas, estatais ou comerciais. É uma lei que amplia a liberdade de expressão ao mesmo tempo em que quebra monopólios. Isso tem um desdobramento político muito importante porque representa um aprofundamento da democracia. Não é só uma questão do campo das comunicações. Quando se amplia o número de vozes, idéias e valores, amplia-se a participação democrática da sociedade. Exemplo disso é o ponto que garante o espaço também para os grupos originários, como o de Bariloche, cujo grupo de habitantes de povos originários está colocando no ar sua emissora de TV. Um grupo que sempre esteve calado. Mas, com um terço do espaço reservado às emissoras públicas, agora também poderão falar à sociedade.

Portanto, esse é o aspecto fundamental, a voz a setores sempre silenciados. Mas existem outros, como a garantia da produção nacional, o que abre espaço a muitos grupos que querem mostrar seu trabalho. Há a classificação indicativa estabelecida em lei, porcentagens máximas de publicidade, enfim, uma série de aspectos, todos voltados não só ao aumento da participação pública, mas também à qualidade do que é oferecido ao público.

Como se viu, é necessário um grande movimento para levar adiante um combate aos monopólios midiáticos, tocando fortes interesses políticos e econômicos com diversos tentáculos de influência. O que teria a dizer, neste sentido, da decisão parcial da justiça de permitir que o grupo Clarín siga adiando seu processo de desmembramento, no qual deve abrir mão de boa parte de seus veículos de comunicação?

O grupo Clarín, como o grupo Globo aqui, foi ocupando os espaços, gradativamente, pela falta de uma presença mais forte do Estado na regulação. Quando o espaço estava vazio, era como um terreno baldio, e foi se criando o latifúndio. E depois se consolidou um grupo muito forte, como se viu, com 240 concessões de TV a cabo, 4 de TVs abertas, 9 emissoras de rádio AM e FM... É um grupo que tem um poder econômico e político muito grande.

Se fosse qualquer outro ramo social ou comercial, poderia ter só o poder econômico. O problema nas comunicações é que, quando se detém o poder econômico, também se detém o poder político. É um poder muito grande, que sempre se confrontou com o Estado, jogando muita influência sobre os outros poderes, isto é, o legislativo e judiciário. O poder judiciário também sofre muitas pressões do grupo Clarín. A lei foi promulgada em outubro de 2009 e até agora não se conseguiu aplicá-la pelas diversas ações promovidas pelo grupo Clarín sobre os vários poderes.

Superados pelo executivo e legislativo, que já deram vigência à lei (o judiciário também, em suas instâncias maiores), restam as instâncias intermediárias do judiciário para pressionar e conseguir recursos no sentido de adiar a aplicação da lei. O que acontece agora é uma disputa entre um grupo poderoso e os poderes da República.

O que você responderia aos setores críticos da lei, inclusive aqueles do próprio meio midiático, como a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP)?

A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) é uma organização que não possui nenhuma legitimidade em relação à sociedade e às populações que ela pretende influenciar. É uma organização empresarial, de um setor comercial das comunicações, defendendo os interesses de quem representa. Quer defender os mercados nos quais atua. Portanto, não tem sustentação política alguma.

É uma organização comercial, que tem a sustentá-la empresas comerciais da América que sempre sustentaram governos conservadores e até ditaduras. As ditaduras da América latina, dos jornais e da própria SIP. Basta lembrar que ela foi fundada durante a ditadura de Fulgencio Batista, antes da revolução cubana. Tem uma articulação com os regimes conservadores de direita muito grande.

Na verdade, quando esses governos populares da América Latina – como os da Argentina, Bolívia, Equador, Venezuela – começaram a colocar algum limite ao poder de seus filiados, a SIP obviamente saiu em defesa deles. Mas é uma defesa de mercado, não tem nada a ver com cidadania, liberdade de expressão, de imprensa. Tem a ver com os interesses comerciais das empresas que a SIP representa.

Ainda quanto às críticas à nova lei, e talvez nesse mesmo sentido explicado, a maioria dos meios de comunicação de nosso país bombardeia que, a despeito de serem razoáveis as precauções contra o monopólio das comunicações, o que se vê na Argentina é uma “descarada perseguição movida pela presidente Cristina Kirchner contra um grupo de mídia, o Clarín, cujo principal pecado é publicar reportagens e opiniões que a desagradam” (segundo Editorial da Folha de S. Paulo, 09/12/2012). O que diria frente a um argumento desta natureza?

É uma forma de distorcer o debate, ofuscar o debate real. A mídia ressalta essa divergência existente entre o governo e o grupo Clarín para esconder a realidade da lei, que é a ampliação da liberdade de expressão. Pegam um aspecto – o confronto – e o colocam em destaque. O grupo Clarín representa hoje a oposição política ao governo Cristina. Mas isso é um aspecto parcial, é direito deles fazer oposição ao governo. Isso não tem nada a ver com uma questão muito maior, o debate em torno da ampliação do espaço para outras vozes e grupos, a fim de que possam estes também se manifestar.

Pra deixar claro, a lei não toca em momento algum nos meios impressos. É uma lei de comunicação audiovisual. E quando os jornais, como Folha, Estadão e Globo, falam em “ataques do governo ao Clarín” parece que o governo argentino está querendo intervir no jornal Clarín. Este jornal continuará fazendo o que faz hoje, com liberdade total. O que acontecerá com a aplicação da lei é que o grupo Clarín, não o jornal, será obrigado a abrir mão de licenças de rádio e TV que vão além do limite estabelecido pela lei.

Creio ser um aspecto importante porque aqui no Brasil os meios de comunicação gostam de misturar mídia impressa com eletrônica. A lei argentina é sobre a mídia eletrônica. A lei de mídia que se começa a discutir no Brasil também é sobre a mídia eletrônica. Porque a nossa lei é de 1962. O que esses grupos brasileiros fazem, para atacarem a Ley de Medios argentina, na verdade revela seu temor de que o exemplo argentino sirva de inspiração para os movimentos populares do Brasil e leve, finalmente, o governo a apresentar projeto de lei semelhante. O governo Lula, no final de seu segundo governo, através de seu ministro Franklin Martins, chegou a deixar pronto o projeto de lei, repassado ao governo Dilma para ser levado ao Congresso, guardando semelhanças com a Ley de Medios argentina.

Portanto, a carga que a mídia brasileira traz sobre o projeto argentino é uma forma de tentar evitar uma “contaminação” no cenário brasileiro pelo avanço ocorrido na Argentina.

E trazendo o assunto para o Brasil, como acredita que deveríamos olhar para a lei argentina e que tipo de debate podemos levar adiante?

Já cansamos de falar, mas o Brasil está atrasado em mais de 50 anos. A lei brasileira das comunicações é de 1962, assinada por João Goulart, e mesmo assim houve uma série de vetos deste governo, que foram derrubados por um Congresso onde os rádiodifusores tinham domínio total - como continuam tendo, configurando o poder que sempre se contrapôs ao avanço de uma legislação da área no Brasil.

Temos muita dificuldade em avançar porque essa é uma questão que ainda não está enraizada no Brasil. Não temos massa crítica para um debate público e popular, como o que existe na Argentina. Mas estamos avançando. Se formos pensar em quinze anos atrás, não tínhamos o debate que hoje já temos. O principal exemplo foi a realização da Conferência Nacional das Comunicações, no final de 2009, que mobilizou entidades da sociedade em número já razoável, indo além dos debatedores tradicionais, que eram as universidades, os sindicatos... Hoje não, temos associações de classe, mulheres, movimento negro, movimentos sociais, entidades regionais, que já começam a discutir pelo país a criação de uma Lei de Mídia.

O caminho para acompanharmos esse processo natural é mais ou menos o modelo argentino. É preciso enraizar socialmente o debate, mas é preciso também contar com o governo. Apesar de toda essa participação popular, o impulso final foi dado pelo governo de Cristina Kirchner, que sem dúvida alguma sancionou a lei usando, principalmente, os canais públicos de rádio e TV para conseguir levar o debate à sociedade. Enquanto isso não acontecer, fica muito difícil para o cidadão comum entender o que significa uma lei dessas.

Como analisa o governo brasileiro em sua atuação no campo das comunicações e sua relação com os grupos midiáticos?

Acredito que não só este governo, mas todos têm um receio muito grande de enfrentar esses poderosos grupos de comunicação. Escrevi um artigo chamado “A síndrome Jango, aos 50”, no qual coloco que o fato de os grupos de comunicação terem praticamente empurrado pra rua o governo Jango, colaborando muito para o golpe de 64, que depois sustentaram, fez com que todos os governos de lá pra cá tenham muitos cuidados, estejam sempre cheios de dedos para dialogar com a mídia. Acho que o fantasma do golpe de 64 perdura até hoje. Não só esse, mas todos os governos sempre tiveram um receio muito grande de ir à frente com um debate pra colocar a mídia e, principalmente, os meios eletrônicos em um enquadramento democrático.

Podemos perceber algumas pesquisas que mostram que, desde 1988, da Constituinte pra cá, já foram elaborados 20 projetos de lei pelos governos, mas que nunca foram colocados em debate na sociedade, muito menos levados ao Congresso Nacional. Pois, em determinado momento da discussão, vinha a ameaça de que o governo poderia ser alvo de uma campanha difamatória muito grande, que poderia até levá-los à desestabilização.

Portanto, é uma disputa muito delicada, sendo necessária uma vontade política muito grande. Mas essa vontade é necessária. E para ser vitoriosa, não basta que seja vontade política dos governos. É preciso que seja combinada com os movimentos sociais. É uma disputa bastante difícil, mas que aqui no Brasil já está passando da hora.

Acredita que o governo Dilma possa se espelhar no exemplo argentino e buscar caminhos para uma maior democratização do espectro midiático, tão dependente de poucos grupos empresariais?

Tenho visto a presidente Dilma tomar medidas que antes a gente achava impossíveis de serem tomadas. São os casos da redução da taxa de juros e agora da redução da tarifa da energia elétrica – mais a disputa que trava agora com as três empresas elétricas controladas pelo PSDB. Ela mostra muita coragem nesses enfrentamentos. Não posso descartar essa possibilidade, ainda mais agora que percebemos que ela tem uma estreita relação com a Cristina Kirchner. Assim, parece-me que a Dilma acompanha bem de perto o que acontece lá com a Ley de Medios. Acredito que o exemplo ela tem, o modelo está traçado. O modelo argentino cabe perfeitamente no Brasil, com pequenas adaptações.

