Ombudsman admite: Folha induz ao erro

Por Altamiro Borges

A Folha tem feito de tudo para livrar a cara do ex-prefeito José Serra no escândalo da "máfia dos fiscais" de São Paulo. Nesta semana, porém, ela se superou. Deu uma capa espalhafatosa: “Prefeito sabia de tudo, diz fiscal preso, em gravação”. Ela não cita o nome do ex-demo Gilberto Kassab e nem do seu antecessor tucano, induzindo o leitor apenas das manchetes nas bancas a suspeitar do atual prefeito, Fernando Haddad, do PT. Até a ombudsman da Folha, Suzana Singer, admitiu que o jornal pisou feio na bola. Vale conferir seu texto deste domingo (10):

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Sujeito oculto

A manchete de sexta-feira passada da Folha --"Prefeito sabia de tudo, diz fiscal preso, em gravação" - induzia o leitor a erro. O prefeito de São Paulo é Fernando Haddad, mas a referência no grampo era a seu antecessor, Gilberto Kassab.

O título partiu da transcrição de um telefonema em que o auditor fiscal Ronilson Bezerra Rodrigues dizia que deveriam ser convocados para depor "o secretário e o prefeito com quem trabalhei", porque "eles tinham ciência de tudo".

Ronilson foi subsecretário da Receita no governo Kassab e, na atual gestão, foi diretor na SPTrans de fevereiro até junho.

O fiscal não cita nominalmente o ex-prefeito, mas é fácil deduzir de quem ele está falando. Foi na gestão anterior que Ronilson ocupou o cargo de zelar pela arrecadação de impostos, o que lhe teria possibilitado atuar na "máfia do ISS" - esquema de cobrança de propina que pode ter causado um prejuízo de R$ 500 milhões aos cofres da cidade.

"A Folha optou por transcrever a declaração do fiscal de forma literal, já que ele não citou nenhum nome e exerceu funções de confiança tanto na gestão atual como na anterior", diz a Secretaria de Redação.

O excesso de zelo ficou só na manchete, já que a hipótese de que a frase do fiscal pudesse ser uma referência a Haddad não foi explorada na reportagem. O "outro lado" foi apenas com Kassab, que classificou as declarações de falsas, mas não cogitou que o fiscal estivesse falando de outra pessoa.

O jornal foi mais realista que o rei, numa cobertura bem delicada. O escândalo do desvio de impostos, que veio à tona no fim de outubro, tinha tudo para render apenas dividendos ao atual prefeito. Embora a investigação tenha começado com Kassab, foi Haddad que revelou a quadrilha. Bastaram, porém, três dias para que surgisse um grampo citando Antonio Donato, secretário de Governo.

Como a investigação continua, é provável que apareçam novas escutas. Elas não são prova de culpa e devem ser tratadas com todo o cuidado, mas sem distorções.

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Suzana Singer omitiu “apenas” uma informação valiosa na sua corajosa crítica. Ela deixou de citar José Serra, o ex-prefeito que abandonou o cargo na capital paulista e o deixou para o seu fiel aliado Gilberto Kassab – ex-DEM e atual presidente do PSD. A “máfia dos fiscais”, denunciada por Fernando Haddad por arrombar os cofres da prefeitura em cerca de R$ 500 milhões, fez carreira durante a gestão do grão-tucano.

Os quatro fiscais presos – Ronilson Bezerra, Luis Alexandre Magalhães, Eduardo Horle Barcellos e Carlos di Lallo – eram subordinados diretos do ex-secretário Mauro Ricardo, indicado por José Serra para cuidar das finanças paulistas na gestão de Gilberto Kassab. Mas a Folha serrista nunca falará mal do tucano, principalmente no momento em que ele está em guerra no PSDB contra o cambaleante mineiro Aécio Neves para ser o presidenciável da legenda na disputa de 2014.

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Alguns comentários de leitores sobre meu romance 'Madame Flaubert'. Aguardo o seu




Embora o livro ainda não tenha sido oficialmente lançado, meu romance Madame Flaubert já está à venda desde setembro, e alguns leitores fizeram seus comentários.

