ANOS DE CHUMBO - Vinicius de Moraes e o golpe militar.


Vinicius de Moraes e o golpe militar

Do blog Socialista Morena:

Nos 100 anos de Vinicius de Moraes, republico a investigação do jornalista Marcelo Bortoloti sobre um episódio até hoje nebuloso: a demissão do poeta, diplomata de carreira, do Itamaraty durante a ditadura militar. O texto foi originalmente publicado em maio deste ano no blog do Instituto Moreira Salles (link aqui).

Para reparar a injustiça, em 2010 o presidente Lula sancionou a lei que concedeu a Vinicius o título de embaixador, em promoção póstuma.


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Por Marcelo Bortoloti*

A expulsão de Vinicius de Moraes do Itamaraty é um episódio que sempre se prestou a especulações e lendas. Pelo menos duas versões podem ser contadas sobre o caso. Na mais folclórica e difundida, o poeta teria sido exonerado através de um memorando em que o presidente Arthur da Costa e Silva o chamava de vagabundo. No livro Chega de saudade, Ruy Castro conta que em fins de 1968 Vinicius recebeu o comunicado mergulhado em sua banheira e caiu em prantos, pois adorava o Itamaraty.

Uma segunda versão, baseada em documentos da ditadura, assegura que ele foi vítima da Comissão de Investigação Sumária, que em 1969 expurgou diplomatas de carreira sob acusação de serem boêmios ou homossexuais. Foi publicada em reportagem do jornal O Globo e também no livro Vinicius de Moraes, produzido pelo Instituto Cultural Cravo Albin. Nesta versão, o algoz do poeta seria o embaixador Antonio Cândido da Câmara Canto, que presidiu a tal comissão inquisidora, e o motivo alegado foi alcoolismo.

Para quem se interessa pelo tema, nos últimos anos essas duas versões ganharam credibilidade diferente. A primeira ficou sendo a mais anedótica, e a segunda a mais séria e correta. Recentemente, tive oportunidade de vasculhar os maços pessoais de Vinicius no Itamaraty, os documentos do SNI no Arquivo Nacional, o fundo das polícias políticas no Arquivo do Estado do Rio e os acervos privados de diplomatas no CPDOC da Fundação Getúlio Vargas.

Sobre o episódio específico não restou uma documentação conclusiva. Mas as pistas deixadas levam a acreditar mais na culpa do marechal Costa e Silva do que na do embaixador Câmara Canto. Ao que tudo indica, a exoneração foi ordenada em instâncias superiores e não pela comissão do Itamaraty, e o que mais incomodou os militares foi a suposta falta de assiduidade ao trabalho, e não a postura política ou o comportamento boêmio do poeta.

Guardiões do Itamaraty

As restrições quanto ao comportamento boêmio e namorador de Vinicius começaram a surgir dentro do próprio Itamaraty, antes mesmo da ditadura militar. Em 1963, ainda no governo João Goulart, um diplomata de carreira enviou carta ao ministro das Relações Exteriores, João Augusto Araújo Castro, em que chamava a atenção para o que considerava um fato grave.

Segundo o delator, que assina como Carlos Pourlon, o embaixador Paulo Carneiro foi abordado no aeroporto do Galeão pelos pais de uma jovem de 18 anos que o poeta havia levado para Paris. Estavam preocupados com o destino da moça. Era Nelita de Abreu, quinta esposa de Vinicius. “Os velhos, chorando, imploraram ao embaixador Carneiro que ajudasse sua filha, agora vivendo em companhia de tal indivíduo”, escreveu. Continuava a carta dizendo que não era a primeira jovem a cair em suas mãos, já que, pouco tempo antes, o poeta “traiu miseravelmente um seu amigo Jorge Vargas de Andrade, casado com uma senhora da família Proença”. Era a quarta esposa de Vinicius, Lúcia Proença, de fato subtraída ao amigo.

O missivista questionava sua designação para trabalhar na Unesco: “Não compreendo como um funcionário possuidor de tão sórdido caráter consegue designação para a Unesco – Paris”. E continuava com uma acusação aparentemente contraditória: “Dizem agora que o tal ‘gênio’ bossa nova virou homossexual…”. O autor lamentava a má influência desse tipo de comportamento sobre os jovens diplomatas e sugeria uma limpeza no Itamaraty, com expurgo dos pederastas e dos amigados, que não tinham casamento formal: “uns amigados com pessoas discretas, outros, mal amigados, afrontando despudoradamente a opinião pública”.

Não houve consequências maiores. A carta foi parar na mesa do chefe do departamento de administração do ministério, Azeredo da Silveira, que era amigo de Vinícius. O filho do ministro Araújo Castro, Luiz Augusto, diz que seu pai também era amigo e admirador do poeta e que esta carta “mesquinha e odiosa” pode nem ter chegado às mãos dele. Para o embaixador Marcos Azambuja, estudioso da história do Itamaraty, o autor da carta deve ser algum funcionário do ministério, já que está cheia de jargões da diplomacia e é formatada como um memorando interno. Mas avalia que o autor usou um pseudônimo, já que não havia funcionários com este nome na época, e pelo uso da ortografia antiga e a incidência de erros de português, provavelmente seria alguém mais velho e pertencente aos quadros subalternos do Itamaraty.

O fato é que este tipo de manifestação ganharia força nos anos seguintes. Em janeiro de 1966, já durante a ditadura militar, o embaixador Manoel Pio Corrêa assumiu o cargo de secretário geral do ministério, adotando uma postura pouco tolerante com comportamentos que considerava impróprios. Em seu livro de memórias, O mundo em que vivi, ele diz que, na época, chamou seu chefe de gabinete para lhe dar a seguinte orientação: “Não gosto de diplomatas pederastas; não gosto de diplomatas vagabundos; não gosto de diplomatas bêbados. Quem não se enquadrar em qualquer dessas três categorias nada tem a recear de mim, mesmo por suas opiniões políticas”. No mesmo livro, o embaixador, que não era militar, assume a culpa por ter colocado Vinicius em licença não remunerada, ainda em 1966, como se verá adiante.

Dois anos depois, com o governo Costa e Silva, o decreto do AI-5 e o consequente acirramento do regime, foi criada a Comissão de Investigação Sumária, medida saneadora proposta pelos militares, que instituíram comissões semelhantes em outros ministérios. No Itamaraty, o objetivo era expurgar funcionários com conduta incompatível com o que se entendiam ser as responsabilidades e o decoro da diplomacia brasileira. A coordenação dos trabalhos coube a Câmara Canto.

