Maria Inês Nassif: "STF age como oposição"


Para colunista da Carta Marior, com o julgamento da AP 470, “STF tornou-se um bunker incrustado no coração da democracia, que mais colabora para manter as deficiências do sistema político do que para saná-las; e que mais se consolida como uma instância máxima de ação política do que como uma instituição que deve garantir justiça”

Para colunista da Carta Marior Maria Inês Nassif, ao decretar o cumprimento de prisões sem o trânsito em julgado de toda a ação da AP 470, “STF tornou-se um bunker incrustado no coração da democracia, que mais colabora para manter as deficiências do sistema político do que para saná-las”. Leia:

STF age como oposição porque partidos não conseguem cumprir papel

O STF tornou-se um bunker incrustado no coração da democracia, que mais colabora para manter as deficiências do sistema político do que para saná-las.

Escrevo com atraso a segunda coluna sobre as dificuldades da oposição partidária brasileira (leia aqui a primeira, O canto do cisne do PSDB e do DEM), mas isso pode ter sido providencial. Coincide com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de decretar a prisão dos condenados do chamado Mensalão sem o trânsito em julgado de toda a ação.

As pessoas que concordam com a intromissão do STF em assuntos que a Constituição define como de competência do Legislativo dizem que os ministros do STF legislam porque o Congresso não cumpre a sua função. Se for possível sofismar sobre essa máxima, dá para concluir que o STF age como oposição porque os partidos políticos, que deveriam fazer isso, não conseguem atuar de forma eficiente e se constituírem em opção de poder pelo voto.

O Supremo, na maioria das vezes em dobradinha com o Ministério Público, tem atuado para consolidar um poder próprio, que rivaliza com o Executivo e o Legislativo, isto é, atua em oposição a poderes constituídos pelo voto. Tornou-se um bunker poderoso incrustado no coração da democracia, que mais colabora para manter as deficiências do sistema político do que para saná-las; e que mais se consolida como uma instância máxima de ação política do que como uma instituição que deve garantir justiça.

Essas afirmações não são uma opinião, mas uma constatação. O STF, nos últimos 11 anos, a pretexto de garantir direito de minorias, legislou para manter o quadro partidário fragilizado nas ocasiões em que o Legislativo – que não gosta muito de fazer isso – tentou mudá-lo. Como magistrado, seleciona réus e culpados e muda critérios e regras de julgamento para produzir condenações e dar a elas claro conteúdo político. O julgamento do caso do chamado Mensalão do PT foi eivado de erros, condenou sem provas e levará para cadeia vários inocentes. Casos de corrupção que envolvem partidos de oposição caminham para a prescrição.

Como legislador, o STF derrubou as tentativas do Congresso de fazer valer as cláusulas de barreira para funcionamento dos partidos no Legislativo, votadas pela Constituinte de 1988 e que foram adiadas ao longo do tempo. Elas serviriam para “enxugar” o quadro partidário das legendas de aluguel.

Em 2008, o Supremo referendou decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de que perderia o mandato o político que, eleito por um partido, migrasse para outro depois da eleição. Embora teoricamente defensável, a decisão de obrigar políticos eleitos à fidelidade partidária apenas fechou a porta usada regularmente pelo políticos para reacomodação do quadro partidário depois das eleições, ou de interesses políticos nas vésperas de um novo pleito.
Num sistema político-partidário imperfeito como o brasileiro, a possibilidade de trocar de legenda era fundamental para o político. Dada a dificuldade dos políticos eleitos por partidos tradicionais de sobreviver sem o apoio do governo federal, era comum que, empossado um novo governo, houvesse uma migração de políticos oposicionistas para partidos da base aliada. Isso manteve inalterado o número de partidos por um bom par de anos, embora em número excessivo; e dava um certo fôlego aos novos governos para compor maiorias parlamentares cuja ausência, num sistema político como o brasileiro, poder inviabilizar um governo.

Na ausência dessa brecha, e sem que houvessem mudanças no sistema político que tornassem adequadas as punições para infidelidade partidária, a decisão do STF escancarou outra porta: abriu uma única exceção para a migração parlamentar, a criação de um novo partido. O PSD foi criado pelo grupo do ex-prefeito Gilberto Kassab em 2010, logo após as eleições, para dar uma alternativa aos integrantes do DEM que constataram que a desidratação eleitoral do ex-PFL naturalmente levaria o partido à extinção, mesmo com o nome novo; e que passar mais quatro anos na oposição, para a maioria dos políticos que lá estavam, também era uma sentença de morte. O PSD foi uma acomodação pós-eleitoral. A criação do Solidariedade e do PROS (e da Rede também, se o partido de Marina Silva tivesse obtido registro no TSE) serviram à acomodação pré-eleitoral no quadro partidário.