Há ainda, curiosamente, pessoas que em seu perfil no Facebook indicam Madame Flaubert como um de seus livros favoritos. Mas não me deram nenhum retorno disso. Por quê? Escreva pra mim!

Alguns comentários me foram enviados por e-mail, dois recebi por mensagem direta no Facebook e outros dois descobri no Google.

Foi uma surpresa agradável, especialmente porque os comentários foram todos positivos. Agora, aguardo o seu, que me leu. O que achou? Comente. Aqui no blog, no Face, envie por e-mail - neste caso, só vou publicá-lo com sua autorização.

Mas estou verdadeiramente interessado na opinião de todos. Vamos lá, escreva.

Aos trechos de comentários:

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Antecipei minha ida para a cama. Por favor, não se apressem em conclusões. Deitei-me em companhia do romance Madame Flaubert, do colega blogueiro Antonio Mello.

Gostei da ironia do título e o encomendei à Publisher, do também blogueiro Renato Rovai, por via postal – eletrônica e regular. Paguei trinta reais, incluindo frete, e recebi em menos de cinco dias, em plena greve dos trabalhadores dos Correios. Isso é que é eficiência.

Trama instigante, em estilo e ritmo elétricos, a envolver escritores e/ou roteiristas de novelas e personagens da política, da TV e botequins. Todos mais ou menos frustrados com a trajetória de suas vidas ou o (des)aproveitamento de seus supostos talentos.

Passa-se no Rio da era Collor, ele próprio assinalado, em narrativa que traduz a superficialidade de uma época e de um meio. A  exemplo de Madame Bovary, de Gustave Flaubert, ponto de partida ou inspiração.

Gostei do que li até agora, e já estou quase no fim das 191 páginas. Recomendo. [Fonte]

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AC é um escritor que se afundou na bebida e nas drogas. Sempre alterado, não consegue terminar um romance, onde vem trabalhando com afinco, porém sem sucesso. Antonio (AC) usa elementos da realidade em seu romance, para ele tudo é literatura.

Sempre bêbado, não consegue mais discernir o que é real ou ficção, de certa forma se apoia nos colegas para encontrar um pouco de verdade em sua vida.

Juntamente com seus amigos, ele vai escrevendo seu romance, onde seus personagens são pessoas reais. Ele luta contra ele mesmo, e contra os efeitos das drogas para terminar seu romance. Cada personagem da história tem suas crises, vícios e sonhos. Todos destruídos de uma forma eletrizante. Histórias que vão se ligando na obra, e no fim recebem um mesmo destino.

Antonio Mello utilizou de fatos que nós conhecemos pela mídia, como quando Collor é eleito e depois deposto, como a filha de Glória Perez que morre assassinada pelo ator que trabalhava com ela. De certa forma, em Madame Flaubert o leitor se sente parte da obra, se sente vivo junto com cada personagem ali descrito. Torce e tenta adivinhar qual será o seu destino. [Fonte]

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O que eu mais gostei foi que o livro foi-me pegando aos poucos e quando eu vi não conseguia mais parar de ler, porque me surpreendia cada vez mais, as coisas vão acontecendo como num quebra-cabeças onde as peças se encaixam. Me surpreendeu, porque sou leitora do blog, gosto do jeito que você escreve, mas no livro é outro nível. Parabéns. [por e-mail]

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Antonio, acabei de ler seu livro, estou emocionada, arrepiada, com o coração batendo. Há muito tempo não lia um romance que me fizesse não querer parar de ler do começo ao fim. Conheço suas histórias e reconheço: você é mesmo Big. Escreva outros meu caro, essa é a parte que te cabe neste latifúndio, todos os elogios meus (ou os do livro) são poucos pra sua Arte, com A maiúscula mesmo. Parabéns. Sucesso e obrigada por existir em nossa vidas. [mensagem no Face, de pessoa queridíssima]

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Bom, Bom demais, por ser Bom, Bom de ler, Bom de "Viajandão", Bom de fazer Bem...Show Mello!! Beijo Grande [de um amigo, diretor de TV e vídeo, na página do romance]

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Aguardo seu comentário. E, por favor, já me diga se posso publicá-lo ou não. Grato.