O embaixador se presta facilmente ao papel de vilão, por ter sido um diplomata linha-dura e posteriormente, no Chile, muito próximo do ditador Augusto Pinochet. Mas o relatório final que entregou no dia 7 de março de 1969, com rubrica do ministro das Relações Exteriores, Magalhães Pinto, não reflete plenamente esse sentimento que já borbulhava na casa e que foi reforçado pelo governo militar. Pode-se dizer que ele foi brando em relação ao que os militares esperavam. Isso fica evidente na maneira com que Vinicius foi tratado: “Considerando que a conduta do primeiro secretário Vinicius de Moraes é incompatível com as exigências e o decoro da carreira diplomática, mas em atenção a seus méritos de homem de letras e artista consagrado, cujo valor não se desconhece, a Comissão propõe o seu aproveitamento no Ministério da Educação e Cultura”. De acordo com a comissão, ele deveria ser transferido, e não exonerado.

Tão esclarecedor quanto esse relatório final é um outro, produzido 20 dias mais tarde pelo departamento de inteligência da Aeronáutica, também acessível no Arquivo Nacional. O autor não se identifica, mas pelas referências trata-se de um coronel da Aeronáutica infiltrado em alguma embaixada brasileira.

Segundo ele, o decreto que ordenava a criação da Comissão de Investigação Sumária foi, de início, motivo de muita apreensão por boa parte dos diplomatas, que consideravam o AI-5 “um golpe dos gorilas”. Mas o militar diz que a tranquilidade voltou a reinar no Itamaraty quando se soube que a comissão seria criada no âmbito do próprio ministério e presidida por um embaixador. Nesse texto, fica nítida a divisão entre os militares e o pessoal do Itamaraty. Por mais que vigorasse dentro da casa uma rejeição aos boêmios e homossexuais desde o governo João Goulart, o sentimento de grupo falou mais alto na ocasião de caça às bruxas promovida pelos militares. No relatório, o coronel afirma textualmente que o código de honra vigente entre os diplomatas ajudou a “neutralizar a comissão”, diminuindo o tamanho do expurgo. Diz que o ministro Magalhães Pinto teria reduzido o número de processos de 34 para 17 – na verdade, o relatório final da comissão pede exoneração de apenas 15 diplomatas (e 33 funcionários subalternos) e sugere a transferência de Vinicius para o MEC.

No final do relato, o militar anexou uma lista mais ampla com 86 nomes que deveriam ser investigados, incluindo o do poeta João Cabral de Melo Neto, visto como comunista. E acrescentou: “De par com a necessidade de eliminar do serviço público os elementos improbos ou de conduta irregular, empenha-se por igual o Governo da Revolução em aliviá-lo dos ociosos (…) como era o caso do primeiro secretário Gilberto Chateaubriand, há poucos dias demitido a pedido, ou é ainda o caso do não menos notório primeiro secretário Vinicius de Moraes”.

Não há documentação que mostre o que aconteceu depois disso: o coronel parece ter sido ouvido apenas parcialmente. No dia 30 de abril de 1969, o Diário Oficial publicou a lista dos diplomatas a serem afastados. Era muito parecida com a relação final de Câmara Canto. Três diplomatas “acusados” de homossexualismo e “insanidade mental” foram absolvidos. E Vinicius foi o único caso de funcionário poupado na lista do embaixador Canto, mas exonerado no decreto oficial.

Na biografia O poeta da paixão, José Castello também menciona a transferência de Vinicius, mas diz que a incompatibilidade de cargos e funções entre o Ministério das Relações Exteriores e o outro seria o motivo alegado para que ela não fosse aceita. Ocorre que, em 1957, o ministro da Educação e Cultura, Clóvis Salgado, já havia pedido a transferência do poeta, para trabalhar em uma comissão de cinema. O pedido foi negado pelo embaixador José Carlos de Macedo Soares sob a alegação de que Vinicius estava lotado em Paris, e recebia salário pela Delegacia do Tesouro Brasileiro no Exterior. Na mesma resposta, diz que a transferência poderia ser feita quando o poeta fosse removido para a Secretaria de Estado, local onde ele servia no momento da exoneração.

Altas esferas do poder

Notícia do Correio da Manhã em março de 1969 informava que os nomes apontados na Comissão de Investigação Sumária do Itamaraty seriam submetidos ao Conselho de Segurança Nacional. Este conselho militar daria a palavra final, o que poderia justificar a mudança de punição em relação a Vinicius. Mas o caso dele não aparece na ata da reunião de 29 de abril, que deu origem às cassações do dia 30, e onde não consta nenhum diplomata. Só que no princípio da sessão, o presidente Costa e Silva informou que fez uma triagem nos nomes que seriam submetidos ao conselho naquele dia. A situação de Vinicius pode ter sido analisada pelo próprio presidente ou pelo seu gabinete. “A história que eu sempre ouvi falar em casa é que a ordem partiu realmente de Costa e Silva”, diz a filha do poeta, Georgiana de Moraes.

Em sintonia com a tese de que o pedido de exoneração veio do andar de cima, o general João Baptista Figueiredo, em entrevista ao jornalista Orlando Brito, publicada na revista Veja, afirmou sobre Vinicius: “Ele até diz que muita gente do Itamaraty foi cassada ou por corrupção ou por pederastia. É verdade. Mas no caso dele foi por vagabundagem mesmo. Eu era o chefe da Agência Central do SNI e recebíamos constantemente informes de que ele, servindo no consulado brasileiro de Montevidéu, ganhando 6 mil dólares por mês, não aparecia por lá havia três meses. Consultamos o Ministério das Relações Exteriores, que nos confirmou a acusação. Checamos e verificamos que ele não saía dos botequins do Rio de Janeiro, tocando violão, se apresentando por aí, com copo de uísque do lado. Nem pestanejamos. Mandamos brasa”.

A memória do general não estava boa na ocasião da entrevista. Vinicius trabalhou em Montevidéu entre agosto de 1957 e março de 1960, período em que Figueiredo era chefe do 1º Regimento de Cavalaria de Guardas em Brasília. O general foi chefe da Agência Central do SNI entre 1974 e 1978, bem depois da exoneração do poeta. Na época do episódio, ele não tinha nem assumido o Gabinete Militar da Presidência da República. Não poderia, portanto, estar envolvido no caso.

Mas Figueiredo estava bem informado quanto às acusações que pesavam sobre Vinicius no meio militar. De fato, ele ficou afastado por três meses do consulado de Montevidéu. Mas essa ausência é justificada em sua ficha pessoal pelo então ministro Horário Lafer em razão de atividades culturais que estava desenvolvendo no Rio de Janeiro. A segunda acusação, de não sair dos botequins do Rio, tem a ver com outro caso já contado pelo embaixador Manoel Pio Corrêa.