Se tudo continuar como está, os períodos de reacomodação das forças políticas sempre exigirão a criação de novas legendas.
O STF foi o artífice de um novo processo de pulverização partidária que certamente tornará mais frágil o quadro partidário e mais deficiente a ação legislativa. E tem inibido o Congresso de legislar sobre partidos e eleições, quase que fixando os dois temas como reserva de mercado do Judiciário. A decisão do ministro Gilmar Mendes, este ano, de sustar a tramitação de um projeto no Legislativo que impedia ao parlamentar que mudasse para outro partido levar junto o seu correspondente em Fundo Partidário e horário eleitoral gratuito (que ficaria com o partido pelo qual foi eleito), foi uma barbaridade jurídica que, se não tinha muito futuro no plenário do SFT, surtiu o efeito de intimidar o Parlamento de seguir adiante.
Diante desses fatos, é possível concluir, sem margem de erro, que não apenas os interesses dos integrantes do Congresso estão em desacordo com uma reforma política. Um risco igualmente grande de fracasso de uma mudança legal efetiva no sistema partidário e eleitoral reside no Poder Judiciário.
No caso do Mensalão, o STF não julgou. Os réus já estavam condenados antes que o julgamento se iniciasse. O hoje presidente do tribunal e relator da ação, Joaquim Barbosa, deu inestimável ajuda para que isso acontecesse. A orquestra tocou rigorosamente sob sua batuta, salvo o honroso desafino do revisor da ação, Ricardo Lewandowski. Seria louvável se o julgamento servisse para mostrar à sociedade que até poderosos podem ser condenados, se o processo não deixasse dúvidas de sua intenção de fazer justiça. As condenações, todavia, foram fundamentadas em erros visíveis a olho nu. É um contrassenso: para fazer a profilaxia política, condena-se culpados, inocentes e quem estava passando por perto mas tinha cara de culpado.
Basta uma análise breve do julgamento para constatar que, não se sabe com que intenção, Barbosa construiu uma acusação sobre um castelo de cartas: como precisava existir dinheiro público para que a acusação de desvio de dinheiro público vingasse, forjou o ex-diretor de Marketing do BB, Henrique Pizzolato, como o “desviador” de uma enorme quantia do Fundo Visanet, que não era público e que não foi desviado. Pizzolato vai para a cadeia sem que em nenhum momento, como diretor de Marketing, tivesse poder de destinar dinheiro do fundo. É uma situação tão absurda que as campanhas contratadas pela agência DNA, que servia por licitação feita no governo anterior ao Banco do Brasil, foram veiculadas pelos maiores órgãos de comunicação, que continuam a falar do desvio embora o dinheiro tenha entrado no caixa de cada um deles.
O STF considerou que a culpa de José Dirceu dispensava provas e que a assinatura de José Genoíno, então presidente do PT, num empréstimo feito pelo partido, que foi quitado ao longo desses anos e considerado legal pelo TSE na prestação de contas do partido, tornava o parlamentar culpado. Foram decisões politicamente convenientes e aplaudidas por isso por parcela da população. Esse foi um erro cometido pela elite brasileira, um grande erro – e torço para que ela perceba isso a tempo. Condenar sem provas e sem evidências, quando o STF é a instituição que condena, pode se tornar uma regra, não uma exceção. Qualquer brasileiro poderá estar sujeito a isso a partir de agora. A visão subjetiva dos ministros do STF terá o poder de prevalecer sobre qualquer fato objetivo.
Esses dois padrões de decisão do STF só podem ser entendidos se tomados conjuntamente. São ações que dão sobrevida aos partidos de oposição, ao manter o partido do governo sob constantes holofotes, de preferência em vésperas de eleições; e ao mesmo tempo mantém os partidos enfraquecidos por constantes intervenções em leis eleitorais e partidárias, o que dá à mais alta Corte brasileira poder constante de intervenção sobre assuntos político.”

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AP 470: Advogado afirma que STF negou-se a analisar provas



* Em entrevista à TV SINDIPETRO Bahia, o Advogado Marthius Sávio Cavalcante Lobato (que defende Henrique Pizzolato, funcionário do Banco do Brasil, na AP 470) fez importante declaração que está registrada no vídeo divulgado em 08/11 - e que aqui disponibilizamos (veja acima).

Na entrevista, o Advogado Marthius Sávio destacou: "...nós temos provas robustas, fortes e que sequer foram contestadas pelo Ministério Público e que sequer foram contestadas nos votos dos ministros, por que eles se negam a citar (= analisar) as provas ..."