E você que ainda não leu, trate de fazê-lo. Clique no banner abaixo e voilá...


Madame Flaubert, de Antonio Mello

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Oposições planejam impor caos no país

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:

Há um fato com o qual praticamente todos os analistas políticos concordam: em uma disputa limpa haverá poucas chances de candidatos da oposição derrotarem a presidente Dilma Rousseff na eleição presidencial do ano que vem. Essa chance só se materializará se a sensação de bem-estar gerada por emprego e renda em alta for anulada.

Mas como anular uma realidade que se faz sentir na veia da maioria dos cidadãos brasileiros, uma maioria hoje inserida na classe média baixa e que, agora, vê filhos se tornando os primeiros universitários da família, que está comprando o primeiro automóvel, que está reformando ou comprando imóveis, que vem tendo sucessivos aumentos de salários?

Em primeiro lugar, os que pretendem tirar o PT do poder após dez longos anos de hegemonia política desse partido sonham com uma ampla frente das oposições de esquerda e direita ao governo Dilma. PSDB, DEM, PSB, PSOL e PSTU vêm mantendo diálogo por meio de interpostas pessoas, acertando pontos mínimos de convergência e uma estratégia comum.

Uma frente formal que reúna partidos aparentemente tão diferentes não é viável. Pegaria mal tanto para o lado esquerdo quanto para o direito. Mas a aliança pode se dar no discurso e nas táticas que serão usadas para tentar anular o bom e velho “feel good factor”, ou “fator sentir-se bem”, em tradução livre.

Mas como fazer o cidadão esquecer que hoje qualquer um consegue emprego em um país em que a escassez de emprego sempre foi tão grande que as empresas pagavam salários de fome até para engenheiros formados? Como fazer o cidadão esquecer do automóvel que agora tem na garagem ou do filho que será o primeiro membro da família a se formar?

Durante as manifestações de rua que se abateram sobre o país ao longo do mês de junho ficou provado que é possível hipnotizar um país inteiro. Diante de um mundo perplexo, o país que mais tem avançado na distribuição de renda, na redução da pobreza, na geração de empregos, no aumento do poder de compra dos salários e que tem resistido à maior crise econômica em cerca de um século parecia um dos países árabes em que ditaduras cruéis foram derrubadas por grandes protestos daqueles povos famintos e sem perspectivas.

A espantosa queda de aprovação de Dilma em um espaço de míseros 30 dias mostrou ser possível, sim, fazer um país esquecer tudo o que conquistou graças aos que o governaram nos últimos dez anos.

Em tese, portanto, bastaria reeditar as tais “jornadas de junho” para derrotar a atual presidente. Os partidos que detêm “tecnologia” para colocar massas nas ruas – PSOL e PSTU, que se valem de todo tipo de gente para inflar protestos, inclusive de neonazistas, punks, skinheads e assemelhados – fariam todo o trabalho e aos partidos de direita bastaria apontar a “insatisfação do país” com “esse governo”.

Enquanto a oposição de esquerda enche as ruas com militantes de esquerda e psicopatas de direita para forjar “insatisfação generalizada”, a de direita usaria os grupos de mídia que a apoiam para desacreditar o Brasil no exterior com olhos na possibilidade (real) de uma reviravolta na crise internacional que tiraria os países ricos da linha de tiro e colocaria países em desenvolvimento.
Recentemente, o colunista da Folha de São Paulo Demétrio Magnoli citou uma “tempestade perfeita” que despencaria sobre o Brasil no ano que vem e que anularia o “feel good factor”.

Em tese, a “tempestade perfeita” de Magnoli consistiria em os Estados Unidos subirem as taxas de juros, hoje praticamente zeradas com vistas a estimular o crescimento de uma economia doente. Com esse aumento de remuneração do capital nos EUA, haveria uma fuga de dólares do Brasil e, com menos dólares na praça, o real se desvalorizaria, gerando inflação.