No livro O mundo em que vivi, Corrêa diz que, quando assumiu a Secretaria Geral, em 1966, notou que Vinicius praticamente não aparecia no trabalho. Mas que se apresentava todas as noites na boite Zum-zum, tomando vários copos de uísque. Decidiu convocar o poeta, num horário propositalmente cedo, em que ele não costumava estar acordado.

Escreve o embaixador: “Apresentou-se pontualíssimamente, corretíssimamente vestido de traje escuro e gravata discreta – soube depois que desde mais de um ano ele não havia usado paletó e gravata – com a face escanhoada na qual um corte testemunhava a pressa com que se havia barbeado”.

Corrêa diz que colocou o poeta em uma poltrona confortável, explicou que era seu fã, mas que o regulamento da casa impedia ao funcionário ter outra atividade remunerada. Com isto, ele deveria escolher o Itamaraty ou uma licença não remunerada para tratar de assuntos particulares. Vinicius teria escolhido a segunda opção.

Um fato desses deveria estar registrado em sua ficha pessoal no Itamaraty. Não está. Mas, como a documentação referente ao período militar praticamente desapareceu, esse atestado pode ter sido também extraviado da pasta. Pio Corrêa, ainda vivo, mas muito adoentado, não pôde dar entrevista para confirmar a história.

Na biografia O poeta da paixão, José Castello diz que, nessa época, Vinicius se colocou voluntariamente à disposição da Fundação Ouro Preto, ligada ao governo de Minas. Mas, acabado o prazo da licença não remunerada, bateu várias vezes à porta de Pio Corrêa para voltar às atividades, sem conseguir qualquer resposta do embaixador. Segundo a irmã do poeta, Laetitia, ele não tinha mesa nem cadeira, e se recusava a ficar vagando pelos corredores. Justamente neste período veio o AI-5 e a Comissão de Investigação Sumária.

A imagem de vagabundo que Vinicius mantinha entre os militares estava associada a esses dois episódios. O primeiro, dos três meses de ausência em Montevidéu, justificado em sua ficha. O segundo forçado pela intransigência do secretário geral. Mas foi essa imagem, provavelmente, que o levou à exoneração, ordenada em alguma instância superior do governo, talvez pelo próprio presidente da República. Fosse pela comissão que expurgou homossexuais e alcoólatras do Itamaraty, ele teria chegado até a aposentadoria como funcionário do Ministério da Cultura.

* Marcelo Bortoloti é jornalista, mestre em Artes e doutorando em Literatura pela UFRJ. Este texto foi originalmente publicado no blog do Instituto Moreira Salles.
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PETROBRAS - Petrobras deve fechar com chineses em Libra.



20 DE OUTUBRO DE 2013 - 7H00 
Portal 247
Graça Foster
Graça Foster

Petrobras deve fechar com chineses em Libra


No consórcio, a estatal brasileira, comandada por Graça Foster, atuaria em conjunto com as empresas CNOOC e CNPC, tendo 40% de participação; governo federal receberia bônus de R$ 15 bilhões e vê essa aliança com bons olhos, uma vez que os custos gigantescos do investimento seriam compartilhados entre a Petrobras e as petroleiras asiáticas

Por Sabrina Lorenzi (*)


A Petrobras se prepara para entrar no leilão de Libra com pelo menos 40% de participação no bloco, em consórcio formado com as estatais chinesas CNOOC e CNPC , afirmou uma fonte com conhecimento direto do assunto nesta sexta-feira (18).

Outras seis empresas das que se inscreveram e pagaram as garantias para participar da primeira rodada de licitações do pré-sal ainda se articulavam para tentar disputar a área de Libra nestes últimos dias que antecedem o certame, disse a fonte, sem revelar os nomes das companhias.

Outra fonte consultada disse que as petroleiras continuam se comunicando em busca de formação de consórcio para a licitação, em um movimento que deve continuar até dia 21, segunda-feira, quando acontece o leilão de Libra.

A Repsol Sinopec (parceria entre a espanhola Repsol e a chinesa Sinopec) não ficaria no consórcio da Petrobras por incompatibilidades entre elas, disseram as duas fontes. Ainda há dúvidas se a Repsol Sinopec poderá constituir um outro consórcio, que seria concorrente ao formado pela Petrobras.

A anglo-holandesa Shell também não faria parte do mesmo consórcio com a Petrobras, disse a primeira fonte.

A presença de interessados em explorar o volume de 8 bilhões a 12 bilhões de barris recuperáveis em Libra é tida como certa por especialistas do setor de óleo e gás, ainda que com a possibilidade de pouca concorrência.

As empresas disputarão até 70% da participação de Libra, já que a Petrobras será a operadora da área com no mínimo 30% de participação em qualquer consórcio que ficar com a área, mesmo em eventuais grupos formados inicialmente sem a estatal brasileira.

Bônus

O importante para o governo, de acordo com avaliação de outros dois executivos do setor que também falaram sob condição de anonimato, é receber o bônus de 15 bilhões de reais e contar com a presença das asiáticas para realizar os pesados investimentos necessários ao desenvolvimento da área gigante de Libra.

Outras empresas que se inscreveram para o certame incluem a japonesa Mitsui, a indiana ONGC, a malaia Petronas, a colombiana Ecopetrol, a francesa Total e a Petrogal (associação da portuguesa Galp com a Sinopec).

Para a Petrobras, menos concorrência no leilão seria positivo, porque mais disputa implicaria maior agressividade das propostas e menor retorno financeiro.

Em um modelo de licitação em que o bônus é fixo, quem oferecer a maior parcela de óleo à União ganhará a licitação. A parcela mínima que caberá ao governo federal é de 41,65 % do petróleo de Libra, descontados os custos de produção.

Libra deverá atingir um pico de produção de 1,4 milhão de barris de petróleo por dia (bpd) entre 10 a 15 anos depois da assinatura do contrato, estimou a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) nesta semana. Para alcançar esse pico, serão necessários de 12 a 18 plataformas e entre 60 a 80 barcos de apoio.

Fonte: Reuters / portal 247
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PETRÓLEO - Posição dos petroleiros no leilão de Libra.


