27/12/2013
Haddad lidera reformas indispensáveis para tirar a cidade do caos. A velocidade dos ônibus já deu um salto de 45%. Mas o dinheiro grosso barra novos avanços.
Saul Leblon, via Carta Maior
A velocidade dos ônibus em São Paulo registou um salto de 45% em 2013 (de 14,2 quilômetros/h para 20,6 quilômetros/h). Três milhões de pessoas ganharam 38 minutos por dia fora das latas de sardinha, que agora pelo menos andam.
Embora a maioria ainda desperdice mais de duas horas diárias em deslocamentos pela cidade, é quase uma revolução quando se verifica a curva antecedente. Ninguém pagou mais por isso: as tarifas estão congeladas desde junho sob a pressão de protestos legítimos liderados pelo Movimento Passe Livre.
Financiar a tarifa e modernizar o sistema com 150 quilômetros de corredores exclusivos (as faixas já passam de 290 quilômetros), seria a tarefa do aumento progressivo do IPTU previsto pelo prefeito Fernando Haddad.
A coerência entre os meios e os fins é irretocável. 1/3 dos moradores mais pobres de São Paulo não pagariam nada de IPTU em 2014; os demais, em média, contribuiriam com um adicional de R$15,00 ao mês. Os boletos dos mais ricos, naturalmente, transitariam acima da média. O matrimônio de interesses expresso na aliança entre Fiesp, PSDB e a toga colérica implodiu esse reajuste.
Como Nero, eles querem ver São Paulo pegar fogo para culpar os adversários (os cristãos, no caso do imperador). Em meio às labaredas emergiria o palanque conservador como a escada Magirus que os reconduziria com segurança ao Bandeirantes e, quem sabe, ao Planalto. O dinheiro grosso fornece a gasolina; o tucanato fino de Higienópolis entra com o maçarico.
“Bum!”, diz a mídia obsequiosa que estampa a foto de Haddad com a legenda: o culpado é o oxigênio.
Depois de subtrair R$40 bilhões por ano do sistema público de saúde, ao extinguir a CPMF, eles não hesitam agora em usar o sofrimento da população como recheio de seu pastel de vento eleitoral. É o de sempre, ataca Haddad: a coalizão da casa-grande contra a senzala.
Eles retrucam estalando o chicote da mídia. A rede de ônibus da capital (linha e fretados) transporta 68% das população e ocupa somente 8% das vias urbanas. A frota de automóveis transporta 28% e ocupa cerca de 80% do espaço das vias. A informação é da urbanista Raquel Rolnik, em artigo reproduzido no Viomundo.
A rigor, portanto, a mobilidade melhorou para a maioria dos habitantes da cidade, com uma redistribuição pontual do uso do espaço viário. Mas a emissão conservadora atiça o fim de ano da classe média com bordão do caos no trânsito – por culpa do privilégio concedido aos ônibus.
Na edição de sábado, dia 21/12, o jornal Folha de S.Paulo estampa a manchete capciosa em seis colunas, no caderno Cotidiano: “Trânsito piora, e ônibus anda mais rápido”. No manual de redação dos Frias, trânsito é sinônimo de transporte individual.
Há um traço comum entre esse entendimento do que seja interesse coletivo e individual e o belicismo conservador contra o Programa Mais Médicos. O programa subverteu a lógica protelatória e alocou médicos estrangeiros, cubanos em sua maioria, ali onde os profissionais locais não querem trabalhar: periferias conflagradas e socavões distantes.
Produz-se assim uma mudança instantânea na vida de 16 milhões de brasileiros até então desassistidos. Quantos não morreriam à espera do longo amanhecer incremental preconizado pelo conservadorismo?
A dimensão estrutural desse antagonismo perpassa a luta pelo desenvolvimento brasileiro desde Getulio. Reformas de base ou a delegação do futuro da economia e do destino da sociedade aos mercados? Em 1964 o pelourinho midiático, a Fiesp e o tucanismo, na versão udenista, resolveram a pendência da forma sabida.
Meio século depois, São Paulo reproduz em ponto pequeno a mesma confluência de interesses que se reivindica o direito consuetudinário de tocar fogo no canavial e estalar o açoite para fazer a moenda girar.
Primeiro, a garapa; resto a gente conversa depois. Com a tigrada guardada nas senzalas. Ou imobilizada em ônibus-jaula.
A gestão Haddad precisa modular o timing de suas ações para discuti-las antes com a população. Tem agora um inédito conselho de participação popular para isso. Mas é indiscutível que o prefeito lidera hoje um conjunto de reformas imperativas, as reformas de base da São Paulo do século 21.
Sem elas a cidade afundará no destino que lhe reservou a elite brasileira branca e plutocrática: ser um exemplo de viabilidade de uma das mais iníquas versões do capitalismo no planeta.
Esse é o embate dos dias que correm na metrópole.
Diante dele, o silêncio de quem liderou os protestos de junho chega a ser desconcertante. Mas não é inédito. Há inúmeros antecedentes gravados na história com os predicados de cada época. E nenhum deles é inocência.