Enquanto os black blocs estivessem apavorando e espantando turistas e fazendo o Brasil passar vexame em plena Copa do Mundo, possivelmente afetando a moral da Seleção, que completaria a tragédia jogando mal e perdendo a Copa “em casa”, os preços estariam explodindo, os empresários entrariam em pânico e, nesse momento, a mídia ainda trataria de expor algum dos escândalos de última hora que sempre explodem contra governos petistas em períodos eleitorais.

Contudo, o que o novo colunista da Folha e os que endossam sua teoria da “tempestade perfeita” não avaliam é que o Brasil resistiu aos solavancos da economia internacional ao longo de toda a década passada. Devido às imensas possibilidades de investimento em nosso país, pode não haver fuga relevante de dólares mesmo que os EUA aumentem os juros.

Além disso, mesmo que diminua o fluxo de dólares para o Brasil, os níveis de investimento irão aumentar ao longo do ano que vem, sobretudo por conta dos investimentos no campo de petróleo de Libra, recém-leiloado.

O que preocupa é que no próprio PT há gente disposta a se unir à oposição pela esquerda. Recentemente, um dos candidatos a presidente do partido propôs que seja “sacrificada” a reeleição de Dilma em troca de se “fazer a reforma agrária”, provavelmente achando que é possível reverter 500 anos de concentração de propriedade da terra ao longo de 2014. E ignorando que a volta da direita ao poder reverteria qualquer conquista.

Contudo, apesar de até o próprio PT abrigar uma oposição de esquerda ao governo federal em seus quadros, de a oposição em outros partidos de esquerda só pensar em vingança contra os grupos de centro-esquerda que hoje dominam o partido do governo e que expulsaram os que fundaram PSOL, PSTU etc., e de haver risco, sim, de os EUA aumentarem os juros, o governo ainda tem bala na agulha.

Apesar da estrondosa queda de popularidade de Dilma advinda das “jornadas de junho”, a continuidade da instalação de programas sociais e de medidas econômicas que beneficiam a maioria reverteu aquela queda.

Assim como o Minha Casa, Minha Vida, como a redução das contas de Luz ou como a queda dos juros liderada pelos bancos oficiais, o governo continuou implantando programas que beneficiam as massas, sendo o Mais Médicos o último programa dessa série. Com isso, reverteu-se a queda de popularidade de Dilma, que já desponta como favorita em 2014.

Está posto, então, o quadro político para o ano que vem. Mais uma vez, haverá disputa entre a razão e a emoção, como em 2002, 2006 e 2010.

Em 2002, Lula venceu graças à racionalidade: após FHC se reeleger em 1998 prometendo não desvalorizar o real, no primeiro mês de seu segundo governo ele violou a promessa. O povo foi racional tirando do poder um partido que o enganou, o PSDB.

Em 2006, Lula se reelegeu contra a comoção que tentaram instalar no país contra a “corrupção” do PT no âmbito do escândalo do mensalão. Mais uma vez prevaleceu a racionalidade. A sociedade preferiu os avanços que já sentia no cotidiano ao discurso moralista que tentava transformar Lula em um corrupto mesmo sem nenhuma prova contra ele.

Em 2010, Lula elegeu Dilma com base no imenso bem-estar social que seu governo gerou ao país. Salários crescendo, empregos surgindo em toda parte, pobreza e desigualdade despencando e o protagonismo internacional do Brasil derrotaram o fundamentalismo religioso e a rede de intrigas aos quais José Serra se agarrou para tentar derrotar a adversária

A racionalidade vem derrotando a catarse há mais de uma década, portanto. Mas essa racionalidade foi rompida em junho graças a um espetáculo pirotécnico que os oposicionistas da situação e da oposição conseguiram montar – uns por falta de visão e outros por má fé mesmo.

O que resta saber, portanto, é se após a sociedade despertar da catarse junina ela poderá ser drogada de novo. Será que o povo aprendeu alguma coisa após ver toda aquela pantomima não resultar em absolutamente nada? Será que a desmoralização da tática de quebra-quebra fará o povo resistir à droga político-ideológica que tentarão lhe inocular?