Petroleiros em greve explicam oposição ao leilão de Libra



Charge Vitor Teixeira
Maior campo de petróleo já descoberto, Libra vai a leilão e FUP explica porque é contra
18/10/2013
Para federação, governo brasileiro erra ao não considerar petróleo estratégico para as próximas décadas
por Luiz Carvalho, no site da CUT, à qual a FUP é filiada
Na próxima segunda-feira (21), o governo brasileiro promove o leilão do campo de Libra, no Rio de Janeiro, o primeiro após a descoberta do pré-sal.
A área que fica a 183 km da costa carioca será disputada por empresas de 10 nacionalidades: as chinesas CNOOC International Limited e China National Petroleum Corporation-CNPC, a colombiana Ecopetrol, a japonesa Mitsui & CO, a indiana ONBC Videsh, a portuguesa Petroga, a malasiana Petronas, a híspano-chinesa Respsol/Sinopec, a anglo-holandesa Shell, além da própria Petrobrás*.
Segundo levantamento da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o campo tem capacidade de produção entre 12 e 15 bilhões de barris de petróleo, o equivalente a toda a reserva nacional – em torno de 14 bilhões – e renderia mais de dois trilhões de dólares ao país.
Diante de tamanho potencial, a FUP comanda uma mobilização para suspender a licitação e cobrar que a riqueza fique em território nacional.
Como parte da mobilização, iniciou uma greve por tempo indeterminado no último dia 16, que atinge 90% de todo o sistema Petrobrás.
“A realização deste leilão é descabida e o governo deveria ter utilizado o artigo 12 da Lei da Partilha nº 12.351, de 2010, aprovada pelo presidente Lula, que deixa claro: todas as vezes em que houver risco ao interesse da nação e à política energética, o governo poderá contratar a Petrobrás sem necessidade de leilão”, afirma o presidente da FUP, João Antônio Moraes, em vídeo gravado para o portal da entidade.
O dirigente refere-se a uma lei aprovada durante o governo do ex-presidente Lula e que vale exclusivamente para a exploração do pré-sal.
A legislação altera o antigo modelo de concessão, de Fernando Henrique Cardoso (FHC), em que as empresas vencedoras tinham a propriedade do petróleo e do gás natural extraídos, para um sistema de partilha em que a União é a dona do petróleo e recebe da empresa vencedora parte da produção, já sem os custos.
A Petrobrás terá participação mínima de 30% no consórcio vencedor.
O ganhador do leilão ainda terá de pagar R$ 15 bilhões de bônus por um contrato de exploração da área de 35 anos, que podem ser prorrogados.
Moraes destaca também que a experiência de quebra do monopólio por parte do governo tucano de FHC e a entrada de empresas estrangeiras no país trouxe prejuízos para a economia.
“Trinta empresas estrangeiras operam nos campos graças às 11 rodadas de leilões anteriores. Esses grupos, ao contrário da Petrobrás, não fazem compras de material no país e não investem na cadeia produtiva do petróleo como um todo para gerar emprego e renda, tanto na aquisição de navios e plataformas, quanto de petroquímicos e derivados plásticos. Apenas se apropriam da nossa riqueza. Se foi assim até aqui, por que mais uma rodada?”, questiona.
Para o diretor da secretaria de Seguridade Social e Políticas Sociais da FUP, Paulo César Martin, nem mesmo uma possível justificativa de falta de capacidade financeira para exploração é justificável.
“A partir do momento em que a Petrobrás se torna a única empresa a operar o pré-sal, as ações sobem e aumentam o capital. Além de abrir linha de crédito para o Brasil em qualquer lugar do mundo. E se a Petrobrás detém a tecnologia de extração, sem depender de qualquer outra empresa, não precisa fazer leilão”, defende.
Para o dirigente, o governo brasileiro adota uma visão equivocada de que este recurso não será estratégico nas próximas décadas.
“O governo acredita que o petróleo não terá papel central nos próximos anos, como tem agora, então, avalia que, quanto mais cedo tirar da terra e explorar, melhor. Porém, ao menos nos próximos 50 anos, será fundamental para as áreas de energia e petroquímica. Por exemplo, se hoje a indústria automobilística deixasse de produzir um motor de combustão interna, levaria 15 anos para ser substituído por outro que não utilizasse derivado de petróleo”, aponta.
Batalha jurídica – Em paralelo à greve, a FUP e seus sindicatos ingressaram com ações populares na Justiça Federal para suspender o leilão por conta do ataque aos interesses nacionais.
O professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP e ex-diretor de Gás e Energia da Petrobras, Ildo Sauer, e o jurista Fábio Konder Comparato, além da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet) também protocolaram ações populares contra o leilão.
* A CUT grafa Petrobrás, com acento, em repúdio à tentativa de mudança de nome da estatal pelas mãos do ex-presidente FHC, em 2000. Ele queria transformar a empresa em Petrobrax para tornar o nome mais palatável e vender ao capital estrangeiro um dos maiores patrimônios brasileiros. Graças à mobilização da classe trabalhadora e ao fim do governo tucano, felizmente, só perdermos o acento.
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PETRÓLEO - "Chineses vão lucrar muito e ainda garantir suprimento seguro de petróleo.

Ildo Sauer: Chineses vão lucrar muito e ainda garantir suprimento seguro de petróleo