É difícil dizer se fará ou não. É difícil acreditar totalmente porque o Brasil tem uma dificuldade a mais: a presença no Congresso Nacional de muitos parlamentares radiodifusores, ou seus representantes, e que fazem parte da base de apoio ao governo, principalmente dentro do PMDB. Esta é uma dificuldade real, coisa que na Argentina acabou sendo enfrentada, e a lei passou.

Não sei até que ponto o governo teria possibilidade de ir à frente numa lei de mídia contando com tal base de sustentação política no Congresso. É luta política, de conquista de apoio, indo à frente e enfrentando essa dificuldade. É muito difícil saber se será possível travá-la no primeiro mandato de Dilma, embora o movimento social e a luta pela democratização da comunicação já tenham claro que estamos muito atrasados, e ficaremos cada vez mais em relação a outros países latino-americanos.

Em sua opinião, quais seriam os pontos mais importantes de uma imaginária “Ley de Medios à brasileira”?
Sem dúvidas, tal como lá, um ponto é a divisão do espectro para ampliar a participação de outras vozes no debate político e cultural brasileiro. Em outras palavras, enfrentar o monopólio. Estabelecer limites máximos pra que grupos econômicos tenham determinado número de concessões de rádio e TV, permitindo que outros grupos da sociedade civil possam participar das disputas. Creio ser esta a questão central, tanto na Argentina como no Brasil.

E temos de ir além, porque o Brasil, com as dimensões continentais que tem, necessita de uma lei que dê conta de uma difusão maior nas concessões, estimulando a produção regional. Isso porque tivemos não só a concentração dos meios nas mãos de poucas empresas, mas também uma concentração regional dos meios, determinando que todas as pautas e valores que circulam pelo país continuem sendo produzidos no eixo Rio-São Paulo, passando um pouco por Brasília. A regionalização é fundamental e a lei precisa dar conta disso.

Além do mais, há outras coisas importantes, que nada mais são que a necessidade de regulamentar a Constituição Federal brasileira. A lei tem de vir pra regulamentar artigos da Constituição que garantem uma maior democratização da comunicação e que até hoje não foram colocados em prática. Tem a ver com a regionalização, tem a ver com cotas pra produção nacional, cotas pra produção independente... A lei deve dar conta de tudo isso, para que a comunicação seja algo de todos para todos, e não como é hoje, (feita) de poucos para muitos.
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Mídia lamenta a surra na Venezuela

Por Altamiro Borges

A mídia nativa até agora não entendeu a surra que a direita levou nas eleições da Venezuela no domingo. Em outubro, ela apostou no ricaço Henrique Capriles na disputa presidencial, mas teve de engolir uma nova e consagradora vitória de Hugo Chávez. Agora, ela até explorou o retornou do câncer do presidente para prognosticar um fortalecimento da oposição direitista. Mas também se deu mal. O “chavismo” venceu em 20 dos 23 estados e Capriles, o queridinho da mídia, quase perdeu em Miranda (52% a 48% dos votos).

A aposta macabra da Folha

Diante da surra, a mídia lambe as feridas. Em editorial ontem, intitulado “Um futuro sem Chávez”, a Folha fez verdadeiro malabarismo para explicar a derrota. Afirma que “os resultados das eleições estaduais na Venezuela tornam ainda mais incerto o futuro do país”. Ela só não explica a causa desta “incerteza”. Afinal, como o jornal mesmo reconhece, “o presidente Hugo Chávez – no poder há 14 anos, reeleito em outubro para mandato de mais seis – obteve vitória acachapante ao arrebatar 20 dos 23 Estados”.

A Folha tem a caradura de afirmar que Henrique Capriles, que quase perdeu a eleição no seu estado e que viu seus adeptos serem enxotados em cinco dos oito governos que administravam, saiu-se mais fortalecido da disputa estadual. “Credenciou-se, assim, como candidato natural na próxima eleição para presidente”. Na prática, a única aposta da famiglia Frias é na morte do líder bolivariano. “Chávez enfrenta um câncer designado como ‘pélvico’ que o levou à quarta cirurgia em Havana, Cuba. O prognóstico não é bom”.

Estadão e o "encanto chavista"

Já o Estadão, também em editorial, lamentou a surra sem disfarçar a sua tristeza. “Mesmo hospitalizado, enfrentando um câncer do qual se dizia curado e longe da Venezuela, o caudilho Hugo Chávez está desmantelando seus opositores, pavimentando o caminho para a manutenção do regime bolivariano na sua eventual ausência... As eleições mostraram a força do caudilho e, em igual medida, a incapacidade da oposição de superar as divergências e de apresentar-se como alternativa viável à ‘revolução bolivariana’”.

Apesar de desnorteada, a mídia nativa – que mais parece uma sucursal rastaquera do Departamento de Estado dos EUA – não desiste. Ela não tolera o “populismo” de Chávez e rejeita sua democracia “plebiscitária”. Sua aposta é no ricaço Henrique Capriles, que também é dono de veículos de comunicação. Mas admite que a situação não é fácil. “Como as urnas mostraram, a oposição venezuelana terá de ser muito mais eficiente e unida do que foi até agora para conseguir quebrar o encanto chavista”, confessa o Estadão.
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Chavismo conquista maioria dos estados

Por Marina Terra, no sítio Opera Mundi:

Com uma vitória ampla do chavismo sobre a oposição nas eleições regionais deste domingo (16/12), o novo mapa político venezuelano favorece o processo revolucionário empreendido pelo presidente Hugo Chávez. Após perder em sete Estados em 2008, o governo ganhou em 20 dos 23, de acordo com o CNE (Conselho Nacional Eleitoral) do país. A abstenção foi alta, de quase 54%.

 "O mapa da Venezuela está pintado de vermelho", afirmou o Jorge Rodríguez, chefe do comando de campanha do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela). "Pela força do povo, cinco governos que estavam nas mãos da oposição foram resgatados para a gestão de Chávez", completou. O secretário-executivo da aliança opositora MUD (Mesa de Unidade Democrática), Ramón Guillermo Aveledo, disse que os resultados não são satisfatóriios, "porque perdemos em alguns Estados", mas falou que ficou demonstrado "que esse povo não se deixa ser influenciado, não se dá por vencido, não se rende a ninguém".

Os candidatos do PSUV recuperaram os governos de três importantes Estados: Zulia, o mais rico do país – produz dois terços do petróleo da Venezuela – e maior zona eleitoral; Carabobo, onde está localizada grande parte dos centros industriais do país, principalmente petroquímico e Táchira, localizado na fronteira com a Colômbia e antes conhecido por ter um forte antichavismo. Os outros dois foram Nova Esparta e Monagas.

A oposição conquistou novamente o importante Estado de Miranda, com Henrique Capriles, candidato na eleição presidencial, derrotando por 52,02% o ex-vice-presidente Elias Jaua (47,62%). Em Lara, foi reeleito Henri Falcón (56,23%), dissidente chavista, que duelava contra Luis Reyes Reyes (43,50%), ex-governador e um dos maiores aliados de Chávez. Em Amazonas, o candidato da MUD Liborio Guarulla bateu Nicia Maldonado do PSUV.

“É uma vitória gigantesca para o governo, porque consegue os governos de Estados estratégicos, como Zulia, pelo petróleo, Carabobo, pelas indústrias e Táchira, pelo aspecto da problemática fronteira”, afirmou a Opera Mundi o analista político venezuelano Alberto Aranguibel. "Por sua vez, as conquistas da oposição, principalmente em Miranda, comprovam que a Venezuela não é uma ditadura e sim uma democracia ampla e profunda", completou.

Antes do anúncio, em 8 de dezembro, de que o câncer do presidente havia voltado, o pleito já era visto como crucial pelo chavismo e pela oposição. Se por um lado a oposição desejava manter os Estados onde governava e conquistar outros mais para fazer frente ao presidente, o governo apostava na reconfiguração da geografia eleitoral para impulsionar o projeto político da chamada “Revolução Bolivariana”.

Após a cirurgia de Chávez e a incerteza com relação à sua saúde, o significado dos resultados se tornou ainda mais importante. “O processo em curso na Venezuela não acontece por causa das eleições, mas é corroborado pelo voto”, disse Aranguibel, para quem a conquista da grande maioria dos governos pelo chavismo representa um avanço no projeto chavista.

Abstenção

A eleição foi marcada por uma alta abstenção – o voto não é obrigatório na Venezuela. De acordo com o CNE, é comum que eleições regionais registrem uma menor participação, em comparação com a presidencial. Em 7 de outubro, 84% dos venezuelanos aptos a votar seguiram para as urnas. Além disso, a proximidade com as festas de fim de ano fez com que muitos venezuelanos viajassem e deixassem de votar.

Percebendo a falta de eleitores nos centros de votação, desde cedo as campanhas do governo e da oposição convocaram os eleitores a votar. O chefe do oficialista Comando Carabobo, Jorge Rodríguez, do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), disse acreditar que a participação popular “se imponha” e convidou as pessoas a votar.

O coordenador da campanha da MUD, Antonio Ledezma, afirmou que nessas eleições “não está em jogo somente um governo”, indicando que os resultados podem definir o mapa político venezuelano.
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Golpistas privatizam o Paraguai

Por Altamiro Borges

Na terça-feira passada, um protesto convocado por entidades estudantis e sindicatos dos professores reuniu milhares de pessoas em Assunção. A manifestação teve como eixo central a denúncia do governo golpista do Paraguai, “presidido” por Federico Franco, que enviou recentemente ao Congresso Nacional um projeto de lei que privatiza todo ensino público do país. A mídia brasileira, que apoiou o “golpe constitucional” na nação vizinha, simplesmente escondeu o gigantesco protesto.

O projeto de privatização do ensino já foi aprovado no Senado e tramita na Câmara dos Deputados – as duas casas são controladas por forças direitistas e foram responsáveis pelo golpe relâmpago que destituiu o presidente Fernando Lugo, em junho deste ano. A nova lei também prevê o aumento das mensalidades pagas nas instituições privadas de ensino. Durante o protesto, realizado em frente ao Congresso Nacional, os trabalhadores na educação também denunciaram que os salários do setor estão atrasados há três meses.

Os retrocessos neoliberais

Na mesma terça-feira, em Santa Maria, no estado de Misiones, organizações de trabalhadores rurais realizaram uma marcha contra o fim dos direitos conquistados no governo de Fernando Lugo. Os golpistas do Paraguai têm promovido acelerados e graves retrocessos nas políticas agrária e agrícola, reforçando o domínio dos latifundiários. Os ruralistas tiveram papel ativo no golpe de junho, criando um clima de terror no campo contra a reforma agrária, e agora estão sendo agraciados pelo “presidente” Federico Franco.

