Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
O deputado Roberto Freire deu um mergulho abaixo da linha da dignidade quando solicitou a Comissão da Verdade que investigue Luiz Inácio Lula da Silva pela suspeita de ser informante da ditadura. Como se sabe, a acusação foi feita por Romeu Tuma Jr, um ex-delegado, ex-deputado, ex-secretário nacional de justiça.
Ao fazer coro a Tuminha para questionar o passado do mais popular presidente do país, sem apoio no mais leve indício real, Roberto Freire ajuda a entender sua linha de trabalho político – o ressentimento. No caso, que não é único, estamos falando de um comunista ressentido.
Explicando, muito resumidamente, Já tivemos comunistas stalinistas, trotskistas, maoístas, castristas.... Hoje, temos os ressentidos. São aqueles políticos e intelectuais que abandonaram ideias cultivadas a vida inteira depois que o Muro de Berlim caiu, a União Soviética se dissolveu e a China parecia ter-se tornado a principal locomotiva do capitalismo. Deformados por uma visão dogmática e estreita da evolução humana, incapazes de enxergar oportunidades diferentes e caminhos inéditos para seguir no esforço pelo progresso dos mais humildes e excluídos, aceitaram o papel de novos reacionários, transportando uma herança com muitos aspectos admiráveis para qualquer palanque onde tivessem direito a pão, água e um punhado de empreguinhos.
Sua função era justamente essa: empregar o passado a esquerda para servir como tacape da direita, tentando negar toda e qualquer possibilidade de contestação a velha ordem mundial.
Mas deram muito azar. Foi exatamente neste período histórico que, contrariando tanto saber estabelecido, a humanidade evoluiu em vários lugares. Povos inteiros fizeram conquistas impensáveis poucos anos antes. Foi assim na China, na Índia, na África inteira, e também no Brasil, sabemos todos.
Nessa situação, só restou ao recém-convertido uma atitude negativa: a torcida contra, com base no ódio contra tudo aquilo que representa seu fracasso e sua arrogância.
É o caso do sujeito que, convencido do naufrágio iminente, abandonou um barco no meio do Atlântico – apenas para perceber que jogou-se numa embarcação ainda mais precária, muito mais insegura.
No olhar do ressentimento, o governo Lula-Dilma não apenas vai dar errado. Tem que dar errado, ainda que a população não se canse de dizer que está muito satisfeita com aquilo que vê - distribuição de renda, melhoria na vida dos mais pobres, desemprego baixo, consumo alto.
A transformação de Roberto Freire em papagaio de pirata de Tuminha é isso.
Ele teve uma longa convivência com Lula, complicada por um traço típico de cidadão formado em aparelho político. Com a presunção de que estava pré-destinado, por uma cultura e formação, a dirigir aquele peão de pouco estudo do ABC, Roberto Freire pretendia dizer a Lula o que fazer, como, quando. No início, essa atitude provocava estranheza em quem estava por perto. Depois, produzia irritação. Hoje, os ares de dirigente político que pretendia dirigir Lula provocam risos.
Há pelo menos um relato público, disponível em livrarias, que esclarece as alegações de Tuminha sobre Lula.
Sem qualquer simpatia pelas ideias do PT, José Nêumane Pinto descreve, no livro O Que Eu Sei de Lula, os esforços de um oficial do Centro de Informações do Exército para tentar cooptar o líder metalúrgico como aliado da ditadura, nos anos finais do regime militar. Nêumane conta que levou Lula para uma conversa com o coronel Gilberto Zenkner, nome importante na área de informações, que procurava infiltrar-se entre os metalúrgicos do ABC, liderados por Lula. Testemunha integral do encontro, Nêumane deixa claro que Lula não deixou o interlocutor avançar um milímetro na conversa assim que foi possível perceber suas reais intenções. “Nada foi dito que desabonasse sua condição de legítimo e leal representante dos interesses do operariado,” escreve Nêumane, na pagina 135.
Referindo-se às relações entre Lula e Romeu Tuma, que era o operador do Centro de Informações do Exército em São Paulo, conforme eu mesmo pude apurar naquele período, Nêumane diz ainda: “Lula nunca negou suas relações amistosas com Tuma mas daí a concluir que os tiveram qualquer relação que ultrapassasse a amizade pessoal e algumas visitas vai uma distância abissal.”
Se tivesse interesse genuíno sobre os informantes que ajudaram a repressão, um assunto relevante para a história de qualquer país, Roberto Freire poderia dar uma grande contribuição a antigos companheiros se olhasse dentro do Partido Comunista, do qual foi líder importante e até candidato a presidente da República.
Poderia começar investigações a partir Adauto Alves dos Santos, um infiltrado denunciado e conhecido de muitos de seus colegas de partido. O veterano dirigente do PCB Armênio Guedes, um dos homens mais honrados que conheci, denunciou, em público e em privado, que atribuía a Adauto Alves dos Santos a operação que resultou na execução de seu irmão, Célio, quando atravessava a fronteira uruguaia como motorista de um alto dirigente do partido. Célio, que era dentista na vida civil, foi reconhecido, capturado, torturado e morto em poucos dias.
O papel de Adauto nunca foi esclarecido, embora Armênio, comunista disciplinado, tenha feito sua denúncia como se deve. Em vez de ir aos jornais, ou esconder-se atrás de um teatro sem credibilidade, procurou os dirigentes do partido para expor suas dúvidas e suspeitas, como relatou várias vezes, inclusive em entrevista que publiquei no livro A mulher que era o general da casa.