‘Governo está promovendo, com o pré-sal, a maior privatização e entrega da história’
VALÉRIA NADER E GABRIEL BRITO, no Correio da Cidadania, em 16.10.2013
Acompanhar a realidade brasileira e as narrativas sobre ela tem sido uma experiência complexa.
Em um dia, e por um lado, aparecem, nas grandes mídias, notícias que destacam um crescimento do emprego e do rendimento do trabalho em alguns meses, a perda de fôlego na subida da inflação e até mesmo a recuperação da aprovação ao atual governo diante da queda bombástica da mesma após as manifestações de junho.
Até aí, estamos frente a um cenário bem tranquilo no Brasil, bom para o governo e para a população.
Em outros dias, e por outro lado, são os mesmos veículos a destacarem os grandes insucessos com que tem se deparado o governo, em face, especialmente, da desistência do leilão do pré-sal pelas grandes corporações do petróleo mundial e da baixa adesão de concorrentes para as concessões de rodovias, ferrovias e aeroportos —  o que seriam consequências de um Estado dirigista e de condições escorchantes impostas aos grupos privados.
Tantas meias-verdades, quando não grosseiras manipulações, inserem-se e decorrem de  contexto em que já está acirrado o debate eleitoral (faltando ainda quase um ano para o próximo pleito presidencial) e no qual grandes infraestruturas econômicas (ou o que restou delas) estão novamente no olho de uma acirrada disputa intercapitalista.
Para comentar e analisar estes fatos, o Correio da Cidadania conversou com o engenheiro e professor da USP Ildo Sauer, ex-diretor de energia e gás da Petrobras no mandato de Lula.
Em uma conversa que forçosamente teve início pelo primeiro e próximo leilão do pré-sal – do qual os atuais mandatários parecem que não vão arredar pé, a despeito de tantos clamores em contrário, de movimentos sociais até reconhecidos técnicos e estudiosos do setor –, o engenheiro  utilizou de sua costumeira lucidez e contundência.
Os grandes atores capitalistas que têm ganhado espaço no Brasil nas últimas gestões, desde FHC, passando por Lula, e agora com Dilma, serão, segundo Ildo, novamente contemplados no setor do petróleo.
Um processo que se revigora a cada nova investida, e sob a guarda principal do BNDES,
Para o engenheiro,  “esse hibridismo do projeto fernandista com o projeto lulista/dilmista coloca um contexto no qual o governo, agora, promove o leilão parcial do petróleo já encontrado, coisa que nenhum país do mundo faz”.
É ainda enfático ao dizer que “vender petróleo já descoberto, em leilão, sem quantificar exatamente seu valor, é uma inovação absolutamente estarrecedora, criada por este governo, inspirado na legislação do modelo de partilha, proposto em 2002, como um avanço em relação às concessões, quando ainda persistia um risco grande em relação aos modelos geológicos. Porém, quando o pré-sal foi confirmado (uma teoria de décadas, que só pôde ser comprovada com o avanço da geofísica e dos novos modelos computacionais, nos anos de 2004, 2005, 2006 e 2007 na Petrobras), o modelo de partilha foi superado, já ali”.
A primeira parte da entrevista pode ser lida a seguir. Na segunda parte, que será em breve publicada, prossegue-se com o enfoque de outros setores que passam por lógica de reestruturação semelhante à do petróleo e com uma avaliação do cenário eleitoral.
Correio da Cidadania: Na última entrevista que nos concedeu, você afirmava que o governo Lula “assumiu toda a herança de FHC da dependência associada, da hegemonia financeira no país, de setores privatizados” e que o governo Dilma trata de “destruir tudo que ainda resta de capacidade de planejamento público”. A insistência do governo no próximo leilão de petróleo, no campo de Libra, na área do Pré-Sal, apesar de tantos clamores em contrário, são uma evidência dessa constatação?
Ildo Sauer: Com certeza, sim. A atitude do governo Dilma Rousseff, sucedendo o governo Lula da Silva, confirma, lamentavelmente, a metamorfose no caráter daquilo que foi proposto na campanha de 2002, colocando os governos do PT como sequência natural aos governos neoliberais tucanos.
Se os primeiros aprofundaram a dependência associada, os governos do PT a mantiveram e acrescentaram alguns conceitos, que eu diria inspirados na visão da CEPAL, para criar os chamados “campeões nacionais”.
Às custas do BNDES e outras garantias vindas do sistema público estatal, puderam se transformar em grandes atores capitalistas, no Brasil, na América Latina, na África e no mundo.
Está aí o projeto: os frigoríficos, com a JBS-Friboi; as telecomunicações, com a Andrade Gutierrez; as redes elétricas, com a Camargo Correa; a petroquímica, com a Braskem, do grupo Odebrecht; os biocombustíveis, com o grupo Odebrecht e outros, no Brasil e na África. Todas essas empresas têm os fundos de pensão e empresas estatais como uma espécie de apoio e muleta para os projetos.
Assim, esse hibridismo do projeto fernandista com o projeto lulista/dilmista coloca um contexto no qual o governo, agora, promove o leilão parcial do petróleo já encontrado, coisa que nenhum país do mundo faz.
Vender petróleo já descoberto, em leilão, sem quantificar exatamente seu valor, é uma inovação absolutamente estarrecedora, criada por este governo, inspirado na legislação do modelo de partilha, proposto em 2002, como um avanço em relação às concessões, quando ainda persistia um risco grande em relação aos modelos geológicos.
Porém, quando o pré-sal foi confirmado (uma teoria de décadas, que só pôde ser comprovada com o avanço da geofísica e dos novos modelos computacionais, nos anos de 2004, 2005, 2006 e 2007 na Petrobras), o modelo de partilha foi superado, já ali.
No estágio em que nos encontramos, depois que o modelo geológico do pré-sal foi confirmado, com uma nova e imensa província petrolífera confirmada, o normal, em qualquer país do mundo, seria delimitar o volume de petróleo envolvido e eventualmente até certificar tal volume. Depois, definir uma estratégia, o que não foi feito.
Por exemplo: na Arábia Saudita, Venezuela, Irã, Iraque, e em todos aqueles campos onde há fortes indícios de petróleo, é feita uma conclusão do processo exploratório – chama-se assim tecnicamente – que permite confirmar o volume envolvido, pra daí definir uma estratégia em relação ao ritmo de produção.
E se o volume for muito grande, como o caso brasileiro indica, coordena-se com os demais países produtores, no sentido de garantir que o preço do petróleo possa ser mantido num patamar elevado, gerando mais riqueza para os países produtores.
Isso é uma disputa geopolítica estratégica, entre os grandes consumidores – comandados pelos EUA, a China, que entrou no clube agora, e outros em menor escala, como a Índia – e os países produtores – comandados pela OPEP, cujo líder principal ainda é a Arábia, maior produtora, com cerca de 10 milhões de barris por dia, em coordenação com a Rússia, que não é da OPEP, mas também produz quase 10 milhões de barris por dia.
OPEP mais Rússia respondem por 35 milhões de barris, dos quase 90 milhões de barris consumidos diariamente no mundo.
Parte significativa é produzida e consumida dentro de países como os EUA, que têm uma produção muito grande, inclusive com a entrada agora do petróleo não convencional e o gás não convencional, chamados shale gas e shale oil, com biocombustíveis e outros potenciais de eficiência energética.
Além disso, há o anúncio recente, de 2011, do acordo entre os presidentes Obama e Rousseff, para acelerar o desenvolvimento dos recursos do pré-sal, com a cooperação dos dois países e no interesse de ambos, se é que isso é possível. Mas foi assim que a Casa Branca anunciou o acordo.
Os EUA dizem que vão buscar desenvolver sua plataforma continental, atrás de shale gas e oil no mundo inteiro, especialmente no México, por estar próximo, na China, que tem mais recursos, e também na Argentina e Brasil.
No México, a Casa Branca já pressiona e negocia a abertura do Golfo do México, na parte do país asteca, pois a parte norte-americana já está em desenvolvimento.
Correio da Cidadania: Diante, portanto, do peso e papel dos EUA no xadrez do petróleo, passou a ser determinante o que pode decorrer na exploração do pré-sal, não?