Desde o golpe, o Paraguai se tornou num paraíso dos ricaços. Como relata o jornal Hora do Povo, “Franco realizou amplas concessões antipopulares para as multinacionais. Entre as quais, ele submeteu a produção de sementes de soja a Monsanto e o monopólio de exploração do petróleo para a Dahava Petróleos”. O país caminha para o abismo. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), ele sofrerá retração de -1,8% em seu PIB neste ano, um dos piores resultados da América Latina.

Merval Pereira e Álvaro Dias

Os neoliberais nativos – como o “imortal” Merval Pereira (Globo) e o exótico senador Álvaro Dias (PSDB-PR) –, que deram total apoio aos golpistas, agora estão em silêncio. Eles nada falam sobre as regressões políticas e sociais no país vizinho, nem sobre as lutas deste sofrido povo. Eles são cúmplices da barbárie em curso no Paraguai. Ninguém pode esquecer!
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O impasse venezuelano e o futuro

Por Juan Carlos Monedero, no sítio Outras Palavras:

Já há gente na oposição venezuelana argumentando que, se Chávez não vencer a doença, quem deve ocupar a presidência é o candidato derrotado Capriles. Sua lógica democrática é tão consistente quanto seu interesse pelos pobres, antes da chegada de Chávez. Há também os que acreditam que podem ir até os militares, sem mais, e convidá-los a dar um passo fora da Constituição.

Esquecem que nos quarteis venezuelanos já não se veem cenas de West Point nem imagens de marines matando vietnamitas, mas retratos de Bolívar ou Che Guevara. Outros andam fuxicando para ver se têm a sorte de que alguém próximo ao presidente dê um passo a favor da oposição, voltando a esquecer que, se existe hoje na Venezuela um mandato transcendente, é o pedido de unidade lançado pelo presidente a caminho da mesa de operação.

Como sempre, aí estão os meios de comunicação (80% deles, é bom lembrar, nas mãos dos inimigos do processo) julgando ser o principal partido de uma oposição cujo único acordo é tirar Chávez do Palácio de Miraflores. A enfermidade do presidente desenha hoje um sorriso em suas faces de bons católicos, apostólicos e romanos convencidos de que, depois de ter sido dado por desaparecido durante décadas, uma hora isso há de ser verdade.

Ontem tentaram fazer de uma mensagem do Twitter um acontecimento mundial. A proximidade do Natal aviva seu amor. Mas sua aposta, #RIPChávez, ficou muito distante do #BuenaVibraPaChávez que bombou no Twitter, deixando claro, aos que se atrevem a esquecer, que Chávez tem com o seu povo o tipo de relacionamento daqueles que saíram juntos do buraco e nunca se traíram. Quando você acredita que o poder lhe pertence por direito de nascença, não se acostuma nunca a ver o outro na cadeira presidencial. E, se a ira o confunde, seu juízo fica nublado.

Essas estratégias se repetem desde o início do governo bolivariano. “Não joguem com o amor de um povo. Menos ainda com o amor de um povo que foi maltratado durante tantos anos (…) Oposição: muito cuidado com o que faz.” A advertência é de Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional, e político com grande ascendência entre os militares venezuelanos. Desde que Chávez surgiu, a oposição desesperada não teve dúvida de usar qualquer tipo de estratégia, em cada momento, para tentar levar, fora das urnas, o que não teve condições de ganhar nas eleições mais limpas e transparentes da América Latina (como reconheceram os presidentes dos tribunais eleitorais da América Latina e o Centro Carter, norte-americano).

Esse não é um atributo exclusivo da direita venezuelana (recordemos os golpes de Estado de Franco, Pinochet, Videla; a caça às bruxas de McCarthy para acabar com os democratas, nos EUA; o papel dos Contra na Nicarágua; a guerra suja, inclusive contra Felipe González – que era, no fundo, um dos seus – e um grande etecétera), mas na pátria de Bolivar eles exageram. Ali testaram, sem êxito, todos e cada um dos métodos que, ao longo da história latino-americana, serviram para tirar do governo os presidentes desobedientes disso que, antes da queda do Muro de Berlim, chamava-se imperialismo. E é aí, nesse fracasso, que nasceu a comunhão de Chávez com seu povo.

Com sua enfermidade, Chavez não fez como Mitterrand – que escondeu a doença do povo francês. Muito pelo contrário, apresentou-se como candidato às eleições informando que estava abatido pelo câncer. O povo lhe deu um apoio espetacular, e com uma participação histórica de eleitores, 80,48%, teve 11 pontos de vantagem sobre seu opositor (8.191.132 a 6.591.304 de votos). Obama teve 3,4 pontos de vantagem sobre Romney. As tentativas de esquecer esse resultado não ajudam ninguém, especialmente a oposição. Mas eles só se miram no espelho da mídia que financiam.

Contudo, o reaparecimento de células malignas no mesmo lugar das operações anteriores não pode ser ignorado. Em uma ação de urgência, Chávez apontou Nicolás Maduro, atual chanceler e vice-presidente, como a pessoa que deveria tomar as rédeas do processo revolucionário no caso de um desenlace fatal impedi-lo de tomar posse em janeiro. O artigo 233 da Constituição, parágrafo segundo, é claro: “Quando se produzir a falta absoluta do presidente eleito ou presidenta eleita antes de tomar posse, se procederá a uma nova eleição universal, direta e secreta, dentro dos trinta dias consecutivos seguintes. Enquanto se elege e toma posse o novo presidente ou a nova presidenta, o presidente ou presidenta da Assembleia Nacional se encarregará da Presidência da República.

Como em tantas outras vezes, Chávez pensou mais na Venezuela do que em sua vida pessoal. Há decisões que poderiam ter sido tomadas de forma mais fluida, se tivessem tido um prazo maior – mas a verdade é que recarregar as baterias de um país na mira dos Estados Unidos não é tarefa simples. Hoje podemos pensar que ele poderia ter feito um esforço menor na campanha, mas sabemos também que isso seria uma opção somente quando o que conta é a sua saúde, e não a do país. A mensagem de Chávez, acompanhada do semblante abatido do pessoal do seu governo – uma cena própria da última ceia –, teve um efeito demolidor de quem pensa em termos de História. 

Chávez disse a quem quis escutar: “entro na sala de operações, mas não sei se saio dela. Quero que o processo em direção ao socialismo siga seu rumo. E a pessoa adequada para alcançar isso é Nicolás. Quero que todo o povo, militares, partidos, conselhos comunitários, funcionários, governo deem um exemplo de unidade em torno do vice-presidente, no caso de haver eleições e eu já não estar aqui. Vou lutar para voltar, mas, se não for esse o caso, vocês sabem claramente qual é o meu desejo”.

Ordem constitucional garantida

Somente os que passaram anos desejando ou tramando a morte de Chávez estão adiantando a análise. Não há grande bondade em pretender dar por ocorrido o que não aconteceu. O que se pode dizer, então? A ordem constitucional está garantida na Venezuela. Os critérios jurídicos vinculados à ausência do presidente são de uma clareza meridiana e o apoio a essa ordem constitucional, tanto do povo como do exército, não tem a menor fissura. Não há nenhuma razão, exceto as más intenções, para questionar aquilo que está bem regulamentado na ordem legal venezuelana. Além do que continua sendo certo que o melhor para a Venezuela e para a América Latina é que, em 10 de janeiro, Hugo Chávez tome posse de seu cargo como presidente.

Nos dias que antecederam a operação do presidente, pareceu sensato legitimar politicamente a opção por Nicolás Maduro expressa por Chávez. Para ele, os órgãos políticos devem colocar-se em marcha – especialmente o PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), mas sem esquecer as outras forças que apoiam o processo. O carisma do presidente Chávez serve para passar a Maduro seu compromisso com a Venezuela socialista, como aconteceu com Lula e Dilma Rousseff. Convém, portanto, respeitar os procedimentos correspondentes, ainda mais quando se pensa que Maduro vem se perfilando há tempos como sucessor natural de Chávez.

A figura de Nicolás Maduro experimentou nos últimos anos um enorme crescimento político – como ocorreu com Evo Morales, Rafael Correa ou Cristina Kirchner. Em qualquer caso, os cenários que poderiam abrir-se com a ausência de Chávez no primeiro plano da cena política obrigam-no a elucidar alguns aspectos importantes, que Chávez resolveu com seu enorme prestígio pessoal.

Em primeiro lugar, deve deixar claros quais serão os canais por meio dos quais será executada a união cívico-militar (que é uma característica da Venezuela bolivariana). Em segundo, seria importante proceder a uma reconfiguração do PSUV, de modo que as diferentes sensibilidades existentes em todo projeto político – e que na ausência de Chávez deverão se manifestar com mais força – encontrem seu espaço de expressão. Em terceiro lugar, há que dedicar muitos esforços para colocar em marcha o novo plano socialista (foi com ele que se ganharam as eleições), dando prioridade às exigências populares, aprofundando a eficiência governamental e permitindo que os problemas existentes encontrem espaços públicos de expressão, de modo a converter-se em formas populares de avaliação das políticas públicas (esta é uma das garantias da unidade popular).

Por último – e nisso Maduro tem muito caminho andado – é essencial que as diferentes formas de integração regional continuem avançando. O continente latino-americano deve a Chávez o fato de que tem hoje a maior integração de toda a sua história. A ALBA (Aliança Bolivariana para as Américas), o Mercosul, a CELAC (Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos) são espaços que devem aprofundar-se, ao invés de desacelerados. Todas essas questões têm o selo de Chávez. Por essa razão, ele chegou para ficar. Há líderes que marcam a História e, por mais esforço que se faça, não morrem nunca.

Seja qual for o desenlace físico – o melhor é ver Chávez colocar a faixa presidencial no início de 2013 –, a tarefa de todas e todos os venezuelanos é fazer um esforço semelhante ao de 2002. Naquele ano, a mesma oposição que agora brinda o câncer com champanhe francês deu um golpe de Estado que foi derrotado pelo povo. Agora, trata-se de assumir a responsabilidade que corresponde a todos e a cada um nesse cenário complicado. Chávez fez o mais difícil. A Venezuela hoje tem pátria. Mas os inimigos continuam à espreita. É agora, mais do que nunca, que Chávez e o povo têm de ser um só. Um povo que converta sua tristeza em ferramenta política para aprofundar a transformação socialista da Venezuela contra todos os ventos do neoliberalismo. Esses ventos de que ela se liberou e, agora, a velha Europa está começando a conhecer.

* Tradução de Inês Castilho
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Manifesto de solidariedade a Chávez

Do sítio Vermelho:

Neste sábado (15), o Consulado da República Bolivariana da Venezuela em São Paulo sediou uma reunião de lideranças de partidos políticos e movimentos populares, que foram levar a solidariedade do povo brasileiro ao povo irmão venezuelano e desejar pronta recuperação do presidente Hugo Chávez, que foi submetido nesta semana a uma complexa cirurgia como parte do tratamento de um câncer.