Mais adiante ele acrescenta: "... eu estou fazendo o meu segundo embargo de declaração, pedindo que eles falem de documentos que estão nos autos que demonstram a inveracidade das afirmações da denúncia e eles não analisam ..."

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Esqueletos

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Militantes da USP adotam tática do PCC


A USP tem formado uma geração de mal educados. Isso ficou comprovado depois que os seus alunos saíram do prédio da reitoria, após 45 dias de ocupação. Mais uma, diga-se. Nem sequer ficaram para esperar a chegada da PM, que acabara de receber ordem judicial para retirar a molecada de lá. Além de bagunceiros, bundões.
O “movimento” exigia eleições diretas para reitor. Aham. Que bandeira mais prioritária, não é? Tanto que a sociedade toda se mobilizou para ignorar solenemente a ocupação. Que eu saiba, voto universal não é adotado em universidade nenhuma do mundo. Até porque seria absurdo, diante da desproporção entre o número de alunos, professores e funcionários — sendo que, de todos, os que menos permanecem na instituição são exatamente os estudantes (à exceção dos militantes profissionais, que só saem de lá jubilados após uma década de parasitismo).
Mas, vá lá, mesmo que a reivindicação seja um clichê consagrado no período pós-democratização do país, quando ainda poderia fazer algum sentido, a estudantada bem que poderia ter agregado alguma palavra de ordem mais útil ou digna para uma universidade que insiste em se manter apartada do restante da população. A USP é famosa por sua resistência à política de cotas, a participar do Enem, a ceder seu campus para lazer aos finais de semana, entre outras posturas típica de uma aristocracia tardia. Eles se acham. E fazem questão de esquecer que são financiados exclusivamente com verbas públicas. O meu, o seu, o nosso dinheirinho.
Posto isso, o que mais chama a atenção é o comportamento selvagem dessa suposta elite da elite. Eles precisam estudar mais. Principalmente, política e sociologia. Apesar de suas lideranças terem se comprometido a não vandalizar o edifício ocupado, o que se viu ao final foi mais uma demonstração da barbárie que corrói todos os níveis dessa nação ignorante.
A reitoria da USP ficou parecendo presidio após rebelião. O movimento estudantil quer prestar alguma homenagem semiológica ao PCC? Parece. O cenário era pura devastação: vidros quebrados, portas arrancadas, maquetes arquitetônicas e extintores de incêndio destruídos, móveis inutilizados, colchões abandonados no chão, “gatos” elétricos, gavetas remexidas, pichações por todo lado. Uma imundície, inclusive moral. Até um busto de Dante Alighieri foi depredado. Com certeza, os militantes esclarecidos nem sabiam que era do grande poeta italiano.
Mas o pior, sem dúvida, foi o criminoso furto de computados e impressoras. Isso é injustificável. E não venham dizer que isso foi plantado pela policia, pois repórteres puderam entrar no exato momento da retomada das dependências. Ladrões. As lideranças permitiram que bandidos participassem da ocupação. Marginais. Repito: ladrões. É muita degradação para o movimento estudantil, tão corajoso e fundamental durante a resistência à ditadura militar. Sinal dos tempos. Mais um.
Tudo que é ruim pode piorar. Além de agirem como escória, os jovens bem nutridos (em sua maioria vindos das melhores escolas particulares) foram derrotados. E construíram o álibi para que a direção possa agir no futuro com violência e prontidão. Bem feito para eles. Mas lamentável para quem eventualmente tiver alguma proposta decente para melhorar o ensino superior em nosso País.
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Caco Barcellos e a classe média que não quer mudar

Ele

Acho que nunca contei essa história a ninguém. Na adolescência, nutri um amor platônico pelo Caco Barcellos. Assim como as minhas amigas eram apaixonadas pelos cantores/dançarinos das boy bands dos anos 1990, eu suspirava pelo jornalista da Globo.

Explico. Em 1999, Caco fora entrevistado pela Regina Casé, que na época apresentava o Muvuca, uma espécie de talk show exibido nas noites de sábado. A certa altura da conversa, Regina perguntou algo sobre as desigualdades existentes no país, não me lembro ao certo o que ela disse. O repórter global respondeu: “o Brasil não muda porque a classe média não quer mudar!”. Aquelas palavras me impactaram de tal maneira que passei alguns dias repetindo mentalmente o que o ele havia dito. Pensei: somente ele teria coragem de dizer aquilo num programa da emissora carioca, e principalmente no horário nobre. Daquele instante em diante, meu interesse pelas questões sociais eclodiu e Caco Barcellos tornou-se o meu ídolo.