Ildo Sauer: A estratégia global dos EUA é tentar quebrar a espinha dorsal da OPEP, porque, em 1960, quando ela foi criada, os Estados Nacionais controlavam 2% das reservas mundiais, as multinacionais, 84% e a URSS, 14%.
Em 2010, temos o reverso: as multinacionais têm menos de 10% e os Estados Nacionais, na maioria com empresas 100% públicas, ou híbridas, como a Petrobras e a Statoil, e algumas chinesas, detêm, em conjunto, mais de 92% das reservas. Foi isso que permitiu a coordenação da produção, elevando o preço, paulatinamente, desde o primeiro experimento, no início de 2005, quando o barril ainda estava em 30 dólares.
Apesar das tentativas da OPEP, em 1973 e 1979, de levantar o preço, isso não se sustentou, porque havia a atuação da União Soviética, que vendia fora da cota, além do próprio México e outros países, que não cumpriam com as cotas e tentavam vender por fora do acordo, o que solapou os preços.
Portanto, essa é a disputa. É evidente que, para um país produtor, com uma riqueza do tamanho do pré-sal (fruto da natureza, pois foi produzido em pelo menos 130 ou 140 milhões de anos – e, do ponto de vista social, fruto de uma luta que em 16 de outubro coroa 60 anos, com o aniversário da Petrobras), tal disputa, natural e social, outorgará à sociedade brasileira uma riqueza que na verdade pertence às gerações futuras.
Porque, neste quadro que citei há pouco, o petróleo tende a ter uma possibilidade de valorização nas próximas décadas, na medida em que se aproxima o fim da disponibilidade de recursos convencionais.
Os substitutos de petróleo, mais caros, não convencionais, as energias renováveis, ou mesmo a liquefação do carvão, que seria a única forma atualmente possível de fazer energia convencional, ou a mudança do padrão urbano-industrial, tudo isso leva a um custo. E quem controla o petróleo pode se apropriar de uma chamada renda absoluta, renda diferencial, desde que construa as condições políticas para isso, o que a OPEP tem feito.
Portanto, a pergunta é: o acordo que a senhora Rousseff assinou com Obama, em 2011, é do interesse do país?
Parece-me que não, é o contrário.
O interesse brasileiro deveria ser se coordenar com a OPEP para manter os preços, especialmente no futuro. Até porque, como eu disse, este petróleo que está aí pertence às gerações futuras.
O conceito de royalty vem da ideia de que existe um soberano. Antigamente, o soberano era o rei, agora o soberano é o povo.
Pelo artigo 20 da Constituição, é a nação brasileira. Arrancar esse petróleo e convertê-lo em moeda, algo possível por muitos modelos técnicos e econômicos, só faz sentido se o petróleo produzido for convertido em uma riqueza superior à que o próprio petróleo representará no futuro, se ainda for mantido nos seus reservatórios.
De maneira que esse é o grande dilema geopolítico, estratégico e ético enfrentado pela sociedade brasileira, quando o governo anuncia o leilão do campo de Libra. Esse é o contexto que deve ser entendido.
O governo tem dado mostras de que não compreendeu nem o papel do petróleo na história da energia e da sua reprodução social, e nem a disputa que está aí.
Correio da Cidadania: Caso fosse pra tratar o assunto petróleo com seriedade hoje, o que deveria ser feito, em sua opinião, tanto em termos operacionais, como no que se refere à atual legislação que arbitrará a partilha?
Ildo Sauer: A primeira medida, em qualquer país, seria concluir o processo exploratório, a um custo de aproximadamente 7 bilhões de dólares, fazendo uns 100 poços exploratórios de Santa Catarina ao Espírito Santo, permitindo-nos delimitar o volume de reservas.
Isso proporcionaria avaliar com segurança qual estratégia poderia ser tomada.
Ao longo de 60 anos, a Petrobras foi capaz de descobrir 20 bilhões de barris convencionais, dos quais 5 bilhões foram produzidos, tendo uma reserva de cerca de 15 bilhões. Mas, no modelo do pré-sal, já temos assegurados, sem confirmação formal, cerca de 60 bilhões de barris.
São 15 bilhões em Libra; 9 bilhões em Lula (antigo Tupi); 4 bilhões em Iara; 10 bilhões no campo de Carioca; 9 bilhões no campo de Franco; 2 bilhões em Guará; cerca de 5 bilhões nas áreas das chamadas baleias.
De modo que, se fizermos a soma de tudo, chegamos a quase 60 bilhões de barris. Há, no entanto, muitos geólogos e especialistas acreditando que o Brasil tem no mínimo 100 bilhões de barris, podendo chegar a 300 bilhões, o que seria a maior reserva do mundo. Esse é o quadro.
Quando vamos fatiar e vender, fazendo um leilão de 15 bilhões de barris, o acontecimento não é grave só pelo que o país conseguiu acumular em 60 anos de história, com  todo o trabalho envolvido da Petrobras; significa também que o modelo de tratar petróleo como algo convencional, e não como um assunto estratégico, está equivocado.
Como disse no começo, o modelo da partilha era interessante antes, quando permitia obter mais recursos públicos em relação ao regime das concessões. Hoje, ambos estão superados.
Todos os países do mundo que possuem grandes reservas, como Arábia, Venezuela, Irã, Iraque, a própria Líbia, Kuwait, Emirados Árabes, todos eles têm uma empresa 100% estatal, que é o modelo preferido. Outros, como não têm a empresa estatal, apelam a um modelo de prestação de serviço com a própria empresa.
A Petrobras foi contratada pra concluir o processo exploratório, como já o fez, por causa da capitalização e da cessão onerosa daqueles 5 bilhões de barris (quando da sanção em lei do modelo de partilha).
A ironia foi essa: a Petrobras foi contratada pela ANP pra encontrar alguns campos que somassem 5 bilhões de barris.
Encontrou Libra, que tinha 15 bilhões, muito além do necessário; encontrou Carioca, com 10; Franco, com 9. Isto é, acabou que o benefício colateral foram as descobertas feitas pela Petrobras.
O certo seria concluir esse processo e saber quanto existe de petróleo no Brasil. E então a Petrobras seria uma prestadora de serviços. Receberia do governo um prêmio muito grande para manter a tecnologia e remunerar as pessoas.
Porque a lei da partilha, apesar de todos os seus problemas, só foi sancionada nos últimos dias do governo Lula (22/12/2010), que durante oito anos exerceu, na plenitude, o modelo da concessão, por ele combatido como candidato.
Ele exerceu tal modelo por mais tempo que o próprio criador, FHC, que o criou em 1997, começando a exercê-lo a partir de 2000.
Mas a lei 12.351/2010 permite, de todo modo, em seu artigo 8, ao governo e à União, estabelecer o contrato de partilha de produção diretamente com a Petrobras, dispensando a licitação, ou mediante a licitação, mas sem modelo de leilão.
Assim, ainda que o governo precise arrumar dinheiro, buscar recursos, por razões macroeconômicas, porque está com problemas de fluxo na balança de pagamentos e no equilíbrio das contas públicas, poderia fazê-lo mediante a contratação aberta e transparente da Petrobras, para então buscar os parceiros, negociando aberta e francamente, como é o caso de China, Índia e outros mais.
Mas não. O governo resolve fazer um leilão que assemelho ao seguinte: suponha que cada campo de petróleo corresponde a uma fazenda cheia de bois. E o dono da fazenda vai leiloá-la sem sequer contar o número de bois. É o caso de Libra.
A ANP diz que pode ter entre 8 e 12 bilhões de barris, mas muitos geólogos da Petrobras acreditam até em 15. Como fazer o leilão? Péssimo sinal.
Indica que estamos abrindo mão de uma estratégia global em benefício de um contrato microeconômico, que se resolve sozinho. Uma vez assinado o contrato com o consórcio, incluindo a Petrobras como operadora ou financiadora, ela pode participar em até 70%. Mas a  empresa está quebrada, com dificuldades, por causa da descapitalização que o governo impôs a ela, ao obrigá-la a importar combustíveis (GLT, gasolina, diesel e outros) e vendê-los abaixo do preço de importação.
Ao mesmo tempo, a empresa não tem plano de investimentos. Está, portanto, numa situação desfavorável para participar do leilão, dando mais chance aos outros.