O deputado Roberto Freire deu um mergulho abaixo da linha da dignidade quando solicitou a Comissão da Verdade que investigue Luiz Inácio Lula da Silva pela suspeita de ser informante da ditadura. Como se sabe, a acusação foi feita por Romeu Tuma Jr, um ex-delegado, ex-deputado, ex-secretário nacional de justiça.
Ao fazer coro a Tuminha para questionar o passado do mais popular presidente do país, sem apoio no mais leve indício real, Roberto Freire ajuda a entender sua linha de trabalho político – o ressentimento. No caso, que não é único, estamos falando de um comunista ressentido.
Explicando, muito resumidamente, Já tivemos comunistas stalinistas, trotskistas, maoístas, castristas.... Hoje, temos os ressentidos. São aqueles políticos e intelectuais que abandonaram ideias cultivadas a vida inteira depois que o Muro de Berlim caiu, a União Soviética se dissolveu e a China parecia ter-se tornado a principal locomotiva do capitalismo. Deformados por uma visão dogmática e estreita da evolução humana, incapazes de enxergar oportunidades diferentes e caminhos inéditos para seguir no esforço pelo progresso dos mais humildes e excluídos, aceitaram o papel de novos reacionários, transportando uma herança com muitos aspectos admiráveis para qualquer palanque onde tivessem direito a pão, água e um punhado de empreguinhos.
Sua função era justamente essa: empregar o passado a esquerda para servir como tacape da direita, tentando negar toda e qualquer possibilidade de contestação a velha ordem mundial.
Mas deram muito azar. Foi exatamente neste período histórico que, contrariando tanto saber estabelecido, a humanidade evoluiu em vários lugares. Povos inteiros fizeram conquistas impensáveis poucos anos antes. Foi assim na China, na Índia, na África inteira, e também no Brasil, sabemos todos.
Nessa situação, só restou ao recém-convertido uma atitude negativa: a torcida contra, com base no ódio contra tudo aquilo que representa seu fracasso e sua arrogância.
É o caso do sujeito que, convencido do naufrágio iminente, abandonou um barco no meio do Atlântico – apenas para perceber que jogou-se numa embarcação ainda mais precária, muito mais insegura.
No olhar do ressentimento, o governo Lula-Dilma não apenas vai dar errado. Tem que dar errado, ainda que a população não se canse de dizer que está muito satisfeita com aquilo que vê - distribuição de renda, melhoria na vida dos mais pobres, desemprego baixo, consumo alto.
A transformação de Roberto Freire em papagaio de pirata de Tuminha é isso.
Ele teve uma longa convivência com Lula, complicada por um traço típico de cidadão formado em aparelho político. Com a presunção de que estava pré-destinado, por uma cultura e formação, a dirigir aquele peão de pouco estudo do ABC, Roberto Freire pretendia dizer a Lula o que fazer, como, quando. No início, essa atitude provocava estranheza em quem estava por perto. Depois, produzia irritação. Hoje, os ares de dirigente político que pretendia dirigir Lula provocam risos.
Há pelo menos um relato público, disponível em livrarias, que esclarece as alegações de Tuminha sobre Lula.
Sem qualquer simpatia pelas ideias do PT, José Nêumane Pinto descreve, no livro O Que Eu Sei de Lula, os esforços de um oficial do Centro de Informações do Exército para tentar cooptar o líder metalúrgico como aliado da ditadura, nos anos finais do regime militar. Nêumane conta que levou Lula para uma conversa com o coronel Gilberto Zenkner, nome importante na área de informações, que procurava infiltrar-se entre os metalúrgicos do ABC, liderados por Lula. Testemunha integral do encontro, Nêumane deixa claro que Lula não deixou o interlocutor avançar um milímetro na conversa assim que foi possível perceber suas reais intenções. “Nada foi dito que desabonasse sua condição de legítimo e leal representante dos interesses do operariado,” escreve Nêumane, na pagina 135.
Referindo-se às relações entre Lula e Romeu Tuma, que era o operador do Centro de Informações do Exército em São Paulo, conforme eu mesmo pude apurar naquele período, Nêumane diz ainda: “Lula nunca negou suas relações amistosas com Tuma mas daí a concluir que os tiveram qualquer relação que ultrapassasse a amizade pessoal e algumas visitas vai uma distância abissal.”
Se tivesse interesse genuíno sobre os informantes que ajudaram a repressão, um assunto relevante para a história de qualquer país, Roberto Freire poderia dar uma grande contribuição a antigos companheiros se olhasse dentro do Partido Comunista, do qual foi líder importante e até candidato a presidente da República.
Poderia começar investigações a partir Adauto Alves dos Santos, um infiltrado denunciado e conhecido de muitos de seus colegas de partido. O veterano dirigente do PCB Armênio Guedes, um dos homens mais honrados que conheci, denunciou, em público e em privado, que atribuía a Adauto Alves dos Santos a operação que resultou na execução de seu irmão, Célio, quando atravessava a fronteira uruguaia como motorista de um alto dirigente do partido. Célio, que era dentista na vida civil, foi reconhecido, capturado, torturado e morto em poucos dias.
O papel de Adauto nunca foi esclarecido, embora Armênio, comunista disciplinado, tenha feito sua denúncia como se deve. Em vez de ir aos jornais, ou esconder-se atrás de um teatro sem credibilidade, procurou os dirigentes do partido para expor suas dúvidas e suspeitas, como relatou várias vezes, inclusive em entrevista que publiquei no livro A mulher que era o general da casa.