Em 02 de março, recebi um e-mail que dizia o seguinte:
Esta manhã, dia 2 de março de 2010, presenciei uma cena lamentável no Metro Itaquera, zona leste de São Paulo. Por volta das 7h30, peguei a escada rolante que leva até a plataforma. Eu estava distraído lendo um texto da faculdade quando, ao chegar perto do fim da escada rolante vejo o caos. A plataforma estava tão lotada, que as pessoas na escada rolante não tinha como sair dela. A escada continuava a conduzir mais e mais pessoas para cima e estas não tinha espaço. As pessoas começar a cair umas em cima das outras. Por sorte eu consegui pular pela mureta da escada e sair do bolo de pessoas enroscadas. Somente abri o pulso na manobra, mas muitas mulheres e homens se machucaram ali, inclusive uma senhora que chorando foi levada com as mãos sangrando pelos agentes de metrô.
Depois de passado o susto e tendo a escada rolante sido desligada, fiquei pensando em como uma coisa dessas pode acontecer. O texto que segue abaixo é o resultado dessa reflexão. Obviamente não é piada e nem muito divertido de ler, mas ainda assim faço o apelo de que leiam. Não dá mais pra ficar na inércia.
Queria rasgar em letras o ódio que sinto de tudo que vejo e ouço. Queria fazer de arma contra a tirania institucional as lágrimas da senhora que vi hoje no metro. Queria tornar revolução a angustia das pessoas que, cansadas e humilhadas, seguiam enfileiradas o caminho de suas senzalas modernas.
Mas ao invés disso vou elogiar. Elogiar as políticas públicas desse nosso governo estadual e municipal que, engajados na luta contra a pobreza, aplicam seus recursos em auto-publicidade, deixando às intempéries do clima a sacra missão de exterminar os pobres. Elogio esse Governo que se faz Estado Absolutista de voraz ímpeto mercantilista, que de forma genial estimula o ensino. Ensino este que com suas centenas de escolas técnicas assegura a todo pobre o direito de apertar parafusos até que a falta de saúde acabe com suas vidas. Elogio ainda, no que diz respeito à educação, o fantástico trabalho de incentivar os professores a serem o modelo do cidadão perfeito, com sua jornada de trabalho inumana e salário parco e que, ainda assim, rasgam o que lhes restam de dignidade aprovando alunos incapazes de raciocinar às séries seguintes - já que a base do bônus salarial, divulgado pelo governo, é baseado no fator: quanto menor a quantidade de notas vermelhas que um professor atribui, maior o bônus que lhe será concedido. E como não elogiar esta canônica generosidade desse governo?
Um governo que investe sem medo algum, milhões de reais em ampliações de vias para carros. Sim! Para carros! Não pessoas, pois afinal isso de humanidade só atrapalha o concretismo da evolução, da ordem e do progresso. Os carros afinal evoluem, mas as pessoas não. E de fato essa é uma atitude muito louvável do nosso amado governo. Porque se ao invés de ampliar a marginal, eles investissem quantidade equivalente em transportes públicos, o pobre teria sua vida facilitada, mas isso seria um infortúnio, pois afinal é a pobreza que gera no pobre seu grande espírito de solidariedade e seria muito errado tirar esse direito dele.
Por fim, elogio a genial arte do cinísmo deste grandioso governo na criação de seu jargão: Governo do Estado, São Paulo cada vez melhor... o governo só esquece de esclarecer em sem jargão, pra quem essa cidade esta cada vez melhor? Mas para que? A educação vai tão bem que todos logo perceberão para quem a cidade realmente está melhor.