O dia 15 de dezembro é repleto de simbolismos para o povo venezuelano. Neste dia, há exatos duzentos anos, Simon Bolívar escrevia o manifesto de Cartagena, em referência à luta pela independência da Colômbia e Venezuela. O histórico documento é considerado por muitos como as primeiras linhas onde o "libertador" expressa seus ideias de integração americana. Neste dia também foi promulgada a Constituição Bolivariana da Venezuela, há 15 anos, e assinado o acordo de criação da Aliança Bolivariana das Américas (Alba), no ano de 2004.

O cônsul da Venezuela em São Paulo, Robert Torrealba, falou sobre o significado histórico da data, relatando as inúmeras manifestações de solidariedade que o presidente Chávez tem recebido, assim como a expressão do compromisso do povo venezuelano com as transformações que estão em curso no país.

Rubens Diniz, membro da comissão de relações internacionais do PCdoB, reafirmou a solidariedade do povo brasileiro com o presidente Chávez, desejando sua pronta recuperação. Lembrou a campanha realizada ao inicio do segundo semestre em apoio à reeleição do presidente Chávez, destacando que a opinião do conjunto das forças políticas de esquerda e dos movimentos sociais no Brasil era de que uma vitória do presidente Chávez, seria uma vitória da integração solidária na América Latina.

Durante o encontro no Consulado da Venezuela em São Paulo foi lido um manifesto solidário. Leia a íntegra.

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O Brasil está com Chávez!

Os partidos e os movimentos sociais que fazem parte da campanha “O Brasil está com Chávez” vêm a público expressar sua solidariedade ao companheiro Hugo Chávez, a seus familiares e a todo o povo venezuelano.

Somos esperançosos de que os procedimentos médicos levem à plena recuperação do companheiro Chávez.

Nós que nos mobilizamos em uma campanha no Brasil de apoio a reeleição do presidente Chávez, temos clareza da importância do processo de transformações que estão em curso na Venezuela e do seu significado para o fortalecimento da soberania e da integração solidária na América Latina.

Neste momento de grande clamor, manifestamos nosso total apoio à direção do Polo Patriótico, do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), aos movimentos sociais, e igualmente a todo o povo venezuelano, conclamando-os à unidade e a seguir em frente com as transformações na Venezuela.

O Brasil esta com Chávez!

Saúde companheiro!

Assinam:

- PT - Partido dos Trabalhadores
- PCdoB - Partido Comunista do Brasil
- MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra
- CTB - Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil
- Via Campesina – Brasil
- UNE – União Nacional dos Estudantes
- Cebrapaz - Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz
- Consulta Popular
- UBM- União Brasileira de Mulheres
- Levante Popular da Juventude
- MAB - Movimento dos Atingidos por Barragens
- UJS – União da Juventude Socialista
- AP – Assembléia Popular
- MMM – Marcha Mundial das Mulheres
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Avanços e temores na América Latina

Editorial do jornal Brasil de Fato:

Na última semana, alguns fatos sacudiram a conjuntura da América Latina. Entre os acontecimentos positivos, que tem muita influência na correlação de forças da luta de classes internacionais e do continente, destacam-se, em primeiro lugar a reunião de Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul e Estados Associados, realizada dia 7, em Brasília. A reunião foi muito importante porque manteve o isolamento do governo golpista do Paraguai e aceitou a condição de membros associados a Bolívia e o Equador, antes eram apenas observadores.

Assim, o bloco deixa de ser apenas um acordo comercial de tarifas aduaneiras e caminha a passos largos no sentido mais político de se transformar no instrumento de integração econômica da Unasul. Espera-se que com as novas adesões o Mercosul passe então a ser uma ferramenta de todos os países da América do Sul. Será apenas uma questão de tempo. Em janeiro haverá reunião da Unasul no Chile. Oxalá os presidentes possam acelerar o passo nesse caminho de maior integração política e econômica da América do Sul.

Assim, com a adesão de todos os países, o Mercosul poderá deixar de ser apenas um acordo de conveniências comerciais que na atualidade beneficia apenas a grandes empresas exportadoras da Argentina e do Brasil, como denunciou seu ex-secretário executivo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, para transformar-se de fato num bloco econômico que construa uma integração econômica, monetária e fiscal da América do Sul. Nesse sentido, quem sabe, abram as portas para acelerar a adoção do Sucre como uma moeda de intercâmbio comercial fora da esfera do dólar e a implantação – já aprovada – do Banco do Sul, que representaria uma alternativa para os depósitos em moeda estrangeira de nossos países, que ora estão em Nova Iorque!

O segundo fato positivo foi a coragem do governo da Argentina em travar a batalha contra o monopólio dos meios de comunicação em seu país. O grupo econômico Clarín controla a ampla maioria da mídia burguesa local, na televisão, revistas e jornais. Basta saber que o grupo tem mais de 200 licenças de televisões regionais, além do jornal impresso, revistas e páginas na internet. Pois bem, a nova lei aprovada pelo Congresso argentino, que entrou em vigor agora em dezembro, permite que um mesmo grupo econômico controle apenas 30 concessões públicas. E mesmo assim a burguesia midiática argentina está esperneando. 

De fato a presidenta Cristina acertou no coração e no fígado da burguesia argentina, sempre muy subserviente aos interesses do capital internacional. Mas lá como cá, a burguesia buscou abrigo entre o Poder Judiciário e não faltaram “funcionários” de plantão para tentar anular a lei já aprovada no Congresso. No entanto, veio ao conhecimento do público que os juízes agora tão servis, recentemente recebiam favores do grupo Clarin. Ou seja, tudo em família.

A América Latina está atenta e torcendo para que o governo Argentino consolide a sua “Lei de Medios”, que de fato seria um passo importantíssimo para um processo de redemocratização da imprensa na Argentina com consequências em todo o continente.

Aqui no Brasil, o corajoso Mino Carta publicou na revista Carta Capital ampla reportagem denunciando a nova modalidade de golpes da burguesia em curso em todo continente: uma diabólica aliança entre o Poder Judiciário e a imprensa burguesa. Essa costura de articulações golpistas é feita em nível continental pelas reuniões da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e pela entidade coordenada pela Globo, com sede no Brasil chamada Instituto Millenium. Falar das operações clandestinas da CIA e seus tentáculos, nesses casos, seria quase redundância.

Já o governo brasileiro está em dívida com a sociedade brasileira em relação a uma atitude democrática e mais corajosa frente à ofensiva da direita na imprensa burguesa. Continua gastando a maior parte dos recursos públicos, de todos os brasileiros, para financiar e locupletar os balanços dos grandes veículos da burguesia como a Globo, revista Veja etc., que fazem campanha cotidiana contra o governo e os avanças sociais no Brasil. Recentemente elegeram dois novos ícones para a direita brasileira: o presidente do STF e o presidente do PSB. Falta apenas eles combinarem com o povo, se aceitaremos seus líderes, como fizeram tantas vezes no passado, por exemplo, com o fatídico caso Collor e outros personagens Globais!

Já a notícia ruim para a correlação de forças da América Latina é o ressurgimento da enfermidade do presidente Chávez. A enfermidade causa preocupações humanitárias, pelo sofrimento e pela falta de saúde e energia necessárias ao mandatário da Venezuela. E seu afastamento, mesmo que temporário, do comando do governo, sempre desperta anseios golpistas e manipulações de todo tipo por parte da burguesia venezuelana e seus aliados nos Estados Unidos. Todas as forças progressistas do continente – que apoiamos o processo de mudanças na Venezuela – estamos atentos e preocupados para que haja um desfecho positivo e que o presidente Chávez volte a assumir seu posto, eleito democraticamente pelo povo da Venezuela.
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Derrota da máfia midiática argentina

Por Altamiro Borges

Em decisão proferida nesta sexta-feira (14), o juiz federal Horacio Alfonso declarou que os dois artigos da Ley de Medios questionados na Justiça pelo principal império midiático da Argentina, o Grupo Clarín, são constitucionais e devem entrar em vigor. Para Martin Sabatella, dirigente da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA), a decisão é histórica e representa uma importante vitória dos que lutam pela verdadeira liberdade de expressão no país vizinho. "Estamos muito contentes, a justiça foi feita”.

Para Martin Sabatella, "foi uma barbaridade que uma lei da democracia tenha sido freada durante três anos por pressões das corporações. A nossa democracia necessita da aplicação integral desta lei”. Ele também reafirmou que "estávamos absolutamente convencidos da constitucionalidade da lei e o juiz ratificou isso... Hoje, mais do que nunca, todos devem entender que ninguém pode estar por fora da lei. Hoje é um dia para a democracia e para a liberdade”.

O Grupo Clarín, que ergueu o seu império durante a sanguinária ditadura militar da Argentina, já anunciou que vai recorrer contra a decisão. A máfia midiática insiste em afirmar que os artigos 45 (que fixa os limites de concentração de licenças) e o 161 (que determina o prazo de um ano para se desfazer do excesso de concessões) são inconstitucionais. A margem de manobra do monopólio, porém, agora ficou mais reduzida. Ele insistirá no falso discurso sobre a "liberdade de expressão" - que, na verdade, é a defesa da liberdade dos monopólios. 

Na sua choradeira, o Grupo Clarín contará com o apoio dos barões da mídia da América Latina, reunidos no antro golpista da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP). Editoriais e comentários ácidos também serão difundidos nos jornalões, revistonas e emissoras de rádio e tevê do Brasil. Mas, de concreto, o monopólio midiático da Argentina precisará estudar as formas para desconcentrar o conglomerado. 
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Hugo Chávez e o câncer da mídia

Por Altamiro Borges

No sábado passado, em cadeia nacional de rádio e tevê, Hugo Chávez causou forte impacto na sociedade venezuelana ao informar que seu câncer ressurgira e que precisará realizar uma quarta cirurgia em menos de 18 meses. A partir de domingo, milhares de pessoas visitaram o Palácio Miraflores, em Caracas, para prestar solidariedade e rezar pela saúde do líder bolivariano. Já a mídia golpista, da Venezuela e também do Brasil, voltou à carga contra o presidente, reeleito em outubro com folgada vantagem.