Haddad lidera reformas indispensáveis para tirar a cidade do caos. A velocidade dos ônibus já deu um salto de 45%. Mas o dinheiro grosso barra novos avanços.
Saul Leblon, via Carta Maior
A velocidade dos ônibus em São Paulo registou um salto de 45% em 2013 (de 14,2 quilômetros/h para 20,6 quilômetros/h). Três milhões de pessoas ganharam 38 minutos por dia fora das latas de sardinha, que agora pelo menos andam.
Embora a maioria ainda desperdice mais de duas horas diárias em deslocamentos pela cidade, é quase uma revolução quando se verifica a curva antecedente. Ninguém pagou mais por isso: as tarifas estão congeladas desde junho sob a pressão de protestos legítimos liderados pelo Movimento Passe Livre.
Financiar a tarifa e modernizar o sistema com 150 quilômetros de corredores exclusivos (as faixas já passam de 290 quilômetros), seria a tarefa do aumento progressivo do IPTU previsto pelo prefeito Fernando Haddad.
A coerência entre os meios e os fins é irretocável. 1/3 dos moradores mais pobres de São Paulo não pagariam nada de IPTU em 2014; os demais, em média, contribuiriam com um adicional de R$15,00 ao mês. Os boletos dos mais ricos, naturalmente, transitariam acima da média. O matrimônio de interesses expresso na aliança entre Fiesp, PSDB e a toga colérica implodiu esse reajuste.
Como Nero, eles querem ver São Paulo pegar fogo para culpar os adversários (os cristãos, no caso do imperador). Em meio às labaredas emergiria o palanque conservador como a escada Magirus que os reconduziria com segurança ao Bandeirantes e, quem sabe, ao Planalto. O dinheiro grosso fornece a gasolina; o tucanato fino de Higienópolis entra com o maçarico.
“Bum!”, diz a mídia obsequiosa que estampa a foto de Haddad com a legenda: o culpado é o oxigênio.
Depois de subtrair R$40 bilhões por ano do sistema público de saúde, ao extinguir a CPMF, eles não hesitam agora em usar o sofrimento da população como recheio de seu pastel de vento eleitoral. É o de sempre, ataca Haddad: a coalizão da casa-grande contra a senzala.
Eles retrucam estalando o chicote da mídia. A rede de ônibus da capital (linha e fretados) transporta 68% das população e ocupa somente 8% das vias urbanas. A frota de automóveis transporta 28% e ocupa cerca de 80% do espaço das vias. A informação é da urbanista Raquel Rolnik, em artigo reproduzido no Viomundo.
A rigor, portanto, a mobilidade melhorou para a maioria dos habitantes da cidade, com uma redistribuição pontual do uso do espaço viário. Mas a emissão conservadora atiça o fim de ano da classe média com bordão do caos no trânsito – por culpa do privilégio concedido aos ônibus.
Na edição de sábado, dia 21/12, o jornal Folha de S.Paulo estampa a manchete capciosa em seis colunas, no caderno Cotidiano: “Trânsito piora, e ônibus anda mais rápido”. No manual de redação dos Frias, trânsito é sinônimo de transporte individual.
Há um traço comum entre esse entendimento do que seja interesse coletivo e individual e o belicismo conservador contra o Programa Mais Médicos. O programa subverteu a lógica protelatória e alocou médicos estrangeiros, cubanos em sua maioria, ali onde os profissionais locais não querem trabalhar: periferias conflagradas e socavões distantes.
Produz-se assim uma mudança instantânea na vida de 16 milhões de brasileiros até então desassistidos. Quantos não morreriam à espera do longo amanhecer incremental preconizado pelo conservadorismo?
A dimensão estrutural desse antagonismo perpassa a luta pelo desenvolvimento brasileiro desde Getulio. Reformas de base ou a delegação do futuro da economia e do destino da sociedade aos mercados? Em 1964 o pelourinho midiático, a Fiesp e o tucanismo, na versão udenista, resolveram a pendência da forma sabida.
Meio século depois, São Paulo reproduz em ponto pequeno a mesma confluência de interesses que se reivindica o direito consuetudinário de tocar fogo no canavial e estalar o açoite para fazer a moenda girar.
Primeiro, a garapa; resto a gente conversa depois. Com a tigrada guardada nas senzalas. Ou imobilizada em ônibus-jaula.
A gestão Haddad precisa modular o timing de suas ações para discuti-las antes com a população. Tem agora um inédito conselho de participação popular para isso. Mas é indiscutível que o prefeito lidera hoje um conjunto de reformas imperativas, as reformas de base da São Paulo do século 21.
Sem elas a cidade afundará no destino que lhe reservou a elite brasileira branca e plutocrática: ser um exemplo de viabilidade de uma das mais iníquas versões do capitalismo no planeta.
Esse é o embate dos dias que correm na metrópole.
Diante dele, o silêncio de quem liderou os protestos de junho chega a ser desconcertante. Mas não é inédito. Há inúmeros antecedentes gravados na história com os predicados de cada época. E nenhum deles é inocência.