Em resumo, o que o governo quer leiloar agora é um duplo recurso: primeiro, o recurso natural, o campo, petróleo; segundo, a capacitação tecnológica da Petrobras, feita operadora e, portanto, minimizando o risco econômico e financeiro do sócio que vier, que só precisará aportar recursos financeiros para cumprir o programa de investimento.
É uma avaliação simples: se esse campo de Libra tiver de fato 15 bilhões de barris, serão necessárias cerca de 20 plataformas, ao custo de 3 a 4 bilhões de dólares, cerca de 70 bilhões de dólares ao todo.
Mas, se a produção for acelerada, por exemplo, pra exaurir o campo em 20 anos, ao invés dos 35 anos possíveis, significa produzir 2 milhões de barris por dia.
Com o custo de capital, somado à operação e manutenção, em 15 dólares, com os 15% de royalties, também 15 dólares, sobram 70 dólares, caso o atual preço de 100 dólares por barril seja mantido.
Isso multiplicado por 2 milhões de barris por dia dá 730 milhões de barris por ano, mais de 50 bilhões de dólares de ganho líquido por ano. Ou seja, o investimento se paga em um ano ou um ano e meio. No máximo, em dois anos. É o dilema que está colocado.
Correio da Cidadania: Diante de um quadro quase surreal, aparentemente sem paralelo algum no mundo, que rifa nosso planejamento estratégico para o futuro, o que você considera que pode ou dever ser feito contra este leilão?
Ildo Sauer: Sabe qual o grave problema? Se o Brasil começar a colocar de 1 a 2 milhões de barris por dia no mercado, e a Petrobras, no seu plano de negócios, estiver prevendo se tornar uma exportadora grande até 2020, o Brasil poderá já estar exportando de 2 a 3 milhões de barris por dia nesse ano, ficando atrás somente da Rússia e Arábia, junto de Venezuela, Irã (se não for invadido também), Iraque (que não se recuperou), Líbia (que decaiu muito)…
Portanto, é o quadro colocado aí. É difícil compreender qual a visão geopolítica e estratégica que motivou o governo a cometer o desatino de propor o leilão desse jeito, sem sequer saber quanto de petróleo existe.
Por isso, também, que eu e outros fazemos a proposta de, primeiro, cancelar e suspender o leilão imediatamente. Estamos buscando parceria, pra entrar na justiça, com movimentos sociais e parlamentares, como os senadores Roberto Requião, Pedro Simon, Randolfe Rodrigues etc.
Até o senador Aloyzio Nunes Ferreira e outros têm manifestado apoio a um decreto legislativo que cancele e suspenda o leilão. Outros defendem a entrada na justiça.
Mas a base que eu e outros defendemos, principalmente, é que a primeira etapa seria concluir o processo exploratório.
Se temos 100 bilhões de barris, ou 200, ou 300, ou 60, a estratégia é uma ou outra, de acordo com a condição. Depois, que se faça um plano nacional de desenvolvimento econômico e social.
Para saber quanto teríamos de investir em educação e saúde públicas, mobilidade e reforma urbana, reforma agrária, proteção ambiental, infraestrutura produtiva, ciência e tecnologia e, acima de tudo, a promoção de tecnologia de transição energética, através das fontes renováveis, tornando-as mais baratas e competitivas.
Em algumas décadas, isso será mandamento, e não uma questão de escolha.
Só depois de saber o orçamento de tudo isso é que iríamos organizar a produção, em coordenação com os demais países, pra manter o preço elevado e obter o excedente econômico.
Isso poderá incluir parcerias estratégicas com países que poderão aportar recursos, por exemplo, China, Índia e outros que precisam de petróleo.
Eles têm tecnologias, serviços e produtos que poderiam ajudar a fazer a rede de transporte de alta velocidade nas cidades, entre estados, além de ferrovias, portos e tudo mais. Isso é possível.
Com esse plano, poderíamos, então, alterar radicalmente a condição socioeconômica do país, promovendo um país desenvolvido.
Correio da Cidadania: Desse modo, a debatida subordinação está sendo francamente assumida como projeto de país? O ‘bilhete premiado’ está sendo rasgado?
Ildo Sauer: Na linha do que disse na entrevista anterior (‘Pacotes do governo vão completar processo que FHC não conseguiu terminar’), precisamos depender necessariamente das empresas capitalistas, brasileiras ou estrangeiras, como propôs FHC, ou mesmo as nacionais, criadas pelo Lula.
Com nossas instituições criadas socialmente – ao estilo do que propuseram Ruy Mauro Marini, Caio Prado Jr., Theothonio dos Santos, Vânia Brambilla, e outros que trabalham com a dialética da dependência –, seria possível alterar radicalmente os termos de intercâmbio e a inserção internacional de nosso país.
Inserção esta que, pela lógica da Dilma, será subalterna, ao apenas aportar petróleo pra jogá-lo pelo mundo, ao invés de construir uma estratégia diferente, pela qual esse intercâmbio se faça em termos menos assimétricos, com maior igualdade, privilegiando o resgate das dívidas sociais do Brasil.
A Constituição brasileira, em seu artigo 5, fala dos direitos sociais. Começa pela educação e saúde, passa pela moradia e muitos outros. O artigo 20 diz que o subsolo, o petróleo e os potenciais hidráulicos pertencem à nação.
O governo diz que não tem dinheiro pra cumprir as dívidas do artigo 5, mas está desperdiçando a riqueza potencialmente presente, garantida pelo artigo 20.
Portanto, recuperando a dimensão do que têm dito esses teóricos citados – que buscam maior autonomia para a sociedade brasileira na sua relação com os países centrais, da América do Norte, Europa e Ásia –, a utilização dos recursos naturais com vistas à sua apropriação social, ao lado do avanço da capacidade produtiva sob comando público (leia-se, sob comando da Petrobras),  faria possível definir uma estratégia capaz de, em uma década, resgatar grande parte da dívida social brasileira.
Mas não é que está acontecendo. Não há esse plano. Está tudo sendo feito no improviso, por incompetência, falta de visão estratégica e geopolítica, arrogância, ignorância. Ou ainda má fé, que me custaria acreditar.
Está claro, portanto, que a visão adotada pelo governo — com a respectiva  missão delegada à ANP, a partir de uma avaliação superficial do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), de promover o leilão açodadamente — indica um desastre político.
Ainda que o governo diga que  resultarão muitos recursos e dinheiro dessa estratégia, está claro que não é bem assim. Estamos abrindo as portas para um modelo de entrega.
É a maior privatização da história brasileira, muito maior do que a promovida pelos tucanos. Essa senhora Rousseff, de uma tacada só, está promovendo a maior privatização e entrega da história.
Repito que não há notícia no mundo, de país algum, que resolva leiloar e vender petróleo, sem saber quanto do produto já foi descoberto. Isso não se faz! É contra qualquer noção de gestão de recursos naturais, no curto, médio e longo prazo.
Correio da Cidadania: Como enxerga, finalmente, e à luz de tudo que foi dito, o fato de, aparentemente, o leilão do campo de Libra não ter atraído a participação de um número maior de empresas, como, por exemplo, a grandes Chevron e Exxon?
Ildo Sauer: Não surpreende, mesmo que a imprensa brasileira tente usar tais empresas a fim de mostrar que o leilão foi um fracasso.
Bom, fracasso é fazer o leilão. Como a Petrobras já está decidida, por lei, como operadora, escolhendo quais plataformas e onde comprá-las, não interessa à Chevron, Exxon, BP e BG (esta menor), pois elas querem operar e perseguir óleo.
Neste caso, o papel que se reserva a elas é o de sócio financeiro. E tais empresas também sabem que ninguém tem esse dinheiro em caixa, 70 ou 80 bilhões de dólares.
Vão todos buscar no mercado financeiro. Hoje, quem tem muito mais recurso financeiro são as empresas chinesas.
O Estado chinês acumulou reservas internacionais de 3 trilhões de dólares, grande parte delas emprestadas ao governo dos EUA.
Obviamente, tirar de lá 80 bilhões pra vir pra cá não tem um significado tão relevante para um país como a China, com a Sinopec, CNPC, Petrochina, seja qual delas estiver nos leilões.
Sabe-se que elas, se vierem, vão lucrar muito e ainda vão garantir suprimento seguro para a China com tal modelo.
Valéria Nader, jornalista e economista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.
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MÍDIA - A Veja e o propinoduto tucano