A candidatura de Nicolás Maduro

Em seu pronunciamento oficial, Hugo Chávez mostrou-se preocupado com a nova cirurgia que fará em Cuba. De maneira serena, ele admitiu que o caso é grave e deixou dúvidas, inclusive, sobre a sua nova posse em 10 de janeiro. Pela legislação do país, caso ele deixe o poder nos próximos quatro anos, novas eleições presidenciais deverão ocorrer no prazo de 30 dias. Diante desta possibilidade, o próprio Hugo Chávez pediu, “de coração”, o apoio à candidatura do chanceler e vice-presidente Nicolás Maduro.

“Minha opinião firme, clara como a lua cheia, irrevogável, absoluta, total é que, num cenário que obrigaria a convocar eleições, vocês elejam Nicolás Maduro”. Ex-motorista de ônibus e sindicalista, o atual ministro das Relações Exteriores tem 50 anos e foi nomeado vice-presidente em outubro – diferentemente do Brasil, o vice não faz parte da chapa eleitoral. Para Hugo Chávez, “Maduro tem o coração de um homem do povo”. Ele conta com o apoio do PSUV, principal partido no poder, e das Forças Armadas.  

Os urubus da velha imprensa

Com o anúncio da nova cirurgia para o tratamento do câncer, as forças políticas do país ficaram agitadas. A direita venezuelana optou pela cautela, já que teme os efeitos de uma reação intempestiva nas eleições deste  domingo. Pesquisas indicam que a oposição deverá perder importantes governos locais. O próprio Henrique Capriles, que disputou as eleições presidenciais de outubro, corre o risco de não ser eleito governador no seu estado. Diante do perigo, a direita evitou comentários sórdidos sobre a saúde de Hugo Chávez.

Já a mídia venezuelana, conhecida pelo seu golpismo visceral, voltou a insinuar que o presidente venezuelano utiliza o câncer como um palanque eleitoral. Alguns veículos até questionaram o resultado da eleição de outubro. No mesmo rumo, a mídia colonizada do Brasil, que também possui longa tradição golpista, age como urubu diante do drama de Chávez. A Folha, em seu editorial de hoje (11), intitulado “A saúde do caudilho”, afirma que “a recidiva do misterioso câncer” prova “a evidente da manipulação” do pleito presidencial.

O câncer da democracia

“Chávez, afinal, trombeteou dos palanques que estava curado da doença. Embora tenha derrotado de forma inquestionável o candidato oposicionista Henrique Capriles (55% a 44%), um grau maior de transparência sobre a moléstia poderia ter dado rumo diverso à campanha, uma vez trincada a aura de invencibilidade e fortaleza que cercava o presidente. O líder e ideólogo-mor do chamado ‘socialismo bolivariano’ segue o figurino clássico do populista na América Latina”, esbraveja o jornal da famiglia Frias.

Derrotada nas urnas, a mídia colonizada da Venezuela e do Brasil torce pela morte Hugo Chávez. Alguns “calunistas” nativos, como o “imortal” Merval Pereira, chegou a jurar que ela ocorreria antes das eleições de outubro. Agora, ele deve estar mais uma vez excitado, consultando suas sinistras “fontes”. A mídia golpista não aceita o voto democrático dos venezuelanos, a quem chama de “ignorantes”, e já pergunta se Nicolás Maduro “conseguirá tocar um chavismo sem Chávez”. A mídia é hoje o verdadeiro câncer da democracia!
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Clarín é flagelo contra a democracia

Por Vanessa Silva e Leonardo Wexell Severo, de Buenos Aires, no blog ComunicaSul:

“O papel do Clarín é o de uma base militar, de ofensiva contra o governo para desestabilizar, triturar Cristina Kirchner”, denunciou o filósofo Fernando Buen Abad Domínguez, defendendo a Ley de Medios como uma vanguarda no continente e que abre aos demais países a possibilidade de “refletir sobre o combate contra o flagelo que representam os monopólios midiáticos”.

Segundo o mexicano, diretor de arte e colunista de diversos jornais da América Latina, a lei argentina teve como base para sua formulação um dos maiores marcos na discussão mundial sobre a democratização da comunicação, o Informe Sean Mac Bride – Um Só Mundo Múltiplas Vozes, publicado pela Unesco em 1980. De acordo com o documento, “um dos defeitos mais extensos da comunicação é a ausência da participação do público na administração e tomada de decisões”. Passadas três décadas, o avanço dos grandes conglomerados de mídia aprofundou ainda mais este fosso, fazendo com que governos e movimentos populares coincidam – e se empenhem - na construção de novos marcos regulatórios que democratizem a comunicação.

Nesta entrevista, Buen Abad, que também integra a Rede de Intelectuais em Defesa da Humanidade e vive na Argentina onde é reitor-fundador da Universidade de la Filosofía, com enfoque na filosofia da Comunicação, analisa os desdobramentos da Ley de Medios argentina para o conjunto do continente

Como vê o que está acontecendo agora na Argentina com a Ley de Medios?

Primeiro é preciso avaliar que esta lei tem características muito particulares, não é uma lei qualquer e tampouco surgiu só da vontade dos legisladores ou deputados. É uma lei que tem uma tradição histórica importantíssima na América Latina, retoma o informe feito por Sean Mc Bride na Unesco e tem uma base social muito ampla em todo o país, com um viés político muito grande. Tudo isso não faz dela uma lei perfeita, mas coerente com o momento que vive a Argentina.

E no contexto latino-americano?
Neste âmbito, ela representa uma vanguarda político-jurídica justamente pela envergadura das teses que sustenta. Ela abre, a muitos países, uma forma de refletir sobre o combate contra o flagelo que representam os monopólios midiáticos. No México é inimaginável lutar contra os monopólios midiáticos. Então esta lei é de uma riqueza muito grande para todo o nosso continente.

O informe Sean Mac Bride foi um marco na luta para a democratização da comunicação. O que podemos apontar na lei argentina que recupera o sentido do que queria a ONU?
O informe trouxe o problema da concentração dos meios tecnológicos em poucas mãos. Viram, já naquela época, que só os países ricos teriam acesso às tecnologias e isso criaria um abismo tecnológico. Outro ponto é a brecha educacional, porque os que detêm as estruturas e recursos podem manejar os discursos, as linguagens e são justamente os que também têm interesses mercantis. Assim, ficamos sem voz e sem espaço. Por isso o informe se chama Múltiplas Vozes. Já viam que poucas vozes poderiam falar através do desenvolvimento que veio com a revolução comunicacional e da imagem. O informe trouxe também outro dilema: as agendas dos meios de comunicação foram sequestradas pelos interesses comerciais dos distintos governos e as agendas sociais foram postergadas até o ponto em que a agenda social foi totalmente substituída pela comercial. Então nos fizeram acreditar que nossa agenda é a deles. Se há uma crise brutal do capitalismo, temos que abraçá-la como sendo nossa, o que é um desastre. Neste sentido, a lei de meios trata essas questões profundas e diz que é preciso haver uma redistribuição tecnológica.

Quanto avançamos nesta questão tecnológica?
Essa é uma grande debilidade. Temos quatro assimetrias: tecnológica, jurídica, educacional e de agenda. Eu proponho que seja feita uma Cúpula de presidentes sobre a comunicação para abordá-las. Primeiro, não fabricamos sequer um “parafuso” nas ferramentas de comunicação. Depois, temos que enfrentar a questão jurídica para colocar em sincronia as novas leis de mídia do continente. Precisamos também atender a assimetria em matéria educacional: todas as faculdades de comunicação, ou quase todas, seguem preparando os garotos para servir à ideia da comunicação como mercadoria. E especialmente, a quarta assimetria é a urgência de recuperar a soberania das agências, deixar de repetir o discurso deles como se fossem nossos e começar a falar dos temas que nos tocam.

Como vê a importância que tem para a unidade latino-americana, a luta política-ideológica por um novo marco regulatório na comunicação?
Uma política de integração em matéria comunicacional nos permitirá corrigir um erro grave, que é uma debilidade perigosa. Estamos pensando que os conflitos tecnológicos são problemas de alguns países isolados. Alguns pensam que as agressões contra a Cristina são uma sabotagem nacional; que as agressões contra Dilma [Rousseff] são ressentimento de O Globo com a presidenta; que as incessantes agressões contra Cuba são problema dos cubanos contra os ianques. E isso me parece ser um erro enorme porque é um problema continental e, à medida que se considera uma questão local, favorece a substituição que a direita vem fazendo de suas forças políticas por suas forças midiáticas. A política de integração é um grande remédio para sincronizar forças, fazer frente à agressão midiática e desenvolver uma política emancipadora.

As novas leis que estão sendo formuladas têm pontas de vanguarda importantíssimas, mas carecem de sincronia continental. A nova corrente constitucionalista que vive a América Latina deveria ter uma reciprocidade para levantar a questão da comunicação ao nível de direitos humanos e nunca mais como mercadoria.

Disse que a Ley de Medios é um paradigma para o continente. O que destacaria como as principais características vanguardistas dela?
Primeiro, a desmonopolização do aparato midiático. Isso é crucial porque reverte os fatores e reassume o papel reitor do Estado frente ao desenvolvimento dessas empresas. Penso que deveria aprofundar o debate sobre a propriedade privada dos meios de comunicação, que é um debate pendente. Mas isso será tratado certamente mais adiante. A outra ponta de vanguarda é a que permite a participação de setores que não podiam participar anteriormente.

Agora, uma coisa central que não está declarada na lei, mas que se supõe, é que ao multiplicar as vozes é necessário revolucionar os métodos de narração. Com que sintaxe nova essas pessoas vão contar suas historias sem repetir os modelos sintáxicos hegemônicos, para não contar suas histórias como a CNN? E para que tenhamos soberania com as agendas. Aí está o núcleo duro das batalhas de ideias: o trabalho imediato que tem que ser feito para combater o discurso da classe dominante que se expressa em nós mesmos.

Então de um lado precisamos de um empoderamento dos povos para aprofundar a revolução. Na Argentina temos uma realidade em que se discute isso, mas no Brasil é mais difícil. Como tratar este tema quando nossa realidade continental é tão distinta?
Temos de encarar nossas debilidades mais agudas, que é ainda não termos conseguido uma unidade. Falamos em unidade, não uniformidade. Mas pensem o que seria se todos os meios alternativos da América Latina neste momento estivessem em um acordo político e se levantassem em apoio à lei argentina como sendo de todos. Seria uma nova força política, uma simbiose emergente. Estaríamos fazendo um novo sentido desde as bases. Se, em uníssono defendêssemos os diálogos de paz da Colômbia, que é a prioridade das prioridades. Mas, nossa debilidade política desde as bases é que não conseguimos a unidade. O velho [Karl] Marx, quando escrevia o manifesto pensava em como dizer isso e encontrou uma palavra pequenina, mas que quando lida, abre-se como uma janela. No fim do manifesto, ele diz: uni-vos. Uni-vos, caralho… E esse é o nosso grande desafio histórico: construir uma frente única. Sabemos na teoria, mas na prática não fazemos.

