Algumas oitavas acima

O Globo de hoje guarda em suas páginas internas uma sensacional pérola.
As eleições americanas ocupam mais espaço neste jornal do que no NYT, vocês sabem. Colonialismo é com a gente mesmo.
Mas hoje há um momento de superação. Reservar espaço para texto e fotografia em um considerável tamanho para estampar "a casa onde obama perdeu um poodle" me cheira a subserviência.
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Pravda Paulista

Andei sumida, como nosso querido Jurandir andou por uns tempos, mas sem querer comparar minhas modestas opiniões com a impressionante produção do meu sócio, lá vou eu :)

Tá, então. Semana passada os jornais deram destaque – a ponto de transformar em manchete – o pronunciamento do Ministro Guido que os bancos brasileiros não estavam quebrando, e que, ora bolas, - e tirando a tal frase totalmente de seu contexto - o que, claro, se ele está falando isso, devemos nos preocupar! E assim estava estampado nas primeiras páginas. Ok. Ok. Também me lembro de FH afirmando que não mudaria o câmbio antes de uma certa eleição.

Então deveríamos usar a mesma fórmula a respeito dos comentários do governador de São Paulo? Aí nos enganamos. Não rola metadiscurso Nunca. Não há filtro. O que ele diz é sempre a Verdade. Ele é o Pravda. Então ele não concorre com o mineiro carioca que quer fazer aliança com Lula? Ele não acha que a disputa para 2010 não começou? Ele realmente queria o melhor para a cidade de São Paulo? Tá, então.

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Balanço das eleições municipais (1)

Nesta segunda, amanheceremos com várias análises dos resultados das eleições municipais. A disputa continuará na interpretação dos números, sobre quem e quais partidos foram vitoriosos. Há o que dizer, mas gostaria de chamar a atenção para outras questões que remetem a melhores reflexões:

1) A crise financeira mundial não compareceu nestas eleições. Deveria. Para o ralo foram mais do que os 686 trilhões de dólares. Junto, naufragaram as principais idéias do neoliberalismo sobre um mundo governado pelo mercado, com estado mínimo. A inegável vitória de José Serra, que será incensada por sua mídia nos próximos dias, terá pela frente o desafio de reinventar um novo discurso. O esboço já foi dado na campanha de fazer colar a crise no vazio de um tucano para enfrentá-la. Torcida pelo quanto pior melhor, desqualificação cotidiana de qualquer decisão do governo. Mesmo assim, quando os tamborins de 2010 esquentarem, será preciso muita lábia para esconder a contestação ideológica sobre as baboseiras econômicas do tucanato e seus aliados.

2) Nas duas maiores capitais a disputa final ficou claramente marcada pela diferença entre classes sociais antagônicas, com as classes médias se aliando às elites e com forte papel no processo. É fenômeno interessante para análise de nossos acadêmicos. Vale ler com atenção o comentário de Altamiro Borges em seu blog na última sexta, que usa referências fundamentais como o livro “Classe média: desenvolvimento e crise”, de Márcio Pochmann. Em São Paulo elas foram vitoriosas, com sua aversão às soluções de atendimento aos seus nordestinos, com o protesto à perda de privilégios no trânsito, com uma sensibilidade ao discurso direitista de sua mídia. No Rio, quase conseguiram graças à criação de um neolacerdismo, agora mais colorido, graças à mídia que há muito pinta o conservador Fernando Gabeira como um candidato moderno, avançado e progressista. O último parágrafo de Miro sobre a classe média vale quase como uma tese:

“Egoísta e egocêntrica, ela não percebe que o país não se desenvolverá, inclusive alavancando as suas camadas médias, sem justiça social; que a miséria estimula a violência e criminalidade; que a barbárie acirra o apartheid social, com os presídios para os pobres e os condomínios fechados, cercados de segurança e câmeras, para os abastados. Ela se opõe às políticas públicas a serviço do conjunto da sociedade e depois reclama dos congestionamentos provocados pela “civilização do automóvel” privado. Critica o Bolsa Família, mas sonha com sua bolsa de estudo no exterior. Diz não ser racista e preconceituosa, mas cada vez mais se parece com a elite fascista da Bolívia.

3) Faltou aprofundamento nas questões políticas e ideológicas. Os debates foram pouco esclarecedores. Particularmente aqui no Rio de Janeiro, onde nem aconteceram no primeiro turno. Deve-se em grande parte ao papel nitidamente inibidor do TSE na regulação destas eleições, que legislou para evitar o aprofundamento da discussão política, enquanto fazia vista grossa para os abusos de poder econômico. Algo a ser comentado em próximo post.

4) Teve papel no resultado os equívocos da esquerda, que não soube interpretar as disputas entre campos políticos e ir além de interesses imediatos de resultado para suas legendas. Vale esperar se mais esta lição terá algum efeito de mudança. Com o capitalismo em crise aguda, resta saber se a esquerda conseguirá um mínimo de ação unitária para ocupar mais espaço. Deveriam estudar o pessimismo de Eric Hobsbawm, que recentemente deu entrevista sobre a crise financeira e alertou para o perigo do fortalecimento da direita:

“Nos anos 30, o claro efeito político da Grande Depressão a curto prazo foi o fortalecimento da direita. A esquerda não foi forte até a chegada da guerra. Então, eu acredito que este é o principal perigo. Depois da guerra, a esquerda esteve presente em várias partes da Europa, inclusive na Inglaterra, com o Partido Trabalhista, mas hoje isso já não acontece. A esquerda está virtualmente ausente. Assim, me parece que o principal beneficiário deste descontentamento atual, com uma possível exceção – pelo menos eu espero – nos Estados Unidos, será a direita.”
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Coisas que eu aprendi nesta campanha eleitoral - 2



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Drops Pós-Eleitorais.