Façam suas apostas.
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A mídia e a farsa do cartel

Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa

Os três principais jornais de circulação nacional resolveram, nesta sexta-feira (08/11), praticar algum jornalismo no caso que envolve o sistema de propinas que encareceu e atrasou o programa de transporte sobre trilhos na região metropolitana de São Paulo. O leitor ou leitora que tiver paciência e disponibilidade para vasculhar os fragmentos de notícias que a imprensa vem ofertando até aqui sobre esse caso vai concluir, facilmente, que se trata de um crime continuado, com alto grau de planejamento, e não apenas de um caso isolado de cartel, como vinham insistindo os jornais até aqui.

O fato que obriga a imprensa a dar mais atenção ao esquema é o bloqueio de bens dos principais envolvidos, no valor total de R$ 60 milhões, que acaba de ser determinado pela Justiça Federal. Os atingidos são cinco dos acusados, entre eles três ex-diretores da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, além das empresas Siemens e Alstom, que teriam sido beneficiadas com obras obtidas à base de propina. Os jornais divergem quanto ao período, mas o inquérito se refere aos anos de 1995 a 2008, alcançando principalmente os mandatos de Geraldo Alckmin e José Serra, do PSDB.

Com todas as evidências de que se tratava de um atentado sistêmico contra o interesse público, no entanto, os jornais vinham insistindo em tratar o caso como "denúncia de cartel", concentrando-se apenas nas informações prestadas voluntariamente pela direção da empresa alemã Siemens. Paralelamente, eram noticiados aspectos do envolvimento da francesa Alstom, como se fossem dois casos diferentes. Com esse apoio da mídia, o governador Alckmin entrou com processo contra a Siemens, com o propósito declarado de obrigá-la a ressarcir os cofres públicos por eventuais prejuízos.

A decisão da Justiça, de bloquear os bens de antigos auxiliares de Alckmin e Serra, expõe a ridículo a tentativa de dirigir o foco à empresa que supostamente pagou a propina, omitindo a culpabilidade de quem teria recebido o dinheiro. Uma juíza federal sepultou a manobra, ao exigir que o governo paulista refaça a ação de indenização, incluindo todas as 19 empresas que teriam atuado em conluio com agentes públicos para aumentar os preços de obras do metrô e do sistema de trens metropolitanos.

Crime continuado
No Ministério Público de São Paulo, procuradores criticam publicamente o governador pela manobra canhestra na tentativa de ocultar o esquema de corrupção. Segundo a Folha de S. Paulo, integrantes do MPE ridicularizam a ação, acusando o procurador-geral do Estado de agir politicamente para preservar Alckmin, declarando que o processo de indenização contra a Siemens "foi mais uma ação política do que um trabalho jurídico de recuperação da verba desviada".

A manobra é tão primária que, numa rápida leitura, pode-se notar como o procurador-geral apenas copiou e colou os elementos da confissão feita publicamente pela própria Siemens em seu acordo para a delação do cartel. Que o governador se submeta a tal vexame, pode-se entender como parte do jogo político. O que causa espanto é que os jornais embarquem no esforço de encobrir o que é, certamente, um dos grandes escândalos do nosso tempo. Por conta de acordos que agora estão sendo revelados, certamente os preços das obras de expansão e manutenção minaram a capacidade de investimento do Estado, atrasando o desenvolvimento do sistema de trens e metrô de São Paulo.

Não há como dissimular que se trata de um sistema organizado de fraudes, com manipulação de preços, iniciado ainda no governo de Mario Covas, que assumiu em 1995 e faleceu em 2001, e continuado sob os mandatos de seus sucessores. Segundo o Estado, o esquema começou com a Alstom em 1995. Segundo o Globo, a Siemens pagou propinas a autoridades estaduais entre 1998 e 2008. Segundo a Folha, o esquema da Alstom ainda funcionava entre 2000 e 2007. Feitas as contas, mesmo os leitores e leitoras mais distraídos vão concluir que não era apenas um caso eventual de cartel.