Discretamente e com pé atrás, Veja embarca no "trensalão" tucano


Reportagem discreta da revista dos Civita aborda o enriquecimento inexplicável de servidores do governo de São Paulo, que teriam recebido propinas de empresas como Alstom e Siemens.


Ao governador Geraldo Alckmin, interessa tratar o caso como desvio isolado de alguns servidores, e não como um esquema de corrupção, vinculado ao financiamento de campanhas políticas; alguns anos atrás, a própria Veja apontava que a cúpula do PSDB montava seu caixa dois a partir de empresas como a Alstom.

Aos poucos, de forma cautelosa e extremamente discreta, a revista Veja, da família Civita, começa a embarcar no chamado "trensalão" tucano. 

Neste fim de semana, a reportagem "Trilha de Dinheiro", assinada pela jornalista Alana Rizzo, aborda o escândalo das propinas pagas por empresas como Alstom e Siemens a governos do PSDB em São Paulo.

O discurso é bem mais cuidadoso do que o de alguns anos atrás, quando a própria Veja investigava esquemas de caixa de dois para a segunda campanha presidencial de Fernando Henrique Cardoso, em 1998. 

Naquele ano, a revista afirmava, com todas as letras, que Andrea Matarazzo, hoje vereador, arrecadou parte do caixa dois, num esquema que passou pela multinacional Alstom. Ou seja: era um esquema de corrupção sistêmica, que passava pela alta cúpula do partido, com o propósito de perpetuá-lo no poder.

Agora, o discurso é diferente – e está alinhado com a estratégia do governador Geraldo Alckmin de se colocar como vítima do cartel, disposto a combatê-lo. Tudo não passaria de desvios cometidos por servidores graduados, mas não pela cúpula partidária.

"Nunca saiu da fase genérica a acusação de formação de cartel de companhias estrangeiras fornecedoras de equipamentos para governos de São Paulo comandados desde 1995 pelo PSDB", diz a reportagem, em sua primeira frase. "Mas, até a semana passada, faltava ao caso um elemento crucial: para que a cartelização funcionasse, muito provavelmente teria sido necessária a colaboração de altos funcionários do governo".

Veja cita os nomes de João Roberto Zaniboni, ex-diretor de operações da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, de Jorge Fagali Neto, ex-secretário de Transportes Metropolitanos, de Eduardo Bernini, ex-presidente da Eletropaulo e de Henrique Fingermann, ex-presidente da Empresa Paulista de Transmissão de Energia. O atual governador, Geraldo Alckmin, e seus dois antecessores, José Serra e Mário Covas, entram "en passant" pela reportagem.

A Alckmin, interessa consolidar o discurso de que os desvios teriam sido falhas isoladas de servidores – e não um esquema de corrupção sistêmica, destinado ao financiamento de campanhas. Veja, desta vez, parece disposta a ajudar.

Fonte: Brasil 247
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