Dificilmente Hugo Chávez voltará a Caracas para tomar posse na próxima quinta-feira. Há vários cenários que poderão ocorrer nos próximos dias, mas a Constituição venezuelana é clara, segundo o disposto nos artigos 231, 233 e 234:
Se Chávez não puder tomar posse no Congresso no dia 10 de janeiro, a Constituição prevê que o presidente poderia prestar juramento diante da Supremo Tribunal de Justiça, sem especificar a data ou o local. A redação vaga dá margem a interpretações, que não deveriam se chocar com a Carta Magna.
O presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, e o vice-presidente do pais, Nicolás Maduro, defendem que a data prevista na Constituição é apenas um "formalismo", interpretando o final do artigo 231 como que permitindo uma "flexibilidade dinâmica". Afirmam que a posse pode se dar em data posterior não determinada. A oposição, contudo, diz que o governo atual termina no dia 10 de janeiro, devendo o presidente da Assembleia Nacional assumir a presidência, de acordo com o artigo 233.
Se o Congresso no dia 10 de janeiro declarar Chávez temporariamente ausente, o vice-presidente assume a presidência por até 90 dias, prorrogáveis por 90 dias (artigo 234).
Se o Congresso declarar Chávez permanentemente incapacitado para assumir a presidência ou se ele morrer antes de 10 de janeiro, o vice presidente, Nicolás Maduro, terminaria o mandato que se encerra no fim da semana. Em seguida, o presidente da Assembleia Nacional venezuelana, Diosdado Cabello, assumiria a presidência e novas eleições seriam convocadas em 30 dias.
Na hipótese de Chávez assumir em 10 de janeiro e falecer em seguida ou se sua doença forçar o Congresso a declará-lo incapacitado permanentemente, o vice-presidente assume a presidência e novas eleições deveriam também ser realizadas em 30 dias.
O governo brasileiro enviou a Havana o assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, para se informar da real situação médica de Hugo Chávez e certamente também dos planos em relação à posse no dia 10. A ida de Marco Aurélio Garcia, e não do ministro Patriota, e a decisão de não envolver apenas o embaixador brasileiro em Havana mostram o grau de preocupação política do governo. Não só pela proximidade e afinidade de Chávez com Lula e com Dilma, mas também pelas conotações ideológicas que dramatizam a questão.
Ainda está presente na memória recente a dura posição adotada pelo governo brasileiro no âmbito do Mercosul, com a suspensão do Paraguai do grupo em função do juízo político do presidente Lugo no Congresso, sob o argumento de que houve um golpe e que a constituição não foi cumprida.
A Venezuela agora é membro pleno do Mercosul. Se Chávez não tomar posse no dia 10 e o mandato presidencial na prática for estendido, a cláusula democrática poderá ser invocada e terá de ser apreciada.
Será muito difícil para os países do Mercosul ou da Unasul apoiarem a posição - que deverá prevalecer - do presidente da Assembleia Nacional, Cabello, e do vice-presidente Maduro, favoráveis ao adiamento sine die da posse, com base em interpretação sem qualquer respaldo legal.
Fonte: O Globo