"A simulação é uma profecia que, de tanto ser repetida, se fortalece como uma realidade", dizia o sociólogo francês Jean Baudrillard. No caso, a cumplicidade da imprensa quase transforma em realidade a farsa do cartel de uma empresa só. A decisão da Justiça desmascara a versão vendida pelo governador e engolida pelos jornais. Os trens lotados e a indecência do transporte público são o resultado desse esquema.
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“Você sabe com quem está falando?”

Leonardo Sakamoto, em seu blog:

“Você sabe com quem está falando?''

Quando alguém diz isso, certamente um anjinho comete suicídio no céu (só para reciclar a piada dos pandas de ontem).

Ouvi isso hoje – o contexto é longo e chato, então não vem ao caso. Mas fiquei com a impressão de que a pessoa, feito um macaco velho, jogou sua caca em mim. Sei que o assunto não é novo neste espaço, mas isso me tira do sério.

Não tanto pela arrogância e prepotência da frase, mas porque ela carrega séculos de nossa formação, lembrando que uns falam, outros obedecem. E que, na visão de parte de nossa elite política e econômica, a igualdade de direitos é um discurso fofo que se dobra às necessidades individuais.

Não somos uma sociedade de castas. Porque cada um sabe qual o seu quadrado.

“Quem você pensa que é?” é menos agressiva e útil frente a algum desmando de um representante do Estado, por exemplo. Mas não faz tanto sucesso por aqui como a outra. Pois não é o questionamento do uso exagerado do poder por um policial ou um fiscal que está em jogo nesse momento de discussão, mas sim a afronta de tentar tratar um “dotô'' como se fosse um operário qualquer.

A ideia vai se adaptando conforme o ambiente e pode, agregando valores, assumir outras formas:

“Teu salário paga a comida do meu cachorro” (muito querida por jogadores de futebol)

“Eu conheço gente importante, sabia?” (uma das campeãs entre os guardas de trânsito)

“Você vai perder seu emprego, meu irmão” (tente ser um oficial de Justiça cumprindo seu dever para ver o que você vai ouvir)

“Isso que dá vir a um lugar que tem essa gentinha” (quando crianças criadas no leite de pêra não têm seus desejos atendidos em grandes shows de música)

Cidades como o Rio de Janeiro, que têm praia, estão mais acostumadas à convivência interclasses, mas nem sempre de forma pacífica, a bem da verdade. No Brasil, de uma maneira geral, se você quiser viver em uma bolha a vida inteira, praticamente consegue. Tenho amigos que conhecem a Europa e os Estados Unidos, mas só irão à Itaquera pela primeira vez na Copa de 2014.

Ou que nunca estudaram com um homem negro ou uma mulher negra. Acha que racismo não existe.

Essa ausência da cultura da alteridade leva ao medo e colabora com comportamentos e frases bizarras, revelando o lado mais sombrio da alma de cada um. O que é extremamente complicado porque o Brasil é composto majoritariamente por essa “gentinha pobre que nunca sabe com quem está falando e acha que pode mandar''.

Não se espera que os mais ricos passem a defender que os mais pobres tenham os mesmos direitos que eles (é o sistema, estúpido!), mas, pelo menos, que concordem com um mínimo para viabilizar a convivência pacífica.

Com o crescimento econômico, aumenta o número de pessoas com acesso a bens e serviços. Isso gera aquela “infestação” de gente parda e feia nos aeroportos (quem já ouviu declarações de dondocas e pseudo-empresários a respeito disso ficou de cabelo em pé), que estão tomando o “nosso” lugar.

Como diria o genial Marcelo Adnet em uma de suas piadas escrachando nossa elite: “Agora pobre voa! Vá de ônibus! O Brasil sempre foi assim. Ora, e as tradições dessa República?”

A coisa boa é que esse pessoal vai ficar cada vez mais irritado. Até que chegue o dia em que será comum responder “Quem você pensa que é” para quem rosnou “Você sabe com quem está falando?''.

A coisa ruim é que mesmo com muito trabalho de educação para a cidadania, concomitante a mudanças estruturais para garantir que a República realmente sirva ao interesse comum, ainda assim levará um rosário de gerações até que frases forjadas pelo preconceito e a soberba tornem-se peça de museu.
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