Temos experiências interessantes no âmbito das TVs com a Telesur, a TV Pública argentina… E no Paraguai ocorreu algo muito interessante porque a TV foi o marco da resistência, da defesa da democracia quando houve o golpe contra Fernando Lugo. Como vê isso? Trata-se de uma questão de empoderamento pela televisão?
Creio que seja um erro discutir o meio antes de discutir o tema. Neste continente estão morrendo mulheres de parto, por razões que poderiam ser evitadas. Que meios precisamos ter para falar com as comunidades que defendemos? Que meios? Essa é a pergunta! No Brasil é um problema, na Bolívia outro e no México outro. As necessidades de interlocução determinam as condições dos meios. Por mais lindos que sejam, alguns meios são inúteis. Não podemos confundir as táticas com os princípios. As ferramentas têm que se ajustar às batalhas. Como nos ensinaram os vietnamitas, os cubanos…

Será que para conseguir isso é preciso dançar Michael Jackson? Eu que o odeio, acho isso correto. No movimento chileno #YoSoy132 dançaram como zumbis para protestar contra os votos dos mortos no PRI [Partido da Revolução Institucional]. Subordinaram a ferramenta a um projeto político que permite a expressão de um salto de consciência. Muitas pessoas que não queriam sair de sua casa se contagiaram. As ferramentas de comunicação deveriam servir para isso.

E quanto à relação entre a comunicação e a soberania de nossos países?

Hoje temos bases militares e ideológicas em todos os países, e se chamam televisões e jornais. O papel do Clarín aqui é o de uma base militar, de uma ofensiva contra o governo para desestabilizar, triturar Cristina. Fazem tarefas destituidoras contra um governo que pela primeira vez têm um projeto político para este país; dizem que temos uma presidenta louca, que há um vazio de poder, que há confusão na condução política, que não sabem o que fazer diante dos problemas… Esses foram exatamente os termos usados para dar o golpe de Estado na Venezuela. Agora, a Corte daquele país disse que não houve um golpe de Estado, mas um vazio de poder. Então não se pode prender muitos desses crápulas, já que ‘não houve golpe’. Isso é exatamente o que está acontecendo aqui, como revelou o espetáculo da corrupção judicial vista no 7D.

Qual é o papel dos intelectuais nesse processo que está vivendo particularmente a Argentina?
Há grandes e importantes intelectuais com diagnósticos muito corretos. Mas minha opinião fraternal é que padecem do problema de um nacionalismo estreito. Eu gostaria de ver os intelectuais somados à Rede de Intelectuais em Defesa da Humanidade para atuar em grupo. Seria ótimo que, na Argentina, tivéssemos um debate sobre a comunicação com intelectuais de todo o planeta. E que a África falasse disso, que os intelectuais alemães discutissem. Precisamos de um grande debate sobre a necessidade de uma nova Constituição política que substitua a Constituição neoliberal feita por Menem. O que poderia ser um grande debate sobre as novas correntes contitucionalistas revolucionárias. Por que não pensar na grande Constituição da integração? Que rompa com o velho chauvinismo em que estão metidos, com os velhos nacionalismos que estão metidos, que é o nacionalismo sectário. Não falo em romper com as identidades locais, isso é outra coisa. Mas falta integração às correntes de intelectuais revolucionários que coloquem a favor da luta o talento disponível e não a favor de si mesmos, que desçam da torre de marfim.
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#DerechosdeCuba no twitter

Por Iroel Sánchez, no blog cubano La Pupila Insomne:

A popular tag #DerechosdeCuba será levada nesta segunda-feira por usuário da rede social twitter em defesa dos direitos dos cubanos.

Direito de viver sem o assédio econômico estadunidense, condenado pela comunidade internacional; direito a levar para casa os cinco cubanos condenados injustamente em Miami por defender seu país do terrorismo; direito de transmitir uma visão distinta sobre Cuba para o mundo e não a imposta pela grande mídia internacional; direito de denunciar a quinta coluna que, com fundos milionários, tenta construir uma Washington no interior da Ilha para fazê-la regressar às rédeas a que esteve imposto até 1959.

Para isso, contamos com o apoio e o entusiasmo dos amigos que ajudam a tornar célebre a tag #DerechosdeCuba.
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EUA e a guerra contra a democracia

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Clarín, Policarpo e a força da mídia

Por Altamiro Borges

Por pressão do Grupo Clarín, a Câmara Civil e Comercial da Argentina garantiu hoje a sobrevida do maior monopólio midiático do país. O órgão prorrogou a medida judicial que suspendia a aplicação dos artigos 45 e 161 da “Ley de Medios”, que fixam os limites para as licenças de emissoras de rádio e televisão. A Câmara resolveu ampliar o prazo da liminar até que a Justiça decida se os dois artigos são constitucionais. Com isso, ela frustrou as expectativas do 7D – o 7 de dezembro da Diversidade e da Democracia.

O Grupo Clarín, que ergueu seu império midiático durante a ditadura militar, tem feito de tudo para sabotar a Ley de Medios, aprovada há três anos pelo parlamento e referendada pela Justiça. Outras empresas do setor de comunicação já se adaptaram à legislação da desconcentração da propriedade, desfazendo-se das licenças que superam os limites impostos aos monopólios. Nesta guerra, o Clarín abusou da desinformação nas suas várias emissoras de rádio e tevê e ainda seduziu alguns membros do Judiciário da Argentina.

Há duas semanas, o conglomerado apelou à Suprema Corte para prorrogar a data de vigência da lei, mas esta negou o pedido. Hoje, porém, a Câmara Civil e Comercial mostrou-se totalmente servil ao poderoso grupo empresarial. Há denúncias de que alguns juízes foram corrompidos, inclusive com viagens pagas pelo Clarín para um recente evento em Miami (EUA). Para o presidente da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (Afsca), Martín Sabbatella, a decisão da Câmara “lesa a democracia”.

“Ela demonstra que tínhamos razão quando dissemos que os juízes que viajaram a Miami financiados pelo Clarín terminam convertidos em sua equipe jurídica... A Justiça argentina não está preparada para brigar com as corporações porque grande parte está colonizada por elas”. Apesar da frustrante decisão, os setores que defendem a democratização da mídia mantiveram o ato de domingo (9) para festejar a chegada do 7D. “Todos à praça! Nenhum monopólio com seus juízes viciados poderá frear o povo”, afirma a convocatória.

A decisão de hoje na Argentina confirma a força dos impérios midiáticos. Apesar da crise do seu modelo de negócios e da crescente perda de credibilidade, os conglomerados de comunicação ainda gozam de enorme poder político. Eles “seduzem” membros da Justiça, do parlamento e dos governos. Na semana retrasada, no Brasil, um pacto dos barões da mídia evitou o indiciamento do editor da Veja, Policarpo Junior, flagrado em intimas relações com a máfia de Carlinhos Cachoeira. A luta contra a ditadura midiática será prolongada! 
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O que está em jogo no 7D da Argentina

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Juízes sabotam a Ley de Medios

Por Vanessa Silva e Leonardo Wexell Severo, de Buenos Aires, no blog ComunicaSul:

Nesta quinta-feira (6) de muita chuva e contaminação no céu de Buenos Aires, às vésperas da entrada em vigor da Lei de Meios Audiovisuais na Argentina, os juízes Francisco de las Carreras e María Susana Najurieta, da Câmara Civil e Comercial Federal, decidiram prorrogar a medida cautelar que beneficia o Grupo Clarín, mantendo suspenso o artigo 161 da lei “até que se dite uma sentença definitiva”.

O artigo em questão determina que as empresas com número de licenças superior ao permitido pela nova regulação vendam o excedente para se adequar. A lei define que uma empresa pode ter no máximo 35% do mercado a nível nacional e 24 licenças (atualmente, o grupo monopolista detém 240), sendo dono de 41% do mercado de rádio, 38% da TV aberta e 59% da TV a cabo.

Entidades populares, lideranças sindicais, parlamentares e movimentos pela democratização da comunicação já vinham alertando para o fato de os juízes em questão terem viajado para Miami inteiramente bancados pelo grupo monopolista, que agora utiliza dos seus préstimos.

O vice-governador de Buenos Aires, Gabriel Mariotto, afirmou que “cada vez fica mais evidente a convivência entre o poder concentrado da Argentina e suas peças na Justiça, que buscam impedir o povo de se expressar”.

Conforme destacou o ministro da Justiça, Julio Alak, “será um adiamento transitório, pois a lei é inexorável e garantirá a efetiva democratização e desmonopolização das comunicações do país”. “Redobramos o nosso compromisso com o avanço da democracia”, frisou.

Apresentadores da TV Pública Argentina lembraram que em governos anteriores várias ações em defesa dos direitos humanos contra os repressores da ditadura foram igualmente barradas na Corte, até que o afastamento do juiz responsável possibilitou que fluíssem as denúncias e começassem a haver as condenações. Mas, neste momento, o ex-juiz apareceu como defensor dos repressores. A história é conhecida. E se repete.

Clarín tour

"Tínhamos razão quando dissemos que os juízes que viajam a Miami financiados pelo Clarín terminam convertidos em sua equipe jurídica”, declarou o titular da Autoridade Federal de Serviços Audiovisuais da Argentina (AFSCA), Martín Sabbatella. “Estamos convencidos da constitucionalidade da Lei. Uma lei que aumenta a qualidade da democracia é freada por juízes financiados pela corporação que pede esta cautelar. Isso é uma vergonha”, afirmou.

Segundo Sabbatella, “a democracia foi colocada em xeque por grupos judiciais, mas pediremos à Corte que revise este ato. Está claro que a justiça argentina não está preparada para enfrentar as corporações porque grande parte dela está colonizada por esses grupos econômicos".

Censura e auto-censura

O secretario-geral da Federação Argentina de Trabalhadores de Imprensa (FATPREN) e vice-presidente da Federação Internacional dos Jornalistas (FIP), Gustavo Graneros, alertou para “a vocação do grupo monopolista contra a liberdade de expressão que hipocritamente diz defender”. Exemplo disso, relatou, foi a recente perseguição contra profissionais de imprensa: “buscaram amedrontar, pressionando com a censura e a auto-censura, da mesma forma que impediram durante anos o exercício da própria atividade sindical”.

Contra a perseguição, a Federação lançou nota denunciando que o “Clarín pretende silenciar as opiniões dos jornalistas que denunciam o descumprimento da lei, a vocação desestabilizadora do grupo e sua aspiração a manter os privilégios que ganhou ao calor da ditadura cívico-militar e dos governos neoliberais, atentando contra toda comunicação diversa e plural”.