Passei a colecionar entrevistas do jornalista gaúcho. Não tive coragem de colocar uma foto dele na parede do meu quarto, pois temia ser incompreendida pela minha mãe. Como explicar a minha paixão repentina por um homem que tinha idade para ser o meu pai?

Um tempo depois, descobri o Caco Barcellos escritor. A leitura de Rota 66 foi inesquecível! Um clássico indispensável para o entendimento da postura violenta e autoritária da polícia militar no Brasil. Em 2003, tão logo foi lançado, li O Abusado, um petardo que narra a história de Márcio VP, traficante do Morro Santa Marta que ficou conhecido em todo o país.

Praticamente quinze anos se passaram desde que o Caco Barcellos concedeu aquela entrevista à Regina Casé. Muita coisa mudou. Apesar de ainda guardar alguns traços daquela garota que sonhava ser inteligente e conhecer o Rio de Janeiro, hoje já sou quase uma balzaquiana. O Brasil nem de longe lembra aquele país dos anos finais da década de 1990, atolado na recessão, subordinado aos interesses econômicos dos Estados Unidos e com índices elevadíssimos de desemprego, pobreza e miséria. Sobre a nossa classe média, lamentavelmente, não posso dizer o mesmo. Como pude testemunhar no início dessa semana, parece insistir em manter a sua face conservadora e reacionária.

Enquanto aguardava na recepção do consultório dentário, ouvi um dentista esbravejar na sala ao lado: “Hoje em dia tudo é muito fácil! Ninguém quer trabalhar! Tem bolsa para tudo! É bolsa família, bolsa disso, bolsa de não sei mais o quê! E ainda tem essas cotas. Agora qualquer um pode entrar na Universidade! É tudo culpa do PT! Tudo culpa do Lula e da Dilma! Sou contra tudo isso!”

Confesso que a fala do dentista não causou em mim nenhuma indignação. Essa gente não me assusta. Na verdade, senti pena. Percebi nas palavras do “doutor” a mais profunda ignorância e um bocado de inveja e ressentimento, sentimentos que parecem ser inerentes à boa parte da classe média brasileira. A negação de forma virulenta e odiosa das melhorias nas condições de vida da população trazidas por programas como o Bolsa Família e pelo sistema de cotas revela o desejo de manutenção de privilégios, muitos deles conquistados na base da exploração e exclusão social da população pobre. Mas como me disse outro dia a Conceição Lemes, jornalista e amiga querida, contra fatos, não há argumentos.

créditos: Carta Maior
créditos: Carta Maior

Em outubro, o Bolsa Família completou 10 anos com o status de programa de transferência de renda mais bem sucedido do mundo. Pesquisas revelam que desde a sua criação, no primeiro mandato de Lula, mais de 36 milhões de brasileiros saíram da extrema pobreza ao serem beneficiados com os recursos pagos mensalmente pelo programa. Na condição de professora de um dos municípios mais pobres de Minas Gerais, posso afirmar que o Bolsa Família tem também o mérito de contribuir para a permanência de crianças e adolescentes na escola, uma vez que  o benefício é suspenso caso o alunos deixem de frequentar as salas de aula.

Já as cotas tem se mostrado um instrumento eficaz na reversão do quadro de injustiça no qual se encontra a população afrodescendente. Estudos mostram que a ação afirmativa é uma medida eficaz para que haja uma maior representatividade de negros nas universidades públicas e consequentemente a elevação da condição socioeconômica desse grupo. Além disso, uma pesquisa recente do IPEA apontou que estudantes cotistas têm rendimento igual ou superior ao dos demais alunos, desmitificando a teoria defendida por muitos de que esse tipo de medida reparatória provocaria a queda da qualidade dos cursos.

Volto ao Caco Barcellos.  Para o meu deleite, há dois anos ele ministrou uma palestra aqui em Belo Horizonte. Sempre sensato e coerente, Caco falou para uma plateia lotada sobre a experiência de ter sido taxista, do ótimo Profissão Repórter, de política e dos nossos dramas sociais. E mais uma vez, ele me encantou. Dessa vez com as seguintes palavras: “a maior herança que o meu pai me deixou foram três palavras: vergonha na cara!”

Bem, na minha modesta opinião, além da vontade de mudar, acho que é exatamente isso que falta à classe média da terra brasilis: uma boa dose de vergonha na cara. Enquanto isso não acontece, o Brasil segue mudando. Para melhor! “E quem não é tolo, pode ver”.

Luana Tolentino
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