Hoje está acontecendo o segundo turno das eleições para Alcaide da mui leal e heróica Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Como escrevo antes do término da votação, ainda não sei quem será o ungido para nos guiar nos próximos quatro anos: se o ex-esquerdista com discurso neoudenista e de viés tucano ou se o ex-tucano com discurso neolulista. De qualquer forma, neste apagar das luzes, gostaria de deixar o registro de algumas situações por mim vividas ou testemunhadas ao longo da campanha eleitoral:

1- Foi de impressionar o fundamentalismo verde que tomou conta de parte dos cariocas nas últimas semanas, contaminando, inclusive, boa parte do meu círculo de relações. Do jeito que os ânimos estavam exaltados, só faltou eu ser agredido fisicamente ao manifestar em público a minha posição crítica em relação à candidatura de Fernando Gabeira. Se no início da conversa a reação era de espanto – “Como alguém com sua formação intelectual e sua trajetória política pode não apoiar o Gabeira? -, em um segundo momento, partia-se para o campo da agressão verbal e, geralmente, o diálogo terminava de maneira abrupta. O mais engraçado é que aqueles que ainda aceitavam escutar os meus argumentos até o fim, na maioria das vezes, não conseguiam se contrapor a eles e encerravam a discussão com afirmações do gênero: “Eu voto nele, porque é o candidato do sonho”, “Minha intuição me diz que Gabeira é o melhor candidato”, “Tenho certeza que a Cidade vai amanhecer mais feliz na segunda-feira, caso ele ganhe”. Com isto, não havia jeito: quando o debate sai do campo da lógica e da racionalidade e resvala para questões metafísicas, fica impossível discutir qualquer coisa de forma séria. Então, só me restava tirar o time de campo...

2- Desde antes do primeiro turno, circula uma estória de que o Gabeira, ao participar de um ato de campanha (ou debate, depende da versão) teria sido chamado de viado e que, então, teria reagido dizendo que, mesmo que ele fosse, isto não era importante, pois não “iria governar com o cu” (os detalhes da estória variam de acordo com cada relato). Diversas pessoas vieram contar-me este episódio (também o recebi por e-mail) e algumas delas, inclusive, afirmaram ter estado presente na ocasião. O problema é que segundo uma das versões isto aconteceu na UFRJ; segundo outra, na UERJ; de acordo com uma terceira, durante uma caminhada na orla; em uma quarta versão, isto ocorreu em uma panfletagem no Centro e por aí vai. Na verdade, este boato não passa de uma daquelas lendas urbanas que surgem não se sabe de onde. Em 1986, quando Gabeira foi candidato a governador pela coligação PT-PV (campanha da qual participei ativamente, como membro da coordenação estudantil da mesma), tal estória já rolava, só que, naquele momento, os apoiadores das outras candidaturas (Darcy Ribeiro e Moreira Franco) a contavam de forma irônica e pejorativa, associando-a uma suposta homossexualidade de Gabeira e, como resultado disto, ao seu “despreparo” para assumir um cargo tão importante. Hoje, tal relato foi resgatado pelos eleitores do candidato do PV, em um sentido diametralmente oposto: ele mostraria o raciocínio rápido e a inteligência de Gabeira e, portanto, a sua capacidade para se tornar o novo prefeito do Rio de Janeiro. Assim, não pude deixar de lembrar-me das reflexões de Marc Bloch sobre as “notícias falsas”, feitas a partir da sua experiência como militar no front durante a Primeira Guerra Mundial, ao perceber como os boatos mais absurdos eram difundidos nos campos de batalha e como os soldados estavam predispostos a acreditar neles. Tais reflexões culminaram na escrita de uma das obras-primas da historiografia do século XX, “Os Reis Taumaturgos”, onde ele analisa a crença no milagre régio da cura das escrófulas, durante a Idade Média. Neste livro, Bloch expõe a idéia de que mais importante do que discutir a veracidade do milagre em si, é procurar entender a mentalidade coletiva que gerou esta crença. De certa forma, ao encarnar as aspirações de determinados setores da sociedade carioca e ao trabalhar de forma extremamente hábil alguns momentos de sua trajetória política e pessoal, Gabeira conseguiu criar em torno de si uma certa aura mítica. O problema é que uma sociedade – ou setores dela - que precisa desesperadamente de mitos, geralmente, traz em si um grande déficit de realidade concreta, como bem diria o Boaventura de Souza Santos.

Agora, ao fim do processo eleitoral, só desejo que as patrulhas verdes - independentemente do resultado das eleições - esqueçam-se de mim a partir de amanhã e que algumas relações não tenham ficado estremecidas devido à tensão pré-eleitoral. Afinal, o que posso fazer se meu coração é vermelho?
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