Tuítaço pela democratização

Em solidariedade à luta do povo argentino pela democratização da comunicação, movimentos sociais e meios comunitários e alternativos latino-americanos promovem, nesta sexta-feira (7), a partir do meio-dia até as 15 horas, uma jornada global de apoio à plena aplicação da Lei de Meios. As etiquetas, ou hastags da campanha são: #7D, #LeydeMedios e #NoMonopolios.

Os movimentos sociais na Argentina decidiram intensificar o apoio ao cumprimento da lei e, no domingo (8), chamado de 8D, será realizado um grande ato pela democracia na Praça de Maio com show de encerramento de Charly García e Fito Paez.
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Tuitaço em apoio à Ley de Medios

Por Altamiro Borges

Por iniciativa de várias entidades latino-americanas, nesta sexta-feira ocorre um tuitaço em apoio à "Ley de Medios", que está prevista para entrar em vigor na Argentina em 7 de dezembro – o 7D da Democracia e Diversidade nos meios de comunicação. A ideia é usar as hashtags #7D, #NOmonopolios e #LeydeMedios para agitar as redes sociais em defesa da democratização dos meios de comunicação e contra os monopólios midiáticos no país vizinho e em todo o continente.  

Segundo o manifesto de convocação do tuitaço, liderado pela AlbaTV e pela Agência Latino-Americana de Informação (Alai), a Ley de Medios é um passo decisivo no rumo da democratização da mídia. “O 7 de dezembro representa uma data chave para quem entende que a comunicação é um direito dos povos e que, por isso, é necessária pluralidade de vozes e de discursos nos meios que difundem notícias de interesse dos movimentos sociais, porque afetam aos mesmos e porque eles são os protagonistas da história”.

“A monopolização dos meios é uma característica comum dos países da América Latina. A privatização dos sinais de rádio e televisão promove não somente a uniformidade de visões e análises, mas também visa incentivar processos antidemocráticos... Assim ocorreu na Venezuela no golpe de 2002 ou no Equador em 2010, quando a mídia tentou legitimar uma sublevação policial que sequestrou o presidente Rafael Correa. Atuações similares ocorreram na Bolívia, Paraguai e Honduras, com resultados favoráveis aos golpistas”.

Neste cenário preocupante, em que a mídia atenta contra a democracia, o manifesto destaca a importância da Ley de Medios, que representa um duro golpe nos monopólios da Argentina. “Neste país, em 7 de dezembro, vence a medida judicial interposta pelo grupo monopolista Clarín, que impede a total vigência da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual. A partir desta data, os meios de comunicação deverão transferir algumas de suas licenças comerciais para outros grupos, mediante concurso público”.
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O fim do monopólio na Argentina

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Regulação da mídia na América Latina

Por Gilberto Maringoni e Verena Glass, na revista Desafios do Desenvolvimento (Ipea):

O debate sobre a regulação dos meios de comunicação gera controvérsias em todo o continente. De um lado, movimentos sociais desejam estabelecer novas regras de funcionamento a um setor que se modifica rapidamente. De outro, empresas acusam tais articulações de quererem uma volta da censura. O que há por trás de cada formulação?

Uma polêmica ronda a América Latina. Ela toca em pontos sensíveis e várias ordens de interesses. Trata-se das propostas envolvendo a elaboração de novas legislações para os meios de comunicação em alguns países do continente.

Isso acontece especialmente na Venezuela, Argentina, Equador e Bolívia. No Brasil ainda não há uma decisão de governo a respeito.

O pano de fundo é a mudança no panorama político continental a partir da virada do século. Em alguns países há uma reação ao modelo de matiz liberal, adotado nos anos 1980-90. Assim, as disputas em torno da comunicação envolvem diversas concepções políticas.

A área de comunicações tem se mostrado particularmente sensível às demandas por novas regras de funcionamento. As empresas de mídia, por lidarem com difusão de ideias, valores e abordagens subjetivas, alegam que a pretensão dos que advogam a criação de novas normas é implantar a censura e o cerceamento à livre circulação de ideias.

Os defensores das mudanças afirmam o contrário. Dizem que o setor é monopolizado e que um novo pacto legal teria por base a defesa de um pluralismo de opiniões.

Além disso, uma série de progressos técnicos tornou obsoletas as políticas públicas de comunicação estabelecidas há mais de duas décadas.

As primeiras legislações sobre meios de comunicação no continente foram criadas no período do nacional desenvolvimentismo, entre os anos 1930 e 1960, tendo como marca inspiradora a estratégia de substituição de importações. Seus pressupostos básicos eram a definição do espectro radioelétrico como espaço público (que funcionaria em regime de concessão à iniciativa privada) e a não permissão para que estrangeiros fossem proprietários de empresas ou meios.

As políticas de abertura das economias, privatizações e enfraquecimento dos poderes de fiscalização e regulação do poder público resultaram em várias situações de hiatos legais.

A constituição de agências reguladoras, de composição tripartite – Estado, empresas e sociedade civil –, em alguns casos, deixou as sociedades a mercê de oscilações e da volatilidade dos mercados.

Com a entrada em cena de novas tecnologias, esse cipoal legal tende a ficar superado.



Tecnologia e economia

Há em curso um processo de internacionalização das empresas de comunicação na América Latina. Ele obedece pelo menos duas dinâmicas, uma tecnológica e outra econômica.

A primeira delas, a tecnológica, refere-se ao grande salto realizado pela microeletrônica nos últimos quarenta anos e que poderia ser sintetizado pela convergência de mídias, observada a partir da segunda metade dos anos 1990. Telefonia, televisão, rádio, transmissão de dados, cinema e música passaram a confluir e a se apoiar cada vez mais em plataformas comuns.

No âmbito legal, isso fez com que lógicas balizadoras nas décadas anteriores, que tratam separadamente de televisão, rádio, indústria cinematográfica e fonográfica e telefonia ficassem obsoletas.

Como conviver com leis que impediam a participação de estrangeiros em grupos de mídia, se as empresas de telefonia, privatizadas e desnacionalizadas, estão não apenas no mercado de internet, mas no de televisão, de radiofonia e de produção de conteúdos? Como submeter tais empresas às jurisdições nacionais?

A segunda variável dessa equação tem contornos na dinâmica da economia. A abertura dos países do sul do mundo à globalização, através dos pontos definidos pelo Consenso de Washington (1989), acarretou ampliação da liberdade de circulação de capitais, incremento de investimentos em carteira, compra de empresas, joint-ventures e fusões de toda ordem.

Ativos negociados nas grandes bolsas internacionais mudam rapidamente de mãos e sociedades são feitas e desfeitas com a rapidez de um impulso eletrônico. Acionistas majoritários tornam-se minoritários da noite para o dia. Na lógica dos negócios, não haveria razões para que empresas de comunicação seguissem senda diversa.

Desterritorialização das empresas

Outra novidade da invenção da tecnologia digital e das redes virtuais é a desterritorialização das empresas de comunicação.

Até o advento da revolução digital (1980- 90) as empresas de comunicação precisavam estar sediadas no país em que operavam. Não se tratava apenas de uma exigência legal, baseada no ideário do nacional-desenvolvimentismo. Toda uma teia de negócios, especialmente aqueles ligados à publicidade e ao financiamento dos meios, estava ancorada em fronteiras definidas.

Agora, um provedor de internet, um sítio, portal ou uma emissora de TV a cabo pode emitir conteúdo de qualquer parte do globo para qualquer país, sem necessidade de antenas transmissoras ou equipamentos sofisticados.

O problema central é que os provedores de internet e as emissoras de TV a cabo não são classificáveis como empresas produtoras de conteúdo informacional pelas antigas legislações.

A privatização das teles na América Latina, nos anos 1980-90, abriu uma caixa de Pandora. Foram vendidos monopólios de telefonia do Estado. É possível que os governantes que patrocinaram tais ações não vislumbrassem estar às portas de uma reviravolta tecnológica que possibilitaria a convergência de mídias e ultrapassaria as fronteiras.

As empresas de telefonia, por exemplo, que nos anos 1990 tinham a seu cargo apenas a comunicação de voz à distância, consolidaram-se, duas décadas depois, como os maiores provedores de internet da região e apresentam um poder de fogo dificilmente igualado por qualquer rede de TV tradicional.

Atualmente televisão, rádio, telefonia, cinema, literatura, audição musical, transmissão de dados, instrumentos de navegação e outros podem ser captadas por um mesmo smartphone. Mas cada uma daquelas funções obedece a regras específicas.

Provedores de internet apresentam tecnologia para produzir e transmitir conteúdos. Como os provedores não estão enquadrados nas antigas normas legais, suas atrações podem ser produzidas em qualquer parte do mundo e enviados, com características locais, a qualquer país. Ao mesmo tempo, como as empresas globais possuem representações também em cada país, uma complicada cadeia de brechas nas antigas regulações foi aproveitada para legalizar as novas firmas.



Cepal e Ipea

Em 2003, a Cepal (Comissão Econômica da América Latina e Caribe), órgão da ONU, lançou o livro Los caminos hacia uma sociedad de la información em América Latina y el Caribe.

Embora defasado no quesito tecnologia, o estudo de 130 páginas busca dar conta das implicações da convergência tecnológica, dos marcos regulatórios até então existentes, do financiamento e do capital humano, entre outros. Segundo o documento:

“O ponto de partida na tarefa de criar um marco regulatório para a sociedade da informação é o respeito pelos direitos humanos fundamentais”.

O pesquisador argentino Martin Becerra, em entrevista concedida em outubro de 2011, comenta a situação da América Latina diante do novo quadro do setor. Para ele,

“na América Latina, há uma falta de tradição no controle estatal da regulação sobre os meios de comunicação, se comparamos com a situação da Europa ou da América do Norte. (…) Uma perspectiva democratizadora deveria orientar a ação do setor dos meios de comunicação à regulação equânime, pública, transparente e equitativa”.

Os pesquisadores do Ipea Fernanda De Negri e Leonardo Costa Ribeiro, publicaram no boletim Radar Ipea nº 7, de outubro de 2010, um artigo intitulado “Tendências tecnológicas mundiais em telecomunicações – Índice de medo do desemprego”.

De acordo com eles,

“recentemente, um estudo realizado pela Comissão Europeia mostrou que grande parte da distância existente entre Estados Unidos e Europa em termos de investimentos privados em P&D se deve ao setor de TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação).

O setor privado norte-americano investe 1,88% do produto interno bruto (PIB) em P&D, contra 1,19% do setor privado europeu. No setor de TICs, estes investimentos são de 0,65% do PIB nos EUA e 0,31% na Europa. (…) No caso brasileiro, as diferenças – em termos de recursos alocados em P&D – em relação aos EUA e à Europa são ainda mais marcantes. O setor privado brasileiro investe, segundo dados de 2008 do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), cerca de 0,5% do PIB em P&D, entre os quais apenas 20%, ou 0,1% do PIB, são realizados pelos setores de TICs”.

As novas leis

Na Venezuela (2000), na Argentina (2009) e na Bolívia (2011) foram aprovadas normas para regulamentar a atividade de comunicação. No Equador, em dezembro de 2011, a Assembleia Nacional discutia novas regras para o setor. O México possui uma legislação aprovada em 1995, que não impõe restrições ao capital externo. No Brasil, o debate sobre uma nova legislação faz parte da demanda de diversos setores sociais. Mas ainda não entrou na pauta político-institucional do país.

Argentina

A legislação mais abrangente e detalhada para o setor de comunicações dos anos recentes foi promulgada na Argentina, em 2009. A própria presidente Cristina Kirschner presidiu reuniões na Casa Rosada com líderes sindicais e estudantis, proprietários de empresas de comunicação, produtores independentes, reitores de universidades, diretores e professores das faculdades de comunicação, líderes de igrejas e associações de rádios e televisões comunitárias para apresentar ideias e sugestões.

A Ley de Medios, promulgada em outubro de 2009, é longa – 166 artigos – e cheia de remissões a outras normas. Ela representa uma resposta ousada à supremacia dos meios de comunicação no jogo político, social e cultural da atualidade. A Ley propõe mecanismos destinados à promoção, descentralização, desconcentração e incentivo à competição, com objetivo de barateamento, democratização e universalização de novas tecnologias de informação e comunicação.

Alguns pontos da lei argentina merecem destaque:

– Democratização e universalização dos serviços;

– Criação da Autoridade Federal dos Serviços de Comunicação Audiovisual, órgão autárquico e descentralizado, que tem a função de aplicar, interpretar e fiscalizar o cumprimento da lei;

– Criação do Conselho Federal de Comunicação Audiovisual da defensoria pública de serviços de comunicação audiovisual, para atender reclamações e demandas populares diante dos meios de comunicação;

– Combate à monopolização – nenhum operador prestará serviços a mais de 35% da população do país. Quem possuir um canal de televisão aberta não poderá ser dono de uma empresa de TV a cabo na mesma localidade;

– Concessões de dez anos, prorrogáveis por mais dez;

– Reserva de 33% dos sinais radioelétricos, em todas as faixas de radiodifusão e de televisão terrestres em todas as áreas de cobertura para as organizações sem fins lucrativos;

– Os povos originários terão direito a dispor de faixas de AM, FM e de televisão aberta, assim como as universidades públicas.

Bolívia

Em 10 de agosto de 2011, o presidente Evo Morales promulgou a Ley general de telecomunicaciones, tecnologias de información y comunicación, que estabelece um marco regulatório para a propriedade privada de rádio e televisão e garante vários direitos aos chamados povos originários. O dispositivo legal também criou um processo de licitação pública para as concessões, e estipulou requisitos a serem cumpridos pelas concessionárias privadas.

A norma é menos abrangente que sua correspondente argentina, mas caminha na mesma direção: fortalecer instrumentos legais do poder público na supervisão da atividade de comunicação. Assim, o espectro redioelétrico, nos termos da lei, segue em mãos do Estado, “que o administrará em seu nível central”.

A grande novidade do conjunto de normas, que envolve 113 artigos, é a distribuição de frequências por setores: Estado, até 33 por cento; Comercial, até 33 por cento; Social comunitária, até 17 por cento e Povos indígenas, camponeses e comunidades interculturais e afrobolivianas, até 17 por cento.

As concessões das frequências do Estado serão definidas pelo Poder Executivo. Já para o setor comercial, haverá licitações públicas e no caso do setor social comunitário – povos originários, camponeses e afrobolivianos –,as concessões serão feitas mediante concurso de projetos, com indicadores objetivos. A lei estabelece ainda que a sociedade civil organizada participará do desenho das políticas públicas em tecnologia de telecomunicações, tecnologias de informação e comunicação e serviço postal, exercendo o controle social em todos os níveis de Estado sobre a qualidade dos serviços públicos.

Por fim, a lei afirma que todas as instâncias de governo – federal, provincial e municipal – garantirão espaços para a organização popular exercer esse direito.

Venezuela

Na Venezuela, a Lei Orgânica de Telecomunicações foi aprovada em março de 2000. Trata-se de uma norma extensa, com 224 artigos, que “estabelece um marco legal de regulação geral das telecomunicações, a fim de garantir o direito humano das pessoas à comunicação e à realização das atividades econômicas de telecomunicações necessárias para consegui-lo, sem mais limitações que a Constituição e as leis”.

A lei também reserva a exploração dos serviços de telecomunicações a pessoas domiciliadas no país. O órgão responsável por supervisionar os serviços é o Ministério da Infraestrutura, e foi criada a Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel), “instituto autônomo, dotado de personalidade jurídica e patrimônio próprio (…) com autonomia técnica, financeira, organizativa e administrativa” para “administrar, regular, ordenar e controlar o espaço radioelétrico”.

O tempo de concessões de frequências de rádio e televisão é estipulado para um período máximo de 15 anos, podendo ou não ser prorrogado. E foram estabelecidas sanções aos concessionários que vão de admoestação pública, multa, e revogação da concessão à prisão dos responsáveis.

A nova legislação também regulamenta o mercado secundário de concessões.

A subscrição de um acordo de fusão entre empresas operadoras de telecomunicações, a aquisição total ou parcial dessas companhias por outras empresas operadoras assim como a divisão ou criação de filiais que explorem os serviços de telecomunicações, quando impliquem mudanças no controle sobre as mesmas deverão submeter-se à aprovação da Comissão Nacional de Telecomunicações.

Brasil

No Brasil, onde ainda vigora o Código Nacional de Telecomunicações de 1962, apesar da vigência de novas normas – como a Lei do Cabo (1994) e da Lei da TV Paga (2011) – não há uma regulação abrangente nessa área. Uma parcela expressiva da sociedade organizada (movimentos populares e entidades empresariais) e representantes do Estado realizaram, no fim de 2009, a I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), onde se destacaram seis pontos centrais: um novo marco regulatório para a comunicação, a regulamentação do artigo 221 da Constituição Federal (que trata da regionalização da programação da televisão), os direitos autorais, a comunicação pública (radiodifusão estatal), o marco civil da internet e a concretização do Conselho Nacional de Comunicação. São debates que ainda aguardam desfecho.

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“A América Latina está em ebulição em matéria de regulação dos meios de comunicação”

Conversamos com Bia Barbosa, do Coletivo Intervozes, e Dênis de Moraes, professor de Comunicação na Universidade Federal Fluminense e autor de diversos livros sobre o tema.

Desafios do desenvolvimento procurou também um representante da Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra), mas não obteve resposta. A seguir, trechos das entrevistas.

Vários países do continente – em especial Argentina, Bolívia e Venezuela – têm aprovado novas regulamentações sobre as comunicações. Como você vê este panorama?

Bia Barbosa – A atualização dos marcos regulatórios da comunicação em diferentes países da América Latina mostra vontade política dos governos e apoio da população para dar maior pluralidade e diversidade a um setor estratégico para a consolidação da democracia nesses países. Em cada uma dessas nações, ficou claro que as reformas que vinham sendo implementadas precisariam necessariamente passar também por esta área, sob o risco de direitos fundamentais como a liberdade de expressão e o acesso à informação continuarem sendo negados ao conjunto daquelas populações.

Denis de Moraes – A América Latina está em ebulição em matéria de regulação dos meios de comunicação. É uma tentativa de superar a histórica letargia do Estado diante da avassaladora concentração das indústrias de informação e entretenimento nas mãos de um reduzido número de corporações, quase sempre pertencentes a dinastias familiares. Cabe ao Estado um papel regulador, harmonizando anseios e zelando pelos direitos à informação e à diversidade cultural.

No caso brasileiro, como está esse debate?

Bia Barbosa – Infelizmente, estamos distantes dos avanços conquistados na América Latina. Depois da I Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009, com a participação do poder público em todas as suas esferas, de setores significativos do empresariado e da sociedade civil, a expectativa era a de que o governo federal colocaria em discussão pública uma proposta de novo marco regulatório. Até agora, no entanto, o anteprojeto elaborado pelo então ministro Franklin Martins continua secreto, e o conjunto das resoluções da I Confecom não saiu do papel. Recentemente o governo voltou a anunciar que em breve abrirá uma consulta pública sobre o novo marco regulatório. A sociedade civil e os movimentos populares esperam que o novo compromisso se cumpra.

Denis de Moraes – O Brasil está na vanguarda do atraso em termos de regulação da mídia. A legislação de radiodifusão brasileira continua sendo uma das mais anacrônicas da América Latina. Até hoje, não foram regulamentados os artigos 220 e 221 da Constituição promulgada em 5 de outubro de 1988, que, respectivamente, impedem monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação de massa (art. 220, § 5º) e asseguram preferência, na produção e programação das emissoras de rádio e televisão, a “finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas”, além da “promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação” (art. 221, I e II). O imobilismo dos sucessivos governos chega a ser alarmante.

Há necessidade de se regulamentar as comunicações num tempo de surgimento acelerado de novos meios?

Bia Barbosa – Sem dúvida. Nossa principal legislação do setor – o Código Brasileiro de Telecomunicações – tem 50 anos. É preciso efetivar a proibição do monopólio nos meios de comunicação de massa, como previsto na Constituição Federal; consolidar um sistema público de comunicação no país; regulamentar a veiculação de conteúdo regional e independente no rádio e na TV; criar mecanismos para que a população se defenda de eventuais abusos na exploração do serviço de radiodifusão; dar transparência aos processos de concessão e renovação de outorgas; acabar com as concessões para políticos; fomentar as rádios comunitárias; etc.

Denis de Moraes – É inadiável a necessidade de regular o sistema de comunicação sob concessão pública. Em primeiro lugar, devemos ressaltar a importância estratégica das políticas públicas de comunicação para redefinir o setor de mídia em bases mais equitativas, combatendo assimetrias que têm favorecido a iniciativa privada (hoje, predominantemente nas mãos de dinastias familiares, muitas delas associadas a corporações transnacionais). Está em questão proteger e valorizar as demandas coletivas frente à voracidade mercantil que prospera à sombra da convergência entre as áreas de informática, telecomunicações e mídia, tornada possível pela digitalização.
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